Acórdão nº 50034329020148210033 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50034329020148210033
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001539750
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003432-90.2014.8.21.0033/RS

TIPO DE AÇÃO: Tratamento médico-hospitalar

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ LOPES DO CANTO

APELANTE: SUL AMERICA SEGURO SAUDE S.A. (RÉU)

ADVOGADO: MARCO AURELIO MELLO MOREIRA (OAB RS035572)

ADVOGADO: PAULO ANTONIO MULLER (OAB RS013449)

APELADO: JOSE DANIEL PEIXOTO WOLLMANN (AUTOR)

ADVOGADO: NIELI DE CAMPOS SEVERO (OAB RS040397)

RELATÓRIO

SUL AMÉRICA SEGURO SAÚDE S.A. interpôs apelação contra a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela, movida por JOSE DANIEL PEIXOTO WOLLMANN, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com base no art. 487, 1, do. CPC, extingo ·a fase procedimental de conhecimento2, com resolução de mérito, e julgo PROCEDENTE o pedido formulado na presente ação ordinária, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada por JOSÉ DANIEL PEIXOTO WOLLMANN em face de SUL AMÉRICA CIA DE SEGUROS SAÚDE aos efeitos de CONDENAR a ré a autorizar os procedimentos e todos os materiais necessários (o que incluiu prótese ou itens importados, se necessário) para a realização· da cirurgia do autor, no prazo de 15 dias, sob pena de fixação de multa diária, conforme indicação de seu médico assistente, e não de médicos ou junta médica indicados pela demandada.

Condeno a requerida ao pagamento de custas e honorários aos patronos da ré, que fixo em R$ 1.000,00, considerado o trabalho desenvolvido e o tempo despendido, tudo em conformidade com o disposto no art. 85, §8º do CPC.

Em suas razões recursais, a parte ré sustentou que após análise dos exames realizados e consoante diagnóstico obtido, constatou-se a existência de divergência médica entre a conclusão do médico assistente do autor e o médico indicado pela seguradora, conforme documento anexo - Análise de Caso, elaborado pela empresa Evidências, concluindo pela não indicação do procedimento cirúrgico postulado pelo autor.

Referiu que a seguradora não pode, de forma frágil, quando constatadas divergências entre os médicos que analisaram o caso, autorizar procedimento médico qualquer, eis que comprometeria a própria saúde do segurado.

Postulou o provimento do recurso com a improcedência da demanda e condenação da autora ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais.

Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a esta Colenda Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade e objeto do recurso

Eminentes colegas, o recurso intentado objetiva a reforma da decisão de primeiro grau, versando a causa sobre contrato de plano de saúde.

Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizado o recurso cabível, há interesse e legitimidade para recorrer, é tempestivo e foi devidamente preparado, inexistindo fato impeditivo do direito recursal noticiado nos autos.

Assim, verificados os pressupostos legais, conheço do recurso intentado para o exame das questões suscitadas.

Mérito do recurso em exame

Preambularmente, é preciso consignar que os planos ou seguros de saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo atinente ao mercado de prestação de serviços médicos.

Aliás, sobre o tema em discussão o STJ editou a súmula n. 608, dispondo esta que: aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

Ademais, entendo aplicável ao caso em tela o disposto no art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, no que concerne à interpretação de forma mais favorável à parte autora quanto às cláusulas do contrato do plano de saúde avençado, levando-se em conta a relação de consumo entre as partes.

No presente feito, busca o autor a cobertura pela demandada de procedimento cirúrgico da lesão principal que apresenta (protusão foraminal do disco C5-C6), pois portador de ruptura do disco cervical e de hérnia foraminal obstruindo o trânsito da raiz nervosa C5-C6 paramediana à esquerda.

Já a parte ré, por seu turno, pretende a reforma da sentença de procedência do pedido, afirmando que o parecer da junta médica pela "não realização" da cirurgia do autor, legitima a negativa de cobertura no caso em questão.

Com efeito, são aplicáveis ao caso em exame as exigências mínimas previstas no plano-referência de que trata os artigos 10 e 12 da legislação dos planos de saúde.

Assim, o inciso II, “a” do artigo 12 do diploma legal precitado, estabelece que constitui exigência mínima dos planos cobertura de internações hospitalares, vedada a limitação de prazo, valor máximo e quantidade, em clínicas básicas e especializadas, reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina, admitindo-se a exclusão dos procedimentos obstétricos.

