Acórdão nº 50024023220188210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Primeira Câmara Cível, 22-02-2023

Data de Julgamento22 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50024023220188210016
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003093211
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

11ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002402-32.2018.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Transporte de coisas

RELATORA: Desembargadora MARIA INES CLARAZ DE SOUZA LINCK

APELANTE: ANALBERTO DE SOUSA SILVA (AUTOR)

APELADO: VIBRA ENERGIA S.A (RÉU)

APELADO: TRANSPARATI - TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ANALBERTO DE SOUZA SILVA ME, nos autos da ação de reparação de danos que move em desfavor de TRANSPARATI - TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA e PETROBRÁS DISTRIBUIDORA S/A, perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Ijuí, julgada improcedente.

Adoto o relatório da sentença prolatada, in verbis:

Vistos, etc.

Analberto de Souza Silva – ME ajuizou Ação de Reparação de Danos contra Transparati – Transportes e Logística Ltda. e Petrobrás Distribuidora S/A, qualificados.

Disse que atua no ramo de transporte rodoviário de carga, proprietária do cavalo mecânico de placas IGN-5264, havendo contrato com a ré Transparati – Transportes e Logística Ltda. Realizou fretes, descritos na inicial, com contrato prevendo que ficaria com 80% do valor dos fretes, totalizando R$ 44.728,64. Passou por pedágios, sem que as rés tivessem fornecido vale pedágio, conforme Resolução nº 2.885, sendo estes embutidos no valor do frete. Teve que arcar com os custos dos pedágios. Possui direito a receber o valor de R$ 89.457,28, pela multa referente ao não fornecimento do vale pedágio, conforme o art. 8º da Lei 10.209,01. Requereu a condenação dos réus a indenizar este montante.

Em audiência, não houve acordo (fl. 68).

Transparati – Transportes e Logística Ltda. Arguiu inconstitucionalidade do art. 8º da Lei 10.209/01. No mérito, que não há comprovação do pagamento dos pedágios. Negou sua obrigação de indenização. Requereu a improcedência.

Petrobrás Distribuidora S/A arguiu ilegitimidade passiva e prescrição. Não reconheceu alguns fretes alegados pelo autor. Requereu a improcedência.

Houve réplica.

Na instrução, juntados documentos.

Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório.

Decido.

A decisão de primeiro grau possui o seguinte dispositivo:

ISSO POSTO, julgo improcedente o pedido feito por Analberto de Souza Silva – ME nesta Ação de Reparação de Danos ajuizada contra Transparati – Transportes e Logística Ltda. e Petrobrás Distribuidora S/A, qualificados.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios que fixo em R$ 3.000,00, pelo trabalho realizado, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Fica suspensa a sua exigibilidade pelo deferimento do benefício da Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da Lei 1.060/50.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Nas razões recursais, o demandante consigna ser fato incontroverso nos autos a realização dos fretes contratados, bem como a existência de pedágios nos trechos por si implementados. Refere que a titular das faturas comprobatórias da antecipação era a contratante, e não o próprio transportador. Alega, ainda, que o valor dos pagamentos efetuados a título de vale-pedágio era posteriormente descontado, em detrimento do autor. Discorre sobre a necessidade de cumprimento da obrigação através de modelo especificado pela ANTT. Colaciona precedentes. Requer o provimento do recurso para reformar a sentença retro, julgando procedentes os pedidos veiculados na petição inicial (Evento 3, PROCJUDIC7, pg. 45 a Evento 3, PROCJUDIC8, pg. 01).

Intimadas as corrés após a digitalização do feito, sobrevieram contrarrazões pela Petrobrás Distribuidora (Vibra Energia), contendo preliminares de prescrição e inépcia da inicial (Evento 18, CONTRAZ1), e pela Transparati (Evento 20, CONTRAZAP1).

Distribuídos os autos, por sorteio, vieram conclusos.

Petições da ré Vibra nos Eventos 4 e 5.

É o relatório.

VOTO

Preliminares contrarrecursais

Com relação à primeira preliminar contrarrecursal da ré Vibra, sendo a prescrição suscitável a qualquer tempo e grau de jurisdição, a teor do disposto no artigo 193 do Código Civil1, teço algumas considerações a esse respeito.

De acordo com a reiterada jurisprudência especializada desta Corte, o prazo prescricional ânuo não se aplica para o descumprimento da obrigação relativa ao vale-pedágio, prevista na Lei nº 10.209/2001. Isso porque a normativa em comento foi promulgada justamente com o intuito de proteger os transportadores de carga e coibir práticas lesivas, a exemplo do custeio unilateral dos pedágios.

Nessa esteira, descabido seria considerar a prescrição da demanda em 01 (um) ano, conforme estabelecido no artigo 18 da Lei nº 11.442/20072, quando essa normativa, por não dispor com a mesma especialidade acerca da controvérsia objeto dos autos, vai de encontro ao aspecto protecionista encampado pela Lei do vale-pedágio.

Da mesma forma, inviável falar em prescrição trienal, uma vez que a pretensão em tela diz respeito à cobrança de sanção emanada de previsão legal e, do contrário, não discute questões relativas à responsabilidade civil, motivo pelo qual é possível afastar, também, a prescrição trienal que alude o artigo 206, § 3º, V, do Código Civil.3

E mesmo ciente das recentes alterações promovidas pela Lei nº 14.229/2021,4 necessário pontuar que o texto não contém ressalvas quanto à eventual retroação do novo prazo. Logo, os 12 (doze) meses, contados da realização do transporte, aplicar-se-ão unicamente aos processos cujos fretes foram contratados após 22 de outubro de 2021, data de publicação da modificação legislativa.

Portanto, em vista do panorama traçado, do mens legis da Lei nº 10.209/2001 e, na ausência de prazos inferiores, há de incidir a regra geral, prevista no artigo 205 do Código Civil5, que estipula a prescrição decenal “quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”.

Os contratos aqui em exame foram executados entre os anos de 2012 e 2013, ao passo que a ação foi proposta em 20 de fevereiro de 2018. Assim, não superado o lapso temporal de 10 (dez) anos para o ajuizamento, impõe-se reconhecer a tempestividade deste feito, rejeitando-se a prefacial prescricional.

Em seguida, no tocante à alegada inépcia da inicial, a preliminar não deve ser conhecida, pois a parte deixou de invocá-la quando da primeira manifestação nos autos, in casu, a contestação (Evento 3, PROCJUDIC3, pg. 02 e segs.) e, inclusive, optou por fazê-lo apenas perante o juízo ad quem, o que viola o princípio do duplo grau de jurisdição por manifesta inovação no âmbito recursal.

Assim, vão superadas ambas as prefaciais arguidas pela ré Petrobrás (Vibra).

Mérito

Preenchidos os demais requisitos de admissibilidade e dispensado o autor de comprovar o preparo por ser beneficiário da gratuidade da justiça, conheço da apelação interposta.

Trata-se, na origem, de ação de reparação de danos na qual buscada a aplicação da multa referente ao não adiantamento do vale-pedágio, tendo a sentença recorrida julgado improcedentes os pedidos autorais.

Antecipo, contudo, não ser o caso de reformar o julgado a quo.

No tocante ao cumprimento da obrigação, tem-se, com base no artigo 1º da Lei nº 10.209/2001, que o vale-pedágio deve ser antecipado pelo embarcador ou seus equiparados, conforme se vê do § 1º:

Art. 1º Fica instituído o Vale-Pedágio obrigatório, para utilização efetiva em despesas de deslocamento de carga por meio de transporte rodoviário, nas rodovias brasileiras.
§ 1º O pagamento de pedágio, por veículos de carga, passa a ser de responsabilidade do embarcador.

Quanto à necessidade de antecipação, deve o responsável demonstrar a sua realização, destacando o valor e os dados essenciais em campo específico de documento idôneo que comprove o embarque, como se depreende da redação do parágrafo único do artigo da Lei nº 10.209/2001, in verbis:

Parágrafo único. O valor do Vale-Pedágio obrigatório e os dados do modelo próprio, necessários à sua identificação, deverão ser destacados em campo específico no Documento Eletrônico de Transporte (DT-e). (Redação dada pela Lei nº 14.206, de 2021)

Não o fazendo do modo estipulado, pode a contratante ser condenada a pagar a indenização ao(s) transportador(es) no equivalente a duas vezes o valor do frete, consoante disposição do artigo 8º da Lei nº 10.209/2001, que segue:

Art. 8º Sem prejuízo do que estabelece o art. 5º, nas hipóteses de infração ao disposto nesta Lei, o embarcador será obrigado a indenizar o transportador em...

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