Acórdão nº 50028002120148210015 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50028002120148210015
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002605211
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5002800-21.2014.8.21.0015/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATORA: Desembargadora ISABEL DE BORBA LUCAS

RELATÓRIO

Primeiramente, cumpre salientar que os nomes das partes envolvidas foram abreviados, inclusive em citações e trechos da sentença utilizados neste relatório e voto, por se tratar de feito que tramita em segredo de justiça.

O MINISTÉRIO PÚBLICO da 2ª Promotoria de Justiça Criminal de Gravataí ofereceu denúncia contra R.B.O., nascido em 22/03/1986, com 25 anos de idade à época do fato, dando-o como incurso nas sanções do artigo 217-A, caput, combinado com os artigos 226, II e 71, caput, todos do Código Penal, pela prática do seguinte fato delituoso (evento 3, DOC1, fl. 03):

Durante o ano de 2011, em diversos horários e por diversas vezes, na Avenida dos Ciprestes, 286, Bairro Castelo Branco, em Gravataí/RS, o denunciado R.B.O. praticou atos libidinosos com a vítima S.C.R.O., que é menor de 14 anos (nesse sentido o documento juntado na fl. 13 do IP).

O acusado é pai da ofendida. Aproveitando-se que a filha ia à sua casa passar os finais de semana, R.B.O. aproximava-se dela com fim libidinoso, oportunidades em que passava as mãos e o pênis na vagina e no ânus da menina. Em algumas ocasiões, o denunciado cuspia na própria mão para que restasse lubrificada, antes de manipular o órgão genital da filha.

Depois dos abusos, R.B.O. dizia à ofendida que, se contasse os ocorridos a alguém, iria matar a mãe da menina com uma arma.

S.C.R.O., quando sofreu os abusos, tinha apenas seis anos de idade. Os crimes ocorreram por diversas vezes, em continuidade delitiva.

Assim agindo, o denunciado R.B.O incorreu nas sanções do artigo 217-A, caput, combinado com os artigos 226, inciso II (ascendente) e 71, caput (diversas vezes), todos do Código Penal, com incidência das normas dispostas na Lei n.° 8.072/90.

Em seguida, adoto o relatório da sentença (evento 3, DOC4, fl. 44):

A denúncia foi recebida em 24/09/2014 (fls. 64-65).

Citado (fl. 70), 0 réu apresentou resposta à acusação (fl. 71).

Avaliação psíquica juntada aos autos (fls. 75-79).

Durante a instrução, foram ouvidas a vítima, as testemunhas e interrogado o réu.

O Ministério Público, entendendo presentes provas de materialidade e autoria do delito, postulou a condenação do réu nos termos da denúncia.

Já a Defesa alegou insuficiência probatória para a condenação. Ainda, pediu a aplicação da fração mínima referente ao aumento de pena da continuidade delitiva.

Sobreveio a sentença, evento 3, DOC4, fls. 44/49, publicada em 04/06/2019 (fl. 48), que julgou procedente a denúncia, condenando R.B.O. à pena de 13 (treze) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, porque incurso nas sanções do art. 217- A, c/c o art. 226, II, ambos do CP. Por não preenchidos os requisitos, a decisão afastou as hipóteses de substituição ou suspensão da pena. Além disso, o réu foi condenado ao pagamento das custas processuais, cuja exigibilidade foi suspensa, sendo a ele concedido o direito de apelar em liberdade.

A dosimetria da pena deu-se da seguinte forma:

Analisando as circunstâncias do art.59, do Código Penal, verifico que o réu não registra antecedentes criminais. Quanto à personalidade e à conduta social, não existem elementos - além do crime - que possam justificar maior juízo de reprovação. Os motivos que levaram ao crime parecem relacionados a problemas de ordem psicológica que devem ser enfrentados pelo réu. Quanto às circunstâncias, cabível a valoração negativa, especialmente em virtude das ameaças perpetradas contra a vítima, com pouca idade, no sentido de que mataria a genitora caso descrevesse os abusos. As consequências são graves, tendo em vista que a avaliação psíquica das fis. 75-79 apontando o desenvolvimento de Transtorno de Adaptação na vítima em virtude dos fatos. A vítima em nada contribuiu para o delito. Assim, em virtude da presença de duas vetoriais negativas (circunstâncias e consequências), aumento a pena em 06 meses para cada, totalizando 09 anos a título de pena-base. Ausentes agravantes e atenuantes, a pena provisória fica mantida no mesmo patamar. Aplico a causa de aumento de pena (art. 226, II, CP) na quarta parte (2 anos e 3 meses), totaiizando 11 anos e 03 meses. Além disso, em virtude do disposto no art. 71 do Código Penal, a pena deve ser aumentada em 1/6 (1 ano, 10 meses e 15 dias), em virtude da continuidade delitiva, sendo que na ausência de causas de diminuição, a PENA DEFINITIVA resta fixada em 13 (treze) anos. 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial FECHADO, com base no artigo 33, do Código Penal.

Intimado o réu pessoalmente da sentença (evento 3, DOC5, fl. 07), nada disse.

A defesa apelou (evento 3, DOC5, fl. 08), acostando razões ao evento 3, DOC5, fls. 11/25, nas quais postulou a absolvição, por insuficiência probatória. Subsidiariamente, pleiteou a desclassificação do delito imputado para a contravenção penal prevista no art. 61 da Lei das Contravenções Penais, com o subsequente reconhecimento da extinção da punibilidade, pela prescrição, a redução da pena base para o mínimo legal, com o afastamento da valoração negativa das consequências e das circunstâncias, e a redução da pena, com a diminuição do quantum de aumento pela incidência do crime continuado para 1/6.

Com as contrarrazões recursais (evento 3, DOC5, fls. 27/40), pelo desprovimento do apelo, vieram os autos.

Nesta Corte, o ilustre Procurador de Justiça, Carlos Roberto Lima Paganella, opinou pelo desprovimento do apelo da defesa (evento 8, DOC1).

Esta 8ª Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, atendido o disposto no art.609 do CPP, bem como no art.207, II, do RITJERGS.

É o relatório.

VOTO

Inicialmente, observe-se que, muito embora os presentes fatos tenham tido curso no longínquo ano de 2011, a tramitação do Inquérito Policial foi bastante lenta, o que restou devidamente justificado pela certidão da fl. 28 (Evento3, PROCJUDIC1), na qual descritas as inúmeras dificuldades de localização do endereço da genitora da ofendida, que também modificou seus números de contato telefônico, sem atualização no seu cadastro de dados no programa Consultas Integradas, inviabilizando as intimações do núcleo familiar todo. Superado o ponto, a denúncia foi promovida em 12/09/2014 e recebida doze dias depois. Após a judicialização do feito, ainda, esse seguiu lenta tramitação, sobrevindo sentença condenatória em 04/06/2019 e, após intimadas as partes e protocolado o recurso de apelação e respectivas contrarrazões, foram os autos distribuídos a esta relatora apenas em 18/08/2022, vindo conclusos para julgamento em 14/09/2022.

Superada a questão, trata-se de recurso promovido pela defesa de R.B.O., que pleiteia a sua absolvição, por insuficiência de provas e, subsidiariamente, a desclassificação do delito para importunação sexual, a redução da pena base e do quantum de aumento pela incidência do crime continuado para 1/6.

Compulsando detidamente os autos, conclui-se que o pleito absolutório deve ser rechaçado, pois os elementos reunidos nos autos revelam que o acusado cometeu o delito pelo qual foi condenado.

A denúncia veio vertida no sentido de R.B.O., em período impreciso durante o ano de 2011, teria constrangido sua filha, S.C.R.O, nascida em 05/03/2005 e que então contava com seis anos de idade, a com ele praticar atos libidinosos diversos da conjunção carnal, em momentos nos quais a criança o visitava, em sua residência (do acusado). Ele esfregou lascivamente as mãos e o pênis na vagina e no ânus da menina. As sevícias foram reveladas pela criança às irmãs e à sua genitora, sendo, então, registrado o Boletim de Ocorrência da fl. 09 (Evento3, PROCJUDIC1), em 24/06/2011.

Impende notar que o crime ora em análise, consistente na prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, em grande parte das circunstâncias – como a dos autos - não deixa vestígios, razão pela qual assume especial relevo a palavra da vítima, que prepondera sobre a versão do acusado, inobstante a negativa genérica deste último.

Com efeito, tanto a AUTORIA quanto a EXISTÊNCIA DO FATO restaram inequívocos, diante da prova coligida aos autos. Como fundamento, já rebatendo as teses defensivas e concluindo pela condenação, merece reprodução a sentença da lavra da ilustre Juíza de Direito, Dra. Luciana Barcellos Tegliacchi, por conter o equacionamento da matéria com a fundamentação precisa advinda da análise dos fatos ocorridos e os testemunhos relevantes ao desiderato da questão, evitando desnecessária tautologia (evento 3, DOC4, fls. 45/47):

Com relação à materialidade do delito, saliento o registro de ocorrência policial da fl. 07, a avaliação psíquica das fls. 75-79, além dos depoimentos prestados em juízo.

Sobre a prova oral, destaco que a vítima confirmou que costumava visitar o seu genitor na cidade de Gravataí e este "pedia para fazer coisa feia". Afirmou que isso aconteceu uma vez "na Betânia" e outra vez em Gravataí, locais em que o pai morava. Ao ser questionada sobre a ocorrência de mais fatos, além dos dois relatados, negou com a cabeça, dando a entender que ocorreram apenas os dois fatos. Disse que o réu encostou em sua parte íntima, "botava os dois dedos". Confirmou que o réu tirava suas roupas e ficava com a parte íntima a mostra. Afirmou que o denunciado dizia que se falasse para sua genitora acerca do ocorrido, iria matá-la. Tinha seis anos de idade quando dos fatos. Começou a urinar nas calças depois do fato e chegou a ter medo de homens. Ao ser questionada pela defesa, disse que não gostava de dormir com sua avó...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT