Acórdão nº 50018457220208210049 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-06-2022

Data de Julgamento15 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50018457220208210049
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002196911
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001845-72.2020.8.21.0049/RS

TIPO DE AÇÃO: Cédula de crédito bancário

RELATOR: Desembargador CARLOS CINI MARCHIONATTI

APELANTE: RODRIGO MARCO RIBEIRO (EMBARGANTE)

APELADO: COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS ALTO URUGUAI - SICREDI ALTO URUGUAI RS/SC (EMBARGADO)

RELATÓRIO

RODRIGO MARCO RIBEIRO interpõe apelação à sentença (Evento 29 do 1º Grau) que julgou improcedentes os embargos à execução opostos aCOOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS ALTO URUGUAI - SICREDI ALTO URUGUAI RS/SC, nos seguintes termos:

Vistos, para sentença.

RODRIGO MARCO RIBEIRO, qualificado na inicial, propôs EMBARGOS À EXECUÇÃO que lhe move a COOPERATIVA DE CRÉDITO, POUPANÇA E INVETIMENTO ALTO URUGUAI – SICREDI ALTO URUGUAI RS/SC/MG, igualmente identificado, sustentando, preliminarmente, a inépcia da inicial por ausência de descrição da evolução do débito e extrato mensal, exigência de apresentação de cédula de crédito original que originou o valor da dívida cobrada e carência de ação diante da ausência de título executivo.

Sustentou a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, requerendo o afastamento da capitalização de juros, a exclusão dos encargos moratórios, recálculo de IOF e afastamento dos encargos moratórios.

Efetuou os requerimentos de estilo, valorou a causa e juntou documentos.

Determinada a juntada de demonstrativo discriminado e atualizado do cálculo, interposto embargos de declaração, acolhidos, tendo sido recebidos os embargos à execução e deferido o benefício da AJG ao embargante.

Intimado, o embargado apresentou impugnação suscitando, preliminarmente, impugnação à AJG, inépcia da inicial por ausência de cópias das peças processuais relevantes e inépcia da inicial por ausência de memória de cálculos. No mérito, alegou, em síntese, a ausência de abusividades contratuais. Discorreu sobre os encargos financeiros pactuados. Requereu a improcedência dos embargos.

Houve réplica.

Intimadas acerca da produção de provas, o embargante requereu a produção de prova pericial, enquanto o embargado postulou pelo julgamento antecipado.

É o relatório. Decido.

Indefiro a produção de prova pericial, pois, salvo melhor Juízo, a matéria controvertida na presente ação é questão unicamente de direito, pois o contrato firmado entre as partes foi juntado aos autos e o mérito diz somente com o exame das cláusulas e condições, configurando, assim, a situação do artigo 355 do Código de Processo Civil. Entendo que há elementos suficientes para o julgamento do mérito, em razão da matéria e dos documentos juntados.

Refuto a preliminar de carência de ação. A cédula de crédito bancário é título executivo extrajudicial, ainda que não assinada por duas testemunhas, por expressa previsão legal, segundo disposto no artigo 28 da Lei n.º 10.931/04.

Ademais, como a cédula de crédito bancário é título de crédito, não incide o disposto no artigo 585, II, do Código de Processo Civil, que exige a assinatura de duas testemunhas para que lhe seja atribuída força executiva.

Quanto a alegação de ausência de cálculo demonstrativo da evolução do débito, compulsados os autos do processo da execução, verifica-se a existência de demonstrativo de evolução do crédito constituído. Da análise do referido documento, é possível verificar-se a evolução do débito, desde a data da contratação, constando as amortizações e os encargos lançados sobre o valor devido até a data do ajuizamento da demanda executiva.

O documento atacado é hábil a instruir a execução, conforme disposto no artigo 28, § 2º, inciso I, da Lei n. 10.931/2004:

Art. 28. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente, elaborados conforme previsto no § 2o.

(...)

