Acórdão nº 50020207320178210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50020207320178210016
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003241819
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002020-73.2017.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Moral

RELATOR: Desembargador NEY WIEDEMANN NETO

APELANTE: OHANA NATALY TAVARES DA SILVA (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença, evento 12, SENT1, que passo a transcrever:

O feito tramita de forma física, tendo sido distribuído no e-proc, em razão do risco de propagação do coronavírus (COVID 19).

Quando da devolução do processo físico, junte-se cópia do presente.

OHANA NATALY TAVARES DA SILVA, assistida por seu guardião UBIRATAN TOBIAS SANTOS DA SILVA, ajuizou AÇÃO INDENIZATÓRIA em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, alegando que seu pai, Ubiraci da Silva era apenado e estava segregado em regime fechado no Presidio Regional de Santo Ângelo, onde foi vítima de homicídio em 09/01/2017, cometido por outro preso. Referiu que o requerido não cumpriu com sua obrigação legal, que era de garantir a integridade física do pai da requerente, que estava sob os cuidados e sob a responsabilidade do Estado. Requereu a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos morais em valor equivalente a 200 salários mínimos nacionais, além de danos materiais representados pelas despesas de funeral, de R$ 800,00, a serem acrescidos de correção monetária, além de arcar com os ônus sucumbenciais. Pediu AJG. Juntou documentos.

Foi concedida a AJG à parte autora (fl. 38).

Citado, o requerido apresentou contestação (fls. 41/46), impugnando o valor da causa. No mérito, sustentou ausência de responsabilidade do Estado pelo óbito, uma vez que o autor do delito agiu por vingança, independentemente de qualquer outra condição, o que afasta o nexo causal em relação à conduta do Estado, impedindo que a ele se atribua culpa pelo ocorrido. Requereu a improcedência da ação, com a condenação da parte autora a arcar com os ônus sucumbenciais. Juntou documentos.

Houve réplica (fls. 116/125).

Rejeitada a impugnação ao valor da causa e intimadas as partes acerca das provas que pretendiam produzir (fl. 126), a autora postulou o julgamento do feito (fl. 128) e o requerido arrolou testemunhas (fl. 129).

Com vista, o Ministério Público disse não ser caso de intervenção (fl.131).

Tentada a conciliação, restou frustrada ante a ausência do réu. Foi declarada preclusa a oitiva da testemunha Josias, que não compareceu, e por não estar presente o réu, que a arrolou, e ouvidas as testemunhas Marco Antônio, Marcia e Ederson. Determinada a expedição de ofício solicitando o atestado de conduta carcerária de Josias, a autora requereu que fosse incluído na alínea "d" da fl.14 o ressarcimento da despesa referente à nota fiscal da fl. 29, que também diz respeito ao funeral (fl. 148).

O requerido manifestou-se, reiterando o pedido de improcedência (fl. 153).

Sobreveio resposta ao ofício (fl.156).

Com vista, a parte autora manifestou-se, postulando a procedência (fls. 158/160).

Intimadas, as partes apresentaram memoriais (fls. 165/168 e 169/171).

A sentença apresentou o seguinte dispositivo:

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por OHANA NATALY TAVARES DA SILVA contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, para CONDENAR o requerido a ressarcir à autora as despesas de funeral (fls. 28/19), de R$800,00 (oitocentos reais) e R$2.440,00 (dois mil quatrocentos e quarenta reais), corrigidos desde a emissão dos referidos documentos pelo IPCA-E, e acrescidos de juros de mora a contar do evento danoso, e a pagar-lhe indenização por danos morais, no equivalente a 20 (vinte) salários mínimos nacional (valor nesta data), a ser atualizado pelo IPC-A a contar desta data e acrescido de juros de mora de acordo com a Lei 11.960/09 a contar do evento danoso.

Sucumbente em parte mínima a autora (apenas quanto ao valor dos danos morais), arcará o réu com honorários ao procurador da autora, que fixo em 10% do valor da condenação atualizado, considerando o disposto no art. 85 do NCPC, a instrução realizada e o tempo de tramitação do feito, sendo isento das custas. Intimem-se.

O réu apelou, evento 27, APELAÇÃO1, suscitando preliminar de nulidade da sentença pela inclusão de condenação referente a pedido formulado em audiência para ressarcimento de despesas relacionadas com o funeral. No mérito, pontuou da ausência de responsabilidade estatal e inexistência de omissão no caso concreto. Disse que o Estado não concorreu de forma alguma para o óbito do apenado e que os fatos tiveram lugar por circunstâncias alheias a qualquer intervenção estatal, decorrentes de ato de terceiro. Atacou o valor da verba indenizatória e termo inicial dos juros de mora. Requereu a reforma da sentença.

Não foram apresentadas contrarrazões, evento 33.

O Ministério Público lançou parecer, evento 10, PARECER1, pelo não provimento do apelo.

Registro, por fim, que tendo em vista a adoção do sistema informatizado, os procedimentos para observância dos ditames dos arts. 931 e 934, do Código de Processo Civil/2015 foram simplificados, mas observados na sua integralidade.

É o Relatório.

VOTO

Estou em dar parcial provimento ao apelo.

No caso em tela, a autora ajuizou a presente demanda buscando a concessão de indenização por danos morais e materiais em decorrência do falecimento do seu pai quando cumpria pena no Presídio Regional de Santo Ângelo. O réu, em sua tese defensiva, refutou omissão estatal e disse que o fato ocorreu por circunstâncias alheias decorrentes de desavenças anteriores entre os segregados. O pedido foi julgado parcialmente procedente, sobrevindo apelo do réu, que passo a examinar.

Inicio examinando a alegação de impossibilidade de aditamento da inicial no que diz respeito ao pleito de ressarcimento de despesas relacionadas com o funeral, que entendo comporta acolhimento. Assim está definido no CPC:

Art. 329. O autor poderá:

I - até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu;

II - até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir.

Assim, efetivada a citação, com a estabilização da demanda, o aditamento da inicial depende do consentimento da parte ré, a teor do que dispõe o art. 329, II, do CPC. Ultrapassado o saneamento, esse aditamento já não seria possível. Essa é a doutrina de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery1:

4. Termo final. A modificação do pedido ou causa de pedir somente poderá ser feita até o término da fase postulatória. Depois do saneamento do processo (CPC 357), isto é, depois da audiência preliminar do CPC 334 caput, nem mesmo com a autorização do réu poderá o autor modificar o pedido ou causa de pedir (CPC 329 II). V. coment. CPC 329 II, abaixo.

• I: 5. Modificação do pedido ou causa de pedir sem consentimento do réu. Antes da citação, o autor pode modificar o pedido e a causa de pedir, sem o consentimento do réu. “Da citação decorre, portanto, a estabilização do processo graças à litispendência (art. 219) [CPC 240]: a lide exposta pelo autor, na inicial, passa a ser o objeto do processo; e ocorre fixação tanto de seus elementos objetivos como subjetivos. Em consequência, desde então, não mais se permite: a) a modificação do pedido ou da causa de pedir, salvo acordo com o réu; b) nem a alteração das partes litigantes, salvo as substituições permitidas por lei; c) o juízo, também, não será alterado, pois se vincula pela propositura da ação (art. 87) [CPC 43]; mas essa vinculação é do órgão (juízo) e não da pessoa física do juiz, e recebe a denominação de perpetuatio iurisdictionis” (Theodoro. Curso DPC, v. I, 2007, p. 341).

• 6. Proibição de alteração do pedido ou causa de pedir. Mesmo havendo ocorrido a revelia, é vedado ao autor prevalecer-se da inferioridade processual do réu e alterar a causa de pedir ou o pedido. Caso queira assim proceder, deverá citar novamente o réu, que terá nova oportunidade para resposta (v. CPC 329 II). Não existe no CPC uma regra que imponha expressamente os limites do CPC/1973 264 par.ún., que vedava, de forma absoluta, a alteração depois do saneamento do processo. Porém, essa vedação está implícita, em razão da sistemática do CPC 329.

• II: 7. Saneamento do processo. O termo final para que o autor possa, com o consentimento do réu, alterar o pedido ou a causa de pedir é o saneamento do processo. Depois dessa decisão, não mais é possível proceder-se à referida modificação, ainda que haja consentimento expresso do réu. “O que agora se cuida, sob o pretexto de estabilização da demanda, é apenas de disciplinar os casos de aditamento ou alteração do pedido por livre convenção das partes, sem que o juiz possa se opor às inovações decorrentes do ajuste dos interessados. Ultrapassado o saneamento, as modificações do pedido continuam sendo possíveis, mas terão de submeter-se a regramento específico, que dão poder de controle ao juiz, como no negócio jurídico processual” (Humberto Theodoro Júnior. Estabilização da demanda no novo Código de Processo Civil [RP 244/201]).

Na situação ora examinada, já saneado o feito, impossível o aditamento do pedido. Assim, no caso concreto, entendo como adequada a retirada da condenação relativa aos encargos do funeral.

Sigo agora para o exame da questão relativa à ausência de responsabilidade estatal na morte do detento UBIRATAN TOBIAS, pai da autora/apelada. Dispõe o ...

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