Acórdão nº 50029713320228210003 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 24-02-2023

Data de Julgamento24 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50029713320228210003
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002949476
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5002971-33.2022.8.21.0003/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002971-33.2022.8.21.0003/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATOR: Desembargador JONI VICTORIA SIMOES

RELATÓRIO

O Ministério Público, na Comarca de Alvorada, ofereceu denúncia contra J. C. S. D. C., já qualificado nos autos, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 217-A, caput, do Código Penal, pelo seguinte fato:

"Em data não suficientemente esclarecida nos autos, mas no período compreendido entre o ano de 2018 e o dia 14 de setembro de 2019, na Rua (...), em Alvorada, por diversas ocasiões, o denunciado J.C.S.D.C. praticou ato libidinoso diverso da conjunção carnal com a vítima T.T.V., menor de 14 (catorze) anos.

Na ocasião, com o fim de satisfazer sua lascívia, o denunciado passou as mãos da vagina da vítima T. T. V., em diversas oportunidades.".

Foi decretada a prisão preventiva do réu, sendo o respectivo mandado cumprido no dia 27/10/2021.

A denúncia foi recebida, em 17/02/2022.

Citado, o acusado apresentou resposta à acusação, por intermédio da Defensoria Pública.

Concedida a liberdade provisória ao inculpado, no dia 10/05/2022.

Não sendo caso de absolvição sumária, seguiu-se à instrução processual, com a oitiva da vítima, uma testemunha e, ao final, interrogado o réu.

Encerrada a instrução, as partes ofereceram memoriais escritos.

Sobreveio sentença, julgando PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação penal, para condenar o réu J. C. S. D. C. por incursão nas sansões do artigo 217-A, caput, c/c o 14, inciso II, e 71, caput, todos do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 06 anos e 08 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto. Mantidas as medidas cautelares fixadas em desfavor do acusado. O agente foi condenado, ainda, ao pagamento de metade das custas processuais, cuja exigibilidade restou suspensa.

Publicada a sentença, em 16/08/2022.

O acusado foi pessoalmente intimado acerca da sentença.

Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, o qual foi recebido.

Nas suas razões, postula a absolvição do acusado, por insuficiência probatória. Sustenta que não ficou demonstrado nos autos, através das provas colhidas em juízo, a prática de estupro de vulnerável pelo réu, restando dúvida sobre o fato. Subsidiariamente, pugna pela desclassificação do delito para o crime previsto no artigo 215-A do Código Penal, argumentando, quanto ao tópico, que a conduta descrita na denúncia não foi praticada mediante violência ou grave ameaça, bem como não foi evidenciada lascividade acentuada. Finalmente, requer (I) a redução da pena-base para o mínimo legal, (II) a incidência da atenuante da menoridade em patamar aquém do mínimo legal, (III) a aplicação da tentativa em grau máximo e (IV) a valoração mínima da continuidade delitiva.

Apresentadas contrarrazões.

Os autos foram remetidos ao Tribunal de Justiça e distribuídos a esta Relatoria.

O Ministério Público, em parecer da lavra do Procurador de Justiça, Dr. José Pedro M. Keunecke, opinou pelo improvimento do recurso.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.

Adianto que não prospera a pretensão defensiva absolutória.

A materialidade do crime de estupro de vulnerável restou demonstrada por meio do registro de ocorrência policial, da avaliação psíquica realizada com a vítima (evento 16, OUT1, evento 88, LAUDO2), da qualificação da ofendida, no boletim de ocorrência, indicando que, à época do fato, esta contava com 12 anos de idade, bem como da prova oral colhida.

A autoria do delito, por sua vez, é indubitável e se encontra respaldada, principalmente, pela firme palavra da ofendida.

Com o intuito de melhor elucidar o caso em tela, transcrevo a síntese dos elementos de prova produzidos ao longo da instrução, realizada na sentença vergastada:

"(...)

1. Do interrogatório.

O réu J. C. S. C., em seu interrogatório, declarou: convivia com a família, mas não praticou o fato. Questionado pelo Ministério Público, respondeu: frequentava a casa do pai da vítima - jogavam vídeo game juntos; as crianças costumavam estar pela casa; também frequentava a casa do avó; não teve desavença com a vítima; não conheceu os motivos que a levaram a acusá-lo. Questionado pela defesa, respondeu: costumava beber com a mãe de H. - A. L. - na casa em frente da de T.; na casa de T. ia para jogar vídeo game; não ficava sozinho com ela; acreditou que a genitora da vítima não tivesse motivos para prejudicá-lo.

