Acórdão nº 50019152920188210027 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50019152920188210027
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002987664
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5001915-29.2018.8.21.0027/RS

TIPO DE AÇÃO: Reconhecimento/Dissolução

RELATOR: Juiz de Direito JOAO RICARDO DOS SANTOS COSTA

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por ILMA contra a sentença de improcedência proferida nos autos da ação de de dissolução de união estável c/c pedido de fixação de alimentos e partilha de bens movida em desfavor de SÉRGIO.

Adoto o relatório da sentença - evento 46, SENT1:

"(...)

SENTENÇA

I. M. DA S. ajuizou ação de dissolução de união estável c/c pedido de fixação de alimentos e partilha de bens em desfavor de S. A. S. DE V., ambas as partes qualificadas. Na exordial, a parte autora narrou que conviveu em união estável com o réu durante doze anos [julho de 2006 a fevereiro de 2018]. Discorreu acerca dos fundamentos jurídicos aplicáveis ao caso. Teceu considerações acerca da união estável, da fixação de alimentos ante a dependência econômica e da partilha de bens [motocicleta de placa IXX4142, automóvel de placa IWX9215]. Pugnou pela concessão de AJG. Ao final, requereu a procedência da ação com o reconhecimento da união estável, a fixação de alimentos no percentual de 53% do salário mínimo e a partilha de bens. Anexou procuração e documentos (evento 2/Petição inicial e documentos 2).

Recebida a exordial, deferida a AJG, designada audiência de conciliação e determinada a citação/intimação da parte ré (evento 2/Petição inicial e documentos 2, fls. 36/37).

Cancelada a audiência de conciliação.

Citado, o requerido apresentou contestação à demanda (evento 2/Petição 3, fls. 24/53 e evento 2/Contestação e documentos 4 e Contestação 5). Preliminarmente, impugnou a concessão de AJG. No mérito, aduziu que a postulante não dispunha de dependência econômica, seja em razão de exercer atividade laboral também como MEI, seja em razão de sua idade e de seu estilo de vida. Disse que a autora contava, ainda, com o pensão alimentar devida a suas duas filhas. Elucidou que ambas as partes residiam em unidades habitacionais distintas, as quais sequer estavam quitadas, inexistindo rateio de despesas. Impugnou as fotografias anexadas pela requerente com a finalidade de comprovar a união estável, sob o argumento de que tiradas em área comum do prédio. Asseverou a impossibilidade de convívio ante a função de comandante que desempenhava. Arguiu que teve apenas um caso com a demandante, argumentando que adimpliu, unilateralmente, com as despesas à aquisição de seu carro Ford. Discorreu acerca da litigância de má-fé. Ao final, requereu a improcedência da ação. Anexou procuração e documentos.

Em réplica (evento 2/Réplica 6), a parte autora rechaçou os argumentos exarados em sede contestacional, reiterou os pedidos formulados na inicial e manifestou desistência em relação ao pedido de fixação alimentar, eis que formulado por equívoco.

Em manifestação (evento 2/Despacho 7), a parte ré anexou documentos a comprovar que a autora dispunha da posse/propriedade de um veículo de valor superior ao seu.

Instadas as partes acerca do interesse na dilação probatória (evento 2/Despacho 7, fls. 23/24), ambas as partes requereram a produção de prova testemunhal e o réu anexou declarações prestadas pos testemunhas (evento 9).

Designada audiência de instrução (evento 12).

Realizada audiência (evento 30), foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas pelas partes processuais, sendo declarado o encerramento da fase instrutória com a apresentação de memoriais.

As partes autora e réu apresentaram memoriais (eventos 42 e 44).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

(...)"

Nas razões, a apelante ILMA afirma que conviveu com o apelado SÉRGIO em regime de união estável no período de julho de 2006 a fevereiro de 2018, e adquiriram dois veículos.

Destaca que a prova produzida comprovou o relacionamento em união estável. Cita as testemunhas CLEONE, AMANDA e ITELMÃ a corroborar a sua tese.

Aponta que as testemunhas do réu/apelado não possuem conhecimento/vivência acerca da relação, eis que algumas só conheceram o casal após alguns anos de convívio.

