Acórdão nº 50022005520188210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 25-05-2022

Data de Julgamento25 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50022005520188210016
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002063010
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5002200-55.2018.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Abandono Material

RELATORA: Juiza de Direito JANE MARIA KOHLER VIDAL

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se da irresignação de ADRIANA S. com a r. sentença que julgou procedente a ação de destituição do poder familiar que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO, destituindo-a, conjuntamente com TIAGO C. M., do poder familiar em relação aos filhos BRUNA VITÓRIA S. S., ANA LUIZA. S. S., GABRIEL S. S., DÉRIK TIAGO. S. M. e MARIA ISABELI S. M. (Evento 09, PROCJUDIC1 fls. 01/17 e PROCJUDIC2, fls. 56/57, dos autos de origem).

Sustenta a recorrente que a decisão recorrida merece reforma, uma vez que a destituição do poder familiar se trata de medida extrema e desproporcional ao caso, não tendo sido esgotadas as tentativas de reinserção dos filhos na família natural. Alega que não é feito estudo social há mais de um ano, destacando que as vulnerabilidades verificadas no ajuizamento do feito não existem mais. Pretende seja mantido o poder familiar da genitora. Pede o provimento do recurso.

Intimado, o MINISTÉRIO PÚBLICO apresentou contrarrazões pugnando pelo desprovimento do recurso.

Mantida a sentença, subiram os autos.

Com vista dos autos, a douta Procuradoria de Justiça lançou parecer opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Estou confirmando a r. sentença recorrida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Inicialmente, é importante salientar que a ação de destituição do poder familiar é um procedimento excepcional e grave, que somente é implementada quando não há condições de se manter os liames jurídicos entre pais e filhos, especialmente porque os efeitos da decisão poderão viabilizar a adoção como forma de inserção da criança ou adolescente em família substituta. E, por esse motivo em especial, a análise dos fatos exige sempre uma análise cuidadosa.

No caso em tela, verifica-se, com clareza, a difícil situação pessoal vivida pela genitora e a sua inaptidão para atender as necessidades dos filhos BRUNA VITÓRIA S. S., ANA LUIZA. S. S., GABRIEL S. S., DÉRIK TIAGO. S. M. e MARIA ISABELI S. M., nascidos, respectivamente, em 17.02.2004, 12.01.2006, 12.06.2009, 24.03.2014 e 05.11.2015, merecendo destacar que o grupo familiar vem sendo acompanhado pela rede de proteção desde 2015 quando foram recebidas denúncias sobre a situaçãoem se encontravam os filhos da recorrente.

Como é sabido, os filhos não são propriedade dos pais e o poder familiar dos genitores deve ser exercido de forma a protegê-los e promover-lhes a educação, o que se deve interpretar da forma mais abrangente possível, compreendendo aspectos de saúde, higiene, educação, lazer, desenvolvimento pessoal, intelectual e afetivo. Mas, no caso em exame, tais obrigações foram totalmente descuradas.

Os autos dão conta que a recorrente ADRIANA S. faz uso abusivo de bebida alcoólica, saía para se prostituir deixando os filhos sozinhos e até tentou atear fogo na casa com os filhos dentro e chegou a ser presa por tentar matar os filhos com uma faca, não apresentando condições para deter a guarda dos filhos, restando claro nos autos que os filhos foram tratados com desinteresse e negligência, sem receber os cuidados mínimos, sendo relegados a uma condição de abandono e a uma situação de risco, até serem abrigados.

Assim, diante desse quadro apresentado, a destituição do poder familiar mostra-se não só adequada mas necessária para que os menores tenham condições de bem se desenvolverem de forma saudável e possam vir a ter uma vida com dignidade.

Com tais considerações, estou acolhendo o parecer do Ministério Público, de lavra da ilustre PROCURADORA DE JUSTIÇA HELOÍSA HELENA ZIGLIOTTO, que peço vênia para transcrever, in verbis:

3.MÉRITO

Em que pesem os argumentos lançados pela apelante, não há qualquer reparo a ser feito na sentença.

O poder familiar está implícito naqueles direitos que se sintonizam com a paternidade/maternidade responsável, com a tutela especial à família, ao dever de convivência familiar e com a proteção integral da criança e do adolescente.

Na hipótese, a prova coligida demonstrou, à exaustão, a inaptidão de ambos os genitores para o exercício do poder familiar, tendo, ao contrário do alegado, sido esgotadas todas as possibilidades de reinserção dos menores no seio de sua família natural/extensa.

Com efeito, a despeito de todos os esforços empreendidos pela rede de proteção, que vem acompanhando o núcleo familiar da apelante desde novembro de 2015, e das inúmeras oportunidades concedidas, não se verificou qualquer atitude concreta de Adriana e/ou do genitor Tiago, o qual, devidamente citado, deixou o feito correr a revelia, para alterarem a sua dinâmica familiar e reassumirem a guarda dos filhos.

