Acórdão nº 50027135820208210014 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50027135820208210014
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002121071
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002713-58.2020.8.21.0014/RS

TIPO DE AÇÃO: Habilitação / Registro Cadastral / Julgamento / Homologação

RELATOR: Desembargador MIGUEL ANGELO DA SILVA

APELANTE: MB ENGENHARIA E MEIO AMBIENTE LTDA (IMPETRANTE)

APELADO: MUNICÍPIO DE ESTEIO (INTERESSADO)

APELADO: ONZEURB TRANSPORTES EIREL (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por MB ENGENHARIA E MEIO AMBIENTE LTDA. em face da sentença proferida nos autos do mandado de segurança impetrado contra ato praticado pelo PRESIDENTE DA COMISSÃO PERMANENTE DE LICITAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL DE ESTEIO, cujo dispositivo enuncia (Evento 67 dos autos originários), “in verbis”:

Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE o mandado de segurança impetrado por MB ENGENHARIA E MEIO AMBIENTE LTDA contra o ato da PRESIDENTE DA COMISSÃO DE LICITAÇÃO - MUNICÍPIO DE ESTEIO - ESTEIO e, em consequência, DENEGO a segurança pleiteada pela impetrante, revogando a decisão que deferiu a liminar.

Sem incidência de honorários advocatícios em face da Súmula 512 do STF e Súmula 105 do STJ.

Sucumbente, arcará a parte impetrante com o pagamento das custas processuais.

Nas razões de apelo, a empresa impetrante traça breve histórico dos fatos, referindo que participou do Edital Concorrência nº 03/2019 da Prefeitura Municipal de Esteio, inaugurado com vistas à contratação de empresa especializada para prestação de serviços continuados de coleta e transporte de resíduos sólidos domésticos. Relata que, após a desclassificação de todas as empresas habilitadas no certame, a Comissão Permanente de Licitação oportunizou que as licitantes apresentassem novas propostas de preços, alterando apenas os pontos que foram objeto de sua desclassificação, com fulcro no disposto no artigo 48, §3º, da Lei 8666/1993. Sustenta que “se sagrou classificada em primeiro lugar a empresa ONZEURB TRANSPORTES EIRELI, com menor preço, porém somente conseguiu alcançar esta posição, pois modificou um item em sua proposta que NÃO FOI objeto de desclassificação pela CPL” (sic). Aponta que “em nenhum momento a Comissão Permanente de Licitação determinou e/ou solicitou a correção do adicional de insalubridade dos motoristas, sendo defeso a ONZEURB o fazer em sua proposta de reconvocação” (sic). Argumenta que “ao contrário dos fundamentos sentenciais, resta inequívoco o direito líquido e certo da impetrante, ora recorrente, eis que a determinação da Comissão Permanente de Licitação para que as propostas fossem alteradas APENAS nos pontos que foram objeto de desclassificação vinculou todos os licitantes, impedindo que baixassem seus custos em itens que não aqueles expressamente elencados pela CPL” (sic). Sublinha que “o fato de a comissão determinar a forma de apresentação das propostas na reconvocação VINCULA todos os licitantes, pois conduta diversa acarretaria a desclassificação, como foi o caso de uma das empresas licitantes, assim não existe como afastar o direito líquido e certo da impetrante, que apenas agiu de forma a RESPEITAR A DETERMINAÇÃO EXARADA PELA ADMINISTRAÇÃO PUBLICA EM UM EDITAL DE LICITAÇÕES A QUE SE ECONTRA ESTRITAMENTE VINCULADA e que vincula a todos os envolvidos no certame” (sic). Pontua que “a questão fulcral foi a determinação da Comissão de Licitações de que as empresas não alterassem suas propostas, e somente fizessem a correção dos itens por ela indicados, sob pena de desclassificação, não se tratando somente de uma questão interpretativa do artigo de lei, e sim o cumprimento de uma determinação da Comissão em fase de licitação que VINCULOU todos os licitantes e inclusive desclassificou um deles” (sic). Requer a concessão de efeito suspensivo ao apelo e, ao final, seu provimento para conceder a segurança postulada, a fim de anular o ato coator, desclassificando a proposta da empresa ONZEURB TRANSPORTES EIRELI (Evento 77 dos autos originários).

O pleito de agregação de efeito suspensivo ao apelo foi deferido nos autos do pedido de efeito suspensivo à apelação nº 5220764-93.2021.8.21.7000/RS (Evento 4 daqueles autos). Os apelados interpuseram recursos de agravo interno, ambos recebidos em seu efeito natural (Eventos 17 e 27 daqueles autos).

Foram apresentadas contrarrazões (Eventos 90 e 93 dos autos originários).

Nesta instância, a d. Procuradoria de Justiça exarou parecer opinando pelo conhecimento e provimento do apelo (Evento 7).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, pois presentes seus pressupostos de admissibilidade.