§ 2o Sempre que necessário, a apuração do valor exato da obrigação, ou de seu saldo devedor, representado pela Cédula de Crédito Bancário, será feita pelo credor, por meio de planilha de cálculo e, quando for o caso, de extrato emitido pela instituição financeira, em favor da qual a Cédula de Crédito Bancário foi originalmente emitida, documentos esses que integrarão a Cédula, observado que:

I - os cálculos realizados deverão evidenciar de modo claro, preciso e de fácil entendimento e compreensão, o valor principal da dívida, seus encargos e despesas contratuais devidos, a parcela de juros e os critérios de sua incidência, a parcela de atualização monetária ou cambial, a parcela correspondente a multas e demais penalidades contratuais, as despesas de cobrança e de honorários advocatícios devidos até a data do cálculo e, por fim, o valor total da dívida; e

(...)

Assim, afasto a preliminar aventada pela parte embargante

Por fim, a redação do artigo 798, I, do Código de Processo Civil, não exige que seja instruída a execução com o título original e, em casos assim, a jurisprudência permite que a execução seja ajuizada sem o título original ou de cópia autenticada, bastando, para o preenchimento de tal requisito de procedibilidade, a juntada de cópia simples.

Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. INSTRUÇÃO COM CÓPIA NÃO AUTENTICADA. POSSIBILIDADE. 1. Não questionada a existência do título original, tampouco a sua correspondência com as cópias trazidas aos autos, a determinação de juntada da via original ou de cópia autenticada configuraria mero formalismo. Exegese do art. 422, caput, do Código de Processo Civil. 2. A juntada do documento original somente se justifica nos casos em que o título executivo, por sua natureza cambial, seja passível de circulação, o que não é o caso dos autos, consistindo o título em instrumento particular de confissão de dívida. 3. Entendimento não prejudicado por falta de autenticação da cópia, consoante já firmado pelo Superior Tribunal de Justiça. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 70078201878, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 23-08-2018) grifei.

Afasto, portanto, a preliminar.

No mérito, cumpre afirmar a incidência do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários, como pretende a parte embargante, uma vez que a atividade desenvolvida pela instituição bancária na concessão de crédito nada mais é do que a prestação de um serviço, sendo a parte embargante classificada como consumidora e o embargado como fornecedor, sob a ótica do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90).

Para corroborar esse entendimento, cumpre transcrever a Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

Além disso, o Supremo Tribunal Federal julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.591-1, que atacava o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90, buscando a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras.

Por outro lado, o contrato firmado entre as partes é tipicamente de adesão, uma vez que são poucas as cláusulas contratuais em que admite a discussão com o outro contratante, já estando previamente fixadas quase todas as cláusulas contratuais.

Por esta razão, mostra-se possível a revisão das cláusulas que forem abusivas ou coloquem o consumidor em situação amplamente desfavorável, de acordo com o artigo 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor.

De qualquer forma, os pedidos contidos na inicial não são automaticamente acolhidos pelo fato de o contrato ser de adesão e aplicável o Código de Defesa do Consumidor, pendendo análise das cláusulas que a parte embargante reputa ilegais.

Em relação as cláusulas impugnadas, serão analisadas apenas aquelas para as quais há pedido expresso na inicial em observância ao princípio da demanda, bem como nos termos do Enunciado de Súmula nº 381 do Superior Tribunal de Justiça.

No que se refere a capitalização de juros, dispõe a Súmula nº 121 do STF: "É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada."

No mesmo sentido, dispunha o art. 4º da Lei de Usura (Decreto nº 22.626/33): "É proibido contar juros dos juros; esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta-corrente ano a ano."

Ocorre que a capitalização mensal passou a ser admitida por força da Medida provisória nº 1963-17/2000, publicada em 31/3/2000, atualmente reeditada sob o nº 2.170-36, de 23/08/2001, que em seu artigo quinto estabelece: “Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”.

Evidente, portanto, a legalidade na capitalização mensal de juros no contrato em discussão, pois firmado em abril de 2016, quando já admitida tal cobrança.

Por sua vez, depois de configurada a mora, possível a incidência de juros moratórios no montante do débito.

Assim, porque perfeitamente prevista no artigo 406 do Código Civil de 2002, combinado com o artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, cujos dispositivos permitem a cobrança dos juros de mora em 1% ao mês, sendo aceitável, assim, a cobrança. Na hipótese, a cobrança obedece ao limite de 1% ao mês.

A multa pelo inadimplemento contratual deve ser...

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