Acórdão nº 50027921220168210003 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 09-12-2022

Data de Julgamento09 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50027921220168210003
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003059397
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002792-12.2016.8.21.0003/RS

TIPO DE AÇÃO: Comodato

RELATORA: Desembargadora MYLENE MARIA MICHEL

APELANTE: ALEXANDRO RODRIGUES DE ARAUJO (AUTOR)

APELADO: CAROLINA RODRIGUES DE ARAUJO (RÉU)

RELATÓRIO

ADRIANA RODRIGUES ARAUJO, ALEXANDRO RODRIGUES DE ARAUJO e LUCIANO SARETTO apelam da sentença que julgou conjuntamente a ação de extinção de comodato cumulada com reintegração de posse n.º 5002792-12.2016.8.21.0003 (themis: 003/1.16.0006371-7) ajuizada por ALEXANDRO em face de CAROLINA RODRIGUES DE ARAUJO e a ação declaratória de nulidade de escritura pública n.º 5002802-56.2016.8.21.0003 (themis: 003/1.16.0005037-2) movida por esta em face de ALEXANDRO, LUCIANO SARETTO e ADRIANA RODRIGUES ARAUJO (Evento 12 - OUT3, da origem; fls. 16 dos autos físicos). Transcrevo o dispositivo sentencial, in verbis:

Diante do exposto, com fundamento no artigo 487, I, do CPC, julgo:

1. PROCEDENTES os pedidos formulados por CAROLINA RODRIGUES DE ARAUJO em desfavor de LUCIANO SARETTO, ADRIANA RODRIGUES ARAUJO e ALEXSANDRO RODRIGUES DE ARAUJO, nos autos do processo n.º 003/1.16.0005037-2, para declarar a nulidade da escritura de compra e venda formalizada entre Olina Rodrigues e Luciano Saretto (fl. 08) e, por consequência, do registro imobiliário R-12-6.2016, efetuado na matrícula do imóvel n.º 6.216, do Registro de Imóvel de Alvorada. Ainda, declaro a nulidade da procuração outorgada por Luciano Saretto a Alexsandro Rodrigues de Araujo (fl. 09), por ser decorrente da compra e venda.

Sucumbentes, condeno os requeridos ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios em favor do patrono da autora, os quais fixo em 10% sobre o valor do imóvel declarado na escritura pública declarada nula, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, atenta à natureza da causa, trabalho desenvolvido e tempo de tramitação.

Suste-se a exigibilidade dessa sucumbência com relação ao requerido Alexsandro, tendo em vista o benefício da AJG que ora lhe defiro.

2. IMPROCEDENTES os pedidos formulados por ALEXSANDRO RODRIGUES DE ARAUJO em desfavor de CAROLINA RODRIGUES DE ARAUJO , nos autos do processo n.º 003/1.16.0006371-7.

Sucumbente, condeno o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios ao patrono da requerida, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, de exigibilidade suspensa em virtude da AJG concedida.

Relatório da apelação cível n.º 5002802-56.2016.8.21.0003 (ação declaratória de nulidade de escritura pública):

No apelo interposto por ADRIANA RODRIGUES ARAUJO e LUCIANO SARETTO (Evento 2, OUT5, fls. 25-33), estes suscitam, inicialmente, a ocorrência de preclusão quanto aos documentos e declaração dos informantes juntadas após o prazo para apresentação de memoriais. Apontam ter ocorrido a decadência, pois a demanda foi proposta quase oito anos depois da formalização do contrato de compra e venda. Quanto ao mérito, alegam a nulidade dos depoimentos das testemunhas da parte apelada Carolina, pois são parentes e irmãos dela, tendo interesse na causa. Afirmam que o negócio foi realizado de forma lícita, não estando configurado preço vil e que Olina, a antiga proprietária, nunca morou no imóvel cuja venda foi impugnada, mas em endereço diverso. Aduzem que Olina não tinha interesse no imóvel e queria que alguém assumisse as prestações, tendo então Luciano, amigo da família, manifestado interesse, comprometendo-se a pagar o financiamento junto a CEF. Referem que Luciano realizou reformas no imóvel, residindo até 2014 na área, oferecendo-o em comodato para Alexandro, tendo sido realizada em favor dele procuração com poderes para alienação. Destacam que Luciano e Adriana jamais mantiveram união estável, apenas um breve relacionamento que resultou no nascimento de um filho em 02/09/2008. Enfatizam que a vendedora não residia no imóvel e que era parte disponível de seu patrimônio, tendo alienado referido imóvel de forma lícita. Pugna pelo provimento, com a consequente reforma da sentença.

ALEXANDRO RODRIGUES DE ARAUJO, por sua vez (Evento 2, OUT5, fls. 37-42), sustenta a ocorrência da decadência, nos termos do artigo 167, 179 e 496 do Código Civil. Alega que negócio jurídico foi firmado em 2008 e a demanda foi proposta em 2016, sendo evidente que ocorreu a decadência. Entende ser caso de procedência da ação de extinção de comodato, pois foi demonstrado que o recorrente é o proprietário do imóvel, conforme procuração juntada, tendo emprestado parte do imóvel para a ré, através de comodato verbal, em 2014, quando ela saiu da prisão e não tinha para onde ir. Invoca o disposto no art. 1200 do CCB, defendendo que é nítido o caráter violento da posse da demandada Carolina, assegurada mediante ameaça praticada contra o demandante e demais coabitantes. Pondera que ocorreu o esbulho possessório, devendo ser reintegrado na posse do imóvel, nos termos do artigo 1.210 do Código Civil. Pugna pelo provimento, reformando-se a sentença.

Regularmente intimada para apresentar contrarrazões ao recurso de apelação, a parte apelada, CAROLINA RODRIGUES DE ARAUJO, deixou transcorrer o prazo in albis.

Relatório da apelação cível n.º 5002792-12.2016.8.21.0003 (ação de extinção de comodato c/c reintegração de posse):

No apelo interposto pelo autor ALEXANDRO RODRIGUES DE ARAUJO (Evento 12, OUT3, fls. 33-37), o mesmo reitera as razões manejadas nos autos da ação conexa, sustentando a ocorrência da decadência, nos termos do artigo 167, 179 e 496 do Código Civil, tendo em vista que o negócio jurídico foi firmado em 2008, ao passo que a demanda foi proposta em 2016. Aponta que é caso de procedência da ação de extinção de comodato, tendo em vista que ficou demonstrado que ocorreu comodato verbal da área à demandada Carolina, firmado em 2014. Assevera que é notório o caráter injusto em relação à posse da parte apelante. Pondera que ocorreu o esbulho possessório, devendo ser reintegrado na posse do imóvel, nos termos do artigo 1.210 do Código Civil. Pugna pelo provimento do apelo.

Regularmente intimada, a parte ré CAROLINA RODRIGUES DE ARAUJO apresentou contrarrazões (Evento 10, CONTRAZAP1), sustentando, em síntese, que a pretensão recursal é protelatória; que não é aplicável decadência diante do negócio jurídico simulado, com base dos artigos 167, §1°, I e 169 do Código Civil. Invoca o Princípio da Imediação da Prova. Assevera que o negócio jurídico simulado trouxe benefícios apenas para ALEXANDRO, LUCIANO e ADRIANA, o que foi comprovado pela oitiva dos informantes. Pugna pelo desprovimento do apelo e manutenção da sentença recorrida.

Digitalizados para inclusão no sistema E-proc, os autos foram remetidos a esta Egrégia Corte, vindo a mim distribuídos por sorteio.

Em ambos os feitos o Ministério ofertou parecer opinando pelo desprovimento dos recursos e manutenção da sentença recorrida.

É o relatório.

VOTO

Conheço dos recursos, porquanto preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade aplicáveis à espécie.

Trata-se de sentença que reconheceu a nulidade - por simulação e dolo - de compra e venda realizada entre a falecida Olina (avó de Carolina, Alexandro e Adriana) e Luciano (companheiro de Adriana), de modo a dissimular doação de ascendente a descendentes (Alexandro e Adriana) sem a anuência dos demais, dentre os quais a autora Carolina (doação inoficiosa) e que, decorrência lógica, reconheceu a inexistência do alegado comodato entre Alexandro e Carolina (irmãos), julgando improcedente a pretensão de extinção do mesmo e reintegração de posse em favor de Alexandro.

Em se tratando de sentença una, os recursos conexos serão apreciados conjuntamente.

De plano, consigno inexistir qualquer nulidade decorrente da juntada dos documentos que foram anexados aos memoriais apresentados de forma extemporânea por Carolina, valendo-me, quanto ao ponto, dos fundamentos do parecer ministerial, da lavra do ilustre procurador de justiça com atuação junto a este órgão fracionário, Dr. André Cipele:

Defende a parte apelante que a autora apresentou memoriais fora do prazo e, assim, os documentos que acompanharam tal peça processual não podem ser considerados como prova.
Ainda que os memoriais tenham sido juntados de forma extemporânea, verifica-se que a parte adversa teve a oportunidade de se manifestar sobre os documentos acostados, sendo respeitado o contraditório, de modo que não parece existir óbice à valoração deles.

De qualquer sorte, mesmo que se conclua que tais documentos não poderiam ter sido utilizados em fundamentação pela sentença, é possível concluir que, mesmo sem eles, as demais provas existentes nos autos já são suficientes para a manutenção da decisão hostilizada, como se verá a seguir, não havendo qualquer nulidade a ser declarada.

Com efeito, as referidas provas tratam-se de postagens em redes sociais que visam a comprovar a relação de convivência existente entre Luciano e Adriana a qual, todavia, foi demonstrada de forma segura através de outros elementos de prova trazidos aos autos, razão pela qual, não sendo essenciais ao deslinde do feito, sequer é necessária a análise de tais documentos.

No que tange à prefacial de decadência, foi corretamente afastada pelo juízo a quo, em decisão que está em absoluta consonância com a jurisprudência desta Corte.

Os argumentos da inicial são, sem sombra de dúvida, de simulação de compra e venda entre ascendente e descendente, sem o consentimento de outro descendente, de modo a ocultar verdadeira doação inoficiosa.

Apesar do negócio dissimulado consistir em eventual doação inoficiosa, a pretensão formulada pelo autor é de anulação da compra e venda por ocorrência de simulação (art. 167, CC), além...

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