Cuida-se de mandado de segurança impetrado por MB – ENGENHARIA E MEIO AMBIENTE LTDA. contra ato praticado pelo PRESIDENTE DA COMISSÃO PERMANENTE DE LICITAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL DE ESTEIO, consistente na classificação da empresa ONZEURB TRANSPORTES EIRELI como vencedora do processo licitatório Edital Concorrência nº 03/2019, inaugurado com vistas à contratação de empresa especializada para prestação de serviços continuados de coleta e transporte de resíduos sólidos domésticos – SMOSU, em cuja inicial alega que a impetrada alterou sua proposta além dos pontos que foram objeto de sua desclassificação, em clara afronta ao Comunicado da Comissão de Licitação, e, sabedora dos valores apresentados pelas licitantes concorrentes, ajustou sua proposta ao efeito de alcançar o menor valor, ferindo o princípio da vinculação ao instrumento convocatório e frustrando o caráter competitivo da licitação.

De saída, vale atentar ao disposto no art. 3º, da Lei nº 8.666/1993:

Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

A teor do disposto no art. 3º da Lei nº 8.666/1993, dentre os princípios básicos que regem a Administração Pública está o da vinculação ao edital ou instrumento convocatório do certame.

Por força desse princípio vetor, não pode a Administração deixar de cumprir as normas estipuladas no edital de licitação (conforme art. 411 da Lei nº 8.666/1993), nem o particular descumprir as exigências nele previstas.

Sobre o tema, invoco a abalizada doutrina de MARÇAL JUSTEN FILHO (“in” Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 13ª ed., São Paulo: Dialética, 2009, p. 59):

“O art. 3º sintetiza o espírito da Lei, no âmbito da licitação. Havendo dúvida sobre o caminho a adotar ou a opção a preferir, o intérprete deverá recorrer a esse dispositivo. Dentre diversas soluções possíveis, deverão ser rejeitadas as incompatíveis com os princípios do art. 3º. Se existir mais de uma solução compatível com ditos princípios, deverá prevalecer aquela que esteja mais de acordo com eles ou que os concretize de modo mais intenso e amplo. Essa diretriz deve nortear a atividade tanto do administrador quanto do próprio Poder Judiciário. O administrador, no curso das licitações, tem de submeter-se a eles. O julgador, ao apreciar conflitos derivados de licitações, encontrará a solução através desses princípios, mas respeitando as regras adotadas.”

A respeito do preceito contido no art. 41 da Lei 8.666/1993, prossegue o ilustre doutrinador (op. cit, p. 543):

“O instrumento convocatório cristaliza a competência discricionária da Administração, que se vincula a seus termos. Conjugando a regra do art. 41 com aquela do art. 4º, pode-se afirmar a estrita vinculação da Administração ao edital, seja quanto a regras de fundo quanto àquelas de procedimento. Sob um certo ângulo, o edital é o fundamento de validade dos atos praticados no curso da licitação, na acepção de que a desconformidade entre o edital e os atos administrativos praticados no curso da licitação se resolve pela invalidade destes últimos. Ao descumprir normas constantes do edital, a Administração Pública frustra a própria razão de ser da licitação. Viola os princípios norteadores da atividade administrativa, tais como a legalidade, a moralidade, a isonomia. O descumprimento a qualquer regra do edital deverá ser reprimido, inclusive através dos instrumentos de controle interno da Administração Pública. Nem mesmo o vício do edital justifica pretensão de ignorar a disciplina por ele veiculada.” - grifei

No caso “sub examine”, a empresa impetrante sustenta que, inaugurado o Edital Concorrência nº 03/2019 da Prefeitura Municipal de Esteio, tendo por objeto a contratação de empresa especializada para prestação de serviços continuados de coleta e transporte de resíduos sólidos domésticos – SMOSU, 5 (cinco) empresas manifestaram interesse em participar do certame (Evento 1 – OUT12 dos autos originários).

Após a análise dos recursos administrativos interpostos em face da habilitação de todas as licitantes, 2 (duas) empresas foram inabilitadas, restando habilitadas no certame apenas as empresas autora, ré e uma outra concorrente (Evento 1 – OUT13 e OUT15 dos autos originários).

Aberto o envelope nº 2, referente à proposta financeira das licitantes, em 15/07/2020, a Comissão Permanente de Licitação decidiu por desclassificar todas as empresas participantes do certame (Evento 1 – OUT16 dos autos originários), em Comunicado assim proferido, “in litteris”:

COMUNICADO

CONCORRÊNCIA 03/2019

PROCESSO Nº 7796/2019

A CPL, no uso de suas atribuições, torna público aos interessados, o resultado do julgamento do Env. 02 (Proposta Financeira): DESCLASSIFICADAS todas as empresas participantes do certame. A ata circunstanciada contendo a exposição...

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