Acórdão nº 50024172920158210073 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50024172920158210073
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002231375
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002417-29.2015.8.21.0073/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

APELANTE: MAURICIO RAMOS (AUTOR)

APELANTE: MUNICÍPIO DE TRAMANDAÍ (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por MAURICIO RAMOS e MUNICÍPIO DE TRAMANDAÍ contra a sentença de Evento 3 - SENT7 - do processo originário que, nos autos desta ação indenizatória que o primeiro move contra o segundo, julgou parcialmente procedente a demanda.

Adoto o relatório da r. sentença, pois bem narrou o presente caso:

I – RELATÓRIO

1. MAURÍCIO RAMOS ajuizou ação indenizatória em face do MUNICÍPIO DE TRAMANDAÍ, já qualificados. Narrou, em síntese, que exerce a profissão de Pedreiro e que na data de 21/08/2014 sofreu acidente de trabalho, tendo sua visão afetada por corpo estranho, uma vez que seu olho esquerdo foi atingido por argamassa/cimento. Diante disso, procurou atendimento emergencial no Posto de Saúde 24 Horas São Francisco II, ocasião em que foi atendido por médico que o avaliou e liberou, sem, no entanto, efetuar limpeza ocular. Seu estado piorou e novamente procurou atendimento, sendo que no dia 29/08/2014 foi constatada queimadura química em seu globo ocular, sendo determinada limpeza e acompanhamento. No entanto, diante da demora na realização do procedimento – que deveria ter sido realizada já no primeiro atendimento, teve seu estado agravado, sendo diagnosticado com glaucoma e consequente perda da visão no olho esquerdo. Teceu considerações acerca da falha no atendimento médico. Requereu, portanto, a procedência da ação, com a condenação do demandado ao pagamento de indenização por danos morais e estéticos a ser arbitrado pelo Juízo. Juntou documentos (fls. 14/69).

2. Recebida a inicial, concedida a gratuidade judiciária e determinada a citação (fl. 70).

3. Citado, o requerido apresentou contestação, sustentando a ausência de agir culposo que lhe possa ser imputado no episódio, na medida em que o médico que prestou atendimento agiu de acordo com a literatura médica, sendo realizados todos os procedimentos necessários. Teceu considerações acerca da Teoria do Faute do Sevice. Argumentos sobre a inexistência de danos morais e estéticos. Finalizou pugnando pela improcedência da ação (fls. 72/76). Acostou documentos (fls. 77/85).

4. Réplica (fls. 88/93).

5. O Ministério Público declinou de intervir (fl. 100).

6. Durante a instrução foi realizada perícia pelo DMJ, com laudo às fls. 113/118, do qual as partes tiveram vistas.

7. Os autos vieram conclusos para sentença.

E o dispositivo sentencial restou redigido nos seguintes termos:

III – DISPOSITIVO

Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação indenizatória ajuizada por MAURÍCIO RAMOS em face do MUNICÍPIO DE TRAMANDAÍ, para o fim de condená-lo ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 50.000,00, devidamente atualizada pelo IGPM, a contar da data da sentença e juros de mora de 1% ao mês, fluindo a partir da citação.

Em face da parcial sucumbência, condeno as partes ao pagamento dos honorários advocatícios em 10% do valor da condenação, com fundamento nos arts. 85, § 2º e seus incisos, e 86 do NCPC, e que vai suspensa a exigibilidade do pagamento em relação ao autor, pois milita sob o manto da gratuidade judiciária.

Condeno o demandado ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da condenação, com fundamento no art. 85, § 2º, inciso IV do NCPC. O requerido deverá arcar com as custas processuais, por metade, forte na redação original do art. 11 do Regimento de Custas (Lei nº 8.121/85), uma vez que reconhecida a inconstitucionalidade da Lei nº 13.471/10, pelo Órgão Pleno do TJRS, no Incidente de Inconstitucionalidade nº 70041334053.

Ainda, em sede de aclaratórios interpostos pelo autor, resultando com efeitos integrativos, a sentença restou acrescida nos seguintes termos:

Vistos.

1) Não há erro na fixação dos juros ou na forma de arbitramento da correção monetária; eventual insurgência nesse sentido, deverá se dar através do recurso cabível.

2) Da pensão prevista no art. 950 do CC.

Nos termos do art. 950 do Código Civil, se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminuir a capacidade de trabalho, será devida pensão correspondente à importância do trabalho para o qual se inabilitou, ou da depreciação por ele sofrida.

Trata-se, portanto, de indenização pela perda da capacidade laborativa.

Assim, para sua fixação, deve o Juiz levar em consideração qual o percentual ou montante de capacidade perdido pelo ofendido, bem como sua real condição de trabalho.

No caso dos autos, extrai-se por meio do laudo pericial de fls. 113/118, que o autor perdeu a visão total do olho esquerdo e que tal lesão não é reversível, tratando-se, pois, de lesão permanente.

Logo, tendo em vista que a lesão é permanente, a pensão deverá ser vitalícia devendo, ainda, corresponder a 100% da remuneração do autor à época dos fatos. Considerando-se que à época o autor recebia R$ 906,40 (fl. 18) e que o salário-mínimo era de R$ 724,00, a fim de não desvalorizar, fixo a pensão em um salário-mínimo e meio.

O décimo terceiro salário e as férias integrarão a base de cálculo da indenização.

Em suas razões de apelação (Evento 3 - APELAÇÃO11 - processo originário), o autor suscita nulidade da sentença por falta de fundamentação e omissão quanto aos termos inicial e final de apuração dos danos materiais, frisando que foram postulados em quota única de pagamento. Também se insurge acerca do termo inicial dos juros de mora e, por fim, entende que lhe são devidos danos estéticos.

O réu, por sua vez, em razões recursais (APELAÇÃO12 do Evento e do processo originário), entendendo não existir prova acerca do nexo de causalidade a amparar a indenização por danos morais a que restou condenado, pugna pelo seu afastamento; e, alternativamente, a minoração do seu quantum.

Os autos digitalizados dão conta de que somente o autor apresentou contrarrazões (CONTRAZAZ13 do Evento 3 daquele feito).

O processo foi remetido para esta Relatoria em razão de declinação de competência (Evento 8 dos autos recursais), quando então o Ministério Público apresentou parecer, opinando pelo desprovimento dos recursos (Eventos 13 e 17 daqueles mesmos autos).

Baixado o feito em diligência, o Primeiro Grau atendeu à determinação (Evento 21 dos autos recursais e certidão de Evento 24 do processo originário).

Após, vieram os autos conclusos para o julgamento.

Tendo em vista a adoção do sistema informatizado, os procedimentos previstos nos artigos 931, 932 e 934 do CPC foram simplificados, porém cumpridos na sua integralidade.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Os recursos devem ser conhecidos, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade, sendo tempestivos (com observação à N/E de fl. 03 do SENT10 do Evento 3 e certidão de Evento 24, ambos do processo originário, aliado ao período da pandemia que implicou em suspensão de prazo dos processos físicos) e estando dispensado o preparo pela parte autora ante a gratuidade da justiça concedida na decisão de Evento 3, OUT - INST PROC3, fl. 1 do processo originário, assim como pelo réu em face do art. 1.007, § 1º, do CPC.

Cuida-se de ação de indenização por danos materiais, morais e estéticos em razão de atendimento emergencial prestado ao autor no Posto de Saúde de Tramandaí após sofrer acidente de trabalho e quando um corpo estranho atingiu seu globo ocular. Segundo o relato na inicial, o atendimento foi negligente e imperito, eis que somente medicado e liberado, sequer tendo o médico que o atendeu procedido a uma avaliação e limpeza ocular. E em razão desse mau atendimento teve o seu quadro de visão agravado, necessitando buscar auxílio em outro Posto de Saúde do Município, ocasião em que passou por avaliação de um oftalmologista, sendo então constatada queimadura química no globo ocular. Aponta que este último procedimento foi realizado tarde demais e a falha no primeiro atendimento já havia colocado sua visão em risco, jamais se agravando ao ponto em que chegou se outro tivesse sido o proceder médico. Diante disso passou por vários acompanhamentos médico, inclusive junto ao Banco de Olhos de Porto Alegre, acarretando diagnóstico de glaucoma e sujeição à cirurgia, todavia resultou com cegueira total em um dos olhos e perda de parte substancial da visão no outro olho, ocasionando afetação em sua vida profissional e pessoal.

Nesse contexto, consigno que não se trata, pois, a lide acerca do acidente de trabalho, o que deslocaria a competência desta c. Câmara Cível, mas sim de apurar-se responsabilizaçao civil decorrente do falho atendimento médico emergencial após o infortúnio laboral e em demanda que não envolve o profissional de saúde, mas somente o Município responsável pelo Posto de Saúde onde o fato teria ocorrido.

Ainda registro que a falha na prestação do serviço é matéria controvertida, porquanto o Município réu, em sede recursal, nega a ocorrência de nexo causal entre o dano moral e o serviço emergencial prestado. E, por conseguinte, pede o afastamento da indenização por dano moral a que foi condenado, de molde a que a demanda seja julgada totalmete improcedente e, alternativamente, pela minoração do quantum indenizatório.

Já o autor nao se conforma quanto ao dano material pela redução de capacidade laborativa lhe ter sido concedido sob a forma de pensionamento (e não em quota única), seus termos inicial e final e sobre o marco inicial dos juros de mora; bem como acerca da não concessão de dano estético.

Inicialmente, é de ser rejeitada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT