Acórdão nº 50022918820228210022 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 03-11-2022

Data de Julgamento03 Novembro 2022
ÓrgãoOitava Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50022918820228210022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002847311
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002291-88.2022.8.21.0022/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002291-88.2022.8.21.0022/RS

TIPO DE AÇÃO: Adoção de Adolescente

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS

RELATÓRIO

JULIANO A. C. interpõe apelação contra sentença que julgou procedente a ação de adoção, cumulada com pedido de destituição de poder familiar, ajuizada por HELTON C. DA S., em favor das adolescentes IASMIN M. A. e ELISA M. A., destituindo o apelante do poder familiar em relação às adolescentes e deferindo a adoção pleiteada, com alteração do genitor e ascendentes no registro de nascimento das menores (evento 97, SENT1).

Assevera que: (a) sempre convivia com as filhas nos finais de semana, levando-as para sua casa ou para casa da avó paterna; (b) separou-se da mãe das menores, mas nunca deixou de procurar as filhas; (c) prova disto são as fotos em anexo, demonstrando o convívio; (d) as menores inclusive conviviam com a irmã, fruto de outro relacionamento do apelante; (e) deixou de conviver com as menores após sua prisão, em meados do ano de 2018, mas até então sempre foi um pai presente, conforme demonstrou; (f) nunca teve nenhum problema com as menores, pelo contrário, sempre manteve ótima relação com elas; (g) a sentença, caso mantida, prejudicará as filhas, porque elas cresceram com seu pai como referência; (h) em nenhum momento deu causa para ser afastado seu direito de pai; (i) no período em que esteve recluso - em torno de dois anos e sete meses - não deixou de ser pai das menores; (j) não nega que o apelado tem convivido com as suas filhas, mas na condição de padrasto; (k) sempre conviveu com as menores e forma amigável, familiar, não sendo assim, um pai ausente, muito menos uma ameaça para as menores.

Requer a reforma da sentença, com a improcedência do pedido ou o reconhecimento de multiparentalidade paterna (evento 106, APELAÇÃO1).

Com contrarrazões (evento 111, CONTRAZAP1), vieram os autos a esta instância.

O parecer é pelo não provimento (evento 7, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Nego provimento à apelação, adotando como razões de decidir, para evitar tautologia, os fundamentos da sentença, da lavra da em. JUÍZA DE DIREITO ALESSANDRA COUTO DE OLIVEIRA, visto que os argumentos deduzidos na apelação não estão a infirmá-los:

(...)

Relativamente à adoção, a regra é a necessária observância do Sistema Nacional de Adoção – SNA, vale dizer, aqueles que pretendem adotar devem estar previamente inscritos no referido cadastro.

O § 13 do artigo 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, todavia, elenca casos em que poderá ser deferida adoção em favor de candidato não cadastrado previamente:

Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção.

§ 13. Somente poderá ser deferida adoção em favor de candidato domiciliado no Brasil não cadastrado previamente nos termos desta Lei quando:

I - se tratar de pedido de adoção unilateral;

II - for formulada por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade;

III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda legal de criança maior de 3 (três) anos ou adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má fé ou qualquer das situações previstas nos arts. 237 ou 238 desta Lei. (grifo da subscritora)

Como se vê, portanto, enquadra-se o requerente na hipótese prevista no referido § 13, no seu inciso I, na medida em que o autor encontra-se casado com a genitora das adotandas, conforme certidão de casamento anexada no evento 1, DOC4.

Pois bem. Na hipótese, consoante aduzido na inicial e constatado, posteriormente, no laudo técnico e nas oitivas em Juízo, o autor convive com a genitora das adolescentes desde 21 de janeiro de 2017, tendo sido oficializada esta união em 15 de outubro de 2021, de modo que, desde então, vem mantendo vínculos com as meninas, assumindo integralmente os deveres inerentes à parentalidade para com as adotandas. Consta que desde a separação dos genitores, ocorrida no ano de 2012, a relação das filhas com Juliano foi se fragilizando, culminando no rompimento total quando da prisão do requerido no ano de 2018. Informa, ainda, que as meninas se recusam a manter contato com o genitor, bem como teria Juliano deixado de contribuir para o sustento das filhas.

