Acórdão nº 50022811720218210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Criminal, 07-12-2022

Data de Julgamento07 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50022811720218210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002913348
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5002281-17.2021.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATORA: Desembargadora JANE MARIA KOHLER VIDAL

APELANTE: FERNANDA DA SILVA BRAZ (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença recorrida, de relatoria da Dra. TAISE VELASQUEZ LOPES, proferida nos seguintes termos (evento 71, SENT1 e evento 80, SENT1):

O MINISTÉRIO PÚBLICO, com amparo no Inquérito Policial nº 38/2021/151003/A, oriundo da DRACO, denunciou FERNANDA DA SILVA BRAZ, qualificada na inicial (evento 1), como incurso nas sanções do artigo art. 33, caput, da Lei 11.343/2006 e artigo 329, caput, do Código Penal, pela prática do seguinte fato, assim narrado na exordial acusatória (fls. 02/04, evento 1):

"1º FatoTráfico de drogas:

No dia 21 de janeiro de 2021, por volta das 19 horas, na Rua das Arapongas, 1943, Bairro Santa Fé, na via pública, nesta Cidade, a denunciada FERNANDA DA SILVA BRAZ trazia consigo, para fins de mercancia, drogas ilícitas, consistentes em 161 (cento e sessenta e uma) pedras de crack, pesando aproximadamente 11,8 g (onze gramas e oitocentos miligramas), e 01 (uma) porção de maconha, pesando cerca de 3,6 g (três gramas e seiscentos miligramas), e vendeu e entregava a consumo a dois usuários não identificados, quantidade não apurada das referidas drogas, substâncias entorpecentes que causam dependência física e psíquica (laudos de constatação da natureza das substâncias das fls. 17/18 do APF), sem autorização e em desacordo com determinação legal, apreendidas pela autoridade policial, consoante os autos de apreensão das fls. 13/15 do APF.

2º FatoResistência:

Nas mesmas condições de tempo e lugar, a denunciada FERNANDA DA SILVA BRAZ opôs-se à execução de ato legal, mediante violência a funcionários competentes para executá-lo, quais sejam os policiais militares que atenderam à ocorrência e deram-lhe voz de abordagem, entrando em luta corporal contra a guarnição, lesionando o Soldado Dias no rosto, que necessitou submeter-se a atendimento médico na UPA Zona Norte.

Circunstâncias comuns aos fatos:

Na ocasião, a guarnição da Brigada Militar, durante patrulhamento de rotina em ponto conhecido como de tráfico de drogas, avistou, na via pública, dois homens e uma mulher em atitude suspeita, haja vista ela estar entregando algum objeto aos demais. Quando os policiais iniciavam a abordagem, a flagrada dispensou uma pequena bolsa que estava sem seu poder e empreendeu fuga juntamente com os outros dois suspeitos, sendo perseguidos pelos policiais, que alcançaram e detiveram a flagrada, que foi identificada como FERNANDA DA SILVA BRAZ, a qual resistiu ativamente à abordagem, entrando em luta corporal com a guarnição e causando lesões no rosto do PM Dias, que necessitou de atendimento médico na UPA Zona Norte. Os demais suspeitos evadiram do local, não sendo mais localizados. Após, os policiais retornaram ao ponto em que a denunciada dispensou a bolsa e, no interior desta, apreenderam 148 (cento e quarenta e oito) pedras de crack e 01 (uma) porção de maconha, que trazia consigo para entrega a terceiros, além da quantia de R$ 148,90 (cento e quarenta e oito reais e noventa centavos), em moeda corrente nacional, distribuída em cédulas e moedas de diversos valores. Durante revista pessoal, foram localizadas, no bolso de sua vestimenta, mais 13 (treze) pedras de crack, R$ 63,00 (sessenta e três reais) em moeda corrente nacional, além de um telefone celular. Em face da apreensão das drogas em evidente situação de traficância, a denunciada foi conduzida para a Delegacia de Polícia para os procedimentos de praxe, sendo lavrado o auto de prisão em flagrante.

O crack apreendido foi avaliado pela autoridade policial em R$ 805,00 (oitocentos e cinco reais), já fracionado em 161 porções individuais, consoante o auto de avaliação das fls. 8/9 do IP (Evento 21).

A denunciada cometeu os crimes em ocasião de calamidade pública, em decorrência da Pandemia mundial da COVID-19, consoante o Decreto Legislativo nº 6, de 20/03/2020, o Decreto Estadual nº 58.128, de 19/03/2020, e o Decreto Municipal nº 20.858, de 06/04/2020, e seus subsequentes."

A denunciada foi autuada em flagrante delito em 21/01/2021.

A Defesa postulou liberdade provisória; ao passo que o Ministério Público requereu a prisão preventiva da acusada (eventos 5 e 7, expediente vinculado 5001491-33.2021.8.21.0010).

Homologado o APF em 22/01/2021, ocasião em que decretada a prisão preventiva da Fernanda (evento 8, expediente vinculado 5001491-33.2021.8.21.0010).

O Ministério Público ofereceu denúncia em 29/01/2021; determinada a notificação da ré em 04/02/2021 (evento 3).

A ré foi notificada em 18/02/2021 (evento 10) e apresentou defesa prévia, com pedido de concessão de liberdade (evento 18); ouvido o Ministério Público (evento 21).

Em 05/03/2021, foi recebida a denúncia, afastada a absolvição sumária e designada data para instrução e julgamento (evento 23).

Em 13/04/2021, foram ouvidas as testemunhas FELIPE PASTORIZA LUIZ, BRUNO RODRIGUES e GABRIEL PORCIUNCULA; ao final, oportunizada entrevista reservada com o Defensor e interrogada a acusada. A Defesa formulou pedido de liberdade, manifestando-se contrário ao pleito o agente ministerial (evento 43).

Em 14/04/2021 concedida liberdade provisória (evento 45).

Atualizados os antecedentes criminais da acusada (evento 55).

Juntado laudo toxicológico da droga apreendida na posse da ré (eventos 36 e 57).

Em memoriais finais escritos, o Ministério Público pugnou pela total procedência da pretensão punitiva, nos exatos termos da denúncia (evento 66).

A Defesa, por sua vez, em sede preliminar, suscitou nulidade da autuação da acusada pelos policiais militares em razão do emprego desmedido de violência durante a revista, contaminando a prova então produzida, assim como aquela derivada. No mérito, requereu a absolvição em face da ausência de provas que se resumem aos informes prestados pelos policiais militares, insuficientes para amparar decreto condenatório. Subsidiariamente, a desclassificação para o delito tipificado no art. 28 da Lei 11.343/06; o reconhecimento da modalidade de tráfico privilegiado; reconhecimento do estado de inimputabilidade ou semi-imputabilidade da acusada em razão de ser dependente química; o afastamento agravante de o crime cometido durante calamidade pública. Por fim, requereu a detração do período de prisão preventiva para fixação do regime inicial e a isenção da pena de multa e das custas processuais (evento 69).

Vieram os autos conclusos para sentença.

Sobreveio sentença que julgou parcialmente procedente a ação penal, condenando a ré I) como incursa nas sanções do artigo 33, §4º, da Lei 11.343/2006, e artigo 329 do Código Penal, fixando a pena definitiva em 01 ano e 08 meses de reclusão, substituindo-a por duas penas restritivas de direitos, consistente em: a) prestação de serviços à comunidade na forma do artigo 46 do CP, em 1 hora por dia de condenação; e, b) prestação pecuniária no valor de 01 salário-mínimo nacional, corrigida monetariamente pelos índices oficiais de atualização, a ser recolhida à conta das penas alternativas da Comarca e, II) em razão do crime de resistência, fixou pena em 02 meses de detenção, substituída por uma restritiva de direito, consistente em na prestação de serviços à comunidade na forma do artigo 46 do CP, em 1 hora por dia de condenação; e estabeleceu a multa em 180 (cento e oitenta) dias-multa, por critério de simetria, à razão de 1/30 do valor do salário-mínimo vigente ao tempo do fato, com amparo nos artigos 33 e 43, da Lei nº 11.343/2006.

A defesa apresentou recurso de apelação (evento 95, RAZAPELA1). Em suas razões recursais, suscitou preliminar de inconstitucionalidade da abordagem policial, em razão da violência perpetrada. No mérito, defendeu que a condenação foi baseada apenas no relatos dos policiais, o que é defeso, pois ausente outra provas que comprovem a autoria do crime. Discorreu sobre a desclassificação do crime para posse de drogas. Além disso, mencionou ser dependente de drogas, razão pela qual deve ser declarada sua inimputabilidade ou semi-imputabilidade. Requereu o provimento da apelação para o efeito de ser absolvida da condenação, assim como, seja afastada a condenação ao pagamento das custas processuais e pena pecuniária.

Contrarrazões (evento 100, CONTRAZAP1).

O Ministério Público, nesse grau de jurisdição, opinou pelo improvimento do recurso (evento 10, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

O recurso deve ser conhecido, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Pretende a defesa, em síntese, em sede de preliminar a declaração da inconstitucionalidade da abordagem policial. No mérito, a absolvição do acusado, argumentando insuficiência probatória quanto à configuração do crime de tráfico de drogas, visto que a condenação não pode ser baseada exclusivamente no relato dos policiais. Defendeu, ainda, a possibilidade do reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade, bem como a desclassificação para o delito de tráfico para uso.

Preliminarmente, desacolho o pedido de nulidade da prova obtida mediante a abordagem policial, porquanto se trata de tese isolada no contexto probatório.

O artigo 244 do CPP dispõe que:

"A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida foi determinada no curso de busca domiciliar".

No caso dos autos, não se verifica a alegada situação de nulidade da busca pessoal,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT