Acórdão nº 50019578620148210005 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Cível, 01-02-2023

Data de Julgamento01 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50019578620148210005
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003164350
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001957-86.2014.8.21.0005/RS

TIPO DE AÇÃO: Consulta

RELATORA: Desembargadora DENISE OLIVEIRA CEZAR

APELANTE: IPE-SAÚDE - INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELADO: ASSOCIACAO DR BARTHOLOMEU TACCHINI (AUTOR)

APELADO: LEONICE AGOSTINI ZANCHI (RÉU)

RELATÓRIO

O INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL IPE-SAÚDE interpõe apelação cível contra a sentença que julgou procedente a ação de cobrança movida pela ASSOCIAÇÃO DR. BARTHOLOMEU TACCHINI em desfavor de LEONICE AGOSTINI ZANCHI; in verbis:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por ASSOCIAÇÃO DR. BARTHOLOMEU TACCHINI contra LEONICE AGOSTINI ZANCHI e CONDENO a parte ré ao pagamento de R$ 8.900,00 (oito mil e novecentos reais), quantia que deverá ser acrescida de juros legais de 1% ao mês desde a citação.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas e honorários de advogado, que fixo em 20% sobre o valor atualizado da condenação, considerando o trabalho desenvolvido e a natureza da causa, de acordo com o art. 85, §2º do CPC. Suspendo, todavia a exigibilidade das verbas em favor da ré, em face da gratuidade de justiça que lhe foi concedida.

E JULGO PROCEDENTE a denunciação a lide e CONDENO o denunciado IPERGS - INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ao ressarcimento dos valores devidos pela denunciante a parte autora, nos termos delineados na fundamentação, à inteligência do artigo 125, II, do CPC.

Considerando a resistência ao pedido de denunciação, o denunciante deverá arcar com o pagamento de honorários de advogado, que fixo em 15% sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, §2º do CPC.

Nas razões de apelo, sustenta que o equipamento utilizado na cirurgia da autora não era coberto pelo plano e narra que ofereceu a esta aparelho alternativo, o qual substituiria o material requerido e poderia ser utilizado normalmente, sem prejuízo ao bom andamento da cirurgia. Discorre acerca do regime do IPE-Saúde, enfatizando sua regulamentação conforme a Lei 12.134/04, diversamente dos planos privados. Argui ser descabida a utilização de materiais não previstos na tabela do recorrente. Tece considerações sobre o gerenciamento e custeio do sistema de planos de saúde. Reputa ilegal a pretensão autoral por culminar em tratamento diferenciado. Se insurge contra o dever de reembolso, argumentando que tal medida se restringe aos casos de atendimento médico e/ou hospitalar e resta condicionada à autorização prévia, nos termos da Resolução 21/79 do Instituto. Na hipótese de manutenção do dever de reembolso, defende que esta precisa se restringir ao valor da tabela. Aduz inexistir relação entre o autor e a recorrente, pois o autor contraiu voluntariamente a dívida. Subsidiariamente, postula a redução dos honorários. Requer o provimento do recurso, ao final.

Remetidos os autos a este Tribunal, foram com vistas ao Ministério Público, o qual opinou pelo parcial provimento do apelo.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Haja vista a pertinência, cumpre apontar a tempestividade do recurso em apreço. Embora o apelante tenha sido intimado da sentença no dia 1º de fevereiro de 2021 (evento 3, DOC7, pag. 12) e interposto o recurso no dia 14 de junho daquele ano, note-se que os prazos processuais na comarca de origem restaram suspensos de 23 de fevereiro a 14 de junho de 2021. Logo, é impositivo o conhecimento do apelo.

Por oportuno, adoto o relatório da sentença, aditado como segue:

ASSOCIAÇÃO DR. BARTHOLOMEU TACCINI ajuizou ação de cobrança contra LEONICE AGOSTINI ZANCHI. Narrou que, em dezembro de 2010, a ré ingressou com ação de obrigação de fazer contra a parte autora e o IPERGS a fim de fornecer equipamento necessário para a retirada de um tumor neurológico que a acometia, o que foi deferido liminarmente. Referiu que cumpriu com a decisão judicial, locando o equipamento na forma determinada, todavia, o IPERGS não cumpriu com a decisão judicial, deixando de repassar os valores à parte autora. Posteriormente, informou que sobreveio sentença julgando improcedente o pedido formulado pela ré, sendo os autos extintos sem julgamento de mérito, e revogada a tutela antecipada. Discorreu acerca do direito aplicável ao caso em tela. Colacionou jurisprudência. Requereu a procedência da ação, condenando a ré ao pagamento de R$ 15.587,23.

Citada, a requerida apresentou contestação às fls. 77/86. Preliminarmente, denunciou à lide o Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul - IPERGS; alegou carência de ação por impossibilidade jurídica do pedido e ilegitimidade passiva. Referiu que a restituição dos valores deveria se dar entre o hospital e o IPERGS, sendo que a requerida é apenas beneficiária do convênio de saúde. (...). Requereu a concessão de assistência judiciária gratuita; o acolhimento das preliminares; e a improcedência da ação.

Conforme as razões supra, o IPERGS se insurge contra a decisão de procedência da lide, argumentando, em suma, que a locação do aparelho utilizado na cirurgia da primeira requerida não encontra previsão nos protocolos do Instituto.

Assim sendo, a controvérsia se restringe à alegação de regularidade (ou irregularidade) da negativa de fornecimento do apelante.

Incabível o acolhimento da pretensão recursal.

De fato, o IPE-SAÚDE, por deter a natureza jurídica de autarquia que oferta planos de saúde públicos, sujeita-se à legislação concernente aos planos de saúde, mas não se submete ao regramento da ANS. O instituto, outrossim, possui a faculdade de editar as próprias normas, que, naturalmente, devem coadunar com a legislação superior.

Nesta senda, cabe lembrar que a Corte Superior firmou entendimento, sobre o tema consignando que é abusiva a negativa de cobertura, pela operadora de plano de saúde de algum tipo de procedimento, medicamento ou material necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas no contrato. Se não vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 282 E 356 DO STF. INAPLICABILIDADE DO CDC. FORMA VINCULANTE DO CONTRATO NÃO AFASTADA. BOA-FÉ OBJETIVA. NEGATIVA DE COBERTURA INDEVIDA. SÚMULA N. 83/STJ. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO A FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA N. 182 DO STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. A simples indicação dos dispositivos legais tidos por violados, sem que o tema tenha sido enfrentado pelo acórdão recorrido, obsta o conhecimento do recurso especial, por falta de prequestionamento, a teor das Súmulas n. 282 e 356 do STF.

2. O fato de não ser aplicável o CDC aos contratos de plano de saúde sob a modalidade de autogestão não atinge o princípio da força obrigatória do contrato, sendo necessária a observância das regras do CC/2002 em matéria contratual, notadamente acerca da boa-fé objetiva e dos desdobramentos dela decorrentes. Precedentes.

3. "A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que é abusiva a negativa de cobertura, pela operadora de plano de saúde - mesmo aquelas constituídas sob a modalidade de autogestão - de algum tipo de procedimento, medicamento ou material necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas no contrato" (AgInt no REsp n. 1.776.448/SP, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 25/6/2019, DJe 1/7/2019).

4. "É pacífica a jurisprudência da Segunda Seção no sentido de reconhecer a existência do dano moral nas hipóteses de recusa injustificada pela operadora de plano de saúde, em autorizar tratamento a que estivesse legal ou contratualmente obrigada, por configurar comportamento abusivo" (AgInt no AREsp n. 1.379.491/PE, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 29/4/2019, DJe 2/5/2019).

5. É inviável o agravo previsto no art. 1.021 do CPC/2015 que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada (Súmula n. 182/STJ).

6. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt no AREsp 835.892/MA, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 30/08/2019)

(grifou-se)

Consequentemente, mostra-se descabida a negativa do IPE-Saúde de custear as despesas relativas ao aluguel de equipamento para a retirada de tumor neurológico, com fundamento na ausência de previsão de cobertura.

Sucede que o Plano IPE-Saúde é composto por atendimentos médicos, hospitalares, atos necessários ao diagnóstico e ao tratamento, bem como ações de prevenção da doença e à promoção da saúde, nos moldes preceituados pelo artigo 2º da Lei Complementar nº 12.134/2004.

Pela pertinência, seguem transcritos os artigos 8º e 9º, da Resolução nº 21/79, do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul; ipsis litteris:

Artº 8º - Incluem-se no Plano de Assistência Médica, em consonância com as respectivas normas, as seguintes especialidades:

Anestesiologia, Angiologia, Cardiologia, Dermatologia, Endocrinologia, Gastroenterologia, Geral, Ginecologia, Hematologia e Hemoterapia, Imunologia (Alergia), Medicina Nuclear, Nefrologia, Obstetrícia, Oftalmologia, Oncologia, Otorrinolaringologia, Patologia Clínica e Cirurgia, Pediatria, Plástica reparadora, Proctologia, Psiquiatria, Radiologia, Radioterapia, Reumatologia, Tisiopneomologia, Torácica, Traumatologia e Urologia.

Art. 9º. A assistência médico-hospitalar abrangerá os seguintes serviços:

1 – Emergências

2 – Consultas Médicas

3 – Serviços Complementares

4 – Tratamento Ambulatorial

5 – Tratamento Hospitalar

Tem-se, então, que a ausência de previsão de aluguel de determinado aparelho nas coberturas do IPE-Saúde não afasta o dever da...

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