Pede a modificação da sentença, para fins de "julgar procedentes os pedidos, declarando-se a união estável no período de 2006 a 2018 e determinar a partilha dos bens (veículos) proporcionalmente" - evento 50, APELAÇÃO1.

Contrarrazões - evento 56, CONTRAZAP1.

Parecer do Ministério Público pelo desprovimento do recurso - evento 7, PARECER1.

Os autos vieram conclusos, por redistribuição.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Acerca do reconhecimento da união estável, os arts. 1.723 e seguintes do Código Civil:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1 o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.

§ 2 o As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.

Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.

Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato.

(grifei)

Neste sentido, para fins de caracterizar a união estável, o pressuposto da convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

E a lição da doutrina de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery1:

"(...)

• 3. União estável e status familiae . A convivência cria vínculo jurídico e, embora não altere o status familiar da pessoa, coloca-a em situação de fato que, se demonstrada, pode fazer com que perca posições jurídicas de vantagem em relação à família. Pode parecer não haver utilidade na afirmação de que alguém viva a posse do estado de companheiro, mas pode ocorrer que uma pessoa permaneça legalmente casada, embora separada de fato, e, concomitantemente, viva outra realidade familiar de convivente com outra pessoa. A forma pela qual essa convivência se dá pode gerar para aquele que permanece casado (mas separado de fato e convivendo com outrem) situações jurídicas de vantagens e desvantagens, que a posse do estado de convivente ajuda a demonstrar. O reconhecimento de determinadas situações no direito brasileiro dá a ideia de posse de um estado de fato, no caso do estado de convivente.

• 4. Participação do companheiro na sucessão do outro. CC 1790 I a IV.

• 5. Convivência pública. A lei qualifica a espécie de convivência que autoriza o reconhecimento da existência de união estável (ou seja, casamento de fato) entre cônjuges. O primeiro requisito é a publicidade dessa convivência. Isto pressupõe que os companheiros (homem e mulher) permitam que se torne conhecida de toda a gente a circunstância de que vivem como se marido e mulher fossem, e que essa convivência se destina ao fim de constituir família. A fama do casal é de que são companheiros e isso há de ser notório, de todos conhecido. Por isso, não se considera pública a convivência equívoca, de que não se possa tirar a consequência da fama do casal. Ou seja: os atos por meio dos quais a convivência se manifesta não hão de ser ocultos, secretos, clandestinos.

• 6. Convivência contínua. A continuidade se verifica pela ausência de interrupção da convivência. Ou seja, os companheiros permanecem em convívio direcionado ao fim de constituir família, sendo fácil identificar a atualidade da união e sua estabilidade.

• 7. Convivência duradoura. Duradoura é a convivência que não é efêmera, ocasional ou transitória.

• 8. Convivência de homem e mulher para constituir família. A finalidade da convivência não é qualquer uma. É a que se qualifica pela disposição (pelo ânimo) de constituir família, de maneira duradoura, ou seja, de se prestar à mútua assistência, moral e material, um do outro, aos cuidados com a prole (prole comum e prole – principalmente os filhos menores – do outro), às exigências de lealdade ou de fidelidade entre os companheiros, à preservação da dignidade pessoal um do outro, dos filhos e daqueles que estão sob a dependência do par, à constituição e à preservação de patrimônio, comum e de cada qual, para favorecimento do bem viver da comunidade familiar e para garantia das vicissitudes da vida dos companheiros, seus filhos e dependentes. Enfim: é a convivência que se destina à formação de um lar, para o desfrute dos bons momentos e para a repartição das dificuldades. O gozo dos bons momentos da convivência, sem a correspectiva partilha das dificuldades do dia a dia, não é união estável, como decidiu o TJRS, 4.º Grupo de Câmaras, EI 70006182166, rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, j. 08.08.2003.

(...)"

E o art. 1.566 do Código Civil, prevê a affectio maritalis, princípio norteador do casamento civil, englobando conceitos de fidelidade recíproca, vida em comum, mútua assistência, além do sustento e guarda de eventual prole, os quais se estendem à união estável:

Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:

I - fidelidade recíproca;

II - vida em comum, no domicílio conjugal;

III - mútua assistência;

IV - sustento, guarda e educação dos filhos;

V - respeito e consideração mútuos.

No caso, a apelante ILMA afirma que conviveu com o apelado SÉRGIO em...

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