Acórdão nº 50022106920148210039 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50022106920148210039
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002248055
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5002210-69.2014.8.21.0039/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro (art. 213)

RELATORA: Juiza de Direito CARLA FERNANDA DE CESERO HAASS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Na Comarca de Viamão/RS, o Ministério Público ofereceu denúncia contra A. de P. R., nascido em 01/09/1981, contando 30 (trinta) anos de idade ao tempo do fato, dando-o como incurso nas sanções do art. 217-A, c/c o art. 61, inc. II, alínea "f", ambos do Código Penal.

Narrou a peça vestibular acusatória, in verbis (processo 5002210-69.2014.8.21.0039/RS, evento 3, PROCJUDIC1, fls. 02/04):

Em data e horário incertoS, mas durante o mês de maio de 2012, no interior da residência localizada na Rua Ana Neri, n.º 130, em Viamão/RS, o denunciado A. de P. R., mediante violência presumida, em face da idade da vítima, constrangeu M. C. R. S., nascida em 12/01/2002, com dez anos de idade (conforme informação da fl. 04 do IP), praticando com ela ato libidinoso diverso da conjunção carnal.

Para executar o delito, o denunciado prevalecia-se do fato de ser tio da vítima, sobre ela exercendo autoridade, e quando a vítima ficou aos seus cuidados, a levou para o quarto e introduziu os dedos em sua vagina.

Recebida a denúncia em 19/05/2015 (3.1, fl. 40), o réu foi citado e, por Defensor constituído, apresentou resposta à acusação (3.2, fls. 01/04 e 17/18).

Ausente hipótese de absolvição sumária, o feito prosseguiu com a inquirição da vítima e das testemunhas, restando, ao final, o réu interrogado (3.3, fls. 48/50, e 3.4, fls. 18/20 e 47/48).

Acostada a certidão de antecedentes criminais do acusado (3.4, fl. 49/50).

O Ministério Público e a Defesa apresentaram memoriais em substituição a alegações finais orais (3.5, fls. 03/07 e 08/11).

Em 27/02/2020, sobreveio sentença, publicada em 28/02/2020 (3.5, fls. 12/21 e 22), julgando procedente a ação penal e condenando o réu como incurso nas sanções do art. 217-A, c/c o artigo 226, inciso II, ambos do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos e 09 (nove) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado. Custas pelo sentenciado, a quem concedido o direito de apelar em liberdade.

Inconformada, a Defesa constituída interpôs recurso de apelação. Em suas razões, postulou a absolvição do increpado, ao argumento de que insuficiente o almanaque probatório ao objetivo de revelar a existência do delito, bem assim para comprovar o elemento subjetivo específico do tipo penal pelo qual condenado. Nesse tom, ressaltou os relatos das testemunhas Mirian P. R. e Arilson G. S., corroborando a narrativa do increpado, de que teria tocado a menina tão só fins de verificar as lesões na vagina por ela retratadas, bem ainda os resultados dos testes anti HIV e anti V.D.R.L., ambos negativos, a denotar a impossibilidade de transmissão da doença venérea (3.5, fls. 28/29 e 30/37).

Intimado pesoalmente o réu do veredicto (3.5, fls. 26/27), subiram os autos a esta Egrégia Corte.

Neste grau, manifestou-se a Procuradoria de Justiça pelo PROVIMENTO do recurso defensivo, fins de absolver o réu da imputação vertida na inicial acusatória (evento 9, PARECER1).

Conclusos os autos para julgamento.

Esta Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, tendo sido atendido o disposto no art. 207, inc. II, do RITJRS, bem como o art. 609, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

Encaminho o voto no sentido de dar provimento ao apelo defensivo, fins de absolver o apelante do fato narrado na exordial acusatória.

Ao acusado foi imputada a prática do crime de estupro de vulnerável porque, em tese, em data e horário incertos, mas durante o mês de maio de 2012, aproveitando-se de momento em que a vítima, sua sobrinha de 10 anos de idade, encontrava-se sob seus cuidados, a levou para o quarto e introduziu os dedos em sua vagina.

O inicial indigitar do réu como autor dos abusos decorreu, notadamente, do fato de a menor, infante de apenas 10 anos de idade, ter sido diagnosticada com sífilis, concluindo-se acerca de sua exposição ao abuso sexual.

Em 05/07/2012, M. R. P., ao registrar a ocorrência, noticiou QUE TROUXE SUA FILHA M. ATÉ ESSE NOSOCÔMIO COM A FINALIDADE DE REALIZAR EXAMES LABORATORIAIS POIS A AVO MIRIAM TINHA OBSERVADO QUE M. QUANDO CAMINHAVA, MANCAVA A PERNA DIREITA E TINHA ALGUMAS BOLINHAS EM TORNO DE SUA REGIÃO GENITAL. NO DIA DE HOJE VEIO ATÉ ESSE HOSPITAL BUSCAR OS RESULTADOS DOS REFERIDOS EXAMES, OS QUAIS APONTAVAM COMO RESULTADO SOROLOGIA PARA SIFILIS (...). A COMUNICANTE DIZ NÃO TER NENHUM SUSPEITO ATE ENTÃO, MAS CITA QUE A CRIANÇA JÁ POUSOU NA CASA DE SEU TIO A. DE P. R. (TIO FUCA) DE 30 ANOS, CAMINHONEIRO E QUE NO MES PASSADO DEU DE PRESENTE A MARCIELE UM PAR DE TENIS DA COR BRANCA SEM MARCA. A CRIANÇA FOI ENCAMINHADA A EXAME DE ESTUPRO E OU ATO LIBIDINOSO (3.1, fl. 09).

Do histórico dos Autos de Exame de Corpo de Delito n. 31463/2012 e 31465/2012, infere-se que, em 05/07/2012, a infante foi submetida a exame de corpo de delito junto ao Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, porque, ao que consta, há cerca de três semanas a mãe percebera lesões em sua região genital, resultando positivo o exame para sífilis, requisitado por médica assistente. Nesse contexto, o Perito Médico-Legista concluiu que, evidenciados dois nódulos cicatriciais nos grandes lábios, predominantemente à esquerda, estavam presentes os sinais de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, caracterizados por presença de doença sexualmente transmissível - sífilis (3.1, fls. 15 e 16).

E, em 16/08/2012, submetida à Avaliação Psíquica junto ao IGP/SSP - Laudo nº 47774/2012 - acerca do ocorrido, a periciada descreveu que meu tio, o irmão da minha mãe chegou lá na mina casa e daí falou p'ros meus irmãos ir no mercado. E daí ele me levou lá p'ro quarto e botou o dedo dele aqui na minha coisinha, daí eu afastei a mão dele. A mão dele tava suja e daí começou a aparecer um monte de bolinha. Ao final, concluiu-se que A declaração emitida, em conjunto com o quadro clínico apresentado, apoiam a hipótese de ato libidinoso, não sendo observados, ademais, sinais diretos de influência, porque a periciada não emite sua declaração de modo rígido ou estereotipado, utiliza linguagem compatível com sua faixa etária e não se observaram motivações para prestar informações falsas (3.1, fls. 18/21).

Na evolução, foram ouvidos, ainda na fase investigativa, a genitora da ofendida, em 19/11/2012, creditando ao irmão a autoria do abuso sexual (3.1, fls. 23/24), e deste, refutando a acusação (3.1, fl. 29).

Instaurada a ação penal, foram ouvidas a vitimada, sua genitora e a avó materna, bem como interrogado o acusado.

O réu negou a acusação. Recordou, contudo, o dia em que esteve na casa da irmã e os sobrinhos alertaram que M. C. R. S. estava febril. Disse que, em razão disso, pediu que os meninos fossem comprar remédio para a menina, tendo um deles, Guilherme, primo de M., permanecido no pátio. Quando a menina saiu do banho, percebeu que ela estava com o rosto vermelho e caminhando com as pernas abertas. Questionada, ela respondeu que se machucara no colégio. Insistiu em saber o que se passava, oportunidade em que a menina afastou a toalha e, envergonhada, mostrou a vagina, que estava cheia de bolotas. Nesse contexto, referiu ter tocado a menina para verificar a situação exposta. Ato seguinte, medicou a sobrinha e foi para a casa de sua mãe, retratando o acontecimento. Na mesma hora, sua mãe foi ver a neta. Na sequência, a genitora e a avó levaram M. ao hospital, quando descobriram que a menina estava com sífilis. Em relação a esta doença, assegurou nunca tê-la contraído, assim como nenhuma outra doença sexualmente transmissível. Advertiu, ainda, jamais ter abusado sexualmente da irmã, tampouco com ela estabelecido qualquer desavença mais grave, apontando, contudo, o fato de que ela mantivera vários relacionamentos amorosos (audiências do processo).

M. de P. R., mãe do réu e avó da vitimada, rechaçou a prática de ato libidinoso por parte do filho. Afirmou que, segundo A. de P. R., ele tocou a menina por preocupação, na condição de tio, considerando que ela estava com bolhas feias na genitália. Disse que ele a tocou para ver o que ela tinha na vagina, sem qualquer conotação sexual, e que não introduziu dedo algum na vagina da infante. Assegurou que, no mesmo dia, o filho procurou-a, fins de contar acerca do quadro de saúde da neta. No mesmo dia foi à casa da filha e, constatando o quadro retratado pelo réu, já no dia seguinte levou M. ao médico. Levou a menina no Posto da 32, onde foram aconselhadas a buscar atendimento junto ao Hospital Presidente Vargas. Disse que em momento algum a menina externou o fato de o tio ter colocado o dedo em sua vagina e que era comum ele ajudar a irmã.

M. R. P., genitora da vitimada, disse ter tomado conhecimento dos fatos pela mãe, que residia nas proximidades. A irmã morava na casa em frente à sua. Na data do ocorrido, estavam em casa a M. e os outros dois filhos, T. C, menina de 08 anos de idade, e o mais velho, D. H, de 12 anos de idade. O bebê estava aos cuidados da avó materna. Soube dos problemas de saúde da filha pela mãe, que disse ter percebido a menina mancando. Disse que a menor, diante disso, mostrou as feridas e que a mãe encarregou-se de levá-la ao médico. No Hospital de Viamão não quiseram atendê-la, encaminhando o caso ao Hospital Presidente Vargas. Após a consulta, a mãe ligou advertindo acerca da suspeita de abuso sexual, informando que deveria fazer contato com a assistente social. Em razão disso, conversaram, ela e a irmã, com a filha, que começou a chorar e contou que o tio teria ido na casa delas, mandado os dois...

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