Acórdão nº 50023668520228210036 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 13-12-2022

Data de Julgamento13 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50023668520228210036
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003030269
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5002366-85.2022.8.21.0036/RS

TIPO DE AÇÃO: Crime de Descumprimento de Medida Protetiva de Urgência

RELATORA: Desembargadora MARIA DE LOURDES GALVAO BRACCINI DE GONZALEZ

RELATÓRIO

Adoto, inicialmente, o relatório do parecer ministerial:

"Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra a decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Criminal de Soledade que concluiu pela incompetência do Juízo e ordenou a redistribuição ao Juizado Especial Criminal para processamento do expediente instaurado contra EDSON CAMARGO LIBANO pela prática, em tese, do delito previsto no art. 24-A da Lei n° 11.340/06, por entender que o delito seria de menor potencial ofensivo e não possuiria, de forma imediata, a mulher como ofendida, mas sim, a Administração Pública.

Em razões, a Dra. Promotora de Justiça busca a reforma do decisum sustentando que, embora o montante de pena cominado ao artigo 24-A da Lei n. º 11.340/06 esteja abrangido pela Lei n. º 9.099/95, o disposto no art. 41 da Lei n.º 11.340/06 não permite a incidência da já mencionada Lei n.º 9.099/95 aos crimes cometidos com violência doméstica e familiar contra a mulher (fls. 05/12).

Oferecidas as contrarrazões pela Defensoria Pública (fls. 44/49)."

A decisão foi mantida (fls. 52), subindo os autos a esta Corte.

Distribuído o feito a esta Relatora e dada vista ao Ministério Público, veio aos autos parecer no sentido do provimento do recurso (7.1).

É o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público, em face da decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Criminal de Soledade que entendeu pela incompetência do Juízo, determinando a redistribuição do feito ao Juizado Especial Criminal (Ev. 4 – DESPADEC1 Proc 5002366-85.2022.8.21.0036).

O Magistrado de primeiro grau entendeu pela incompetência da Vara Criminal para apreciação da matéria, porquanto o delito previsto no art. 24-A seria de menor potencial ofensivo e não possuiria a mulher como ofendida e, sim, imediatamente, a Administração Pública, de modo que determinou a redistribuição do feito ao Juizado Especial Criminal da Comarca no tocante ao referido crime (Evento 4 – DESPADEC1), advindo, daí, a irresignação ministerial.

O recurso merece provimento.

Inicialmente, passo à transcrição da denúncia:

"No dia 13 de março de 2022, por volta das 16h20min, na Rua Joaquim Cenair de Morais, n° 150, Bairro Botucaraí, em Soledade/RS, o denunciado EDSON CAMARGO LIBANO descumpriu decisão judicial que deferiu medidas protetivas de urgência previstas na Lei n° 11.340/06 em favor da ofendida Cleonice Camargo Telles, sua genitora.

Na oportunidade, o denunciado, ciente da decisão judicial que o proibia de frequentar a residência da ofendida, bem como de aproximar-se dela por até 200 (duzentos metros), procedeu de forma a violar tais medidas protetivas impostas em seu desfavor, ao ingressar na da casa da vítima, tentando agredi-la, realizando tumulto no local, sendo necessário fosse acionada, por vizinhos, a Brigada Militar que compareceu no local e deteve o denunciado em flagrante delito, na casa de uma irmã que mora nas proximidades.

As medidas protetivas foram deferidas no bojo do expediente nº 5006058-29.2021.8.21.0036, estando em vigor, tendo o denunciado sido intimado pessoalmente no dia 31/01/2021 (fl. 28, Evento 43 - OUT1).

DIANTE DO EXPOSTO, o MINISTÉRIO PÚBLICO oferece denúncia contra EDSON CAMARGO LIBANO como incurso nos art. 24-A da Lei 11.340/06, requerendo o recebimento da peça acusatória, citação do denunciado para oferecer resposta escrita à acusação, na forma dos arts. 396 e 396-A do Código de Processo Penal, prosseguindo-se o feito com a oitiva da vítima, das testemunhas abaixo arroladas e interrogatório, até sentença final, culminando com a condenação nas penas que lhe couber."

Sobreveio a decisão recorrida, exarada nos seguintes termos:

"Vistos etc.

1) Com a devida vênia ao entendimento ministerial, melhor examinando a questão, observo o seguinte. O delito do novel artigo 24-A da Lei 11.340/06 não possui como objeto jurídico a mulher ofendida (mediatamente), e sim, imediatamente, o Estado-juiz; ou em sentido “lato sensu”: a Administração Pública.

2) Daí por que não sendo a integridade física e psíquica da mulher o bem jurídico tutelado, muito menos a incolumidade moral, psicológica e física familiar (art. 226, § 8º da CF), falta título para a restrição, sob o enfoque da regra processual do art. 41 da Lei 11.340/06, dos institutos despenalizadores: transação penal (art. 76 da Lei 9.099/95), bem como suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei 9.099/95).

3) De fato. A citada norma constritiva, expressamente, enumera o seu suporte fático de incidência: “os crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher (grifei).

4) Daí por que sendo, dogmaticamente, defesa a interpretação expansionista ou “in malam parte” no âmbito criminal, outra exegese não emerge senão no sentido de não aplicabilidade do disposto no artigo 41 em face da persecução referente ao delito de desobediência de medidas judiciais protetivas contra a mulher. Cuida-se de delito com autonomia dogmática e normativa, inclusive por efeito da regra do art. 20 da referida Lei e da do artigo 313, III, do CPP (“para garantir a execução das medidas protetivas de urgência”) Vale dizer: excluir qualquer juízo proibitivo no sentido de “bis in idem” punitivo.

5) Neste sentido, tem decidido o STJ, in verbis:

"A orientação jurisprudencial atual desta corte é no sentido de que, para que a competência dos Juizados Especiais de Violência Doméstica seja firmada, não basta que o crime seja praticado contra mulher no âmbito doméstico ou familiar, exigindo-se que a motivação do acusado seja de gênero, ou que a vulnerabilidade da ofendida seja decorrente da sua condição de mulher", Min. Sebastião Reis, no AREsp 1.658.396 (vide ↩

6) ISSO POSTO, nos termos do art. 74, §2º do CPP, a sua redistribuição ao JECrim.

Outrossim, Expeça-se mandado de reiteração da medida protetiva de não aproximação da ofendida por até duzentos metros. Intimem-se.

Dil.legais."

Pela leitura da peça incoativa, verifica-se que houve suposta prática de crime de descumprimento de medidas protetivas, deferidas em proteção de vítima do sexo feminino e que era genitora do denunciado.

Entendeu o juízo de...

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