Acórdão nº 50028121120188210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 24-11-2022
Data de Julgamento | 24 Novembro 2022 |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50028121120188210010 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002955094
3ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5002812-11.2018.8.21.0010/RS
TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de Energia Elétrica
RELATOR: Desembargador LEONEL PIRES OHLWEILER
APELANTE: RIO GRANDE ENERGIA SA (RÉU)
APELADO: VINICOLA TONINI LTDA (AUTOR)
RELATÓRIO
VINÍCOLA TONINI LTDA. ajuizou ação contra a RIO GRANDE ENERGIA S.A.
A magistrada de 1º grau decidiu pela procedência do pedido, nos seguintes termos:
ISSO POSTO, julgo procedente o pedido feito por VINICOLA TONINI LTDA. contra RIO GRANDE ENERGIA S.A., a fim de:
a) condenar a ré à obrigação de reenquadrar a unidade consumidora da autora na classe rural, na subclasse agroindustrial “B2 Rural Agroindustrial” e;
b) condenar a ré à restituição dos valores pagos em excesso, correspondentes às diferenças havidas entre as tarifas da subclasse agroindustrial da classe rural “B2 Rural Agroindustrial” e da classe industrial “B3 Industrial”, corrigidas pelo IGP-M, a contar de cada desembolso, e acrescidas de juros de 1% ao mês, a partir da citação, observada a prescrição decenal.
Condeno a ré ao pagamento das custas e demais despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios aos procuradores da autora, fixados em 10% do valor da condenação, corrigidos pelo IGP-M a contar desta data e acrescidos de juros de 1% a partir do trânsito em julgado, observando o disposto no art. 85, § 2º do CPC, considerando-se a natureza e a complexidade da causa, o trabalho que se fez necessário e o tempo de tramitação do processo.
Em razões recursais (evento 21), a RGE SUL defende que a autora não está cadastrada como produtor rural perante a Secretaria da Fazenda do Estado e está cadastrada, perante a Receita Federal, como fabricante de vinho, suco de frutas, hortaliças e legumes, exceto concentrados. Alega que a autora não preenche os requisitos para o reenquadramento na classe rural, pois sua atividade não é exclusivamente rural. Sustenta a regularidade do enquadramento tarifário na classe “B3 Industrial”. Afirma que não tem como verificar a atividade exercida para fins de reenquadramento de cada um de seus clientes, sendo necessário o pedido expresso por parte da empresa solicitante com a juntada de documentos. Ressalta que não está comprovado nos autos atividade exclusivamente rural. Insurge-se contra a condenação a restituir os valores pagos. Alternativamente, pede a aplicação da Taxa SELIC como parâmetro para atualização monetária.
Foram apresentadas contrarrazões (evento 25), pugnando pela manutenção da sentença. Pede seja afastado o “pedido alternativo” da apelante quanto ao índice de correção monetária, visto que se trata de inovação recursal.
Subiram os autos, e, neste grau, o Ministério Público, em parecer da Procuradora de Justiça Elaine Fayet Lorenzon Schaly, manifestou-se pelo desprovimento da apelação.
É o relatório.
VOTO
I - PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE.
O recurso é tempestivo e está preparado. Presentes os demais pressupostos, conheço do apelo.
II – MÉRITO.
A parte autora afirmou na petição inicial que exerce atividade de agroindústria, cuja atividade desenvolvida é a fabricação de produtos advindos diretamente da agricultura (uva), fazendo jus ao enquadramento tarifário para esse tipo de atividade (agroindustrial).
Após a contestação e a instrução, sobreveio a sentença que julgou procedente a ação para fins de determinar a reclassificação tarifária da autora "na classe rural, na subclasse agroindustrial “B2 Rural Agroindustrial”.
Contra a sentença, recorre a RGE SUL.
A Prestação do Serviço Público de Fornecimento de Energia Elétrica
De início, faz-se mister compreender que a parte ré efetivamente presta um serviço público, ou seja:
“Serviços públicos são as atividades de prestação de utilidades econômicas a indivíduos determinados, colocados pela Constituição ou pela Lei a cargo do Estado, com ou sem reserva de titularidade, e por ele desempenhadas diretamente ou por seus delegatários, gratuita ou remuneradamente, com vistas ao bem-estar da coletividade”(Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Público. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 157).
Com relação ao enquadramento tarifário postulado pela demandante, a classificação das empresas rurais tinha previsão na Resolução nº 456/2000 da ANEEL:
Art. 5º A concessionária deverá comunicar, por escrito, quando da efetivação do pedido de fornecimento ou sempre que solicitado, as opções disponíveis para faturamento ou mudança de Grupo tarifário e prestar as informações necessárias e adequadas a cada caso, cabendo ao consumidor formular sua opção também por escrito.
[...]
