Acórdão nº 50022654420208210157 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50022654420208210157
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002289425
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5002265-44.2020.8.21.0157/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio Simples (art. 121 caput)

RELATORA: Juiza de Direito VIVIANE DE FARIA MIRANDA

RECORRENTE: CLEVERSON MURILO CANTARELLI PEREIRA (ACUSADO)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

De início, trago à baila o relatório da sentença de lavra do Juiz de Direito Dr. Felipe Roberto Palopoli, que bem sintetizou os principais eventos da marcha processual (evento 286, SENT1):

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, no uso de suas atribuições e com base no Inquérito Policial n° 186/2020/150428/A, ofereceu denúncia contra JOÃO PAULO DA SILVA, vulgo Parobé, portador do RG 1124346261, inscrito no CPF sob n° 414.789.300-03, brasileiro, solteiro, sem profissão declarada, com instrução fundamental, natural de Porto Alegre/RS, nascido em 08/03/1998, com 21 anos à época do fato, filho de Valtair dos Santos Silva e Gilvana Borba da Silva, residente na Rua Nossa Senhora de Lourdes, n° 52, em Parobé/RS, como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV do Código Penal; DANIEL DA SILVA, vulgo Dani, portador do RG n° 6128326086, inscrito no CPF sob n° 422.317.520-34, brasileiro, solteiro, sem profissão declarada, com instrução fundamental, natural de Rolante/RS, nascido em 26/08/1999, com 20 anos à época do fato, filho de Valtair dos Santos e Gilvana Borba da Silva, residente no Beco da Servidão Weber, n° 394, Bairro Alvorada, em Parobé/RS, como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, na forma do art. 29, caput, ambos do Código Penal; e CLEVERSON MURILO CANTARELLI PEREIRA, vulgo Clebinho, portador do RG n° 7133087961, brasileiro, solteiro, de profissão e grau de escolaridade desconhecidos, natural de Curitiba/PR. nascido em 07/03/1983, com 36 anos à época do fato, filho de Clemente Pereira e Leoci Maria Codo, residente na Rua Archymendes Fortini, n° 205, Bairro São Luiz, Sapiranga/RS, como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, c/c art. 29, caput, 61, inciso I e 62, inciso I, todos do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso:

Entre os dias 06 e 12 de fevereiro de 2020 (possivelmente na primeira data), na parte da tarde, na localidade popularmente chamada de “Morro do Gás”, no Bairro Alvorada, em Parobé/RS, os denunciados João Paulo da Silva, Daniel da Silva e Cleverson Murilo Cantarelli Pereira, em comunhão de esforços e conjugação de vontades entre si, mataram Moisés Tawilliam Medeiros Soares. Na oportunidade, os denunciados João Paulo e Daniel – o primeiro armado e ambos sob ordem do denunciado Cleverson – dirigiram-se à localidade acima juntamente com a vítima Moisés, atraída ao local sob o falso pretexto de subtraírem para eles um boi.

Durante o percurso em meio a mata fechada, os três resolveram fumar maconha, sendo que enquanto Moisés “preparava” o cigarro, o denunciado João Paulo posicionou-se atrás dele, sacou uma arma de fogo (não apreendida) que trazia consigo e efetuou diversos disparos contra o ofendido, matando-o (necropsia às fls. 46/47). O corpo da vítima foi localizado no dia 12 de fevereiro de 2020, já em estado de putrefação. Fútil é a motivação do crime, uma vez que o denunciado Cleber suspeitava que Moisés teria subtraído o motor/compressor de água de uma casa por ele alugada em Parobé/RS.

O homicídio foi cometido à traição, uma vez que o ofendido Moisés era amigo dos denunciados João Paulo e Daniel, sendo atraído pelo primeiro até o local sob o pretexto de, conluiados com o segundo, todos subtraírem um boi, sendo a vítima executada pelas costas durante o percurso onde supostamente cometeriam o furto.

O denunciado Daniel concorreu para a prática do crime prestando apoio moral e material, uma vez que acompanhou o codenunciado João Paulo a fim de dar credibilidade à versão por ele criada para ludibriar a vítima, garantindo, também, a superioridade numérica e de forças entre os denunciados com relação à vítima.

O denunciado Cleverson, recolhido ao sistema prisional à época do fato, concorreu para a prática do delito na medida em que planejou e organizou com seus comparsas a prática da empreitada criminosa, bem como ao determinar a seus comparsas que executassem a vítima, atuando como mandante.

O denunciado Cleverson é reincidente

Após pedido da Autoridade Policial e parecer favorável do Ministério Público, a prisão preventiva dos réus foi decretada. Na mesma ocasião, recebida a denúncia, em 06 de julho de 2020 (evento 2, DESP46).

Os réus foram pessoalmente citados (evento 2, OUT INSPROC68, página 3/evento 2, CERT73) e apresentaram resposta à acusação (evento 2, DEFESA PRÉVIA71; DEFESA PRÉVIA72; DEFESA PRÉVIA74).

