Acórdão nº 50022848320228213001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50022848320228213001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003342454
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002284-83.2022.8.21.3001/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA

APELANTE: ALEKSANDER GONCALVES DE ALMEIDA (AUTOR)

APELADO: COMERCIO DE VEICULOS DALUSKA LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

A princípio, adoto o relatório da sentença (Evento 17 - SENT1). In verbis:

ALEKSANDER GONÇALVES DE ALMEIDA ajuizou AÇÃO INDENIZATÓRIA em face de COMÉRCIO DE VEÍCULOS DALUSKA LTDA, narrando que, em 16 de novembro de 2021, adquiriu da ré o veículo HB20S, pelo preço de R$ 39.900,00. Afirmou que o automóvel passou a apresentar problemas logo após a aquisição e, no mês de fevereiro de 2022, parou de funcionar enquanto estava de férias em Laguna/SC. Disse ter sido constatado um problema na retifica do motor e, embora se trate de veículo de repasse, deveria ter sido comercializado em condições mínimas de uso, sobretudo porque o valor pago alcançou aproximadamente 90% do valor da tabela FIPE. Asseverou que o conserto foi orçado em R$ 8.210,00, devendo ser suportado pela ré, assim como as despesas com guincho e abertura do motor para identificação do problema, no total de R$ 1.750,00. Sustentou fazer jus à reparação pelos danos imateriais suportados em razão do ocorrido.

Pediu a procedência da ação para condenar a ré ao pagamento de R$ 9.960,00 a título de danos materiais e de R$ 12.100,00 a título de indenização pelos danos morais. Postulou o benefício da gratuidade.

Deferida a gratuidade (evento 3).

Citada (evento 5), a ré deixou transcorrer in albis o prazo de defesa (evento 6).

Decretada a revelia da parte ré no evento 11.

Ausente interesse na dilação probatória, vieram os autos conclusos para sentença.

O pedido foi julgado improcedente.

Apela o autor. Reedita os argumentos da inicial. Aduz que a conclusão da sentença não pode prevalecer. Refere que a exclusão de responsabilidade por ser de "repasse", por não possui amparo legal, porque a sua natureza colide frontalmente com as disposições do CDC, que assegura ao consumidor o direito de reclamar por vícios nos prazos estabelecidos no art. 26 do mencionado diploma. Anota que de acordo com o art. 51 do CDC, são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza. Diz ser induvidoso que a relação de compra e venda de veículo é de consumo, tendo o estabelecimento comercial obrigação de prestar a garantia legal, sendo nula a clausula contratual que exclui a garantia, por ser excessivamente onerosa e prejudicial ao consumidor, que não pode ser compelido a arcar com os danos do carro que não estava em condições de uso. Infirma a assertiva do julgador a quo, negando que o defeito fosse de fácil constatação, pois somente com a abertura do motor se constatou o fato alegado. Requer, ao fim, o provimento da Apelação, para julgar procedente o pedido, com a condenação da ré a reparar os custos vinculados ao conserto do veículo, além do dano moral que diz ter suportado.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

Registro terem sido cumpridas as formalidades dos artigos 549, 551 e 552 do Código de Processo Civil, considerando a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

Colegas.

O recurso merece provimento.

De início, estou por enquadrar a relação havida entre as partes como de consumo, com incidência do Código de Defesa do Consumidor.

O instrumento contratual firmado entre as partes é aquele juntado no Evento1 - CONTR1.

Nele, o autor figura como comprador e a parte ré como vendedora.

Ainda, na parte final do documento a ré se qualifica como Comércio de Veículos (espaço destinado à assinatura).

Disso resulta que incidem as garantias, proteções, vedações previstas no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90).

Evidenciado está que as partes se enquadram no que dispõem os artigos e do CDC.

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

A alegação da sentença de que se trata de veículo de repasse vai de encontro aos documentos trazidos pelo autor, notadamente o instrumento do contrato, citado acima, pois ali o réu assume a posição de vendedor do veículo e nessa condição responde pelos deveres de fornecedor.

Caso a empresa quisesse se eximir das obrigações cogentes próprias do fornecedor, não deveria ter assumido a posição de vendedora de um bem que é próprio do seu objeto social.1

Logo, a cláusula que exclui a garantira pelos vícios do bem comercializado pelo réu é nula de pleno direito,por força do que dispõe o inciso I do artigo 51 do CDC.

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;

Dito isso, em sendo adquirido o veículo junto à parte ré em 16.11.2021 (Evento 1 - CONTR7) e tendo apresentado o grave defeito no motor quando da sua abertura em 10.02.2022 (Evento 1 - OUT8), tendo sido dada ciência ao fornecedor do problema logo em seguida, tem-se que reclamação foi apresentada dentro do prazo legal.

De resto, tenho que os pedidos iniciais devem ser acolhidos.

Com efeito, o problema com o veículo foi evidenciado, tendo-se mostrado necessária a retifica do motor.

Assim, entendo que a prova trazida ao processo demonstra a existência de vício no produto, circunstância que impõe a responsabilidade civil da empresa demandada.

Analiso as parcelas indenizatórias pretendidas.

No que diz com o pedido de ressarcimento de R$ 8.210,00 (oito mil duzentos e dez reais), o que se soma aos custos com guincho e abertura do motor no importe de R$ 1.750,00 (um mil setecentos e cinquenta e...

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