De acordo com o laudo social (evento 80, DOC1), as adolescentes, embora ouvidas separadamente, apresentaram relatos similares, assim como sentimentos convergentes. Relataram que, após a separação dos genitores, mantiveram visitação ao pai, pois "a mãe obrigava", mesmo que elas não desejassem estar com o genitor. Questionadas sobre os motivos, referiram: “o pai não ficava com a gente, pegava e deixava a gente na casa da vó”. Em outro momento: “a gente tinha que dormir em colchões no chão, na loja do pai”. E ainda: “o pai não dava atenção pra gente, dava atenção pra Adriane (companheira de Juliano naquele momento), e pedia para gente cuidar do bebê (filho do casal) e iam dormir”. Discorreram sobre situações nas quais o requerido as deixaram sozinhas na casa de terceiros e na loja do pai. Colocaram que seu pai “mente e acredita naquilo que diz”. Afirmaram que diante de terceiros Juliano se apresenta como um pai afetivo, participativo e cuidadoso, diferentemente de como é no ambiente privado. Mencionam vínculo afetivo com membros da família extensa paterna, especialmente com a avó, Sra. Nara, a qual faleceu há poucos anos, bem como com a tia Isa, o tio Alex e sua esposa "Néia". Relataram que a ideia da presente ação partiu delas, pois percebiam que era Helton quem exercia a paternidade junto a elas. Demonstraram compreensão sobre a destituição do poder familiar e adoção, bem como informaram ter conhecimento das implicações de tais atos em suas vidas, externando o desejo de regularizar o que de fato acontece, ou seja, Helton atuando enquanto pai e ambas nutrindo, por ele, sentimentos de filhas. Por fim, desejam não mais manter contato e convívio com Juliano, ao qual nem conseguem mais referir-se como pai. Por sua vez, Juliano discorreu que foi casado com Íris, relação da qual nasceram Iasmin e Elisa. Quando se separaram, as meninas tinham 4 anos e foi definida a guarda compartilhada. Afirmou que manteve convívio com as filhas por meio de duas visitas semanais até o ano de 2018, quando foi preso e perdeu contato com as meninas. Relata que sua relação com as filhas era harmoniosa, cuidadosa e afetiva. Questionado acerca do processo nº 022/1.12.0017130-4, que trata da Regulamentação de Visitas, no qual houve um Estudo Social, em setembro de 2013, onde consta que ele não compareceu ao atendimento, Juliano, primeiramente, demonstrou não lembrar do processo, depois afirmou que não compareceu por não concordar com a ação. Referiu que no período em que esteve preso recebia notícias das filhas pela Denise e atualmente não busca contato com as meninas devido a sua irmã ter informado que “Íris estava fazendo alienação parental (…) e que se procurasse as filhas, Íris poderia lhe denunciar por perseguição”. Afirma que até os 11 anos das filhas mantinham relação paterno filial consistente e afetiva, apontando Íris como responsável pela mudança do vínculo das filhas para com ele, “por fazer a cabeça das meninas contra ele”. A Equipe Técnica destacou: "mesmo que verbalize ter saudades das filhas, querendo abraçá-las e dar carinho, enfatiza que, caso seja destituído do poder familiar, haverá perdas materiais para Iasmim e Elisa, tais como: perda da pensão, plano de saúde e herança". Ainda, o requerido demonstrou aceitar que as meninas possam ter dois pais, umas vez que Helton, de fato, exerce tal papel. Refere não ter sentido a destituição do poder familiar, pois considera que sempre esteve presente na vida das filhas, bem como afirma que nunca as agrediu e sempre prestou auxílio material. Já Helton referiu manter relacionamento com Íris há 5 anos, estando casados desde outubro de 2021. Afirmou que a ideia da presente ação partiu das enteadas que, em razão da relação de cuidado e afeto estabelecida, referem-se a ele como "papi". Conheceu as meninas quando elas tinham 9 anos de idade e se apegaram a ele, referindo que “elas tinham carência paterna”. Por possuir horários flexíveis e trabalhar perto de casa, consegue estar presente no cotidiano das meninas, mais que a própria genitora, pos ela trabalha em turno integral. Destacou que as meninas possuem vinculação tanto com a sua família quanto com a família biológica paterna. Não apresenta nenhuma situação conflituosa com o requerido. "Sobre sua motivação para adoção, Helton percebe que as enteadas completam algo que ele não tinha e vice-versa: relação de afeto parento filial. Deseja legitimar a parentalidade socioafetiva, pois pretende decidir e responder pelas meninas junto à Iris, sem a necessidade de depender de Juliano.". Por fim, procedeu-se à oitiva de Íris, esta afirmando que esteve casada com Juliano por cerca de 6 anos. Discorreu ter se sentido sozinha após o nascimento das filhas, pois o requerido indicava outras prioridades que não a família. Após a separação, ajuizou a ação para regulamentar as visitas paternas, discorrendo que quando o genitor buscava as filhas quem as cuidavas era a mãe de Juliano, avó paterna das adotandas, tendo essas construído forte vínculo afetivo com a avó. Até os 11 anos de idade, o convívio paterno ocorria por meio de visitas com pernoites, as quais restringiu posteriormente, uma vez que o genitor deixava as filhas com terceiros. Negou qualquer...

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