Acórdão nº 50027853720218210070 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 09-02-2023

Data de Julgamento09 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50027853720218210070
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003249338
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5002785-37.2021.8.21.0070/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes contra a Fauna

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: ANTONIO FLAVIO DE OLIVEIRA (DPE)

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra CARLOS HENRIQUE JANSON, com 26 anos à época dos fatos, dando-o como incurso nas sanções do artigo 32, caput, duas vezes, com a majoração prevista no §2º do mesmo artigo da Lei 9.605/98, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1° FATO DELITUOSO:

Em data que não se pode precisar, mas pelo menos até 19 de maio de 2020, às 17h, na Rua Carlos Kroeff, n.º 162, Centro, no Município de Rolante/RS, praticou maus tratos contra animais, caçando dois exemplares da espécie veado mazamba americano, causando-lhes o resultado morte.

Segundo o Boletim de Ocorrência nº 743/2020/15431 da 2ª Delegacia de Polícia Regional do Interior – 2ª DPRI Rolante –, na data, horário e local acima citados, a guarnição, por meio do Ofício encaminhado pela Rede de Proteção Ambiental e Animais de Teutônia (REPRAAS) n.º 38/2020, registrou a ocorrência policial com base na publicação de um vídeo e imagens, de autoria do acusado, dando conta da caça de dois exemplares da espécie veado mazamba americano.

De acordo com o apurado, Carlos publicou junto a um grupo de conversas no aplicativo WhatsApp de nome “Caça e Pesca Esportiva” o respectivo conteúdo, dando conta da prática de caça de animais protegidos pela legislação ambiental, mortos pelo acusado com a utilização de arma de fogo e cães para a caça.

2º FATO DELITUOSO:

Em data que não se pode precisar, mas pelo menos até 10 de dezembro de 2020, em horário não sabido, praticou maus tratos contra animais, participando da organização de rinhas de galo.

Com a autorização do Juízo para quebra do sigilo telefônico, em cumprimento à determinação de busca e apreensão ordenada nos autos do processo 070/2.20.0001285-7 (cumprida em 10 de dezembro de 2020), foram obtidas informações junto ao aparelho celular de CARLOS HENRIQUE JASON. Do conteúdo, verificou-se a divulgação de fotos e vídeos, de autoria do investigado, de galos visivelmente debilitados e disputas ocorridas em local improvisado para realização das rinhas.

Ademais, os mesmos arquivos produzidos pelo acusado foram compartilhados com Perci Silva Costa, cujo histórico de ocorrências pretéritas registra crimes de maus tratos a animais – rinhas de galo e caça ilegal – (evento 1, Inquérito 1, pag. 52). Perci e Carlos participavam de um grupo de mensagens no aplicativo WhatsApp intitulado de “Amizade Através do Galo”, onde havia expresso conteúdo sobre divulgações de eventos, inclusive com oferecimento de premiações, em disputadas de rinhas de galos.

Em declarações prestadas junto ao Inquérito Policial o acusado referiu que o conteúdo encontrado em seu celular versava apenas sobre a venda dos galos, uma vez que auxiliava seu tio, já falecido, na comercialização e nos cuidados destes animais, destinados à prática do ilícito penal.

A denúncia foi recebida em 11.06.2021 (evento 3, DESPADEC1).

O réu foi citado pessoalmente em 15.07.2021, (evento 9, CERTGM1), tendo apresentado resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública (evento 12, PET1).

Durante a instrução, foram ouvidas as testemunhas, bem como decretada a revelia do réu (evento 58, TERMOAUD1).

Encerrada a instrução, as partes apresentaram memoriais escritos (evento 61, MEMORIAIS1 e evento 67, MEMORIAIS1).

Sobreveio a sentença, de lavra da Dra. Maria Ines Couto Terra, de procedência da pretensão punitiva estatal, para condenar o réu CARLOS HENRIQUE JANSON nas sanções do artigo 32, majorado pelo § 2º, da Lei 9.605/98, à pena de 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção, e 10 (dez) dias-multa, fixada a unidade em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo em vigor à época dos fatos. Satisfeitos os requisitos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade restou substituída por uma restritiva de direito, consistente em prestação pecuniária.

A sentença foi publicada em 31.08.2022 (evento 73, SENT1).

Irresignada, a defesa apelou. Em suas razões, requereu a reforma da decisão atacada para a absolvição do réu por insuficiência probatória quanto ao fato denunciado. Alternativamente, pleiteou a isenção da pena de multa (evento 79, APELAÇÃO1).

O Ministério Público apresentou contrarrazões (evento 85, CONTRAZAP1), e os autos foram remetidos a esta Corte.

Em parecer, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Ubaldo Alexandre Licks Flores, opinou pelo não provimento do recurso defensivo (evento 7, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Desembargadores:

Conheço do recurso porque adequado e tempestivo.

No que tange ao pedido de absolvição, entendo que não assiste razão à defesa do acusado, devendo ser mantida a condenação. A prova dos autos foi adequadamente analisada na sentença condenatória, estando evidenciadas a materialidade e a autoria delitivas.

Com efeito, a materialidade do delito restou devidamente comprovada nos autos, estando delineada na comunicação de ocorrência, Ofício n° 38/2020 do REPRAAS, nos depoimentos prestados nos autos e nas mídias extraídas do aparelho celular do acusado.

Há de se ressaltar que a ausência de laudo pericial em nada obsta a condenação, quando embasada em outros e suficientes elementos dos autos, a exemplo da prova oral e dos dados extraídos do aparelho celular do réu.

Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte:

APELAÇÃO. CRIME AMBIENTAL. MAUS-TRATOS. ART. 32, CAPUT, DA LEI Nº 9.605/98. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR UMA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. I - O entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que tal prova pode ser suprida por outros elementos de convicção, tais como prova testemunhal, documental, desde que declinadas as justificativas robustas que ensejaram a condenação do acusado, com fundamento no contexto probatório existente nos autos. No presente feito, o boletim de ocorrência de fl. 05v e o auto de constatação de fl. 06 descrevem que o equino encontrava-se em evidente estado de magreza, com diversas lesões pelo corpo. Corroborando tais documentos, o laudo técnico de fl. 22, elaborado por Médica Veterinária, dá conta de que o animal estava em mau estado nutricional e apresentava lesões de pele profundas nas coxas, axilas e joelhos, além de quatro ferraduras soltas. A soma destes elementos, por certo, comprova a existência da materialidade delitiva. II - Ainda que seja provável que as lesões causadas ao equino tenham sido em decorrência do acidente sofrido momentos antes da abordagem policial, não há dúvidas de que o animal apresentava quadro de mau estado nutricional, o que, da mesma forma, configura o delito de maus-tratos, previsto no art. 32, caput, da Lei nº 9.605/98. III - Pena privativa de liberdade fixada no mínimo legal, substituída por pena restritiva de direitos consistente em prestação de serviço comunitário, observadas as peculiaridades do art. 9º, da Lei nº 9.605/98. APELO MINISTERIAL PROVIDO.(Apelação Crime, Nº 70077239895, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em: 28-06-2018)[0]

Outrossim, para a comprovação da materialidade do crime de maus-tratos, basta a simples exposição do animal ao perigo e risco de vida, o que se verifica no caso concreto.

No caso, após a apreensão e extração dos dados do aparelho celular do réu, constatou-se que este integrava grupos de caçadores e rinhas de galos, denominados Caça e Pesca Esportiva, Amizade Através do Galo e Canil do Americano.

Nos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT