Acórdão nº 50024697120178210035 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 24-06-2022

Data de Julgamento24 Junho 2022
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50024697120178210035
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002212678
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002469-71.2017.8.21.0035/RS

TIPO DE AÇÃO: Bancários

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: CARLOS FRANCISCO DOMINGUES (AUTOR)

APELADO: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por CARLOS FRANCISCO DOMINGUES contra a sentença proferida nos autos da ação revisional de contrato bancário c/c ação anulatória de débito c/c ação condenatória para repetição de indébito ajuizada em face de BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL, com o seguinte dispositivo (Evento 3 - PROCJUDIC5, fls. 27-41):

DIANTE DO EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação ajuizada por CARLOS FRANCISCO DOMINGUES em face do BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL.

Em face da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da causa atualizado, com fundamento nos arts. 85, § 2º e seus incisos, e 86 do NCPC, e que vai suspensa a exigibilidade do pagamento, pois milita ao abrigo da Gratuidade Judiciária.

A parte-autora, declinando suas razões (Evento 3 do originário, doc. "PROCJUDIC5-6", fls. 45-50 e fls. 1-14 - respectivamente), requer:

- a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado ou, em caso de aplicação do art. 359 do CPC, seja a taxa substituída pela taxa SELIC.

- a proibição da capitalização em qualquer periodicidade;

- a vedação de cobrança de Tarifa de Abertura de Crédito – TAC e de Tarifa de Emissão de Carnê - TEC;

- afastamento da cobrança do imposto sobre operações financeiras - IOF;

- descaracterização da mora;

- vedação da comissão de permanência;

- a repetição do indébito e a compensação;

- a inexigibilidade do débito;

- a inversão do ônus de sucumbência;

- a verificação dos valores em liquidação de sentença.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 3 - PROCJUDIC6, fls. 18-35).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC/2015.

É o relatório.

VOTO

RELAÇÃO JURÍDICA LITIGIOSA.

As partes celebraram os seguintes contratos:

- Cédula de Crédito Bancário n. 2016081930195105000004, em agosto de 2016 [juros de 1,80% a.m. e de 23,88% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3", fls. 29-33],

- Cédula de Crédito Bancário n. 2016081930195105000008, em dezembro de 2016 [juros de 1,80 % a.m. e de 23,88% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3", fls. 34-8],

- Instrumento Particular de Confissão de Dívida com Garantia de Fiança n. 2016081930190475000005, em agosto de 2016 [juros de 1,90 % a.m. e de 25,35% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3", fls. 42-5],

- Instrumento particular de Confissão de Dívida com Garantia de Fiança n. 2016081930190475000010, em dezembro de 2016 [juros de 1,90 % a.m. e de 25,35% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3-4" fls. 48-50 e fl. 1 - respectivamente].

A instituição financeira juntou as cláusulas gerais dos respectivos contratos (Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3-4" fls. 29-38, fls. 42-5 e fl. 1 - respectivamente).

JUROS REMUNERATÓRIOS.

A norma prevista no art. 192, § 3º, da Constituição Federal, que limitava as taxas de juros reais em 12% ao ano e que restou revogada pela Emenda Constitucional n. 40 de 29 de maio de 2003, não era autoaplicável.

Veja-se a Súmula n. 648 do STF: “A norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela EC 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar” (Súmula 648, Sessão Plenária de 24/09/2003, DJ de 9/10/2003, p. 3).

Outrossim, a limitação dos juros em 12% ao ano fundamentada na legislação ordinária e infraconstitucional também não procede.

Eventual abusividade no caso concreto pode determinar a revisão dos juros contratados com base na Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC).

A cobrança de juros superiores a 12% ao ano, por si só, não caracteriza o abuso ensejador do reconhecimento de ilegalidade com fundamento no CDC.

A competência para limitar a taxa de juros é do Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República (art. 4º, IX, da Lei n. 4.595/64).

Nos termos da Súmula n. 596 do STF, “as disposições do Decreto n. 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o sistema financeiro nacional” (Súmula 596, Sessão Plenária de 15/12/1976, DJ de 3/1/1977, p. 7).

As disposições contidas nos arts. 591 e 406, combinados, ambos do CCB/2002, não se aplicam aos contratos de mútuo bancário, tendo em vista que os juros remuneratórios referentes ao Sistema Financeiro encontram amparo na Lei n. 4.595/64.

O Superior Tribunal de Justiça analisou a questão dos juros remuneratórios em ação revisional de contrato bancário, conforme incidente de processo repetitivo, REsp n. 1.061.530/RS (Tema n. 24, 25, 26 e 27 -STJ) resultando a orientação n. 1, a qual transcrevo:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. [...] ORIENTAÇÃO 1 – JUROS REMUNERATÓRIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. [...] (Recurso Especial n. 1.061.530/RS, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).

Assim, a taxa de juros remuneratórios restou estabelecida em percentual próximo à taxa média informada pelo Banco Central em operações da mesma espécie, o que, associado à natureza do contrato, afasta a alegada abusividade.

A taxa média de juros é informação pública que se encontra disponível no Sistema Gerenciador de Séries Temporais no site1 do Banco Central do Brasil, com simples pesquisa dos indicadores de crédito no mês da contratação.

No caso concreto, os juros remuneratórios não se encontram limitados em 12% ao ano, sendo lícita a cobrança dos juros livremente pactuados, sobretudo porquanto inexiste abusividade cabalmente demonstrada, Vejamos:

- Cédula de Crédito Bancário n. 2016081930195105000004, em agosto de 2016 [juros de 1,80% a.m. e de 23,88% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3", fls. 29-33], em cotejo com a taxa média de juros (20742 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado) de 132,16% a.a.;

- Cédula de Crédito Bancário n. 2016081930195105000008, em dezembro de 2016 [juros de 1,80 % a.m. e de 23,88% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3", fls. 34-8], em cotejo com a taxa média de juros (20742 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado) de 139,79% a.a.;

- Instrumento Particular de Confissão de Dívida com Garantia de Fiança n. 2016081930190475000005, em agosto de 2016 [juros de 1,90 % a.m. e de 25,35% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3", fls. 42-5], em cotejo com a taxa média de juros (20743 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dívidas) de 53,14% a.a.;

- Instrumento particular de Confissão de Dívida com Garantia de Fiança n. 2016081930190475000010, em dezembro de 2016 [juros de 1,90 % a.m. e de 25,35% a.a. - Evento 3 do originário - doc. "PROCJUDIC3-4" fls. 48-50 e fl. 1 - respectivamente], em cotejo com a taxa média de juros (20743 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dívidas) de 54,17% a.a..

Portanto, não há abusividade a ser reconhecida, no ponto.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS.

A capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano é admitida em contratos celebrados a partir de 31/03/2000 - Medida Provisória n. 1.963-17/2000, em vigor como Medida Provisória n. 2.170-36/2001 -, desde que expressamente pactuada.

O Superior Tribunal de Justiça analisou esta questão em sede de recurso repetitivo, REsp 973.827/RS (Tema n. 246 e 247-STJ), resultando as seguintes orientações:

1) É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada;

2) A pactuação mensal dos juros deve vir estabelecida de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. (REsp 973.827/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/06/2012).

Vale lembrar a Súmula n. 539 do STJ, segundo a qual é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada (Súmula 539, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/06/2015, DJe...

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