Art. 19. Nos casos em que a reclassificação da unidade consumidora implicar em alteração da tarifa aplicada, a concessionária deverá proceder os ajustes necessários conforme as situações indicadas nos incisos I e II deste artigo, emitir comunicado específico informando ao consumidor as alterações decorrentes e observando os prazos a seguir fixados:”
I - redução da tarifa: a reclassificação deverá ser realizada imediatamente após a constatação e a comunicação até a data da apresentação da primeira fatura corrigida; ou
II - elevação da tarifa: a comunicação deverá ser realizada, no mínimo, com 15 (quinze) dias antes da apresentação da primeira fatura corrigida.
Art. 20. Ficam estabelecidas as seguintes classes e subclasses para efeito de aplicação de tarifas:
[...]
IV – Rural
Fornecimento para unidade consumidora localizada em área rural, em que seja desenvolvida atividade rural, sujeita à comprovação perante a concessionária, devendo ser consideradas as seguintes subclasses:
[...]
c) Indústria Rural
Fornecimento para unidade consumidora em que seja desenvolvido processo industrial de transformação e/ou beneficiamento de produtos oriundos da atividade relativa à agricultura e/ou a criação, recriação ou engorda de animais, com potência instalada em transformadores não superior a 112,5 kVA.
Posteriormente, com a revogação desses dispositivos, o art. 5º da Resolução nº 414/2010 da ANEEL passou a prever:
Art. 5º A aplicação das tarifas deve observar as classes e subclasses estabelecidas neste artigo.
[...]
2º A classe industrial caracteriza-se pelo fornecimento à unidade consumidora em que seja desenvolvida atividade industrial, conforme definido na Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE, assim como o transporte de matéria-prima, insumo ou produto resultante do seu processamento, caracterizado como atividade de suporte e sem fim econômico próprio, desde que realizado de forma integrada fisicamente à unidade consumidora industrial.
[...]
§ 4º A classe rural caracteriza-se pelo fornecimento à unidade consumidora que desenvolva atividades de agricultura, pecuária ou aquicultura, dispostas nos grupos 01.1 a 01.6 ou 03.2 da CNAE, considerando-se as seguintes subclasses: (Redação dada pela REN ANEEL 449, de 20.09.2011)
[...]
V - agroindustrial: independente de sua localização, que se dedicar a atividades agroindustriais, em que sejam promovidos a transformação ou beneficiamento de produtos advindos diretamente da agropecuária, mesmo que oriundos de outras propriedades, desde que a potência disponibilizada seja de até 112,5 kVA; (Redação dada pela REN ANEEL 449, de 20.09.2011)
Por sua vez, o artigo 58 da citada Resolução, estabelece: "Quando da solicitação de fornecimento, mudança de grupo tarifário ou sempre que solicitado, para unidades consumidoras do grupo A, a distribuidora deve informar, por escrito, em até 15 (quinze) dias, as modalidades tarifárias disponíveis para faturamento, cabendo ao interessado formular sua opção por escrito".
Vale ressaltar que a citada resolução foi revogada pela Resolução Normativa nº 800/2017 da ANEEL, a qual passou a dispor:
Art. 53-F Na classe industrial enquadram-se as unidades consumidoras em que seja desenvolvida atividade industrial, conforme definido na Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE, assim como o transporte de matéria-prima, insumo ou produto resultante do seu processamento, caracterizado como atividade de suporte e sem fim econômico próprio, desde que realizado de forma integrada fisicamente à unidade consumidora industrial, ressalvados os casos previstos no inciso V do art. 53-J.
[...]
Art. 53-J Na classe rural, com fundamento na Lei nº 10.438, de 2002, no Decreto nº 62.724, de 1968 e no Decreto nº 7.891, de 2013, enquadram-se as unidades consumidoras que desenvolvam as atividades dispostas nas seguintes subclasses:
[...]
V - agroindustrial: indústrias de transformação ou beneficiamento de produtos advindos diretamente da agropecuária, mesmo que oriundos de outras propriedades, independentemente de sua localização, desde que a potência nominal total do transformador seja de até 112,5 kVA;
Recentemente entrou em vigor a Resolução nº 1000, de 07.12.2021, da ANEEL, que revogou as anteriores e assim dispôs:
Art. 174. A distribuidora deve classificar a unidade consumidora para fins de aplicação tarifária de acordo com a atividade comprovadamente exercida, a finalidade de utilização da energia elétrica e o atendimento aos critérios dispostos neste Capítulo e na legislação, em uma das seguintes classes tarifárias:
I - residencial;
II - industrial;
III - comércio, serviços e outras atividades;
IV - rural;
...
Art. 180. Deve ser classificada na classe industrial a unidade consumidora em que sejam desenvolvidas as seguintes atividades estabelecidas na Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE:
I - industrial; e
II - transporte de matéria-prima, insumo ou produto resultante do seu processamento, caracterizado como atividade de suporte e sem fim econômico próprio, desde que realizado de forma integrada fisicamente à unidade consumidora...
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