Acórdão nº 50023615120208210095 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50023615120208210095
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002268026
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5002361-51.2020.8.21.0095/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002361-51.2020.8.21.0095/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

RECORRENTE: MOISES LEDESMA DOS SANTOS (ACUSADO)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra MOISES LEDESMA DOS SANTOS, dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, §2º, inciso III, na forma do artigo 14, inciso II, (1º fato), artigo 148, caput, combinado com o artigo 14, inciso II, todos do Código Penal (2º fato), e artigo 21 da Lei das Contravenções Penais (3º fato), pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1º Fato:

No dia 26 de fevereiro de 2020, por volta das 6h, na Rua Belém, bairro Lago Azul, na cidade de Estância Velha/RS, o denunciado MOISÉS LEDESMA DOS SANTOS tentou matar a vítima Lourdes Maria Hörig, através de disparos de arma de fogo, com perigo comum, não se consumando o fato por circunstâncias alheias à sua vontade.

Na oportunidade, o denunciado encostou o veículo que dirigia junto ao meio fio do passeio em que transitava a vítima e ordenou que ela entrasse no seu automóvel. A ofendida, por sua vez, empreendeu fuga, o que levou o réu a disparar por diversas vezes na sua direção, com o intuito de matá-la. O ofensor não logrou êxito no intento em razão da sua falta de pontaria e de a vítima ter buscado refúgio em uma residência próxima.

O delito foi cometido com emprego de meio de que resultou em perigo comum, visto que o denunciado praticou o delito enquanto a vítima se encontrava em movimento no passeio público.

2º Fato:

No dia 19 de março de 2020, por volta de 06h50min, nas imediações do bairro Lago Azul, na cidade de Estância Velha/RS, próximo ao Mercado do Jair, o denunciado MOISÉS LEDESMA DOS SANTOS tentou privar a vítima Ivete Maria Eckhardt de sua liberdade, mediante sequestro, com o emprego de arma branca, só não consumando o intento por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Na oportunidade, o denunciado conduzia o seu veículo nas imediações do bairro Lago Azul quando avistou a vítima, momento em que desceu do automóvel, munido de um facão, e mediante agressões consistentes em socos e pontapés, tentou colocá-la para dentro do seu veículo, só não logrando êxito em razão da interferência do transeunte Marco Antônio Azambuja, fato que permitiu que a vítima se evadisse do local.

3º Fato:

Na mesma oportunidade, enquanto tentava privar a vítima de sua liberdade, o denunciado MOISÉS LEESMA DOS SANTOS praticou vias de fato contra a vítima Ivete Maria Eckerdt.

Na oportunidade, quando buscava a vítima a ingressar em seu veículo, o denunciado agrediu-a por meio de socos e pontapés.

A denúncia foi recebida em 19/05/2020 (evento 3, PROCJUDIC3, fls. 09/10).

O acusado foi pessoalmente citado (evento 3, PROCJUDIC14, fl. 43) e apresentou resposta à acusação através de defensor constituído (evento 3, PROCJUDIC4, fls. 28/35).

Durante a instrução processual, foram ouvidas a vítima, as testemunhas, interrogado o acusado (evento 3, PROCJUDIC6, fls. 10/11).

Encerrada a instrução, as partes apresentaram memoriais em substituição aos debates orais (evento 3, PROCJUDIC7, fls. 13/26 e fls. 29/37 e evento 3, PROCJUDIC15, fls. 44/45).

Sobreveio a decisão, de lavra do Dr. Carlos Fernando Noschang Júnior, pronunciando Moises Ledesma dos Santos, como incurso nas sanções do 121, §2º, inciso III, combinado com o artigo 14, inciso II e 148, caput, todos do Código Penal, a fim de submetê-lo a julgamento perante o Tribunal do Júri da Comarca de Estância Velha e o impronunciou com relação ao terceiro fato descrito na denúncia (evento 3, PROCJUDIC7, fls. 47/50 e evento 3, PROCJUDIC8, fls. 01/07).

A decisão foi presumidamente publicada em 21/01/2022 (evento 3, PROCJUDIC8, fl. 08).

A defesa interpôs Recurso em Sentido Estrito (evento 3, PROCJUDIC8, fl. 09). Arrazoando, a defesa sustentou a nulidade do reconhecimento fotográfico operado na delegacia e requereu a despronúncia (evento 3, PROCJUDIC8, fls. 10/20).

O Ministério Público apresentou contrarrazões (evento 3, PROCJUDIC8, fls. 22/29), a decisão foi mantida (evento 3, PROCJUDIC8, fl. 30) e os autos foram remetidos a esta Corte.

Nesta instância, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Airton Zanatta, firmou parecer opinando pelo desprovimento do recurso defensivo (evento 11, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Conheço do recurso, uma vez que adequado e tempestivo.

Despronúncia

No mérito a defesa pretende a despronúncia do acusado, o que não lhe assiste razão.

Primeiramente, cabe destacar que pronúncia é mero juízo de admissibilidade acusatória, e não condenatório. Logo, se após a instrução criminal, existirem elementos, mesmo que indiciários, a apontar a autoria, provada substancialmente a materialidade, cabe ao Juiz remeter a acusação a exame pelos Jurados.

Dessa forma, não é necessária a certeza, bastando apenas a existência elementos circunstanciais verossímeis da autoria e/ou do concurso para que o Juiz técnico acolha a acusação e remeta o processo a julgamento pelo Júri. A avaliação das provas e sua credibilidade é competência dos Jurados.

Nesse sentido, colaciono precedentes do STJ:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. INEXISTÊNCIA DE EXCESSO DE LINGUAGEM NA SENTENÇA DE PRONÚNCIA. PRETENSÃO DE DESPRONÚNCIA OU DE EXCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7 DO STJ. QUALIFICADORAS SOMENTE PODEM SER AFASTADAS QUANDO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos do art. 413, § 1º, do Código de Processo Civil, a decisão de pronúncia consiste em um simples juízo de admissibilidade da acusação, satisfazendo-se, tão somente, pelo exame da ocorrência do crime e de indícios de sua autoria, não demandando juízo de certeza necessário à sentença condenatória, uma vez que as eventuais dúvidas, nessa fase processual, resolvem-se em favor da sociedade - in dubio pro societate. 2. Não se cogita excesso de linguagem, uma vez que as instâncias ordinárias mantiveram postura absolutamente imparcial em relação aos fatos, somente apontando, com cautela e cuidado as provas constantes dos autos que justificaram a decisão de pronúncia, para que seja o agravante submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, órgão constitucionalmente competente para dirimir as dúvidas e resolver a controvérsia, nos termos do art. 5º, inciso XXXVIII, "d", da CF/88. 3. A Corte de origem confirmou a sentença de pronúncia por entender haver indícios de materialidade e autoria do delito de homicídio, pontuando que "vislumbra-se que o réu pode ter sido um dos autores do crime que lhe é imputado, devendo a questão ser submetida ao Juízo Natural dos Crimes deste gênero, em obediência ao brocardo do in dubio pro societate". 4. Para alterar a conclusão a que chegaram as instâncias ordinárias e decidir pela despronúncia do agravante, ou ainda, para excluir as qualificadoras, seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é vedado pela Súmula 7/STJ. 5. Esta Corte entende que, ao se prolatar a decisão de pronúncia, as qualificadoras somente podem ser afastadas quando se revelarem manifestamente improcedentes, o que não é o caso dos autos. (Precedentes). 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 1387190/PE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 03/06/2020).

REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. IMPRONÚNCIA. LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO. INDÍCIOS DE AUTORIA.EXISTÊNCIA. REVISÃO INVIÁVEL. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO.SÚMULA 7/STJ. 1. Não há violação ao artigo 413 do Código de Processo Penal quando o Tribunal de origem, de forma fundamentada, considerando a inexistência de elementos que pudessem justificar o acolhimento da tese de negativa de autoria, entendeu que a decisão de pronúncia está devidamente justificada. 2. A pronúncia do réu para o julgamento pelo Tribunal do Júri não exige a existência de prova cabal da autoria do delito, sendo suficiente, nessa fase processual, a mera existência de indícios da autoria, devendo estar comprovada, apenas, a materialidade do crime, uma vez que vigora o princípio in dubio pro societate. 3. Desse modo, somente será possível a impronúncia do réu pelo Togado singular, quando restar devidamente evidenciado nos autos a negativa de autoria, sob pena de usurpação da competência do Tribunal do Júri. 4. A desconstituição do julgado, no intuito de abrigar o pleito defensivo de ausência de autoria, não encontra espaço na via eleita, porquanto seria necessário a este Superior Tribunal de Justiça aprofundado revolvimento do contexto fático-probatório, providência incabível pela via eleita, conforme já assentado pela Súmula n. 7 desta Corte. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA. PROVIDÊNCIA PERMITIDA APENAS NOS CASOS DE SEREM MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTES. COMPETÊNCIA DO CONSELHO DE SENTENÇA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DE PROVAS. ÓBICE DA SÚMULA N. 7/STJ. RECURSO IMPROVIDO. 1. Em respeito ao princípio do juiz natural, somente é cabível a exclusão das qualificadoras na decisão de pronúncia quando manifestamente descabidas, porquanto a decisão acerca da sua caracterização ou não deve ficar a cargo do Conselho de Sentença. 2. Desconstituir a premissa de que a conduta teria sido motivada por ser a vítima amiga de um desafeto do acusado, além de terem os disparos sido realizados pelas costas, exige o revolvimento do contexto fático-probatório, providência incabível nesta sede, conforme já assentado pelo...

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