Acórdão nº 50019714020208210141 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50019714020208210141
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001927850
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001971-40.2020.8.21.0141/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR: Desembargador CAIRO ROBERTO RODRIGUES MADRUGA

APELANTE: CLAUDIA MARIA RAMOS CORTES (AUTOR)

APELANTE: PAGSEGURO INTERNET S.A. (RÉU)

APELADO: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU)

APELADO: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelações cíveis interpostos por CLÁUDIA MARIA RAMOS CORTES e PAGSEGURO INTERNET S/A., da sentença proferida nos autos da ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada contra BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A. e AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A., cujo dispositivo é o seguinte: “Diante do exposto, na forma do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil: a) julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados em face de Banco Santander S/A e Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A, e revogo a antecipação de tutela deferida (eventos 08 e 47). Condeno a autora ao pagamento de 2/3 das custas restantes do processo e honorários advocatícios aos procuradores dos demandados, os quais fixo em R$ 1.000,00 (hum mil reais) para o cada um dos procuradores, pelos mesmos balizadores acima expostos e observando a proporcionalidade na distribuição sucumbencial. Contudo, resta suspensa a exigibilidade de tais verbas, em razão da Gratuidade de Justiça deferida initio litis. b) julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pela autora e face da empresa Pagseguro Internet S/A, devendo a ré restituir à autora o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos de correção monetária pelo IGP-M, a contar do pagamento, e juros de mora incidentes desde a citação. Considerando a sucumbência recíproca, condeno a ré Pagseguro ao pagamento de 1/3 das custas processuais e dos honorários advocatícios devidos ao procurador da autora, os quais fixo 12% sobre o valor atualizado a ser restituído, considerando a singeleza da demanda, o labor desenvolvido pelo patrono da autora, o tempo e o local de tramitação da ação processual, nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º e com o caput do artigo 86, ambos do Código de Processo Civil."

A parte autora apelou, noticiou que possuía o contrato empréstimo nº 200227466970 com a empresa Aymoré, a qual é diretamente ligada ao Banco Santander. Relatou que, ao buscar informações sobre os procedimentos e valores para a quitação desse contrato na agência do Santander em que possui conta, foi orientada a buscar esclarecimentos pelo telefone 4004-9090, contudo, não pôde completar a chamada através de seu aparelho celular, o que a fez procurar no site oficial da Aymoré o canal de atendimento ao cliente, para renegociação da dívida e tentativa de quitação integral do débito. Referiu que, através do referido canal, o atendimento foi redirecionado a uma conversa direta pelo whatsapp, onde restou negociada integralmente a dívida e foi encaminhado o boleto para pagamento integral do montante devido, o qual foi devidamente quitado. Todavia, mesmo após o pagamento, continuou recebendo cobranças, tendo apresentado comprovante de pagamento do contrato, mas foi informada de que fora vítima de uma possível fraude. Alegou que o boleto emitido tinha a razão social da empresa Aymoré, bem como os seus dados pessoais. Salientou que há responsabilidade da Aymoré e Santander, pois os estelionatários tinham seus dados, sem contar que, mesmo sabedores da fraude de que fora vítima, nada fizeram, senão persistir na cobrança dos valores já pagos. Alegou fazer jus à declaração de inexistência do débito, pois realizado o pagamento de boa-fé, através de canal que acreditava ser o oficial das instituições requeridas. Discorreu acerca dos danos morais sofridos. Requereu o provimento do recurso.

A empresa PagSeguro também apelou, arguindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, sob o argumento de que não participou dos fatos noticiados na petição inicial. No mérito, alegou que a fraude não reside no fato de o fraudador ter gerado um boleto aparentemente legal de depósito de valores em uma conta de pagamentos, sem qualquer denúncia de fraude e, sim, pelo fato de a apelante ter realizado o pagamento de boleto enviado por e-mail, rede social ou aplicativos de mensagens, em flagrante descumprimento com as regras mínimas de segurança de transações pela internet, principalmente quando envolve valores expressivos, como é a hipótese dos autos. Referiu que a transação realizada em sua plataforma de pagamentos pelo fraudador, trata-se tão somente de uma operação de adição de fundos que consiste simplesmente em depositar valores em uma conta de pagamentos regularmente cadastrada em sua plataforma. Argumentou não ser responsável pela restituição de valores à arte autora, já que não se beneficiou do pagamento realizado. Pugnou pelo provimento do recurso.

Ambas as partes apresentaram contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso da parte adversa.

Cumpridas as formalidades legais, vieram-me os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Da admissibilidade dos recursos

Os recursos são adequados e tempestivos, estando devidamente preparado o apelo da parte ré, e dispensado de preparo o apelo da parte autora, por litigar abrigado pela gratuidade judiciária deferida na origem.

APELAÇÃO DA PARTE AUTORA

Da inexistência de falha na prestação de serviços

O Código de Defesa do Consumidor adota a teoria do risco do empreendimento, da qual deriva a responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos e serviços, independentemente de culpa, pelos riscos decorrentes de sua atividade lucrativa, bastando ao consumidor demonstrar o ato lesivo perpetrado, o dano sofrido e o liame causal entre ambos, somente eximindo-se da responsabilidade o prestador, por vícios ou defeitos dos produtos ou serviços postos à disposição dos consumidores, provando a inexistência de defeito no serviço, a culpa exclusiva da vítima ou fato de terceiro (art. 14, § 3º, I e II, do CDC).

A autora noticiou haver procurado a agência do Banco Santander, a fim de obter informações relativas à quitação de seu contrato de empréstimo, sendo orientada a entrar em contato através do telefone 4004-9090, todavia não logrou completar a ligação telefônica por ter efetuado a ligação por aparelho celular, tendo, então, buscado informações através do site da Aymoré, no qual veio a ser direcionada para uma conversa via whatsapp, em que realizou a renegociação e o envio boleto para quitação do referido contrato, e realizou o pagamento dos valores, que não foi reconhecido pelos demandados.

Pois bem.

A parte autora pagou valores acreditando que seriam para quitação de um financiamento, não recebendo, contudo, a quitação do contrato, porquanto houve fraude na emissão do boleto.

Conforme se extrai do conjunto probatório, a demandante foi efetivamente vítima de fraude, praticada por terceiro, não se vislumbrando qualquer participação das instituições financeiras demandadas ou de seus prepostos, nem falha na segurança ou em seus sistemas.

Ao revés, a funcionária do banco Santander informou à autora corretamente o canal que deveria acessar para renegociar seu financiamento (ligação ao número 4004-9090), não sendo verídica a alegação de que a ligação não pôde ser completada por ter sido realizada através do telefone celular, pois efetivada diligência nesse sentido e a ligação foi plenamente completada.

A autora, olvidando a informação recebida de que deveria contatar a instituição financeira através do telefone informado, acessou canal malicioso, iniciando aí a fraude de que foi vítima.

Não há dúvidas, pois, de que a autora foi vítima do denominado phishing, que se trata, em linhas gerais, de uma técnica usada por fraudadores para enganar usuários e obter informações confidenciais, como nome de usuário, senha, detalhes de financiamentos, etc., na oportunidade em que buscam na internet um canal virtual para negociação de débitos e acessam algum site fraudulento, ao qual informam seus dados pessoais, acreditando estarem em contato com o site oficial de um banco.

Veja-se que a autora alegou ter entrado no site oficial da Aymoré, porém deixou de indicar qual seria o endereço eletrônico consultado, bem como não comprovou que o referido site faça o alegado direcionamento de conversa para whatsapp.

A propósito, em consulta ao Google, digitando "Aymoré Financiamentos", a consulta é imediatamente direcionada ao site do Banco Santander, o que leva à conclusão de que a empresa Aymoré sequer possui site próprio.

E, em acesso ao site do banco Santander1 verifica-se que os canais informados para renegociação de financiamentos são apenas dois telefones (4004 9090 capitais e regiões metropolitanas e 0800 722 9090 demais localidades), não havendo qualquer direcionamento para atendimento via whatsapp.

Importante destacar que os prints das indigitadas conversas pelo whatsapp acostados à petição inicial estão incompletos, pois não demonstram o início do diálogo mantido, mas apenas a partir do momento em que recebidos os dados do contrato e a indicação dos valores para pagamento, tudo indicando que a omissão seja proposital, a fim de ocultar que fora a própria autora quem forneceu os dados do contrato aos falsários.

Nesse contexto, inafastável a conclusão de que a fraude havida não passou, de forma alguma, por qualquer ato ou omissão das instituições financeiras, muito menos por uma falha na segurança de seus sistemas, sendo causada exclusivamente pela atuação de falsário e pela falta de cuidado da parte autora.

Como é sabido, somente há responsabilidade das instituições financeiras quando as fraudes decorrem de falha nos seus sistemas,...

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