Ainda, o inciso II, “e” da norma precitada estabelece a obrigatoriedade da cobertura de toda e qualquer taxa, incluindo materiais utilizados, assim como da remoção do paciente, comprovadamente necessária, para outro estabelecimento hospitalar, dentro dos limites de abrangência geográfica previstos no contrato, em território brasileiro

Sustenta a parte demandada que, em razão de divergência entre médico assistente do consumidor e médico auditor da operadora, foi realizada junta médica, que concluiu pela negativa do procedimento, conforme segue (Evento 3 - PROCJUDIC4):

Mais elementos precisam ser avaliados definir se a cirurgia está bem indicada e, caso positivo, quantos níveis precisam ser abordados.
A cirurgia somente deve ser indicada se for exaurida a investigação de outras causas prováveis de dor e, persistindo a doença degenerativa da coluna como causa mais provável, caso se comprove a falha do tratamento conservador estruturado, feito com equipe multiprofissional e de forma adequada.

Se realmente a indicação de tratamento for cirúrgica, a nossa recomendação seria pela discectomia ou microdiscectomia somente, procedimento para o qual não é necessário nenhum tipo de implante.

Em que pese a artroplastia seja considerada uma opção válida para o tratamento da doença degenerativa cervical, não há estudos indicando melhores resultados com esta técnica.
No entanto, esta afirmativa á válida apenas para próteses cervicais tradicionais e bem estudadas.
Não há estudos clínicos que indiquem que a prótese Discocerv seja eficaz e segura, motivo pelo qual não a recomendamos.

Encaminho à equipe da operadora para dar continuidade à avaliação de cobertura e eventual perícia com especialista.

Contudo, não pode prevalecer o entendimento da junta médica organizada pela demandada no presente feito, pois se trata de mero parecer com recomendação de uso de uma das vias possíveis de abordagem da enfermidade, tendo em vista que somente o médico assistente tem o conhecimento acerca do quadro de saúde apresentado pela parte autora, indicando o tratamento que entende mais adequado considerando a situação específica do autor.

Ademais, pela análise dos documentos acostados ao feito, verifica-se que a ré não nega a cobertura do procedimento cirúrgico postulado na inicial, ressaltando, contudo, que este não é indicado para o quadro clínico apresentado pela parte autora, razão pela qual houve a negativa de cobertura.

Porém, não cabe à demandada determinar o tipo de tratamento que será realizado pela parte autora, uma vez que esta decisão é do médico que a acompanha, que possui a capacidade de avaliar os riscos e benefícios para o caso específico, indicando o tratamento que entende adequado para as patologias apresentadas.

Ressalta-se que o Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento jurídico no sentido de que os planos de saúde somente podem estabelecer para quais doenças oferecerão cobertura, não lhes cabendo limitar o tipo de tratamento que será prescrito, incumbência essa que pertence ao profissional da área médica que assiste ao paciente, conforme precedentes que seguem:

CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. DECISÃO MANTIDA.
1. "A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que é abusiva a negativa de cobertura, pela operadora de plano de saúde - mesmo aquelas constituídas sob a modalidade de autogestão - de algum tipo de procedimento, medicamento ou material necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas no contrato" (AgInt no REsp n. 1.776.448/SP, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 25/6/2019, DJe 1/7/2019).
2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1846804/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 30/03/2020, DJe 01/04/2020)

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO SINGULAR. SÚMULA 568/STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. PLANO DE SAÚDE SOB A MODALIDADE DE AUTOGESTÃO. NEGATIVA DE COBERTURA INDEVIDA. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. PEDIDO DE REDUÇÃO DO VALOR DA COMPENSAÇÃO. INOVAÇÃO NO RECURSO. INADMISSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Nos termos da Súmula 568 do STJ, "relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema".
2. Não se admite o recurso especial quando a questão federal nele suscitada não foi enfrentada no acórdão recorrido. Incidem as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal.
3. "É abusiva a cláusula que prevê a exclusão, da cobertura do plano de saúde, de procedimentos imprescindíveis para o êxito de tratamento médico" (AgRg no REsp 1260121/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 6/12/2012).
4. "O fato de não ser aplicável o CDC aos contratos de plano de saúde sob a modalidade de autogestão não atinge o princípio da...

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