Acórdão nº 50021247120208210077 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 31-01-2022
Data de Julgamento | 31 Janeiro 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50021247120208210077 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Segunda Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001480690
2ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5002124-71.2020.8.21.0077/RS
TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias
RELATOR: Desembargador RICARDO TORRES HERMANN
APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (EXEQUENTE)
APELANTE: EGISSON LUIZ DA SILVA LORETO (EXECUTADO)
APELANTE: RBRASIL INDUSTRIA E COMERCIO DE VEICULOS DE COMBATE A INCENDIOS LTDA (EXECUTADO)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
LINCOLN FERRAZ BENTO PEREIRA e ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL apelam da sentença que julgou improcedentes os Embargos de Terceiro nº 077/11800009817 (CNJ: 0002045-51.2018.8.21.0077), cujos fundamentos transcrevo (EVENTO 3 - PROCJUDIC4):
Processo nº: 077/1.18.0000981-7 (CNJ:.0002045-51.2018.8.21.0077)
Natureza: Embargos de Terceiro
Autor: Lincoln Ferraz Bento Pereira
Réu: Estado do Rio Grande do Sul
Juiz Prolator: Juiz de Direito - Dr. João Francisco Goulart Borges
Data: 17/06/2019
Vistos, etc.
I. Relatório.
Cuida-se de embargos de terceiros opostos por LINCOLN FERRAZ BENTO PEREIRA em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, partes devidamente qualificadas nos autos.
O embargante narrou que adquiriu de Egisson Luiz da Silva Loreto, por escritura pública lavrada em janeiro de 2016 e levada a registro no álbum fundiário, o imóvel matriculado no Registro de Imóveis da Comarca de Santa Cruz do Sul, composto de um terreno com 1.763,455m², sobre o qual está edificada uma construção de alvenaria predial-residencial com área de 232,42m², situado na Rua Desembargador Doutor Alfredo Zimmer, n° 140, na cidade de Santa Cruz do Sul/RS. Relatou que na ocasião da compra nenhum gravame pendia sobre o imóvel. Salientou que o único ônus era a penhora do Banco ABN Anro S/A, referente ao processo n° 56.630 da Comarca de Santa Cruz do Sul, porém, o referido débito já havia sido quitado pelo vendedor. Ocorre que, para a surpresa do embargante, o imóvel teria sido objeto de alegação de fraude à execução e/ou indicado à penhora pelo Estado do Rio Grande do Sul. Discorreu acerca do direito e pugnou pelo recebimento dos embargos. Acostaram procuração e documentos, fls. 16-82. Recebidos os embargos e determinada a suspensão da execução e deferida a liminar de manutenção de posse do imóvel (fl. 83).
Citada a parte requerida apresentou contestação (fls. 86- 91). Arguiu, em preliminar, a intempestividade dos embargos à execução. No mérito, arguiu que ocorreu fraude à execução. Requereu a improcedência dos embargos. Anexou documentos (fls. 92-108).
Houve réplica (fls. 110-119). As partes foram intimadas para manifestarem-se acerca das provas que pretendiam produzir (fl. 120), as partes pugnaram pelo julgamento do feito no estado em que se encontra (fls. 122-125 e 126).
Nada sendo requerido, vieram os autos conclusos para sentença.
Foi breve o relatório.
Passo a fundamentar e a decidir.
II. Fundamentação.
O caso é de julgamento antecipado do mérito, nos termos do inciso I do artigo 355 do Código de Processo Civil.
1) Preliminares.
1.1) Da intempestividade dos embargos.
Conforme § 4º do art. 792 do CPC, antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15 (quinze) dias.
Conforme despacho de fl. 282 da execução apensa, o juízo fixou prazo de 15 dias para interposição de embargos, sendo que o AR foi juntado aos autos na data de 11/04/2018 e, considerando que o prazo começa a fluir da juntada do mandado aos autos, prazo que é contado em dias úteis. Nessa senda, considerando que os embargos de terceiro foram ajuizados em 23/04/2018 dentro do prazo legal.
Afastada a preliminar, passo à análise do mérito.
2) Do mérito.
Trata-se de embargos de terceiro, alegando a embargante que houve alegação de fraude à execução no processo executivo n° 077/1.05.0003158-4, uma vez que o executado teria vendido o imóvel em momento posterior a sua citação na ação executiva.
Os embargos de terceiro têm por finalidade a defesa da posse, buscando livrar da apreensão judicial bens integrantes do patrimônio de quem não é parte do processo.
Acerca dos embargos de terceiro, observe-se a redação do caput do art. 674 do CPC/2015: Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.
Ocorre que o conjunto probatório permite uma conclusão segura no sentido de que o embargante comprou o imóvel de Egisson Luiz da silva Loreto, executado na ação n° 077/1.05.0003158- 4, compra que ocorreu em 14 janeiro de 2016, conforme escritura pública de compra e venda de fls. 22-24 e registrada à fl. 21 no Registro de imóveis.
In casu, a execução fiscal foi ajuizada em 17/10/2005, depois da entrada em vigor da LC nº 118/2005 de 09 de junho de 2005.
A jurisprudência da Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.141.990/PR, de relatoria do Ministro Luiz Fux, submetido ao rito dos feitos repetitivos, firmou-se no sentido de que 'a alienação efetivada presumia-se em fraude à execução se o negócio jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005, consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa'.
Portanto, considerando a data da inscrição em dívida ativa, anteriores ao negócio efetuado, seria o caso de se reconhecer a fraude. A inicial refere que em 14 janeiro de 2016 foi lavrada a escritura pública de compra e venda, posteriormente a inscrição em dívida ativa, após o ajuizamento do executivo fiscal e mesmo depois da citação.
A questão da inclusão de Egisson Luiz da Silva Loreto (vendedor) no polo passivo, como pessoa física, foi reclamada pelo Estado em 22/05/2006 (fls. 86 da ação executiva) e deferida pelo juízo logo após, sendo que em data de 29/05/2007 o vendedor Egisson foi citado no executivo fiscal, inclusive indicando à penhora um caminhão de combate a incêndio. O negócio envolvendo o imóvel somente ocorreu uma década depois, ou seja, uma mera busca no Foro já indicaria que Egisson é devedor do estado e que o negócio era temerário. A fraude a meu ver salta aos olhos, tanto que o veículo que Egisson indicou a penhora, ele tratou de vender para outra empresa, assim como vendeu o bem que agora o terceiro pretende livrar da constrição. A questão da boa fé do terceiro deve ser afastada, pois Egisson já respondia pessoalmente pela execução fiscal, já havia sido até mesmo citado e seu nome constava dos registros da ação executiva fiscal. A presunção de fraude neste caso é absoluta, sendo que sua inclusão no polo passivo se deu uma década antes da venda. Aplica-se aqui o entendimento firmado no RE 1.441.990 e o disposto no § 3º do art. 792 do CPC/2015, em vigor antes mesmo da dada da venda. Bastava ir ao foro e pedir uma certidão para se saber que o vendedor era pessoalmente responsável pela dívida fiscal. É cautela ordinária que se exige de todos, que está presente em todas as transaçõesa imobiliárias, de modo que a fraude restou demonstrada.
Destaco o julgado que segue:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORABILIDADE DE BEM IMÓVEL. ALIENAÇÃO ANTERIOR AO REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL AOS SÓCIOS. FRAUDE NÃO CONFIGURADA. AFASTAMENTO DO PRECEDENTE FIRMADO NO RESP 1.141.990/PR E DO § 3º DO ART. 792 DO CPC/2015. PRECEDENTE DESTA CORTE REGIONAL. VERBA HONORÁRIA MANTIDA. APELAÇÃO IMPROVIDA. 1 - A questão devolvida a este Tribunal cinge-se à penhorabilidade de bem imóvel adquirido pelos ora embargantes Roberto Marzochi e Sônia Fátima Toledo Marzochi, alienado anteriormente ao redirecionamento do feito executivo aos sócios Paulo César Thomaseto e Célia Aparecida de Toledo Thomaseto em virtude da desconsideração da personalidade jurídica, e já sob a vigência do art. 185 do CTN na redação conferida pela Lei Complementar nº 118/05. 2 - O Superior Tribunal de Justiça apaziguou os critérios para a configuração de fraude à execução fiscal no julgamento do REsp nº 1.141.990/PR, submetido à sistemática dos recursos repetitivos. A fraude à execução fiscal é, dessa forma, regida pela norma vigente à época da alienação, concluindo-se que, em relação aos negócios jurídicos celebrados na vigência da redação original do art. 185, caput, do CTN, a fraude é presumida somente a partir da citação válida do executado; quanto às transações realizadas posteriormente à LC nº 118/2005, configura-se a fraude desde a mera inscrição do débito tributário em dívida ativa. 3 - Deveras, restou assentado pela Corte Superior que as disposições processuais civis em matéria de fraude à execução não se aplicam aos executivos fiscais, os quais se sujeitam ao específico regramento do aludido art. 185, do Código Tributário Nacional. É que o Código Tributário é norma especial em relação ao Código de Processo Civil e disciplina a fraude à execução de modo mais favorável ao credor fazendário e mais rigoroso ao devedor, uma vez que estão em jogo créditos de natureza pública. Consignou o STJ, ainda, que o enunciado de sua Súmula nº 375 também não é aplicável no âmbito das execuções de dívidas tributárias, não se exigindo, para o reconhecimento da fraude à execução fiscal, que a constrição judicial seja prévia e tornada pública por meio de averbação em cartório. A má-fé é presumida de forma absoluta. 4 - Com efeito, a natureza jurídica do crédito tributário conduz a que a simples alienação de bens e rendas pelo devedor do Fisco, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta de fraude à execução. Desconsideram-se, portanto, à vontade e a intenção do devedor alienante,...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO