Acórdão nº 50021132920188210007 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 01-03-2023

Data de Julgamento01 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50021132920188210007
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003342283
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002113-29.2018.8.21.0007/RS

TIPO DE AÇÃO: Recuperação extrajudicial

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

APELANTE: PABLO WIENKE ISQUIERDO (RÉU)

APELADO: NORTON OLSON & CIA LTDA (Massa Falida/Insolvente) (AUTOR)

RELATÓRIO

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto por PABLO WIENKE ISQUIERDO contra a sentença (Evento 47, Processo originário) que, nos autos desta ação revocatória ajuizada por NORTON OLSON & CIA LTDA (MASSA FALIDA), julgou procedente a demanda.

Adoto o relatório da r. sentença, pois bem narrou o presente caso:

A MASSA FALIDA DE NORTON OLSON & CIA. LTDA. ajuizou ação revocatória contra os réus Pablo, Norton e Elisete. Disse que a empresa, que tem como sócios Norton e Elisete, era proprietária de um caminhão VW 7.110S, vermelho, 1989, placas IHV 5171. Em 04/04/2014, a empresa apresentou pedido de recuperação judicial. Em 10/04/2014, a ré Elisete, com procuração da empresa, firmada pelo réu Norton, assinou o CRV do veículo (evento 2-5-4), alienando o caminhão ao réu Pablo pelo valor de R$ 16.000,00, que reconheceu sua assinatura apenas em 19/05/2016. Disse que tal venda representa simulação, pois ninguém deixaria tanto tempo para reconhecer sua assinatura no CRV. Salientou que Pablo ajuizou embargos de terceiro com relação a esse mesmo bem (apenso), onde disse que somente não transferiu o bem na época em razão da existência de restrição, a qual na verdade apenas passou a constar em 23/05/2016. Acrescentou que Norton e Elisete já haviam usado deste artifício para desviar uma Kombi da falida, o que foi confessado pelo comprador (documentos anexos à inicial) e Pablo era amigo pessoal deles e prestador de serviços . Assim, houve fraude na alienação, devendo o bem retornar ao patrimônio da falida. Acrescentou ainda que a alienação, mesmo afastada a fraude, ocorreu dentro do termo legal da falência (90 dias antes do primeiro protesto – 26/10/2013), o que acarreta a ineficácia da alienação frente a Massa, ainda que o adquirente esteja de boa fé. Por fim, acrescentou que a venda do caminhão, após o ajuizamento do pedido de recuperação judicial, é nulo por ausência de autorização judicial (art. 66 da Lei de Falências). Requereu liminar de reintegração de posse. Juntou procuração e documentos.

Na audiência, não houve acordo (evento 2-10-2), sendo Elisete nomeada curadora especial de Norton.

No evento 2-10-5, Pablo disse que comprou e pagou pelo caminhão, sendo que na época o mercado estava em plena atividade. Não efetuou a transferência porque tinha a posse do veículo e os documentos assinados. O pedido de recuperação judicial tem protocolo no dia 15/04/2014, e não 04/04/2014 como alegado. O veículo nunca esteve escondido, mas apenas estacionado no pátio de sua empresa, que loca o prédio da antiga Guaíba Arroz. Negou fosse amigo dos corréus, mas tão somente tinha relações comerciais com eles. Alegou ser terceiro de boa fé, não sendo passível de ação revocatória (art. 130 da LF). Requereu assistência judiciária gratuita e juntou procuração e documentos.

No evento 2-12-5, Norton e Elisete alegaram que a venda ocorreu antes do pedido de recuperação e os valores foram utilizados na manutenção da atividade da empresa. Disse que Pablo é adquirente de boa fé. Elisete juntou procuração. Vieram documentos.

Em réplica, a massa alegou que o caminhão ficou na posse da empresa até pouco antes de encerrar suas atividades. Pablo era e é amigo de Norton e Elisete e continuou a negociar com a falida com cheques de sócia oculta (Edir Aline da Silva Olson). Acrescentou que não há nenhuma prova do pagamento do preço (recibo, declaração de imposto de renda, baixa na contabilidade da falida, etc.). Acrescentou que as vendas dentro do período suspeito da falência tem a má-fé presumida (art. 129 da LF). Juntou documentos.

