Acórdão nº 50026433820198213001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50026433820198213001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000203805
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002643-38.2019.8.21.3001/RS

TIPO DE AÇÃO: Tratamento médico-hospitalar

RELATORA: Desembargadora ISABEL DIAS ALMEIDA

APELANTE: CLEITON XAVIER LEITE (AUTOR)

APELADO: SUL AMERICA COMPANHIA DE SEGURO SAUDE (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelações cíveis interpostas pelas partes contra sentença (evento 88 da origem), que julgou parcialmente procedente em parte a ação de cobrança c/c indenização por danos morais ajuizada por CLEITON XAVIER LEITE em desfavor de SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, nos seguintes termos:

Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação para:

a) condenar a ré a custear as despesas de internação do autor para tratamento de dependência química, nos seguintes termos:

a.1) durante a situação de emergência (primeiros 30 dias de internação), com base no valor da tabela de referência de preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo plano, sem a limitação do multiplicador de reembolso constante do contrato e sem copartipação;

a.2) ultrapassada a situação de emergência (a partir do 31º dia de internação), também com base no valor da tabela de referência de preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo plano, observando-se o multiplicador de reembolso previsto no contrato, de 0,6 para diárias e despesas hospitalares, com possibilidade de cobrança de copartipação de 50% do valor das despesas hospitalares e honorários médicos de internação para tratamento psiquiátrico.

b) reformar, em parte, a tutela de urgência concedida no Ev. 8, de acordo com os parâmetros estabelecidos nas letras "a.1" e "a.2" deste dispositivo; e

c) condenar a parte autora a reembolsar à ré o valor correspondente ao prejuízo decorrente do cumprimento da decisão concessiva da tutela de urgência, conforme vier a ser apurado em liquidação, nos termos do art. 302, parágrafo único, do CPC, com correção pelo IGPM a contar da data do efetivo prejuízo e juros de 1% ao mês a contar do trânsito em julgado da presente decisão.

Diante da sucumbência recíproca, as custas serão pagas por metade.

A ré pagará honorários de R$ 3.000,00 ao patrono do autor, nos termos do art. 85, § 8º, do CPC.

O autor, por sua vez, pagará honorários ao patrono da ré de 10% sobre o valor da indenização que vier a ser apurada com base na letra "c" do dispositivo. Na inexistência de prejuízo, deverá ser observado o valor de R$ 3.000,00, conforme disposto no art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC.

Em suas razões de apelo, a ré (evento 94 da origem) relata os fatos e sustenta que o apelado é beneficiário de seguro saúde coletivo por adesão, firmado através da administradora de benefício 5Qualicorp, Produto - Adesão Ambulatorial e Hospital com Obstetrícia, Plano IDEAL, com início de vigência em 20/06/2019 e, portanto, submetido à Lei 9.656/98. Menciona que deve ser aplicado ao caso o constante no contrato firmado, mais precisamente no Manual do Beneficiário, onde consta expressamente a existência de cobertura parcial temporária pelo período de 24 meses em relação às doenças preexistentes à contratação, como na espécie. Destaca que o próprio autor reconhece ser dependente químico a mais de 4 anos, sedo que agiu em evidente má-fé ao contratar o seguro saúde deixando de informar a doença preexistente à contratação, assinalando como “não” a opção de transtornos psiquiátricos e transtornos de comportamento por uso de drogas, conforme se verifica na declaração de saúde anexada aos autos. Explica ser dispensável a comprovação de realização de exame médico prévio à aceitação da proposta para implantação do prazo de CPT de 24 meses, ante a manifesta má-fé do segurado, que mesmo ciente de seu quadro de saúde deixou de relatá-lo à seguradora. Colaciona jurisprudência e refere que o estabelecimento da carência contratual de 180 dias observa os dispositivos legais estabelecidos na Lei 9.656/98. Tece considerações legais e aduz que ainda que se considerasse o prazo de carência de 24 horas para casos de urgência ou emergência, o dever de cobertura da seguradora se restringiria às primeiras doze horas de atendimento ou até que fosse necessária a internação. Pede, de forma sucessiva, a parcial reforma da sentença, porquanto os limites contratuais devem ser observados desde o 1º dia da internação psiquiátrica e não somente após o 30º dia, visto que desde o início o tratamento foi realizado em clínica particular por escolha do segurado. Finaliza tecendo considerações contratuais e referindo que o reembolso se dá nos limites da cobertura. Pede o provimento.

