Acórdão nº 50018079520118210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 26-05-2022

Data de Julgamento26 Maio 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50018079520118210010
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002012521
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5001807-95.2011.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

RECORRENTE: JULIANO DOS SANTOS BREMBATI (ACUSADO)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra JULIANO DOS SANTOS BREMBATI e SÉRGIO DAL ALBA, dando o primeiro como incurso nas sanções do artigo 121, §2º, incisos I, IV e V, do Código Penal e o segundo por incursão nas sanções do artigo 16, caput, da Lei nº. 10.826/03, pela prática dos seguintes fatos delituosos (ev. 02, DENUNCIA1):

1º FATO (Homicídio qualificado)

"No dia 24 de junho de 2011, por volta das 11h09min, na Rua Dr. José Aloysio-Brugger, 1407, apto. 11, Condomínio Tropical, bairro Jardim América, nesta Cidade, o denunciado Juliano dos Santos Brembati, valendo-se de uma arma de fogo, mediante dissimulação, por motivação torpe e para assegurar a ocultação de outro crime, matou, dolosamente, Reni Mattana, desferindo contra este disparos com o instrumento lesivo aludido, produzindo, na vítima, as lesões documentadas no Auto de Necropsia n.° 218-52/2011 (fls. 103-104 do IP), que aponta, como causa da morte, hemorragia interna por lesão cardíaca e pulmonar.

Para tanto, o denunciado, representando à vítima que pretendia pagar parte dos valores devidos em razão de operações de desconto de duplicatas com a empresa da qual ela era sócia (RKL Fomento Mercantil Ltda.), combinou de se encontrar com o ofendido na manhã do fato, no endereço acima indicado, onde funcionava escritório da aludida empresa.

Na oportunidade, Juliano apanhou uma arma de fogo e deslocou-se ao local do encontro, acompanhando a vítima até o apartamento, ocasião em que o agente desferiu diversos disparos contra Reni, provocando neste as lesões somáticas fatais indicadas na perícia médica acima mencionada.

O ilícito foi cometido mediante dissimulação, porquanto o denunciado ocultou a intenção homicida, encontrando a vítima e sendo por esta conduzido ao local do crime sob o pretexto de que pretendia pagar parte de uma dívida.

O crime foi cometido pelo denunciado, por motivo torpe, identificado com o seu propósito em pôr termo à vida da vítima, livrando-se, assim, da cobrança de dívida por essa realizada, decorrente da negociação de títulos de crédito emitidos sem correspondência em negócio que deveriam estar-lhes dando causa.

O crime foi cometido para garantir a ocultação do delito de duplicata simulada, relativo à emissão de títulos não correspondentes às mercadorias vendidas pelas empresas de Juliano, uma vez que, antes do fato, o ofendido passara a cobrar comprovante relativo à emissão de duplicatas descontadas pelo agente, acusando este de possuir uma fábrica de “títulos frios”.

2º FATO (Porte de Arma)

"Em data e horário e local não suficientemente precisados, mas até o ano de 2009 (inclusive), em Flores da Cunha/RS, o denunciado Sérgio Dal Alba possuía e, entre o final do mencionado ano e o início do subsequente, em data, horário e local incertos, cedeu, ainda que gratuitamente, o revólver Taurus, calibre.357, n.º de série NE939619, infra-tambor n.° 7431, arma de fogo de uso restrito, apreendida (conforme auto da fl. 34 do IP), sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Na oportunidade, o denunciado, que possuía a arma de fogo em questão desacompanhada de quaisquer documentos legitimadores da posse, vez que o instrumento lesivo em questão não estava, nem mesmo registrado em nome do agente, entregou o revólver a Reni Mattana, vítima do primeiro fato delituoso narrado.

O artefato acabou sendo encontrado e apreendido em 27 de junho de 2011, após a morte de Reni, no local onde funcionava o escritório da empresa RKL Fomento Mercantil Ltda., pertencente à vítima."

A denúncia foi recebida com relação a Juliano em 14/11/2011 (ev. 02, PROCJUDIC15, fl. 01) e foi recebida quanto a Sérgio em 21/09/2012 (ev. 02, PROCJUDIC24, fl. 22)

Os acusados foram pessoalmente citados (ev. 02, PROCJUDIC15, fl. 15 e PROCJUDIC25, fl. 20) e apresentou resposta à acusação através de defensores constituídos (ev. 02, PROCJUDIC15, fls. 17/23 e PROCJUDIC24, fls. 32/33 e PROCJUDIC25, fls. 01/14).

Foi determinada a cisão processual quanto ao acusado Sérgio, tendo o processo prosseguido tão somente quanto a Juliano (ev. 02, PROCJUDIC25, fls. 23/24).

