Acórdão nº 50032669520218210006 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 14-04-2022
Data de Julgamento | 14 Abril 2022 |
Órgão | Terceira Câmara Cível |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50032669520218210006 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001827393
3ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5003266-95.2021.8.21.0006/RS
TIPO DE AÇÃO: Reajustes de Remuneração, Proventos ou Pensão
RELATOR: Desembargador LEONEL PIRES OHLWEILER
APELANTE: IONE MARIA SANMARTIN CARLOS (EXEQUENTE)
APELADO: MUNICÍPIO DE CACHOEIRA DO SUL (EXECUTADO)
RELATÓRIO
Vistos.
Trata-se de apelação interposta por IONE MARIA SANMARTIN CARLOS contra sentença que julgou procedente a impugnação ao cumprimento de sentença e julgou extinto, em razão da inexistência da incidência do piso nacional do magistério no caso da apelante, o cumprimento de sentença movido em desfavor do MUNICÍPIO DE CACHOEIRA DO SUL, nos seguintes termos:
Diante do exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do CPC, julgo procedente a impugnação ao cumprimento de sentença aforada por MUNICÍPIO DE CACHOEIRA DO SUL em desfavor de IONE MARIA SANMARTIN CARLOS, para reconhecer a inexistência da incidência do piso nacional do magistério no caso da impugnada, julgando extinto, por consequência, o cumprimento de sentença nº 5003266-95.2021.8.21.0006.
Condeno a impugnada ao pagamento de eventuais custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 800,00 (oitocentos reais), diante da questão posta em juízo e do trabalho realizado, na forma do art. 85, § 3º, inciso I, do CPC. Suspensa a exigibilidade em face da gratuidade da justiça.
Registre-se. Publique-se. Intimem-se.
Em razões recursais, a parte apelante narra que mesmo tendo prestado concurso para atuar no magistério, foi desviada de função pelo gestor municipal, que segundo suas necessidades, retirou-a da sala de aula, alocando-a em outros setores. Assevera que prestou concurso para professor e como tal não pode ser penalizado por culpa do gestor que o desvia de função. Menciona acerca da sentença proferida no feito coletivo em discussão e do acordo firmado entre as partes, afirmando que foi determinado que o executado pagasse o piso nacional do magistério à totalidade dos substituídos, sem fazer qualquer restrição de forma a prejudicar os desviados de função. Refere acerca dos efeitos da coisa julgada, uma vez que a sentença estende a todos os substituídos o direito ao piso nacional do magistério sem fazer qualquer exclusão. Requer o provimento do apelo.
Foram apresentadas contrarrazões, afirmando que o artigo 2º § 2º da Lei 11.738/08 limita o direito ao piso somente aos profissionais que atuam naquelas atividades ali especificadas, resultando que, comprovadamente a recorrente esteve afastada destas funções durante todo período de aplicabilidade da Lei 11.738/08, revelando que não tem direito as diferenças pleiteadas naqueles interregnos. Requer o desprovimento do recurso.
Subiram os autos, e, neste grau, o Ministério Público, por meio do parecer lançado pelo Procurador de Justiça Eduardo Roth Dalcin, manifestou-se pelo desprovimento do apelo.
É o relatório.
VOTO
I – PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE.
O apelo é tempestivo e está isento de preparo em virtude de concessão de AJG. Presentes os demais pressupostos, conheço do recurso.
II – MÉRITO.
A Administração Pública submete-se à legalidade (art. 37, caput, da CF), constituindo-se parâmetro normativo importante para salvaguardar o Estado de Direito. Sobre a importância da legalidade, refere Celso Antônio Bandeira de Mello:
“Este é o princípio capital para a configuração do regime jurídico-administrativo. Justifica-se, pois, que seja tratado – como o será – com alguma extensão e detença. Com efeito, enquanto o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é da essência de qualquer Estado, de qualquer sociedade juridicamente organizada com fins políticos, o da legalidade é específico do Estado de Direito, é justamente aquele que o qualifica e que lhe dá a identidade própria. Por isso mesmo é o princípio basilar do regime jurídico-administrativo, já que o Direito Administrativo (pelo menos aquilo que como tal se concebe) nasce com o Estado de Direito: é uma conseqüência dele. É o fruto da submissão do Estado à lei. É, em suma: a consagração da ideia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei.”[1]
Diante de tal compreensão, impõe-se o exame da legislação que rege a matéria.
A Previsão Normativa do Piso Salarial do Magistério
A Constituição Federal, no capítulo correspondente à educação, dispõe que:
Art. 206 – O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
...
VIII – piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
O artigo 60, inciso III, letra “e”, do ADCT igualmente prevê:
Art. 60. Até o 14º (décimo quarto) ano a partir da promulgação desta Emenda Constitucional, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios destinarão parte dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento da educação básica e à remuneração condigna dos trabalhadores da educação, respeitadas as seguintes disposições:
...
III - observadas as garantias estabelecidas nos incisos I, II, III e IV do caput do art. 208 da Constituição Federal e as metas de universalização da educação básica estabelecidas no Plano Nacional de Educação, a lei disporá sobre:
...
e) prazo para fixar, em lei específica, piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica;
A Lei Federal nº 11.738/2008, que regulamentou o piso salarial nacional dos profissionais do magistério público da educação básica, referido pela alínea “e” do inciso III do caput do art. 60 do ADCT, assim os define:
“Art. 1º Esta Lei regulamenta o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica a que se refere a alínea “e” do inciso III do caput do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Art. 2º O piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica será de R$ 950,00 (novecentos e cinqüenta reais) mensais, para a formação em nível médio, na modalidade Normal, prevista no art. 62 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
§ 1º O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais.
§ 2º Por profissionais do magistério público da educação básica entendem-se aqueles que desempenham as atividades de docência ou as de suporte pedagógico à docência, isto é, direção ou administração, planejamento, inspeção, supervisão, orientação e coordenação educacionais, exercidas no âmbito das unidades escolares de educação básica, em suas diversas etapas e modalidades, com a formação mínima determinada pela legislação federal de diretrizes e bases da educação nacional.
A Situação Concreta dos Autos
Conforme se denota dos autos, a apelante é servidora pública municipal aposentada, nomeada para o cargo de Professora (Evento 10 – CALC2) e pretende receber as diferenças salariais pelo não pagamento do piso nacional do magistério, inclusive no período em desvio de função (fora da sala de aula).
No caso, o presente cumprimento individual de sentença é oriundo da ação civil pública ajuizada pelo Sindicato dos Professores Municipais de Cachoeira do Sul - SIPROM em face do Município de Cachoeira do Sul (nº 006/11300035814), que foi julgada procedente o pedido, nos seguintes termos:
Diante do exposto, fulcro no art. 487, I, do NCPC, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na Ação Coletiva promovida por SINDICATO DOS PROFESSORES MUNICIPAIS DE CACHOEIRA DO SUL - SIPROM em face do MUNIÍPIO DE CACHOEIRA DO SUL, para:
a) determinar que o réu implemente na folha de pagamento dos substituídos os valores referentes ao piso nacional, devidamente atualizados na forma estabelecida na Lei n. 11.738/08, desde 27/04/2011, observada a carga horária e com os reflexos sobre nível, classe e demais vantagens calculadas sobre o salário-base; e
b) condenar o requerido ao pagamento das diferenças entre o que os substituídos perceberam e o valor que deveriam ter recebido se tivesse sido obedecido o piso nacional desde 27/04/2011, corrigidas monetariamente pelo IGP-M a partir do vencimento de cada parcela, e acrescidas de juros legais de 12% ao ano desde a citação e de acordo com o art. 1º-F, da Lei 9.494/97 (somente quanto à correção monetária).
A parte autora propôs cumprimento individual de sentença, requerendo o pagamento da quantia de R$ 9.909,77, ocasião em que o Município apresentou impugnação ao cumprimento de sentença, alegando que a parte apelante não estava abrangida pelas normas da Lei nº 11738/08 no período do ano de 2011 até a sua aposentadoria.
Analisando a documentação da parte apelante, verifica-se que a servidora...
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