Acórdão nº 50027312320198210044 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 24-03-2022

Data de Julgamento24 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50027312320198210044
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001891982
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002731-23.2019.8.21.0044/RS

TIPO DE AÇÃO: Responsabilidade civil

RELATOR: Desembargador PEDRO CELSO DAL PRA

APELANTE: MARI LOURDES SARTORI (AUTOR)

APELANTE: VILMAR LUIZ SARTORI (AUTOR)

APELANTE: EMPRESA GAUCHA DE RODOVIAS S/A - EGR (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por EMPRESA GAUCHA DE RODOVIAS S/A - EGR contra a sentença (evento 3, PROCJUDIC11, Página 9) que, nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por MARI LOURDES SARTORI e VILMAR LUIZ SARTORI, assim decidiu a lide:

“Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por MARI LOURDES SARTORI e VILMAR LUIZ SARTORI em face de EMPRESA GAÚCHA DE RODOVIRAS – EGR, condenando a requerida ao pagamento de R$ 10.958,55, corrigidos monetariamente com base no IGPM, desde a data do desembolso, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, desde a data da citação. Das custas processuais e honorários advocatícios. Considerando a sucumbência recíproca, condeno as partes na proporção de 70% a requerida e 30% as autoras, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais ora fixo em 10% sobre o valor da condenação (7% aos patronos da parte autora e 3% aos procuradores da EGR) forte no art. 85, § 2º, do CPC/2015. Suspensa a exigibilidade das verbas sucumbenciais à parte autora face a AJG deferida.”

A apelante alega, em suas razões, que a ação deve ser julgada improcedente, pois que, na sua ótica, não seria responsável pela manutenção da instalação de esgoto pluvial. Refere ser responsável pela drenagem da rodovia, que se estende, no máximo, até os limites da faixa de domínio. Diz que a causa dos alagamentos são a falta de drenagem pelo Município, excesso de chuvas e o fato de o imóvel encontrar-se abaixo do eixo da rua. Refere que não foi o sistema de drenagem que causou o alegado dano. Refere não ter havido a produção de prova técnica. Pede o afastamento da condenação por danos materiais, por ausência de prejuízo. Requer o provimento do recurso, com o consequente julgamento de procedência integral da ação.

Contrarrazões no evento 3, PROCJUDIC12, Página 8.

Os autores igualmente interpõem recurso de apelação, onde alegam, em suas razões (evento 3, PROCJUDIC11, Página 46), que a sua residência teria sido invadida por esgoto público, em razão da falha da prestação do serviço de responsabilidade da parte ré, fazendo, assim, juz à indenização por danos morais pleiteada. Apontam tratar-se de dano in re ipsa. Requerem o provimento do recurso, com o consequente julgamento de procedência integral da ação.

Contrarrazões no evento 3, PROCJUDIC12, Página 18.

Remetidos a este Tribunal de Justiça, foram os autos distribuídos em 09/08/2021, vindo-me, após manifestação do Ministério Público pelo desprovimento do recurso da demandada e parcial provimento do apelo dos autores, conclusos para julgamento em 24/11/2021.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas: entendo que é de ser desprovido o apelo da parte demandada e parcialmente provido o recurso dos demandantes.

I. Do recurso de apelação da Empresa Gaucha de Rodovias S/A - EGR.

Cuida-se de ação de indenização por danos morais e materiais, lastreada na alegação de danos advindos de alagamento que alcançou a residência dos autores, fato atribuído, segundo a inicial, à omissão da ré e ausência de manutenção preventiva dos bueiros que guarnecem a via de sua responsabilidade.

A sentença julgou procedente em parte a ação, afastando a indenização por danos morais, mas reconhecendo o dever de indenizar pelos danos materiais, ao fundamento de que, "ainda que tenha ocorrido chuva intensa, não há como isentar a responsabilidade da requerida, uma vez que o alagamento se deu em decorrência da omissão da demandada, que tinha obrigação de promover a manutenção da via pública".

Analisando os autos verifico que a sentença, no que tange ao reconhecimento da responsabilidade civil da empresa demandada, nenhum reparo merece.