Durante a instrução processual, foram ouvidas as testemunhas, deferida a habilitação de assistência à acusação e interrogado o acusado (ev. 02, PROCJUDIC27, fls. 04/05 e 07/22, PROCJUDIC28, fls. 02/31, PROCJUDIC29, fls. 01/32, PROCJUDIC30, fls. 01/30, PROCJUDIC31, fls. 01/02, PROCJUDIC31, fls. 26/27, PROCJUDIC32, fls. 08 e 21/22, PROCJUDIC33, fl. 06, PROCJUDIC34, fls. 07/09, PROCJUDIC36, fls. 04/05, PROCJUDIC37, fls. 13/15, PROCJUDIC39, fls. 01/30, PROCJUDIC40, fls. 01/31, PROCJUDIC41, fls. 01/27 e PROCJUDIC42, fls. 01/03, 20/21 e 24).

Encerrada a instrução, as partes apresentaram memoriais em substituição aos debates orais (ev. 02, PROCJUDIC42, fls. 29/35 e PROCJUDIC43, fls. 03/04 e 09/14).

Sobreveio a decisão, de lavra do Dr. Rafael Morita Kayo, pronunciando Juliano dos Santos Brembati, como incurso nas sanções do artigo 121, §2º, incisos I e IV, do Código Penal, a fim de submetê-lo a julgamento perante o Tribunal do Júri da Comarca de Caxias do Sul (ev. 02, SENT44).

A decisão foi presumidamente publicada em 04/12/2020 (ev. 02, RSE45, fl. 01).

A defesa interpôs Recurso em Sentido Estrito (ev. 02, RSE45, fl. 07). Em razões recursais, postulou apenas e tão-somente a exclusão das qualificadoras, haja vista a sua improcedência manifesta (ev. 02, RAZRECUR46, fls. 12/16).

Com as contrarrazões (ev. 02, RAZRECUR46, fls. 18/24 e 28/29), a decisão foi mantida em juízo de retratação (ev. 15, DESPADEC1) e os autos foram remetidos a esta Corte.

Nesta instância, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Eduardo Bernstein Iriart, firmou parecer opinando pelo desprovimento do recurso defensivo (ev. 10, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Conheço do recurso, uma vez que adequado e tempestivo.

No caso dos autos pretende a defesa a exclusão das qualificadora do motivo torpe e da dissimulação.

Primeiramente, a fim de firmar alguns conceitos, cabe destacar que pronúncia é mero juízo de admissibilidade acusatória, e não condenatório. Logo, se após a instrução criminal, existirem elementos, mesmo que indiciários, a apontar a autoria/participação, provada substancialmente a materialidade, cabe ao juiz remeter a acusação a exame pelos jurados.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS COUS. HOMICÍDIO. LEGÍTIMA DEFESA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. PRONÚNCIA. FUNDAMENTAÇÃO. REVISÃO FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Tendo a Corte de origem, ao manter a pronúncia, concluído pela presença dos indícios suficientes de autoria e prova da materialidade do crime, salientando não haver prova cabal e irrefutável da prática da conduta sob legítima defesa, não é possível rever tal posicionamento, por demandar revisão do conteúdo fático-probatório dos autos, providência incabível em habeas corpus.
2. A sentença de pronúncia não encerra juízo de procedência acerca da pretensão punitiva, tão somente viabilizando a competência para o Tribunal do Júri, a quem competirá apreciar o pleito de reconhecimento da legítima defesa, decidindo a lide de acordo com os elementos probatórios produzidos.
3. Nos termos do art. 385 do Código de Processo Penal, nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição. O artigo 385 do Código de Processo Penal foi recepcionado pela Constituição Federal (AgRg no REsp 1612551/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 02/02/2017, DJe 10/02/2017).
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no HC 605.748/PI, Rel.
Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 24/11/2020, DJe 27/11/2020)

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS COUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS DA AUTORIA. ANIMUS NECANDI. PRESENÇA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. NÃO CONHECIDO.
1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício.
2. A decisão de pronúncia não revela juízo de mérito mas apenas de admissibilidade da acusação, direcionando o julgamento da causa para o Tribunal do Júri, órgão competente para julgar os crimes dolosos contra a vida. Para tanto, basta a demonstração da materialidade do fato e a existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, conforme disciplina o art. 413 do Código de Processo Penal. 3. Dessa forma, havendo, na r. decisão de pronúncia, elemento indiciário da existência de crime doloso contra a vida, não se revela despropositada a submissão ao Conselho de Sentença, da imputação da conduta prevista nos artigo 121, § 2º, incisos V e VII, na forma do art. 14, inciso II, do Código Penal.
4. Habeas corpus não conhecido.
(HC 488.155/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 12/03/2019, DJe 29/03/2019)

Dessa forma, não é necessária a certeza, bastando apenas a existência elementos circunstanciais verossímeis da autoria e/ou do concurso para que o Juiz técnico acolha a acusação e remeta o processo a julgamento pelo júri. A avaliação das provas e sua credibilidade é competência dos jurados.

Nesse sentido, colaciono precedentes do STJ:

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