O autor, em suas razões de apelo (evento 106 da origem), relata os fatos e sustenta que a operadora demandada apresentou duas clínicas supostamente aptas, quais sejam: a Clínica São José e a Clínica Pinel, que na verdade, se trata de hospitais psiquiátricos, o que difere totalmente de clínica de reabilitação para dependentes químicos. Explica que hospitais psiquiátricos, também denominados hospícios, manicômios ou manicómios, são hospitais especializados no tratamento de doenças mentais e/ou de "transtornos mentais", enquanto a clínica de reabilitação para dependentes químicos é um espaço específico e necessário para a aplicação de técnicas e tratamentos que promovam a retirada das drogas da vida das pessoas, que se encontram em condição avançada de vício, nas mais diversas substâncias, como é o caso do recorrente, dependente químico de cocaína, álcool e crack. Explica que foi internada na Clínica Viva Melhor em caráter emergencial, de modo que não poderia ficar a espera de quando a apelada decidisse lhe dar uma resposta, indicando a existência de clínica credenciada apta a fornecer o tratamento prescrito, o que somente fez nos autos, quando ajuizada a ação. Argumenta que a busca pela Clínica Viva Melhor, estabelecimento não credenciado, não se tratou de mera escolha/preferência, posto que a apelada não respondeu a notificação extrajudicial indicando estabelecimento credenciado com a mesma perfeição técnica exigível para viabilizar o restabelecimento da saúde do demandante, o fazendo ao longo da fase de conhecimento, sem qualquer demonstração que a Clínica São José e a Clínica Pinel é capaz de realizar o tratamento prescrito ao autor, e que se mostrou não o serem. Assevera que, quando teve crise necessitando da internação emergencial, encontrou essa confiança na Clínica Viva Melhor, mas especificamente no Dra. Eveline Bordignon (CRM nº 39.352/RS -RQE 34.929), médica psiquiatra, quem lhe acompanha desde o momento do surto e durante toda a evolução do seu quadro clínico, em razão da operadora recorrida faltar com a sua obrigação de responder à notificação extrajudicial que lhe foi encaminhada, quando poderia ter indicado estabelecimento credenciado. Por essa razão, registra que nenhum outro profissional dispôs da confiança da apelada como o Dra. Eveline Bordignon (CRM nº 39.352/RS -RQE 34.929), de modo que demonstra ser uma condição além da mera opção, mas sim da plena eficácia do tratamento. Esclarece que a internação necessária e realizada na Clínica Viva Melhor se trata de um conjunto de serviços multidisciplinares que vai desde psiquiátrico e psicológico a médico clínico, educador físico, nutricionista dentre outros, ou seja, envolve diversas especialidades que compõem a internação do paciente, razão pela qual não se configura hipótese de internação exclusivamente psiquiátrica, uma vez que a internação realizada abrange diversos outros serviços para além do meramente psiquiátrico, razão pela qual afasta por completo a possibilidade de incidência do mencionado dispositivo contratual específico, que é claro ao impor a coparticipação apenas nos casos de internação exclusivamente psiquiátrica, não sendo este o caso em tela. Explica que não há qualquer condição em arcar com as altas despesas para os seus padrões cobradas pela Clínica, para só então demandar o reembolso da operadora de plano de saúde. Registra que a espécie caracteriza ocorrência de danos morais, de natureza in re ipsa, ou seja, aquele dano em que não se faz necessária a prova da ofensa moral sofrida pela pessoa, pois, uma vez configurada a negativa injustificada, o dano moral já deve ser tido como presumido, bem como o seu consequente dever de reparação. Refere que em restando delineada a violação de direito imputada à entidade ré - omissão na prestação de serviço de internação - bem como os danos morais suportados pelo autor, restam preenchidos todos os elementos que compõem os dispositivos legais prescritos nos arts. 186 e 927, ambos do Código Civil. Postula o provimento.

Com as contrarrazões das partes (eventos 107 e 117 da origem), no sentido do desprovimento dos apelos, vieram os autos conclusos para julgamento.

Suspenso o processo por Recurso Especial Repetitivo - Tema 1032 do STJ (evento 6).

Intimadas acerca do trânsito em julgado (evento 34), apenas a parte ré apresentou manifestação (evento 39).

Retornaram os autos conclusos para julgamento.

Foram observados os dispositivos legais, considerando a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

Os apelos são adequados, tempestivos, sendo que o autor litiga ao abrigo da gratuidade e a ré comprova o preparo, razão pela qual passo ao seu enfrentamento de forma conjunta.

Melhor situando o objeto da controvérsia, adoto o relato da sentença, vertido nos seguintes termos:

CLEITON XAVIER LEITE ajuizou ação contra SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, alegando ser dependente químico diagnosticado com a doença F19.2 do CID10, razão pela qual necessita de internação em clínica especializada em tratamento para drogadição. Disse que é beneficiário de plano de saúde operado pela ré e que cientificou a demandada a respeito da necessidade do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT