Acórdão nº 50029814320198210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 05-05-2022

Data de Julgamento05 Maio 2022
ÓrgãoOitava Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50029814320198210016
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001489280
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002981-43.2019.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Alimentos

RELATOR: Desembargador RUI PORTANOVA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de ação de alimentos avoengos ajuizada por ANA LAURA e BRENDA, ambas menores e representadas por sua genitora MONICA, em face de sua avó paterna ANELY.

Na inicial, as autoras ANA LAURA e BRENDA requereram a fixação de alimentos no valor de 30% do benefício do INSS recebido pela avó paterna.

Foram fixados alimentos provisórios no valor de 20% do benefício de pensão por morte recebido pela avó paterna, sendo 10% para cada uma das alimentadas (benefício = R$3.878,56, 20% = R$775,71) (Evento 3 ,OUT - INST PROC6, fl. 08 dos autos de origem).

Em contestação, a demandada requereu a improcedência do pedido (Evento 3, CONT E DOCS4, fls. 01/06 dos autos de origem).

A sentença julgou parcialmente procedente o pedido e fixou alimentos em 20% do benefício de pensão por morte recebido pela avó paterna, sendo 10% para cada uma das alimentadas (Evento 3, SENT7, fls. 01/05 dos autos de origem).

Recorreu a alimentante/avó paterna (Evento 3, APELAÇÃO8 dos autos de origem).

Requereu a redução da verba para 30% do salário mínimo.

Vieram contrarrazões (Evento 3, CONTRAZ9 dos autos de origem).

O Ministério Público com atuação neste grau de jurisdição opinou pelo conhecimento e provimento do recurso (Evento 7).

É o relatório.

VOTO

Alimentos avoengos.

A obrigação alimentar dos avós tem natureza complementar e subsidiária, somente se configurando no caso de impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais.

Em acréscimo aos termos da lei, vale transcrever os termos da Súmula 596 do Superior Tribunal de Justiça sobre alimentos avoengos: A obrigação alimentar dos avós tem natureza complementar e subsidiária, somente se configurando no caso de impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais.

Ou seja, tratando-se de obrigação subsidiária, imprescindível restar provado nos autos que os genitores - pai e mãe, ou apenas a mãe, ou apenas o pai - não dispõem dos meios necessários a suprir as necessidades do filho.

Assim, antes de discorrer acerca das possibilidades - ou não - da avó paterna alcançar alimentos à suas netas ANA LAURA e BRENDA, importa restar provado, primeiro, a impossibilidade do genitor das alimentadas suportar, na íntegra, as necessidades de suas filhas.

Possibilidades do genitor.

Foi ajuizada ação de execução de alimentos para pagamento de débito alimentar pelo genitor (Evento 3, INIC E DOCS2, fls. 15/16 dos autos de origem).

Decretada a prisão civil do genitor, esta foi efetuada (mandado de prisão e certidão anexadas no Evento 3, INIC E DOCS2, fls. 17 e 18 dos autos de origem).

Expedido o alvará de soltura, em virtude de de ter expirado o prazo da prisão civil, o genitor foi intimado para realizar o pagamento do débito alimentar (Evento 3, OUT - INST PROC3, fl. 01 e 03 dos autos de origem).

A certidão datada de maio/2016 trouxe a informação de que o réu não trabalhava mais no endereço indicado, sendo desconhecido o seu endereço atual (Evento 3, OUT - INST PROC3, fl. 04 dos autos de origem).

Novamente, em novembro/2017, a oficiala de justiça informou que se deslocou até o último endereço fornecido, e lá não obteve informações sobre o executado, sequer encontrou a numeração da casa (certidão acostada no Evento 3, OUT - INST PROC3, fl. 06 dos autos de origem).

A certidão datada de junho/2018 trouxe a informação de que a esposa do executado mencionou que ele estava trabalhando na cidade de Crissiuma/SC (Evento 3, OUT - INST PROC3, fl. 07 dos autos de origem).

A partir de então, o executado não foi mais encontrado, estando em lugar incerto e não sabido.

Portanto, comprovada a ausência de assistência do genitor em face das alimentadas ANA LAURA e BRENDA, cabível a fixação de alimentos em face da avó paterna ANELY.

Vamos ao caso.

O CASO.

As autoras ANA LAURA e BRENDA ingressaram com a presente ação de alimentos, requerendo a obrigação alimentar no valor de 30% do benefício do INSS recebido pela avó paterna.

Em contestação, a demandada/avó paterna informou ter sido diagnosticada com câncer, o que consequentemente, fez com que as suas despesas aumentassem com a compra de medicamentos e gastos hospitalares. Juntou exames e laudos médicos (Evento 3, CONT E DOCS4, fls. 11/12 dos autos de origem).

Foram fixados alimentos no patamar de 20% do benefício do INSS recebido pela avó paterna (10% para cada uma das alimentadas).

Inconformada com a decisão, a avó/alimentante apelou.

Em suas razões, repetiu que foi diagnosticada com câncer e está realizando tratamento.

Mencionou possuir empréstimos consignados, sendo os mesmos descontados da fonte pagadora, restando apenas o valor líquido de R$1.000,00, antes do desconto dos alimentos. Não juntou provas.

Pediu a redução da verba alimentar para 30% do salário mínimo.

Costuma-se dizer que a obrigação alimentar deve ser estabelecida em observância ao binômio alimentar necessidades-possibilidades.

Contudo, vale a pena ter em conta que o §1º do Artigo 1694 do Código Civil diz que "Os alimentos de devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamente e dos recursos da pessoa obrigada".

Logo, em tese, para fixação do valor dos alimentos, para além da análise das necessidades e das possibilidades, é de rigor, uma terceira análise, qual seja, um juízo de proporcionalidade entre necessidade e possibilidade.

É um essencial juízo de proporcionalidade que vai fundamentar o percentual do encargo deve ser suficiente a suportar as necessidades do alimentado, e ser possível de ser alcançado sopesando as possibilidades financeiras do alimentante.

Vale começar pelas necessidades das alimentadas.

Necessidades das alimentadas.

As alimentadas ANA LAURA e BRENDA nasceram, respectivamente, em 01/06/2006 e 15/10/2007, contando hoje com 15 e 14 anos de idade (certidões de nascimentos anexados no Evento 3, INIC E DOCS2, fls. 12 e 13 dos autos de origem).

Suas necessidades são as ordinárias de duas adolescentes em idade escolar.

Não foram apresentadas despesas especiais que demandem gastos extraordinários.

Possibilidades da alimentante/avó paterna.

A avó paterna ANELY recebe pensão por morte do INSS, no valor de R$3.878,56 (informação fornecida pelo INSS anexo no Evento 3, OUT - INST PROC6, fl. 03 dos autos de origem).

Disse que possui inúmeras despesas médicas, hospitalares e medicamentosas, em razão de ter sido diagnosticada com câncer. Juntou laudos e exames médicos para comprovar a doença (Evento 3, CONT E DOCS4, fls. 11/12 dos autos de origem).

Juntou, também, carta de notificação de registro no SPC (serviço de proteção ao crédito) de abril/2019 - Evento 3, CONT E DOCS4, fl. 14 dos autos de origem.

Do parecer do Ministério Público.

O Ministério Público com atuação neste grau de jurisdição opinou pelo provimento do recurso:

ANELY ODETE W. P. postula, por meio do presente recurso, a reforma da sentença prolatada, para o efeito de afastar sua condenação ao pagamento de alimentos às netas ANA LAURA D. P. e BRENDA D. P. na ordem de 20% de seu benefício previdenciário, aduzindo, em suma, a impossibilidade de suportar o quantum estabelecido pelo Juízo a quo, sem prejuízo do próprio sustento, haja vista auferir parcos rendimentos a título de pensão por morte do INSS, os quais estão comprometidos com as diversas despesas com dívidas de empréstimos consignados, além de médicos, hospitais e tratamentos, considerando ter sido diagnosticada com câncer, situação que sobrecarregou seu orçamento mensal. Assevera, ainda, a capacidade contributiva de seu filho, genitor das meninas, em arcar com a verba alimentar, pois possui emprego registrado, o que reforça a necessidade de ser eximida da obrigação alimentícia, que é subsidiária e complementar à dos pais.

A inconformidade vertida no presente apelo merece prosperar.

O pleito recursal encontra amparo nas regras insculpidas nos artigos 1.696 e 1.698 do Código Civil, que assim dispõem:

Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

Art. 1698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todos devem concorrer na proporção de seus respectivos recursos e, intentada a ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.

Da análise dos dispositivos supratranscritos, extraise, conforme entendimento de há muito sedimentado na jurisprudência, ser a obrigação alimentar avoenga de natureza subsidiária e complementar, decorrente do dever genérico de assistência entre parentes (solidariedade familiar) – e não no dever de sustento derivado do poder familiar –, sendo, por isso, condicionada à verificação da impossibilidade de os genitores adimplirem o encargo.

Com efeito, diversamente da pensão alimentícia prestada pelos pais, somente se justifica imputar a responsabilidade aos avós quando comprovado não disporem ambos os genitores – devedores originais – de condições financeiras para arcar com o sustento e a manutenção dos filhos, considerada a subsidiariedade da obrigação avoenga, devendo, ainda, ser demonstrado que o sustento dos netos não possuirá o condão de dificultar ou prejudicar a sobrevivência e sustento dos avós.

Desta forma, recaindo sobre o pai e a mãe o dever de sustentar ou auxiliar no sustento da prole, na eventualidade de um deles estar impossibilitado de atender à...

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