Acórdão nº 50029404620198210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50029404620198210026
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003103415
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002940-46.2019.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: Tratamento médico-hospitalar

RELATORA: Desembargadora ISABEL DIAS ALMEIDA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por UNIMED - COOPERATIVA DE SERVICOS DE SAUDE DOS VALES DO TAQUARI E RIO PARDO LTDA. contra a sentença (evento 27, SENT1) que, nos autos da ação de obrigação de fazer ajuizada por MARLI ELLERT KROTH., julgou a demanda nos seguintes termos:

ANTE O EXPOSTO, na forma do art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, julgo procedente o pedido contido na presente demanda cominatória de obrigação de fazer ajuizada por Marli Ellert Kroth em face da Cooperativa de Serviços de Saúde dos Vales do Taquari e Rio Pardo – UNIMED para condená-la ao fornecimento, em favor da autora, do medicamento Nolvadex D - inadmitida a substituição deste por genérico ou similar -, na quantidade indicada pelo médico, enquanto o tratamento for necessário, segundo prescrição médica, tornando definitiva a tutela de urgência concedida (evento 03, OUT2, páginas 29/32).

Arcará a requerida com o pagamento/reembolso da Taxa Única de Serviços Judiciais e das despesas processuais, bem como com o pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte autora, os quais fixo, considerando a natureza da demanda, o julgamento antecipado da lide, o grau de zelo e o trabalho desenvolvido pelo profissional, bem como o tempo de duração do processo, em R$2.000,00 (dois mil reais), nos termos do disposto pelo art. 85, §8°, do CPC. Os honorários deverão ser corrigidos pelo IGP-M desde a data da sentença, bem como acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, incidentes a partir do trânsito em julgado desta sentença.

A ré, apresenta recurso de apelação (evento 48, APELAÇÃO1), alegando que o rol de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar, previsto na Resolução Normativa nº 428/2017, não é meramente exemplificativo. Invoca a necessidade de aplicação do entendimento firmado no REsp n.º 1.733.013/PR do STJ, a respeito da taxatividade do referido rol. Sustenta a legitimidade da negativa de cobertura. Menciona que a Diretriz de Utilização n° 64 da Resolução Normativa nº 468/2017 da ANS oferece listagem com os medicamentos para terapia antineoplásica oral para tratamento do câncer, da qual consta o medicamento requerido, mas a obrigação de cobertura do genérico Citrato de Tamoxifeno, não de marca específica. Tece considerações sobre os pareceres emitidos pela junta médica da operadora, no sentido de que o fármaco genérico possui a mesma eficácia que aquele produzido pelo laboratório AstraZeneca, Nolvadex D. Refere que as amplitude das coberturas será definida pelas normas editadas pela ANS, nos termos do art. 10, §4º, da Lei nº 9.656/1998. Salienta que as disposições da ANS são de observância obrigatória pelas operadoras de planos de saúde. Conclui que não está obrigada, pela lei ou pelo contrato, a prestar cobertura assistencial além daquela devidamente regulamentada, em atenção ao artigo 5º, XXXVI, da CF e ao artigo 6º do Decreto-Lei 4.657/1942 (LINDB), sob pena de causar desequilíbrio econômico-financeiro, apto a culminar na impossibilidade de continuidade de prestação dos serviços médicos. Colaciona jurisprudência. Requer o provimento do recurso.

Apresentadas contrarrazões (evento 53, CONTRAZAP1), subiram os autos a esta Corte, vindo conclusos para julgamento.

Foram observados os dispositivos legais, considerando a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

O apelo é adequado, tempestivo e o recorrente comprova o recolhimento do preparo (evento 48, OUT2), razão pela qual passo ao seu enfrentamento.

Melhor delimitando o objeto da controvérsia, adoto o relato da sentença, vertido nos seguintes termos:

Marli Ellert Kroth ajuizou, em meio físico, a presente demanda cominatória de obrigação de fazer em face da Cooperativa de Serviços de Saúde dos Vales do Taquari e Rio Pardo – UNIMED afirmando ser beneficiária de plano de saúde firmado com a requerida. Relatou que fora diagnosticada como sendo portadora de Neoplasia de Mama, sendo o tratamento custeado pela requerida em razão da cobertura do aludido plano de saúde. Informou que, conquanto a demandada tenha fornecido regularmente o medicamento Nolvadex D, recentemente ela pretendeu fornecer à autora o medicamento Citrato de Tamoxifeno, sob a alegação de que se tratava do mesmo fármaco. Referiu que o seu médico assistente contestou a informação da cooperativa ré, informando que jamais havia sido autorizada a substituição do medicamento por sua fórmula genérica ou por similar. Sustentou que demandada pretendia, com tal conduta, impor aos médicos cooperados uma Proposta de Padronização de Uso de Medicamentos para Tratamento Oncológico Oral, o que aduziu não poder prevalecer sob pena de acarretar a limitação do direito de atuação do médico assistente. Colacionou precedentes jurisprudenciais que aventou ampararem a sua pretensão. Requereu, em sede de cognição sumária, que a ré fosse compelida a lhe fornecer o tratamento prescrito, disponibilizando-lhe o medicamento Nolvadex D, inadmitindo-se a substituição deste por genérico o similar. Ao final, postulou a procedência do pedido ao efeito de ser tornada definitiva a tutela de urgência. Requereu, ainda, a concessão da gratuidade de justiça. Instruiu a petição inicial com procuração e documentos (evento 03, INIC E DOCS1, páginas 21/35, e OUT2, páginas 01/28).

Recebida a petição inicial, foi concedida a gratuidade de justiça à autora e deferida tutela de urgência (evento 03, OUT2, páginas 29/32).

Citada (evento 03, OUT3, página 13), a requerida ofertou contestação (evento 03, OUT3, páginas 30/41, e OUT4, páginas 01/11). Narrou que, em razão da sistemática adotada por si no trato do fornecimento de fármacos desta espécie, encaminhou ao médico assistente da autora, Dr. Marcelo Dotto, um e-mail indagando a justificativa para que não houvesse a substituição do medicamento com nome comercial pelo seu correspondente genérico. Disse que, num primeiro momento, não houve resposta do médico ao seu questionamento e que, após a autora ter se negado a receber o medicamento genérico, o profissional justificou a impossibilidade de substituição no fato de o medicamento genérico apresentar altos índices de toxicidade. Aludiu ter encaminhado a justificativa ao seu setor de auditoria externa, o qual manteve o indeferimento do fornecimento do fármaco com marca específica, por entender que não foi apresentada qualquer demonstração técnica quanto à impossibilidade de sua intercambialidade. Informou que a lista de medicamentos padronizada foi elaborada pelos médicos cooperados, nos termos da legislação vigente, de modo a impedir a utilização de marca do medicamento na prescrição. Fez digressões acerca da Lei dos Planos de Saúde, referindo inexistir discussão acerca da cobertura para o fármaco solicitado pela autora, mas, tão somente, a utilização do seu formato genérico. Apontou as características do medicamento genérico, bem como as consequências e efeitos observados. Destarte, protestou pela improcedência do pedido. Anexou documentos (evento 03, OUT4, páginas 13/37, OUT5, páginas 01/36, OUT6, páginas 01/33, OUT7, páginas 02/43, OUT8, páginas 01/47, e OUT9, páginas 01/02).

Houve réplica (evento 03, OUT9, páginas 06/37).

A requerida noticiou a interposição de agravo de instrumento em face da decisão que concedeu a tutela de urgência (evento 26).

Houve réplica (evento 44).

Instadas as partes a declinarem o interesse na dilação probatória (evento 03, OUT10, páginas 10/11), a demandante postulou o encaminhado de solicitação ao médico Marcelo Luis Dotto para que encaminhasse laudo complementar ao Juízo (evento 03, OUT10, página 19), enquanto, a requerida, anexou documento e pretendeu a expedição de ofício à ANVISA (evento 03, OUT10, páginas 20/24).

Deferida a expedição de ofício à ANVISA (evento 03, OUT10, página 26).

A autora anexou laudo firmado pelo seu médico assistente (evento 03, OUT10, páginas 47/49).

Acostada a resposta ao ofício encaminhado à ANVISA (evento 03, OUT12, páginas 38/39), oportunizou-se a manifestação das litigantes (evento 03, OUT13, páginas 07/20 e 08/22).

Os autos do processo físico foram digitalizados e implantados no Sistema E-proc (evento 04).

Foi indeferida a prova pericial requerida pela demandada (evento 20).

Veio a ação conclusa para sentença.

É o relatório.

Sobreveio sentença de procedência, razão da interposição dos recursos por ambas as partes.

A controvérsia recursal diz com o dever de cobertura fornecimento do medicamento Nolvadex D (Citrato de Tamoxifeno), recomendado pelo médico assistente da parte beneficiária do plano de saúde, em detrimento do genérico oferecido pela operadora.

De plano, observo que os contratos de planos de saúde estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos do artigo 35 da Lei 9.656/98, pois envolvem típica relação de consumo. Aliás, este é o entendimento da Súmula 608 do STJ1.

Assim, incide, na espécie, o artigo 47 do CDC, que determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor.

No caso em análise, resta incontroversa a contratação do plano de saúde, bem como o diagnóstico de Neoplasia de Mama (CID C50), razão da prescrição de tratamento com Nolvadex D (Citrato de Tamoxifeno), fornecido especificamente pelo laboratório AstraZeneca, na dosagem de 20 mg, 30 comprimidos, o fornecimento do medicamento pela operadora desde 2015 e a substituição abrupta do mesmo por fármaco genérico por deliberação da ré em 2021.

As alegações das partes e a farta prova produzida permitem esse...

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