Registro, de início, que, de fato, à luz da regra contida no art. 17 do Código de Processo Civil, são considerados consumidores por equiparação ou “bystander” todas as vítimas inocentes de consumo (no caso, do propalado dano advindo da falha no dever de conservação de serviço público - bueiros que guarnecem a ERS 129), ainda que não tenham participado diretamente da relação consumerista.

Nesse sentido, entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. DERRAMAMENTO DE ÓLEO. PESCADORES ARTESANAIS PREJUDICADOS. ACIDENTE DE CONSUMO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. FORO. DOMICÍLIO DOS AUTORES.
1. Trata-se de ação ordinária ajuizada por pescadores artesanais visando a reparação de danos materiais e morais decorrentes de dano ambiental.
2. Os autores foram vítimas de acidente de consumo, visto que suas atividades pesqueiras foram supostamente prejudicadas pelo derramamento de óleo ocorrido no Estado do Rio de Janeiro. Aplica-se à espécie o disposto no art. 17 do Código de Defesa do Consumidor.
3. As regras consumeristas contidas no artigo 101, I, da Lei nº 8.078/1990 devem incidir no caso, sendo facultada ao consumidor a propositura da ação no foro do seu domicílio.
4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da Vara Cível de Marataízes/ES, o suscitado.
(CC 143.204/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/04/2016, DJe 18/04/2016).

Desse modo, forçoso reconhecer a incidência das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor à espécie, inseridas neste contexto as regras de responsabilidade civil objetiva.

No que tange, de outro lado, ao pedido de afastamento da indenização por danos materiais, entendo que sem razão a parte ré.

De fato, como muito bem percebido na sentença ora recorrida, e reforçado pela Ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Jussara Maria Lahude, o rol de competência da Empresa Gaúcha de Rodovias vem assim especificado na Lei nº 14.033/2012, em seu art. 3º, VI e VIII, verbis:

"Art. 3º Compete à EGR:

(...) VI – planejar, executar, ampliar, remodelar, operar, manter, realizar obras e projetos de engenharia nas rodovias sob sua administração;

(...)

VIII – exercer outras atividades necessárias ao cumprimento do seu objeto social, conforme definido no seu estatuto".

O art. 2º, de sua vez, reza o seguinte:

“Art. 2º A EGR terá por objeto social a conservação, a manutenção e a implantação de melhorias na malha rodoviária do Estado, sob sua responsabilidade, bem como o planejamento para a expansão da capacidade dos serviços ofertados, de forma a qualificar a infraestrutura rodoviária gaúcha".

Vê-se, pois, ser de competência da Empresa demandada a execução de obras nas rodovias de sua administração, em especial as destinadas à sua manutenção, em cujo contexto se insere não só apenas a faixa de domínio, mas, também, por certo, todos os equipamentos a ela agregados, como o sistema de escoamento de águas pluviais. Descabe, pois, nessa ordem de ideias, imputar a responsabilidade por essa manutenção ao Município.

Possível extrair da prova acostada ao processo que ocorreram alagamentos substanciais na localidade, atingindo a residência dos autores, não evitados estes pelo sistema de escoamento da rodovia, de responsabilidade, repito, da ré.

Reporto-me, neste passo, à sumarização proporcionada pela sentença dos depoimentos prestados pelas testemunhas ouvidas em juízo (não impugnada especificamente nas razões de apelo), verbis:

"Conforme referido pelas testemunhas em audiência (CD de mídia à fl. 191), moradores da localidade em que os autores residem, entraram em contato com a EGR diversas vezes para solicitar a limpeza das galerias pluviais, uma vez que estavam obstruídas e impediam o escoamento da água da chuva, o que não foi atendido pela demanda. Ainda, as testemunhas confirmaram que foi necessário realizar obras às próprias expendias para solucionar o problema que vinha ocorrendo".

E não obstante as solicitações de limpeza das galerias pluviais, limitou-se, a demandada, a responder o seguinte:

"Entendemos que a responsabilidade pelo acontecido não pode ser atribuída a EGR, vez que decorrente de atos de terceiros”.

De observar, ainda, que, aberto protocolo de Atendimento nº 007060.00029/2014, na Promotoria de Justiça de...

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