Acórdão nº 50018619620208210155 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 25-05-2022

Data de Julgamento25 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50018619620208210155
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002122777
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001861-96.2020.8.21.0155/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

APELANTE: ICATU SEGUROS S/A (RÉU)

APELADO: ELAINE MARCHIONNI (AUTOR)

APELADO: IVANDRO PORTELA DE MORAES (AUTOR)

RELATÓRIO

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por ICATU SEGUROS S/A contra a sentença de Evento 46 (Processo originário) que, nos autos desta ação de cobrança securitária ajuizada por ELAINE MARCHIONNI e IVANDRO PORTELA DE MORAES, julgou procedente a demanda.

Adoto o relatório da r. sentença, pois bem narrou o presente caso:

VISTOS.

ELAINE MARCHIONNI e IVANDRO PORTELA DE MORAES ajuizaram ação de cobrança em face de ICATU SEGUROS S/A, todos qualificados nos autos. Referiram ser genitores e únicos herdeiro de Raquel Marchionni de Moraes, a qual faleceu em 09/01/2020, por acidente de trânsito. Relataram que após o óbito tomaram conhecimento que sua filha fazia parte de um grupo de consórcio pertencente a Administradora de Consórcio Sicredi (contrato nº 00581103), que havia firmado seguro dos consorciados em caso de morte natural ou acidental, junto à requerida. Declararam que foi realizado aviso de sinistro junto à seguradora ré, porém foi negada a cobertura, ao argumento de que a segurada agravou intencionalmente o risco ao dirigir embriagada. Em vista disso, pugnaram pela procedência da ação, a fim de que fosse a requerida condenada ao pagamento do valor da cobertura por morte. Por fim, pleitearam a gratuidade de justiça.

Custas iniciais foram recolhidas ao evento 12.

Recebida a inicial, foi determinada a citação da requerida (evento 15, DOC1).

Devidamente citada, a ré apresentou contestação (evento 30, DOC1). Alegou a perda da garantia pelo agravamento intencional do risco, uma vez que o falecimento da titular do seguro de vida se deu em decorrência desta conduzir veículo automotor sob a influência de álcool. Subsidiariamente, em caso de eventual condenação, ponderou que esta deva ficar restrita aos termos do contrato, limitando-se ao saldo devedor existente na data da morte da segurada, a ser pago diretamente à Administradora de Consórcio Sicredi, beneficiária do seguro.

Houve réplica (evento 35, DOC1).

As partes postularam pelo julgamento antecipado da lide (evento 42, DOC1 e evento 44, DOC1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É O RELATÓRIO.

E o dispositivo sentencial restou redigido nos seguintes termos:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, I, do CPC, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por ELAINE MARCHIONNI e IVANDRO PORTELA DE MORAES em face de ICATU SEGUROS S/A, para o fim de CONDENAR a requerida a efetuar o pagamento do valor de R$ 85.000,00, correspondente a indenização securitária prestamista vinculada ao contrato de "PROPOSTA DE PARTICIPAÇÃO À GRUPO DE CONSÓRCIOS DE BENS MÓVEIS" (evento 30, DOC6). O pagamento deverá ser realizado, inicialmente, através da quitação do referido contrato e, caso ainda exista um saldo remanescente, as sobras deverão ser pagas aos requerentes, conforme previsto na Cláusula 4, do "CONTRATO DE SEGURO PRESTAMITA APÓLICE nº 77.000.024" (evento 30, DOC5). Por fim, o valor deverá ser devidamente atualizado pelo IGP-M desde a data do óbito, acrescido de juros de mora de 1% a contar da citação.

Diante da sucumbência mínima dos requerentes, condeno a ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação, com base no art. 85, § 2º, do CPC.

Havendo recurso(s) – excepcionados embargos de declaração e recurso adesivo – intime(m)-se, independentemente de conclusão (ato ordinatório – arts. 152, VI, CPC, e 567, XX, da Consolidação Normativa Judicial), a(s) contraparte(s) para contrarrazões, remetendo-se em seguida os autos ao Tribunal de Justiça (art. 1010 § 3º, CPC).

Transcorrido o prazo legal sem interposição de recurso voluntário, certifique-se o trânsito em julgado e dê-se baixa nos autos.

Publicada e registrada a sentença, bem como intimadas as partes, automaticamente, via sistema Eproc.

Opostos embargos de declaração por ambas as partes (Eventos 53 e 55 - Processo originário), os aclaratórios opostos pela seguradora ré foram desacolhidos, ao passo que os embargos declaratórios opostos pela parte autora foram acolhidos, nos seguintes termos (Evento 58 - Processo originário):

(...)

Ante o exposto, presentes os requisitos do art. 1.022 do CPC, ACOLHO os embargos de declaração opostos pelos autores (evento 53, DOC1), para que a parte dispositiva da sentença de evento 46, DOC1 passe a ter a seguinte redação:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, I, do CPC, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por ELAINE MARCHIONNI e IVANDRO PORTELA DE MORAES em face de ICATU SEGUROS S/A, para o fim de CONDENAR a requerida a efetuar o pagamento do valor de R$ 85.000,00, correspondente a indenização securitária prestamista vinculada ao contrato de "PROPOSTA DE PARTICIPAÇÃO À GRUPO DE CONSÓRCIOS DE BENS MÓVEIS" (evento 30, DOC6). O pagamento deverá ser realizado, inicialmente, através da quitação do referido contrato e, caso ainda exista um saldo remanescente, as sobras deverão ser pagas aos requerentes, conforme previsto na Cláusula 4, do "CONTRATO DE SEGURO PRESTAMITA APÓLICE nº 77.000.024" (evento 30, DOC5). Por fim, o valor deverá ser devidamente atualizado pelo IGP-M desde a contratação, acrescido de juros de mora de 1% a contar da citação.

Em suas razões recursais (Evento 66 - Processo originário), a seguradora demandada insurge-se contra a sentença de procedência do feito. Para tanto, defende que há perda do direito à indenização securitária por agravamento do risco pelo segurado no caso em comento. Argumenta que a verdadeira intenção da Súmula 620 do Superior Tribunal de Justiça foi impossibilitar a seguradora de recusar o sinistro unicamente com base no estado de embriaguez. Afirma que, contudo, o fato de a embriaguez não constar no rol de riscos excluídos, desimporta caso haja comprovação de agravamento do risco. Nesse sentido, discorre sobre a possibilidade de se considerar a embriaguez como agravamento do risco quando provado o nexo causal com o dano. Disserta sobre o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria. Quanto ao conjunto probatório, sustenta que foi comprovado o nexo causal entre a embriaguez da segurada e o sinistro ocorrido. Salienta que a segurada estava em estado de embriaguez e que as condições climáticas e as condições da via eram regulares. Noutro quadrante, discorre acerca do contrato de seguro e sobre a garantia de interesse legítimo e riscos predeterminados. Subsidiariamente, sustenta a necessidade de ser respeitado o limite do capital segurado, o qual corresponde ao saldo devedor referente à cota do segurado consorciado. Além disso, pugna pela alteração do marco inicial da correção monetária para a data do sinistro. Ao fim, requer o provimento do recurso.

Apresentadas as contrarrazões (Evento 70 - Processo originário), vieram os autos conclusos para julgamento.

Tendo em vista a adoção do sistema informatizado, todos os procedimentos previstos nos artigos 931, 932 e 934 do Código de Processo Civil foram simplificados, porém cumpridos na sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Deve ser conhecido o recurso de apelação interposto pela parte demandada, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade, sendo tempestivo e estando comprovado o preparo do recurso (Evento 65 - Processo originário).

Trata-se de demanda em que os autores, beneficiários secundários de um seguro prestamista vinculado a um consórcio aderido pela falecida Sra. Raquel Marchionni de Moraes, pleiteiam a indenização securitária prevista no Contrato celebrado. Como ponto de partida, é importante destacar que, na lição de Sergio Cavalieri Filho (in “Programa de Responsabilidade Civil”, 12ª Edição. Ed. Atlas, São Paulo, 2015, p. 537), temos a conceituação do contrato de seguro:

Contrato por meio do qual o segurador, mediante recebimento de um prêmio, assume perante o segurado a obrigação de pagar-lhe uma determinada indenização, prevista no contrato, caso o risco a que está sujeito se materialize em um sinistro. Segurador e segurado negociam as consequências econômicas do risco mediante a obrigação do segurador de repará-las. (…) Enfim, o interesse legítimo do segurado, verdadeiro objeto do seguro, é a segurança, a tranquilidade, a garantia de que, se os riscos a que está exposto vierem a se materializar em um sinistro, terá condições econômicas de reparar as suas consequências.

Dessa forma, tornou-se clara a identificação das seguradoras como fornecedoras de serviço e do beneficiário (segurado) como destinatário final (consumidor), nos termos do que dispõem os artigos 2º, caput, e 3º, § 2º, da legislação consumerista.

Com efeito, os contratos de seguro devem se submeter às regras constantes na legislação consumerista, para evitar eventual desequilíbrio entre as partes, considerando a hipossuficiência do consumidor em relação ao fornecedor; bem como manter a base do negócio a fim de permitir a continuidade da relação no tempo. Sobre a incidência do CDC, a lição de Claudia Lima Marques, na obra Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 2ª ed. Editora RT:

“... em todos estes contratos de seguro podemos identificar o fornecedor exigido pelo art. 3º do CDC, e o consumidor. Note-se que o destinatário do prêmio pode ser o contratante com a empresa seguradora (estipulante) ou terceira pessoa, que participará como beneficiária do seguro. Nos dois casos, há um destinatário final do serviço prestado pela empresa seguradora. Como vimos, mesmo no caso do seguro-saúde, em...

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