Acórdão nº 50019312220148210027 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50019312220148210027
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002619803
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001931-22.2014.8.21.0027/RS

TIPO DE AÇÃO: Bancários

RELATOR: Desembargador CAIRO ROBERTO RODRIGUES MADRUGA

APELANTE: DORACY TOLIO (AUTOR)

APELADO: BANCO DO BRASIL S/A (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por DORACY TÓLIO, da sentença proferida nos autos da ação de indenização por danos materiais e morais, ajuizada contra BANCO DO BRASIL S/A, cujo dispositivo é o seguinte: "ISSO POSTO, julgo improcedentes os pedidos formulados por DORACY TÓLIO nos autos da AÇÃO DE DEVOLUÇÃO DE VALORES, CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS, que move contra BANCO DO BRASIL S/A. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios fixados em R$2.000,00 (dois mil reais), com fulcro no artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil de 2015, restando suspensa, contudo, a exigibilidade do pagamento, por litigar amparada pelo benefício da gratuidade judiciária (fl. 91), nos termos do artigo 98, § 3º, do suprarreferido diploma."

A parte apelante, em suas razões, noticiou que, em 04/07/2011, foi retirada de sua conta bancária a quantia de R$140.013,50, sendo R$130.000,00 através de TED e R$10.000,00 em espécie. Afirmou que os valores foram retirados de sua conta de forma ilícita, pois o banco não observou regras de conferência da pessoa que estava efetuando as operações. Noticiou que, num segundo momento, precisou retirar R$20.000,00 de sua conta, tendo que apresentar documentos e assinar comprovante de saque, o que não ocorreu com o saque de R$140.000,00, a corroborar a falha na prestação de serviços do banco. Salientou que o banco não juntou imagens a demonstrar quem realizou os saques. Disse ter sido vítima de estelionato e o banco nada fez para impedir. Discorreu acerca dos danos materiais e morais sofridos. Requereu o provimento do apelo.

A parte apelada apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso.

Cumpridas as formalidades legais, vieram-me os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Da admissibilidade do recurso

O recurso é adequado e tempestivo, ficando dispensado do preparo, em razão da gratuidade judiciária deferida na origem.

Da ausência de falha na prestação de serviço

O Código de Defesa do Consumidor adota a teoria do risco do empreendimento, da qual deriva a responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos e serviços, independentemente de culpa, pelos riscos decorrentes de sua atividade lucrativa, bastando ao consumidor demonstrar o ato lesivo perpetrado, o dano sofrido e o liame causal entre ambos, somente eximindo-se da responsabilidade o prestador, por vícios ou defeitos dos produtos ou serviços postos à disposição dos consumidores, provando a inexistência de defeito no serviço, a culpa exclusiva da vítima ou fato de terceiro (art. 14, § 3º, I e II, do CDC).

Todavia, no presente caso, inexiste falha na prestação do serviço da instituição financeira.

Na inicial, a parte autora afirmou que teve retirada de sua conta indevidamente a importância de R$140.013,50, requerendo a restituição do respectivo valor e indenização por danos morais.

A prova produzida nos autos, ao contrário do sustentado pelo autor, evidencia que foi ele próprio que realizou as transações impugnadas, ainda que ludibriado.

Com efeito, ao analisar a cópia de inquérito policial e denúncia (fls. 144 e seguintes), resta claro que o autor alugava uma casa para Leandro M., e com ele comentou que vendera um terreno e que o comprador havia demarcado área maior que a efetivamente adquirida, tendo Leandro, alegando ser "conhecedor de leis", se oferecido para ajudá-lo, apresentando-lhe a um advogado, que ajuizaria uma ação, porém, para tanto, seria necessário o depósito do valor recebido pela venda do terreno em juízo. O autor, então, transferiu o valor de R$130.000,00 para a conta de Jackson R. M., irmão de Leandro, bem como sacou R$10.000,00 em espécie (sendo R$13,50 relativo a taxa bancária para a transferência de R$130.000,00 via TED).

Dias depois, ainda, sacou R$20.000,00 e entregou a Leandro, porém este valor não é questionado, já que há comprovante de saque assinado pelo autor.

Ocorre que as operações impugnadas foram realizadas no interior da agência bancária e, ao contrário do alegado pelo autor, houve a identificação pessoal do titular, inclusive sendo necessária a liberação pelo gerente, já que o valor solicitado era vultoso.

Nesse sentido, a sentença recorrida muito bem apreciou a prova constante dos autos, valendo transcrever excerto sobre o particular, litteris:

Outrossim, o autor referiu, em suas manifestações e depoimento pessoal, que o seu cartão nunca saiu de sua posse, o que corrobora a conclusão de que o saque e transferência impugnados foram por ele realizados pessoalmente.

O fato de não ter o réu acostado filmagens do dia do saque é plenamente justificado pelo decurso do tempo, na medida em que o fato ocorreu em 04/07/2011 e a presente ação ajuizada em 12/08/2014.

Igualmente, despicienda a apresentação de canhoto assinado, pois, como bem consignado pela sentença recorrida, houve a identificação do titular e liberação eletrônica das operações, as quais foram realizadas com cartão magnético e senha que, repita-se, nunca saíram da posse do autor.

A ausência de responsabilidade da instituição financeira em caso de utilização de cartão magnético e emprego de senha, reiteradamente tem sido reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça.

Veja-se:

“RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. ESTABELECIMENTO COMERCIAL. COMPRA. REALIZAÇÃO POR TERCEIRO. PAGAMENTO. APRESENTAÇÃO DO CARTÃO. USO MEDIANTE SENHA PESSOAL DO CORRENTISTA. TITULAR DO CARTÃO. DEVER DE GUARDA. FURTO. FORTUITO EXTERNO. DOCUMENTO DE IDENTIFICAÇÃO. EXIGÊNCIA. OBRIGAÇÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. ATO ILÍCITO DO ESTABELECIMENTO. NÃO CONFIGURAÇÃO. DEVER DE INDENIZAR. AFASTAMENTO. [...]. 4. Danos decorrentes de pagamento mediante a apresentação de cartão bancário de uso mediante senha, por terceiro, amoldam-se à hipótese estabelecida no art. 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor, não podendo ser imputado ao estabelecimento comercial. 5. Não comete ato ilícito o estabelecimento comercial que deixa de exigir documento de identidade no momento do pagamento mediante cartão com uso de senha, porquanto inexiste lei federal que estabeleça obrigação nesse sentido. 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.”(REsp 1676090/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 03/09/2019). g.n.

“RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. SAQUES. COMPRAS A CRÉDITO. CONTRAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. CONTESTAÇÃO. USO DO CARTÃO ORIGINAL E DA SENHA PESSOAL DO CORRENTISTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. DEFEITO. INEXISTÊNCIA. RESPONSABILIDADE AFASTADA.

1. Recurso especial julgado com base no Código de Processo Civil de 1973 (cf. Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

2. Controvérsia limitada a definir se a instituição financeira deve responder por danos decorrentes de operações bancárias que, embora contestadas pelo correntista, foram realizadas com o uso de cartão magnético com "chip" e da senha pessoal.

3. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade da instituição financeira deve ser afastada quando o evento danoso decorre de transações que, embora contestadas, são realizadas com a apresentação física do cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista.

4. Hipótese em que as conclusões da perícia oficial atestaram a inexistência de indícios de ter sido o cartão do autor alvo de fraude ou ação criminosa, bem como que todas as transações contestadas foram realizadas com o cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista.

5. O cartão magnético e a respectiva senha são de uso exclusivo do correntista, que deve tomar as devidas cautelas para impedir...

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