Acórdão nº 50028110220138210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50028110220138210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001263245
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002811-02.2013.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Licenças

RELATORA: Desembargadora LUCIA DE FATIMA CERVEIRA

APELANTE: SUBCONDOMINIO DO CENTRO COMERCIAL DO SHOPPING CENTER IGUATEMI CAXIAS (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELADO: MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por SUBCONDOMÍNIO DO CENTRO COMERCIAL DO SHOPPING CENTER IGUATEMI CAXIAS em face da sentença proferida nos autos da ação declaratória ajuizada contra o MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL e do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, que assim dispôs:

"...

ISSO POSTO, julgo IMPROCEDENTES os pedidos contidos na AÇÃO DECLARATÓRIA ajuizada pelo SUBCONDOMINIO DO CENTRO COMERCIAL DO SHOPPING CENTER IGUATEMI CAXIAS em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e do MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL, revogando a tutela concedida.

Condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios a serem pagos em favor dos adversos, que fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada um, nos termos do art. 85, § 8º do CPC, considerando a expressão econômica da causa, o trabalho exigido e o tempo decorrido, de modo a remunerar condignamente o trabalho dos profissionais. Esse valor será atualizado pelo IPCA-E a contar desta data e acrescido de juros de mora de 1% ao mês (§ 16° do art. 85) a partir do trânsito em julgado da sentença, até o efetivo pagamento.

Sentença não sujeita à remessa necessária.

..."

Opostos embargos de declaração pela parte autora, foram acolhidos para o fim de estipular o prazo de 90 dias, a contar do trânsito em julgado, para adequação do sistema de abastecimento de água do empreendimento aos ditames do art. 96 do Decreto Estadual nº 23.430/74 (fls. 840-841@).

Em suas razões, alega que, embora o art. 18 da Lei Estadual nº 6.503/72 imponha a obrigatoriedade de ligação das edificações habitáveis à rede pública de abastecimento de água e coleta de esgoto, em momento algum a norma veda a utilização concomitante de fontes alternativas de abastecimento, como é o caso dos poços artesianos, tampouco limita as finalidades permitidas para o uso da água proveniemte dessas fontes. Diz que o art. 96 do Decreto Estadual nº 23.430/74 extrapola os ditames da Lei Estadual nº 6.503/72. Sustenta que somente a lei, em sentido formal estrito, pode inovar no mundo jurídico para criar direitos e obrigações, o que restou usurpado pelo Decreto Estadual nº 24.430/74. Alega que os dois poços artesianos existentes na propriedade encontram-se cadastrados junto ao Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAMAE), conforme atestados nºs 23/2006 e 11/2007, cuja potabilidade da água é constantemente acompanhada por empresa especializada contratada pelo empreendimento. Refere que nos dois processos administrativos em trâmite junto ao DRH do Estado do Rio Grande do Sul, não foi negada a outorga pretendida, mas tão somente restringido indevidamente o uso da água para fins de jardinagem. Aduz que somente se comprovada a não-potalbilidade da água dos poços é que, em tese, se justificaria a não concessão de licença sanitária pelo Município, o que não é o caso dos autos. Sustenta a necessidade de redução dos honorários advocatícios.Postula o provimento do recurso.

Apresentadas as contrarrazões, manifesta-se o Ministério Público pelo parcial provimento do apelo.

Vêm os autos para julgamento.

Observados os artigos 931 e 934 do CPC.

É o relatório.

VOTO

Pretende a parte apelante a reforma da decisão que julgou improcedente o pedido formulado, cujo objetivo consistia em obter autorização para captação de água subterrânea, para manter seu poço aberto e em funcionamento, para consumo humano e limpeza, conforme item d -fl. 23.

Adianto não ser caso de provimento do recurso.

Colhe-se dos autos que, em que pese o Condomínio já contasse com dois poços, o Poder Público delegou ao SAMAE a competência do cadastros dos poços artesianos existentes no Município de Caxias do Sul (Decreto Municipal nº 11.334/2003).

Conforme consta no art. 4º do citado Decreto "Todos os poços tubulares já perfurados, inclusive artesianos, em uso ou não, deverão ser cadastrados no prázo máximo de cento e oitenta dias, a contar da publicação deste decreto."

Nestes termos, o Condomínio restou notificado a realizar os cadastros (fl. 46@) e, por permanecer inerte, acabou autuado conforme se verifica às fls. 48-49@.

Dado prosseguimento aos processos administrativos nºs 014231-0567/11-6 e 014226-05.67/11-8, verifica-se dos autos que, em 29/10/2012, restou informado à apelante que o pleito de regularização para uso em limpeza e consumo humano não poderia ser atendido em face do art. 96 do Decreto Estadual nº 23.430/74. A regularização somente poderia ser realizada para finalidade de uso em irrigação de jardim (fl. 200@).

Ao contrário do entendimento sustentado pelo autor, não vislumbro qualquer ilegalidade nas disposições contidas nos arts. 83 e 96 do Decreto nº 23.430/74, in verbis:

Art. 83 - Não será permitida, em qualquer circunstância, a conexão do sistema de abastecimento de água potável com outro destinado a abastecimento para outra finalidade.

Art. 96 - Nas zonas servidas por rede de abastecimento de água potável, os poços serão tolerados exclusivamente para suprimento com fins industriais ou para uso em floricultura ou agricultura, devendo satisfazer seguintes condições:

a) serem convenientemente fechados, com tampa, no mínimo, a 0,40 m (quarenta centímetros) da superfície do solo;

b) serem dotados de bomba;

Parágrafo único - Os poços não utilizados serão aterrados até o nível do terreno.

Com efeito, o Estado possui competência para dispor sobre questões referentes às águas, na medida em que compete aos Estados-membros estabelecerem restrições administrativas, objetivando a proteção do meio ambiente.

Desta sorte, tenho que os arts. 83 e 96, do Decreto supra não afrontam aos preceitos constitucionalmente estabelecidos, mormente porque não invadem a competência da União, na medida em que se situam no âmbito de proteção ambiental, especificamente no que concerne ao saneamento básico da região.

Assim, afigura-se correta a negativa do órgão ambiental competente em outorgar a autorização do poço artesiano para fins de consumo humano, na medida em que o local é abastecido por rede pública, não havendo controvérsia da recorrente nesse ponto.

Ademais, tal decisão está consubstanciada no que dispõe o art. 96, do Decreto Estadual nº 23.430/74, que regulamenta a Lei Estadual nº 6.503/72, mormente no que tange ao seu art. 18:

É obrigatória a ligação de toda construção considerada habitável à rede pública de abastecimento de água e aos coletores públicos de esgoto.

Assim sendo, a negativa do órgão ambiental encontra amparo na legislação vigente, estando assim plenamente justificada, haja vista que a utilização de poços artesianos e, sobretudo, o consumo da água subterrânea deles proveniente podem gerar danos à saúde humana e degradação ambiental.

A respeito do tema, cito:

AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 966, V E VII DO CPC. UTILIZAÇÃO DE POÇO ARTESIANO PARA FINS DE CONSUMO HUMANO. SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS. ÁGUA. BEM DE DOMÍNIO PÚBLICO. O regime jurídico das águas internas sofreu radical transformação com a promulgação da Lei Federal n. 9.433/97, que regulamentou o art. 21, XIX, da Constituição Federal. A água é um bem de domínio público (art. 1º, inc. I, da Lei n. 9.433/97), revogado, por isso, o art. 96 do Código de Águas, que assegura ao dono de qualquer terreno a apropriação por meio de poços, galerias, etc. das águas existentes debaixo da superfície de seu prédio. Estão sujeitos à outorga pelo Poder Público os direitos de uso dos recursos hídricos, como a extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo (art. 12, inc. II, da Lei n. 9.433/97). Legalidade da Lei Estadual n. 6.503/72 e do Decreto Estadual n. 23.430/74 que proíbe o uso de água decorrente de poço artesiano...

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