Ademais, ao contrário do alegado, restou demostrado que os genitores, expos os filhos a diversas situações de risco/vulnerabilidade, restando caracterizadas as hipóteses de perda do poder familiar prevista no artigo 1.638, incisos I, II, e III, do Código Civil.

A propósito, a fim de evitar desnecessária tautologia, haja vista a propriedade com que foi enfrentada a análise da prova, enfeixa-se o Parecer do Ministério Público de origem, de lavra da Dra. Marlise Cordenonsi Bortoluzzi, in verbis:

(...)

Trata-se de ação que visa à destituição do poder familiar da recorrente em razão da situação de risco em que se encontravam os protegidos.

A Promotoria de Justiça Especializada de Ijuí tomou conhecimento da situação dos beneficiários por intermédio do Ofício nº 2672/2015, oriundo do Conselho Tutelar. O referido dava conta de narrar a extrema situação de vulnerabilidade em que residiam Ana Luiza, Bruna Vitória, Gabriel, Dérick e Maria Isabelli, enquanto aos cuidados da genitora Adriana (fl. 08).

Em decorrência de denúncias feitas pelo ESF Luiz Fogliatto, o CT foi até o local averiguar a situação. Constatou que as cinco crianças (à época) estavam sozinhas em casa, sendo que as filhas mais velhas de Adriana (Bruna e Ana Luiza) eram quem cuidavam dos irmãos e realizavam serviços domésticos.

Sabe-se que a genitora, principalmente aos finais de semana, fazia uso abusivo de álcool e havia suspeita de prostituição. Nas oportunidades, as crianças ficavam sozinhas ou, por vezes, na companhia do companheiro de Adriana, o qual se suspeitava, também era usuário de drogas.

Conforme o noticiado, os protegidos, na data da averiguação pelo CT, estavam sem alimento e sozinhos na residência. Depreende-se que no mesmo terreno residiam Adriana e também Helena, avó paterna de Ana

Luiza, Bruna e Gabriel. A avó, quando questionada, disse que não tinha mantimentos para alimentar os netos e, ainda, informou estar sem energia elétrica. Quanto à ausência da genitora na residência no momento da visita, foi justificado que estava providenciando o retorno da energia elétrica.

Ademais, foi colocada a situação de extrema precariedade habitacional. A casa era composta de apenas um cômodo, onde as seis pessoas residiam.

Ainda, ressalta-se que Ana Luiza e Bruna, que estudavam no turno da manhã, não haviam ido à escola para cuidar dos irmãos mais novos.

Frente à situação em que se encontravam os protegidos, a então Conselheira Tutelar Luciana Albrecht, que atuava em sobreaviso, entrou em contato com a Secretaria Municipal de Assistência Social a fim de que levassem mantimentos ao grupo familiar, o que ocorreu posteriormente.

Ressalta-se que foi cogitado o acolhimento institucional, o que somente não havia sido efetivado no momento em razão de a genitora ter comparecido ao local.

O estudo social acostado nas fls. 17/21, realizado pela Assistente Social Judiciária, concluiu que a requerida sofria com as consequências da miserabilidade, da precariedade habitacional, da baixa escolaridade e da falta de trabalho. Porém, constatou-se forte vínculo entre os integrantes da família, identificando-se um grande interesse em melhorar aquela situação, o que vinha sendo concretizado com o auxílio de terceiros. Segundo o relatório, não havia indícios de abandono da genitora em relação aos seus filhos, mas sim uma falta de orientação e suporte, o que deveria ser averiguado ao longo da Ação de Medida Protetiva.

Às fls. 39 e 41 aportaram relatórios acerca da frequência escolar dos beneficiários Gabriel, Ana Luiza e Bruna Vitória, do qual se infere que, no ano letivo de 2015, Gabriel teve constantes faltas não justificadas. Ainda, o relatório mencionou que Gabriel era um menino inquieto, faltando-lhe concentração e persistência nos trabalhos, não concluindo os mesmos.

Com relação à Ana Luiza, o cenário não era diferente, pois apresentava muitas dificuldades de aprendizagem, reprovando por duas vezes no 3º ano do ensino fundamental.

Bruna Vitória apresentou uma grande quantidade de faltas injustificadas.

Os relatórios remetidos pelas Escolas demonstram a situação de infrequência escolar dos beneficiários Gabriel, Ana Luiza e Bruna Vitória, tendo em vista que apresentaram inúmeras faltas injustificadas apenas no mês de março de 2016.

Às fls. 50/52 foi juntado relatório do Conselho Tutelar. Da análise do documento, verifica-se que, em visita realizada pela Conselheira no dia 31 de julho de 2016, foi constatada situação de extremo risco em que estavam inseridos os protegidos, pois Adriana fazia uso excessivo de bebidas alcoólicas e de drogas, aparentando comportamento agressivo. As crianças eram deixadas sozinhas em casa, ao relento de qualquer proteção.

Em análise do caso junto à Conselheira Tutelar na data de 12/08/2016, nesta Promotoria, constatou-se que muitos foram os relatos não repassados ao Ministério Público e ao Juízo, havendo...

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