Inaplicáveis as hipóteses de absolvição sumária, restou designada a instrução.

Durante as audiências, foram ouvidas as testemunhas de defesa e acusação, além de interrogados os réus (Eventos 42, 177 e 259)

Juntado aos autos o Laudo Pericial n.º 23779/2020 sobre o local do crime (evento 63, LAUDO1).

Encerrada a instrução processual, os debates orais foram substituídos por memoriais escritos.

Em sede de memoriais, o MINISTÉRIO PÚBLICO, afirmou que está comprovada a materialidade e que há indícios suficientes de autoria do delito, requerendo a pronúncia dos réus nos termos da denúncia (Evento 267).

As defesas, por seu turno, apresentaram memoriais. A defesa de JOÃO PAULO discorreu sobre a ausência de indícios autorais, requerendo a impronúncia do acusado, nos termos do artigo 409, do CPP. Subsidiariamente, requereu o afastamento das qualificadoras, além da revogação da prisão do acusado (Evento 277).

A defesa de CLEVERSON pugnou pela impronúncia, com fundamento no art. 414 do CPP. Subsidiariamente, requereu o afastamento das qualificadoras da motivação fútil e do recurso que dificultou a defesa do ofendido, alegando que a última sequer seria aplicável ao acusado que teria atuado como mero mandante do crime (Evento 279).

Por fim, a defesa de DANIEL sustentou a ausência de provas, pugnando pela impronúncia, com fundamento no art. 414 do CPP. Subsidiariamente, requereu o afastamento das qualificadoras (Evento 283).

Atualizados os antecedentes criminais dos réus (Evento 284).

Vieram os autos conclusos para sentença.

Por sentença publicada em 19/11/2021, o Juízo a quo julgou PROCEDENTE a denúncia para PRONUNCIAR, com base no art. 413 do Código de Processo Penal, JOÃO PAULO DA SILVA dando-o provisoriamente como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV do Código Penal; DANIEL DA SILVA, dando-o provisoriamente como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, na forma do art. 29, caput, ambos do Código Penal; e CLEVERSON MURILO CANTARELLI PEREIRA, dando-o provisoriamente como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, c/c art. 29, caput, 61, inciso I e 62, inciso I, todos do Código Penal, a fim de que sejam submetidos a julgamento pelo Tribunal do Júri (evento 286, SENT1).

Inconformado, o réu CLEVERSON MURILO CANTARELLI PEREIRA interpôs recurso em sentido estrito (evento 294, REC1).

Em suas razões, requereu, em síntese, a despronúncia nos termos do art. 414 do Código de Processo Penal, apontando a inexistência de substrato probatório mínimo capaz de sustentar a submissão do denunciados a julgamento perante ao Tribunal do Júri. Por fim, pugnou pelo afastamento das qualificadoras (evento 309, RAZRECUR1).

Foram apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público (evento 316, CONTRAZ1).

Os autos foram remetidos a este Sodalício, sendo distribuídos à minha Relatoria.

Nesta instância, em parecer exarado pelo Dr. Marcelo Roberto Ribeiro, Procurador de Justiça, o Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento do recurso (evento 8, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Eminentes Desembargadores:

Cuida-se de recurso em sentido estrito manejado pela Defesa de CLEVERSON MURILO CANTARELLI PEREIRA, inconformado com o decisum que o pronunciou nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, c/c art. 29, caput, 61, inciso I e 62, inciso I, todos do Código Penal.

Requisitos do artigo 413 do Código de Processo Penal

Na decisão de pronúncia, veda-se ao Julgador análise "exaustiva, percuciente do processo, como se estivesse julgando um crime de sua competência"1, porquanto somente ao Conselho de Sentença, diante de expressa determinação no texto constitucional, incumbe o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Exige-se do Juiz togado, tão somente, nesta decisão interlocutória mista não terminativa, que encerra o judicium accusationes, a indicação de prova da materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria, a teor do artigo 413 do Código de Processo Penal.

Nessa toada, descabe ao Juiz togado, nesta fase processual, realizar exame percuciente do almanaque probatório, bem como a integralidade de fatores que permeiam a acusação, tal apreciação acurada competindo ao Conselho de Sentença, nos termos do artigo 5º, inciso XXXVIII, “d”, da Constituição Federal.

Entretanto, como preleciona Campos (2021, p. 341/342):

Deve-se tomar redobrado cuidado na interpretação do art. 413, § 1º do CPP que limita a fundamentação da pronúncia à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. Isso porque, numa leitura literal de tal dispositivo, a fundamentação, da decisão de pronúncia limitar-se-ia, tão somente, a indicar páginas referentes ao laudo de exame de corpo de delito ou necroscópico e aquelas onde constam os depoimentos colhidos e mais nada! Ora, não se pode aceitar essa indicação de provas como fundamento da decisão; é preciso que o magistrado, além de apontar onde constatou as...

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