Acórdão nº 50032971920188210072 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 07-07-2022

Data de Julgamento07 Julho 2022
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50032971920188210072
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001985189
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5003297-19.2018.8.21.0072/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATOR: Desembargador MANUEL JOSE MARTINEZ LUCAS

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR) E OUTRO

RELATÓRIO

Na Comarca de Torres, L. E. da S., alcunha "Negro", 48 anos à época dos fatos, foi denunciado como incurso nas sanções do art. 121, incisos III e IV, combinado com o art. 14, inciso II, e o art. 250, caput, todos combinados com o art. 61, inciso II, alínea "e", na forma do art. 69, caput, todos do Código Penal.

A peça acusatória, recebida em 06/08/2018 (p. 12, contida no evento 3 - PROCJUDIC2 da ação penal), é do seguinte teor:

“1º FATO

No dia 22 de maio de 2018, por volta das 22h, na Rua Domingos Felisberto Magnus, nº 1000, em Torres/RS, o denunciado LUIS EDUARDO DA SILVA causou incêndio da residência pertencente a JOSÉ ELEODORO DA SILVA, expondo o perigo de vida, a integridade física e o patrimônio da vítima.

Na ocasião, o denunciado, que residia no mesmo pátio da vítima, dirigiu-se até sua mãe pedindo comida, momento em que avistou o ofendido e passou a dizer que este tinha ido até a Polícia "lhe entregar". Diante da negativa da vítima acerca da presunção feita pelo acusado, este ateou fogo na residência que estava construindo para si no pátio de propriedade da vítima, causando incêndio do qual restou em parcial destruição do bem, conforme levantamento fotográfico das fls. 13/16.

2° FATO

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, o denunciado LUIS EDUARDO DA SILVA tentou matar seu ascendente JOSÉ ELEODORO DA SILVA, empregando meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima, somente não consumando o delito por circunstâncias alheias a sua vontade.

Na ocasião, após a ocorrência do 1º fato delituoso, o denunciado retornou à residência da vítima e atacou esta pelas costas, desferindo-lhe diversos chutes, socos e aplicando um golpe de "gravata", no intuito de asfixiá-lo, ocasião em que os familiares interviram.

O delito apenas não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do denunciado, qual seja, o fato de a vítima ter sido prontamente socorrida por familiares.

O crime foi praticado mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, uma vez que o denunciado atacou a vítima de inopino, agarrando-a pelas costas, além do fato de se tratar de pessoa idosa, aproveitando-se da situação de vulnerabilidade do ofendido, pessoa que possui limitações físicas por conta da idade.

O denunciado empregou o meio cruel, pois, além de desferir diversos chutes e socos contra a vítima, ainda aplicou-lhe lum golpe de "gravata", de forma a causar-lhe asfixia por sufocação.

Ainda, o delito foi praticado contra a vítima maior de 60 (sessenta) anos."

Instruído o processo, sobreveio decisão (p. 37/50, contidas no evento 3 - PROCJUDIC5 da ação penal), prolatada em 24/10/2019, julgando procedente a ação penal para PRONUNCIAR o réu L. E. da S. como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos III e IV, na forma do art. 14, inciso II, e do art. 250, caput, combinado com o art. 61, inciso II, alínea "e", na forma do art. 69, caput, todos do Código Penal, para que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri.

Realizado o julgamento pelo Tribunal do Júri, o magistrado declarou CONDENADO o réu L. E. da S. como incurso nas sanções do art. 129, caput, e do art. 250, caput, combinado com o art. 61, inciso III, alínea "e" e "h", na forma do art. 69, caput, todos do Código Penal, à pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 05 (cinco) meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por 02 (duas) penas restritivas de direitos (prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 01 salário mínimo), e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato.

Irresignados com a decisão, a defesa (p. 15, contida no evento 3 - PROCJUDIC9 da ação penal) e o Ministério Público (p. 12, contida no evento 3 - PROCJUDIC9 da ação penal) interpuseram recursos de apelação.

Em suas razões (p. 18/27, contidas no evento 3 - PROCJUDIC9 da ação penal), o representante do Parquet requereu a retificação da conduta imputada para a transgressão prevista no art. 129, § 9º, do Código Penal e a exasperação da pena-base, sustentando que as circunstâncias são amplamente desfavoráveis ao réu. Por fim, postulou o afastamento da substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos e a fixação do regime semiaberto para o cumprimento inicial da pena em virtude do concurso material e da unificação das penas.

A defesa (p. 42/50, contidas no evento 3 - PROCJUDIC9 e p. 1/7, contidas no evento 3 - PROCJUDIC10 da ação penal), por sua vez, requereu a absolvição do recorrente, com fundamento no art. 386, incisos II, III ou VII, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, não sendo o entendimento desta Câmara, postulou a desclassificação da conduta imputada para o delito previsto no art. 163, parágrafo único, inciso II, do Código Penal e a redução da exasperação da pena pelas agravantes dispostas no art. 61, inciso II, alíneas "e" e "h" em relação ao 2º fato. Por fim, pugnou pelo redimensionamento da pena-base ao mínimo legal em relação ao 1º fato descrito na peça acusatória e alteração da pena de multa ao mínimo legal, pois se trata de pessoa hipossuficiente.

Foram apresentadas contrarrazões pela defesa (p. 28/40, contidas no evento 3 - PROCJUDIC9 da ação penal) e pelo Ministério Público (p. 10/11, contidas no evento 3 - PROCJUDIC10 da ação penal).

Nesta instância, o parecer do Procurador de Justiça Carlos Eduardo Vieira da Cunha foi para negar provimento ao recurso defensivo e dar provimento ao recurso ministerial (evento 8 da apelação).

É o relatório.

VOTO

O recurso interposto é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razões pelas quais é conhecido.

Inexistindo teses preliminares, passo ao exame do mérito.

DO DELITO DE LESÃO COORAL

O conjunto probatório foi contundente em esclarecer que o acusado, de fato, tentou estrangular a vítima (seu genitor), após terem discutido previamente.

O ofendido, em audiência, relatou (Evento 3, PROCJUDIC7 - p. 33):

"(...)

Vítima: Ele chegou em casa né? Já bebado (sic) e drogado né? Cachaça e droga, passou subiu pra cima, pra casinha dele assim, aí ele "vorto" de novo, aí ele "vorto" e olhou para casa da minha filha, chegou la (sic) em casa e pediu comida, pra mãe, aí a "mulhé" fez, aí ele pego (sic) "vorto" de novo, eu sei como ele é, "vorto" de novo, ele "vorto" de novo e andou por ali, e ia por dentro da casa da minha filha, porque lá em casa é assim, passa tudo por dentro a rua entendeu? É tudo em um terreno só, passa uma rua pela minha, pela da minha filha e pela dele, aí quando eu fiquei até as dez hora (sic) na rua, cuidando, porque eu sei como ele é né? Quando eu vi ele "tocou-lhe" fogo na casa, "tocou-lhe" fogo na casa e eu saí correndo, eu saí correndo para cortar a luz, que o fogo veio para luz, aí quando eu cheguei la (sic) em cima aí eu fui pra ligar pros bombeiros, foi quando ele me deu um cutucão por trás, não sei como foi, aí uma gravata no pescoço, e foi torcendo o pescoço, torcendo torcendo, e eu "Ah, me mata agora", aí veio o meu neto e o meu genro, tiraram, mas custaram a tirar, tiraram e eu saí torto, pescoço todo duro, aí veio o bombeiro e apagaram o resto do fogo né? Mas se "nois" não tivesse cortado a luz tinha passado pras outras casas, e aí tem outra que ele fez também, faz 21 anos, foi lá em Florianópolis, (inaudível) lá dentro, aí depois foi na casa de uma mulher que ele vivia também, a mulher até já morreu, ele cortou um bujão, e botou fogo também e a casa ficou em cinza, queimou tudo, ele é queimador de casa, muito perigoso, é meu filho mas é perigoso, agora tenho medo.

(...)"

O informante Marino Alves Besi, na fase judicial (Evento 3, PROCJUDIC7 - p. 39/41), informou:

"(...)

MP: E o senhor viu no local se a vítima e o acusado brigavam?

Informante: Eles estavam discutindo quando eu cheguei né?

MP: Estavam discutindo?

Informante: Aham.

MP: Mas o senhor interveio para separar a briga depois?

Informante: Aham, com certeza, com a idade do meu sogro né?

MP: O senhor já teve algum problema com o acusado?

Informante: Nunca tive problema com ele.

MP: Essa assinatura é sua aqui na folha 11?

Informante: É.

MP: O senhor pode confirmar por favor?

Informante: Essa aqui é minha mesmo.

MP: Quando o senhor foi ouvido o senhor disse o seguinte: Que a cena que recorda em ter visto quando foi separar a briga seria o acusado gravateando a vítima, e seu filho Moisés teve que auxiliar para separar a briga.

Informante: É, foi isso aí, mais ou menos dessa maneira.

MP: Então o senhor se recorda disso?

Informante: É o que eu digo para ti, eu fui la para separar a briga, eu não separei a briga deles.

MP: Ta (sic) mas o senhor se recorda de ter visto o acusado gravateando a vítima?

Informante: É, eu vi ali eles tavam (sic) brigando né? Eles tavam (sic) brigando ali, meu sogro e o meu cunhado.

(...)"

O informante Moises da Silva Besi, em juízo (Evento 3, PROCJUDIC7 - p. 42/45), narrou:

"(...)

Informante: Sim, eu tava (sic) no quarto jogando "Play" assim né? Aí eu ouvi um barulho de estralo assim, tipo não sabia o que que era, daí o pai meio que me chamou assim, daí eu saí na rua e vi a casa do meu tio pegando fogo né? Daí quando eu subi, é tipo uma subida assim de minha casa pro meu tio, eu olhei já o meu vô meio que tentando se defender do meu tio assim, sabe?

Juíza: Que é o Luiz Eduardo?

Informante: Isso.

Juíza: Uhum.

Informante: Daí eu peguei e fui lá e consegui separa os dois meio que da briga assim, não deu pra ouvir...

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