2. Da prova oral.

A vítima T. T. V., em juízo, declarou: quando tinha oito ou nove anos o réu passava a mão em suas pernas e partes íntimas; os abusos foram ficando mais frequentes; ocorriam nas três residências da família; na casa do seu pai, ocorriam com menos frequência; ele visitava bastante as três casas; recordou-se de uma vez em que brincava com sua tia; ele pegou ela no colo e a levou para um canto; depois pegou a vítima e passou a mão na sua perna, coxa e bunda; em outra ocasião, estava tomando banho na casa do seu pai; quando saiu do banheiro, o réu disse que a viu pelada; outra vez, cochilava e o réu passava a mão em si; dormia no quarto da sua mãe sem porta; "eu tava meio que dormindo e ele passou a mão em mim", nas pernas e na bunda; seu pai estava na cozinha preparando alimentos para as crianças; quando ficou mais velha - 12 ou 13 anos - ele passava a mão nas suas pernas, bunda e genitálias; não colocou as mãos dentro de suas vestes; quando acordava, pedia para que ele saísse; contou para um ex-melhor amigo; o acusado também abusava de sua tia C.; não se sentiu bem para contar os fatos detalhadamente para sua mãe. Questionada pelo Ministério Público, respondeu: sofria abusos desde os 7 ou 8 anos; quando ficou mais velha - 12 ou 13 anos - ele praticou abusos novamente; os fatos ocorriam muitas vezes; mais vezes na casa do seu avô e quando estava dormindo; acordava, o réu fingia que não estava fazendo nada e ia embora; ele nunca falava nada; nos 7 ou 8 anos, ele passava a mão na bunda e na perna; com 12 a 13, passava a mão na bunda, na perna e nas partes íntimas; se estava de saia, passava por baixo das vestes; acordava assustava, o réu dissimulava e ia embora; a casa do seu avô era localizado na frente da do seu pai; a dos fundos era do seu tio; todas ficavam no mesmo pátio; os abusos ocorreram na casa do seu avô e do seu pai; posteriormente, mudou-se para a casa da sua mãe; seu avô acordava muito cedo; o réu comparecia afirmando querer ver os cachorros; na casa da sua mãe, não ocorreram, mas ele foi até o seu quarto para vê-la dormindo; ele foi até a casa da sua mãe, "só porque meu irmão abria a porta"; todavia, sua mãe acordava e o réu ia embora; a mãe reprimia seu irmão para que não abrisse a porta; seu irmão tinha 7 ou 8 anos; em uma ocasião, quando tinha 9 anos, seu pai estava dormindo, foi para o quarto; o acusado a agarrou e tentou colocá-la no colo; pegou um banco e o acertou no rosto; o genitor estava dormindo; ninguém presenciou o fato; foi realizado registro de ocorrência em razão de outras duas crianças de sua família que teriam sido abusadas pelo acusado; contou sobre os fatos em razão de questionamentos; temia que seu pai ficasse brabo consigo; pensava que tivesse culpa. Questionada pela defesa, respondeu: costumava brincar com sua tia; posteriormente, descobriu que ele também abusada dela; J. era amigo da família; ele ia seguidamente na residência dos familiares; sempre existiam pessoas nas casas, mas não no mesmo cômodo; ele nunca tirou suas vestes, mas colocou sua calcinha para o lado.

C. P. V., genitora da vítima, ouvida em juízo, disse: estava brincando com suas sobrinhas que comentaram que o réu dava dinheiro para "mexer na pererequinha delas, pra passar a mão nas partes delas"; questinou-as; sua filha confirmou os fatos e que ele também fazia isso com ela e sua cunhada; por essa razão, registrou a ocorrência. Questionada pelo Ministério Público, respondeu: os abusos ocorriam em razão do acesso livre à residência do pai; a única coisa que a vítima contou sobre os fatos é que os abusos também aconteciam consigo; não participou do depoimento dela em sede policial; perguntou a ela se teria ocorrido penetração; ela negou e disse que quando ela acordava ele mexia nela; a casa do avô ficava no mesmo pátio; o avô tem diabetes e não enxerga; ela nunca havia relatado fato semelhante antes; ela não foi ameaçada; acreditou que ela tenha contado, pois a depoente levantou dúvidas sobre o relato das sobrinhas; a vítima não realizou tratamentos psicológicos; os médicos disseram ser desnecessário; depois da ocorrência, o acusado passou por sua residência várias vezes com "ar de deboche"; ele parou de frequentar as casas dos familiares. Questionada pela defesa, respondeu: antes dos relatos, não suspeitou da conduta do acusado.

(...)." - Grifei.

Compulsando os autos, verifica-se que o conjunto probatório produzido, ao longo da persecução penal, mostra-se suficiente para fornecer a segurança necessária acerca da ocorrência do crime, tal como de sua autoria.

A vítima, tanto na seara policial, quanto em juízo, narrou, detalhadamente, a ocorrência do fato, apontando, em todas as oportunidades em que inquirida, a autoria delitiva ao inculpado. Disse que, quando contava com 07 ou 08 anos de idade, o réu, que era amigo de sua família e frequentava sua residência, costumava encostar as mãos em suas pernas e nádegas. Transcorridos alguns anos, quando já tinha, aproximadamente, 12 anos, ele começou a passar as mãos também em sua vagina, sempre que se encontravam sozinhos em algum cômodo - o que teria ocorrido por diversas vezes, ao...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT