Acórdão nº 50020966920198210132 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 14-04-2022

Data de Julgamento14 Abril 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50020966920198210132
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001988669
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002096-69.2019.8.21.0132/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de Energia Elétrica

RELATOR: Desembargador NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO

APELANTE: RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. (RÉU)

APELADO: CLUBE 19 DE JULHO (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A, porquanto está inconformada com a sentença (evento 55 na origem) proferida nos autos da ação declaratória de inexistência de débito ajuizada pelo CLUBE 19 DE JULHO, cujo dispositivo restou assim redigido:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS, para (i.) declarar a ilegalidade do procedimento de elaboração do Termo de Ocorrência de Irregularidade de nº 000745600163, (ii.) desconstituir o débito referente a recuperação de consumo no valor de R$ 7.126,22 e (iii.) determinar à Ré que se abstenha de interromper o fornecimento de energia em razão de tal débito, confirmando, no ponto, a decisão que deferiu a tutela antecipada (evento 04).

Condeno a Ré ao pagamento das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), forte no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil, considerando o valor patrimonial envolvido, o tempo decorrido desde o ajuizamento e o trabalho dispensado pelo procurador da partes.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Nas razões, a concessionária sustentou a regularidade do procedimento adotado. Asseverou que no caso de avaria do medidor, não se aplica o art. 129, mas sim o 115 da Resolução-ANEEL nº 414/10, que dispensa o acompanhamento do usuário, quando da verificação do equipamento de medição. Aduziu que o consumidor foi cientificado da constatação da avaria e do débito gerado em decorrência dessa. Lembrou que houve alteração no padrão de consumo e que os cálculos foram elaborados de forma correta sendo possível, inclusive, a suspensão do serviço. Pediu o provimento da apelação (evento 59 na origem).

Intimada, a parte autora ofertou contrarrazões, nas quais defendeu a manutenção da sentença (evento 65 na origem).

Os autos foram remetidos a esta Corte, indo com vista ao Dr. Eduardo Roth Dalcin, Procurador de Justiça, que deixou de intervir (evento 09).

É o relatório.

VOTO

Encaminho voto pelo improvimento da apelação.

Destaco que os autos versam sobre o fornecimento de energia elétrica pela concessionária, matéria que foi objeto de alteração regimental desta Corte através da Resolução nº 01/2005, publicada no DOJ do dia 18NOV05, que em seu art. 1º, modificou o inciso I do art. 11 da Resolução nº 01/98, excluindo dos contratos administrativos as demandas relativas ao fornecimento de água potável e energia elétrica, inserindo a matéria no chamado direito público não especificado.

No caso dos autos, a concessionária defende a regularidade e a legitimidade da recuperação de consumo de energia elétrica, por conta de avaria no equipamento de medição. O tema vinha disciplinado na Resolução nº 414/10 da ANEEL, vigente à época dos fatos, que é um instrumento normativo que regulamenta a Lei nº 9.427/96 e fundamenta-se na Lei nº 8.987/95 (Lei das Concessões Públicas) e na própria CF-88, em seu art. 175, tratando-se de um ato administrativo geral que nas palavras de Hely Lopes Meirelles tem a seguinte definição:

Atos administrativos gerais ou regulamentares são aqueles expedidos sem destinatários determinados, com finalidade normativa, alcançando todos os sujeitos que se encontrem na mesma situação de fato abrangida por seus preceitos. São atos de comando abstrato e impessoal, semelhantes aos da lei, e, por isso mesmo, revogáveis a qualquer tempo pela Administração, mas inatacáveis por via judicial, a não ser pelo questionamento da constitucionalidade (art. 102, I, “a”, da CF).

(Direito Administrativo Brasileiro, 27ª edição, Malheiros, São Paulo, 2002).

Contudo, no caso dos autos, o regular procedimento para a apuração do consumo extrafaturado não foi efetivamente observado.

Em que pese tenha sido realizada a fiscalização na unidade consumidora da parte autora, isso em 31JAN19, lavrando-se o Termo de Ocorrência de Irregularidade - TOI (evento 16 - OUT4 na origem) dando conta da avaria no medidor de energia, não há prova material suficiente para demonstrar eventual desvio desvio de energia ou mesmo o benefício auferido pela parte autora.

Consta do TOI:

Em vistoria no ponto de medição foi encontrado o medidor avariado com perda de seus parâmetros, desta forma não sendo possível realizar a leitura de kWhs consumidos.

Por este motivo o medidor foi substituído e ficará armazenado na RGE.

No ponto, denota-se que o procedimento não foi acompanhado pelo titular da unidade consumidora ou qualquer outra testemunha, o que revela evidente inobservância do disposto no art. 129, §§ 2º e 5º, da Resolução - ANEEL nº 414/10:

Art. 129. (...).

§ 2º Uma cópia do TOI deve ser entregue ao consumidor ou àquele que acompanhar a inspeção, no ato da sua emissão, mediante recibo.

(...).

§ 5º Nos casos em que houver a necessidade de retirada do medidor ou demais equipamentos de medição, a distribuidora deve acondicioná-los em invólucro específico, a ser lacrado no ato da retirada, mediante entrega de comprovante desse procedimento ao consumidor ou àquele que acompanhar a inspeção, e encaminhá-los por meio de transporte adequado para realização da avaliação técnica.

(...).

E aqui não calha o argumento de que o art. 129 não se aplica à hipótese, mas sim o art. 115, em especial o seu § 4º, da Resolução-ANEEL nº 414/10. Dito dispositivo prevê:

Art. 115º. Comprovada deficiência no medidor ou em demais equipamentos de medição, a distribuidora deve proceder à compensação do faturamento de consumo de energia elétrica e de demanda de potência ativa e reativa excedentes com base nos seguintes critérios: (Redação do caput pela Resolução Normativa ANEEL Nº 479 DE 03/04/2012).

(...).

§ 4º A distribuidora deve informar ao consumidor, por escrito, a descrição da deficiência ocorrida, assim como os procedimentos a serem adotados para a compensação do faturamento, com base no art. 133.

(...).

No entanto, a concessionária desconsidera que a normativa integra todo um sistema, regulando, assim, a relação consumidor-concessionária. E o § 7º do referido art. 115 diz:

Art. 115 (...).

§ 7º Condiciona-se a caracterização da deficiência no medidor ou demais equipamentos de medição ao disposto no § 1º do art. 129.

(...).

Não se pode, portanto, pretender a aplicação isolada dos dispositivos previstos na legislação de regência. Seja qual for a natureza da irregularidade, seja por ação humana, ou não, como no caso dos autos, a fiscalização deve-se dar na presença do titular da unidade consumidora ou de...

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