Acórdão nº 50022629620218210014 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50022629620218210014
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003201800
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5002262-96.2021.8.21.0014/RS

TIPO DE AÇÃO: Tráfico de Drogas e Condutas Afins

RELATOR: Desembargador SERGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos por MYKAEL S. contra o acórdão que, à unanimidade, negou provimento ao recurso de apelação interposto pelo adolescente, contra a r. sentença que julgou procedente a representação que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO pela prática de ato infracional tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 e aplicou-lhe a medida socioeducativa de internação sem possibilidade de atividades externas.

Sustenta a defesa que o fato reflete a realidade de milhares de trabalhadores infantis, visto que adolescentes servem como fundamental força de trabalho para grandes organizações criminosas. Alega que devem ser considerados os aspectos jurídicos, sociais e humanos, nos termos dos tratados e convenções internacionais firmados pelo Brasil, priorizando a proteção dos trabalhadores infantis. Pede sejam acolhidos os embargos de declaração com pronunciamento expresso acerca da não aplicação dos tratados internacionais firmados pelo Brasil relacionados diretamente ao caso em epígrafe, especialmente as Convenções nº 182 e nº 183 e a Recomendação nº 190, ambas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da violação dos art. 5º, §§ 1°, 2° e 3°, e art. 227, da Constituição Federal, da Emenda Constitucional nº 45/2004, e dos art. , , 98, 101 e 103, do ECA.

É o relatório.

VOTO

Estou desacolhendo os embargos de declaração opostos, pois não vislumbro qualquer vício formal no aresto.

No corpo do acórdão foram deduzidas de forma suficientemente clara as razões pelas quais foi, unanimemente, desprovido o recurso de apelação, não pendendo qualquer dúvida sobre o conteúdo do aresto, nem existe nele qualquer contradição, erro ou omissão, nem houve ofensa à legislação federal, sendo oportuno transcrever o voto lançado na íntegra:

Estou desacolhendo ambos os pleitos recursais.

Com efeito, restando cabalmente comprovadas tanto a autoria como também e a materialidade do grave ato infracional, torna-se imperioso o juízo de procedência da representação e também a aplicação da medida socioeducativa compatível com a gravidade dos fatos e, sobretudo, com as condições pessoais do infrator.

Tendo o adolescente sido apreendido em situação de flagrância, na posse de droga conhecida como maconha, sendo 15 porções, totalizando em 375 gramas, bem como 04 folhas contendo a contabilidade do tráfico, as quais foram encontradas no fundo da sacola que o adolescente portava, resta configurado o ato infracional descrito na representação como tráfico de entorpecentes.

Não se cogita de nulidade da apreensão em flagrante, pois não houve violação de domicílio, sendo que os policiais avistaram o infrator após uma denúncia de tráfico na localidade, e, ao perceber a aproximação da guarnição, o representado tentou evadir-se, sendo imediatamente apreendido e localizada com ele a droga apreendida.

Nesse contexto, considerando a gravidade do ato infracional e ficando claro que o infrator é pessoa desestruturada e comprometida com o tráfico, respondendo por outros fatos da mesma natureza, a medida socioeducativa de internação com atividades externas se mostra a mais adequada, pois há necessidade de contenção visando afastá-lo do mundo das drogas e do crime, para que ele faça uma profunda reflexão sobre o comportamento desenvolvido, sendo necessário mostrar a ele que o tráfico de entorpecentes é considerado, na perspectiva criminal, crime hediondo, tão grandes são os malefícios que causa para a sociedade.

Por fim, observo que o estado de calamidade sanitária que foi decretada no Estado, não teve qualquer relevância na prática do ato infracional, já tendo sido aplicada ao infrator a medida extrema, que, como disse, se mostra adequada, não sendo possível o abrandamento reclamado pela defesa, diante da gravidade do fato e da conduta desajustada que o infrator vem desenvolvendo.

Com tais considerações, estou acolhendo também os argumentos expendidos na bem lançada sentença de lavra da ilustre Magistrada, DRA. FLAVIA MACIEL PINHEIRO GIORA, que fez correta análise dos fatos, da prova e do direito incidente, motivo pelo qual peço vênia para transcrevê-la em parte, in verbis:

1) Preliminares

a) Da violação ilegal de domicílio:

Adianto que a invocação da defesa de que a apreensão do adolescente se deu por violação ilegal de domicílio sem razões fundadas, sendo ilícito o flagrante e os demais elementos probatórios, não merece prosperar.

Isso porque, como se verá na fundamentação a seguir, o policial militar ouvido em juízo salientou que a apreensão e abordagem ao adolescente se deu em frente à residência quando ele estava chegando em casa, afirmando que a droga foi apreendida durante a revista ao representado, tendo ele ainda tentado evadir-se do local, porém lograram êxito em abordá-lo.

A alegação do representado de que estava almoçando dentro da casa da sua vó e que os policiais invadiram a residência dela se trata de versão isolada nos autos, visto que não foi trazida qualquer prova a amparar tal alegação, sendo que a mãe do adolescente que prestou depoimento em juízo não presenciou o momento da apreensão dele, ao passo que o adolescente aduziu que outras pessoas presenciaram a abordagem, porém não as trouxe em juízo para corroborar sua versão.

Dessa forma, não há que se falar em violação de domicílio e ilicitude ou ilegalidade do flagrante e dos demais elementos probatórios constantes dos autos, razão pela qual DESACOLHO a invocação defensiva.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. ECA. ATO INFRACIONAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO DEVIDAMENTE CUMPRIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO. INTERESSE RECURSAL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DOMICÍLIO. AUSÊNCIA DE PARECER DA EQUIPE INTERPROFISSIONAL. ART. 212, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPP. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CREDIBILIDADE DAS DECLARAÇÕES PRESTADAS POR POLICIAIS. DESCABIMENTO. PREQUESTIONAMENTO. 1. Caso em que a medida de internação imposta ao representado já foi devidamente cumprida, com a extinção do processo de execução, ficando prejudicada a análise dos pontos referentes à medida socioeducativa (pedido para responder ao processo em liberdade, reconhecimento da minorante do § 4º do art. 33 da Lei n.º 11.343/06 e substituição da medida socioeducativa de internação). 2. Não há que se falar em nulidade da prova produzida, sob a alegação de violação ao domicílio, na medida em que os policiais militares que participaram da ocorrência foram categóricos ao afirmar que a droga foi apreendida durante revista pessoal do representado. 3. A ausência do Relatório de Investigação Social de que trata o item 16.1 das Regras de Beijing que, no ECA, equivale ao parecer elaborado por equipe interprofissional, nos termos de seu art. 186, não enseja, por si só, a nulidade do procedimento, porquanto se trata de providência facultada ao juízo. Entendimento consolidado na Conclusão n.º 43 do Centro de Estudos desta Corte. 4. Consoante entendimento desta Corte de Justiça, mesmo após a alteração legislativa promovida em 2008, a interpretação do art. 212 do CPP não retira do juiz o direito de inquirir as partes ou testemunhas, na busca da verdade real. 5. A materialidade e a autoria da prática pelo representado das condutas descritas no art. 33, caput, e no art. 35, caput, ambos da Lei n.º 11.343/06, estão comprovadas pelos dados informativos colhidos na fase investigativa e pelas provas produzidas durante a instrução processual. 6. Inexiste nos autos qualquer adminículo de prova a afastar a credibilidade das declarações prestadas pelos policiais, tampouco de que eles tivessem interesse em prejudicar o representado, o que não se pode concluir simplesmente pelo fato de haverem trabalhado na fase investigatória. 7. A apresentação de questões para fins de prequestionamento não induz à resposta de todos os artigos referidos pela parte. PRELIMINARES REJEITADAS. APELAÇÃO DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70084400001, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em: 09-10-2020). (grifei).

Ad argumentandum tantum, cumpre consignar que não há violação de domicílio quando há flagrante delito, na esteira do artigo 5º, XI, da Constituição da República de 1988, visto que, em se tratando de crime permanente, o ingresso no domicílio pode ocorrer sem autorização judicial, sendo prescindível a obtenção prévia de mandado ou mesmo a autorização do representado, quando presentes elementos mínimos a caracterizar justa causa para a medida.

Sobre o tema, cito:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO NA FORMA MONOCRÁTICA. AUSENTE PREJUÍZO. Tratando-se de recurso manifestamente improcedente, acrescida à existência de precedentes jurisprudenciais acerca da matéria, autorizado estava o Relator a proceder ao julgamento singular. Ademais, o recurso está sendo levado a julgamento pelo órgão colegiado, afastando qualquer prejuízo que se possa cogitar. Aplicação do art. 206, XXXVI, do RITJRS, combinado com o art. 932, VIII, do CPC. Precedentes do TJRS. AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO CÍVEL. ECA. ATO INFRACIONAL. EQUIPARAÇÃO AOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, PREVISTOS NOS ARTS. 33 E 35, DA LEI Nº 11.343/06. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO E APREENSÃO EM FLAGRANTE. ILICITUDE DA PROVA. INOCORRÊNCIA. Não há que se falar em nulidade das provas colhidas no domicílio dos representados, por, supostamente, terem ingressado os policiais civis na residência sem mandado, uma vez que...

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