Veio saneador (evento 2-12-19), foram fixadas premissas de análise do processo e fixados fatos controvertidos e ônus da prova, bem como restituiu o bem ao requerido Pablo, mediante caução (termo de caução evento 2-15-27).

Vieram embargos de declaração (decisão no evento 2-17-15), foi reconhecido que o caminhão integra o conceito de estabelecimento, sendo que sua venda se enquadra no art. 129, VI, da Lei de Falências, pelo que foi modificado o saneador quanto a pontos controvertidos.

No evento 2-24-1, veio audiência de instrução.

O feito foi digitalizado.

As partes apresentaram memoriais.

O advogado de Norton renunciou.

RELATEI.

E o dispositivo sentencial foi redigido nos seguintes termos:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a ação e declaro a ineficácia da venda do caminhão VW 7.110S, vermelho, 1989, placas IHV 5171, feita pela falida em favor do réu Pablo, retornando o bem à propriedade da massa para cumprir com seus débitos. Por consequência, defiro a reintegração da posse do bem à massa.

A parte vencida na ação pagará a taxa única e despesas do processo, bem como honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 20% sobre o valor final da condenação, na forma do art. 85, § 2º, do CPC, considerando a extensão do labor exigido e valores envolvidos na causa.

Sobre a renúncia do advogado do requerido Norton, não tem nenhum efeito no processo. Ocorre que Norton, desde o início e em razão de seu estado de saúde, teve nomeada curadora especial e esta sim outorgou procuração ao causídico.

Portanto, se Norton não outorgou procuração, não há mandato a ser renunciado.

Publique-se; registre-se; intimem-se. Nada sendo requerido, arquivem-se.

Em suas razões recursais (Evento 55, Processo originário), a parte ré insurge-se contra a sentença de procedência da ação revocatória. Para tanto, sustenta que foi comprovada nos autos a aquisição do veículo objeto da revocatória de forma anterior ao ingresso da ação de recuperação judicial pela ora falida. Sustenta que a transação foi realizada de boa-fé e sem qualquer intenção de lesar terceiros ou a falida. Argumenta que os valores recebidos pela falida à época da alienação passaram a integrar seu patrimônio. Narra que a gerente da empresa no período da transação confirmou que o veículo já estava com a empresa ré na época da recuperação judicial, tendo demorado a transferir o o veículo para seu nome em razão da necessidade de reparos no bem. Discorre sobre os depoimentos testemunhais. Narra que, enquanto fornecedor e credor do supermercado falido, não tinha como saber que a sociedade empresária chegaria à falência, bem como não fez nada além de buscar perceber crédito existente. Argumenta que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria é no sentido de que a transferência de bens da empresa, registrada durante o termo legal da falência, mas antes da decretação da quebra, só pode ser declarada ineficaz mediante comprovação de fraude. Requer o provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões ao recurso de apelação (Evento 63, Processo originário).

O Ministério Público, em parecer de Evento 8, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação.

Após, vieram os autos conclusos para julgamento.

Tendo em vista a adoção do sistema informatizado, os procedimentos previstos nos artigos 931, 932 e 934 do Código de Processo Civil foram simplificados, porém cumpridos na sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso de apelação deve ser conhecido, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade, sendo aforado de forma tempestiva e acompanhado de preparo (Evento 60, Processo originário).

De início, consigna-se que a falência de NORTON OLSON & CIA LTDA foi decretada em 23/08/2016, tendo sido fixado o termo legal da falência para 26/10/2013 (90 dias antes do primeiro protesto).

A recorrente pretende a reforma da sentença que reconheceu a absoluta ineficácia da alienação de caminhão VW 7.110S, vermelho, 1989, placas IHV 5171, defendendo, em suma, a inexistência de intenção de fraudar terceiros e a falida e ausência de má-fé na celebração do negócio jurídico, o que, em seu entendimento, obstaculizaria o reconhecimento da ineficácia do negócio.

Ao passo que a falência foi decretada em agosto de 2016 (Evento 2, doc.2, p. 16,...

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