Acórdão nº 50034986920198210009 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 15-06-2023

Data de Julgamento15 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50034986920198210009
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003868358
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5003498-69.2019.8.21.0009/RS

TIPO DE AÇÃO: Receptação (art. 180)

RELATOR: Desembargador Sérgio Miguel Achutti Blattes

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELADO: RODRIGO DOS SANTOS NUNES (RÉU)

RELATÓRIO

O Ministério Público, por meio da Promotoria de Justiça atuante na comarca de Carazinho/RS, ofereceu denúncia em desfavor de Rodrigo dos Santos Nunes e Jucilene de Fátima Gonçalves, reputando-os como incursos nas sanções do art. 180, caput, do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na denúncia:

No dia 21 de julho de 2019, entre à 0h10min e às 19h, em endereço não claramente especificado, em Carazinho, os denunciados RODRIGO DOS SANTOS NUNES e JUCILENE DE FÁTIMA GONÇALVES, em conjugação de esforços e unidade de desígnios, receberam, e, posteriormente, conduziram, em proveito próprio, coisa que sabiam ser produto de crime, qual seja, a motocicleta Honda/CG 125 Titan ES, de cor azul, placas ILN-1203, avaliada em R$ 3.392,00 (três mil, trezentos e noventa e dois reais), conforme auto de avaliação da fl. 122, pertencente à vítima Ânderson da Silva Gonçalves.

Para perpetrar o delito, os denunciados, em circunstâncias não totalmente esclarecidas nos autos, receberam o bem, que fora objeto de furto, conforme Comunicação de Ocorrência nº 5803/2019, da Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento de Carazinho - DPPA, perpetrado no dia 21/07/2019, por volta da 0h10min (fl. 120 do IP), de que os denunciados estavam inteiramente cientes, visto que à evidência o receberam do adolescente Anderson Camargo Prates desacompanhada de qualquer documentação.

Posteriormente, ainda no dia 21/07/2019, por volta das 19h, os denunciados conduziram a motocicleta até a Rua Assis Chateaubriand, próximo ao nº 438, em Carazinho, quando foram abordados pela Brigada Militar, que constatou que a motocicleta era oriunda de furto, sendo os denunciados presos em flagrante delito.

A motocicleta foi apreendida (fl. 12 do IP).

O denunciado RODRIGO é reincidente em crime doloso, conforme certidão criminal das fls. 135/141.

Quanto ao trâmite processual, adoto o relatório da sentença, in verbis:

A denúncia foi oferecida em 22/08/2019 e recebida em 26/08/2019 (páginas 17/18 Processo Judicial 4, evento 3).

Houve cisão do processo com relação a ré Jucilene (página 1 do Processo Judicial 5, evento 3).

O réu Rodrigo dos Santos Nunes foi citado em 6/11/2019 (página 6 do Processo Judicial 5, evento 3).

Devidamente citado, o acusado apresentou resposta à acusação em 03/12/2019 (páginas 7/8 do Processo Judicial 5, evento 3).

Não constatada nenhuma hipótese de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução e julgamento, sendo a mesma cancelada.

Foi decretada a revelia do acusado (página 34 do Processo Judicial 5, evento 3).

Foi designada audiência de instrução e julgamento, na qual foram ouvidas 3 testemunhas arroladas pela acusação.

Ultimada a instrução, os debates orais foram convertidos em memoriais.

Em sede de memoriais, o Ministério Público alegou que a a materialidade e a autoria do delito estão comprovadas pelos seguintes documentos, acostados no Inquérito Policial nº 009/2.19.0002420-8: ocorrência policial das pp. 12/15; auto de apreensão da p. 17, todos constantes no evento 03 - Processo Judicial 1; depoimentos constantes nas pp. 46 a 50 – evento 03 - Processo Judicial 2 e pp. 01 e 03 - evento 03 - Processo Judicial 3; auto de avaliação indireta da p 41 – evento 03 - Processo Judicial 3. Resumiu a prova oral produzida em juízo. Salientou que o testemunho dos policiais comprovam a existência do crime, sendo que o relato destes deve preponderar, pois não possuem qualquer interesse no processo nem motivo conhecido para incriminar injustificadamente os réus e apresentaram depoimento firme e coerente sobre o ocorrido. Requereu a procedência da pretensão acusatória para que o denunciado RODRIGO DOS SANTOS NUNES seja condenado nas sanções do art. 180, caput, na forma do art. 29, caput, e combinado com o art. 61, inciso I, todos do Código Penal.

Em seu turno, a Defesa argumentou que não há, nos autos, prova suficiente a comprovar a veracidade das informações contidas na denúncia, razão pela qual os réus devem ser absolvidos da imputação que lhes é feita. Salientou que Rodrigo foi revel, o que não merece ser considerado em seu desfavor, da mesma forma, eis que cabe única e exclusivamente à acusação a prova da culpa, o que não restou demonstrado ao longo da instrução. Suscitou que não houve prova cabal do conluio entre os acusados para a suposta prática da conduta delitiva. Destacou que não foi individualizada a conduta de cada um dos acusados ora em julgamento. Aduziu que os policiais ouvidos em juízo não recordavam do fato, pois ocorrido há muito tempo, no ano de 2019. Alegou que a ineficiência da persecução criminal não pode dar lugar à insegurança jurídica de condenarmos alguém com base em meras suposições e concreções abstratas, fundadas em relatos de fatos que não apontam a autoria por parte do acusado com concreção e certeza. Arguiu que, no presente caso, nenhuma prova restou produzida na fase judicial, motivo pelo qual não há nada comprovando a autoria do delito. Requereu a absolvição do acusado, em face da insuficiência probatória ou, subsidiariamente, a desclassificação do delito de receptação dolosa para receptação culposa; o afastamento da agravante prevista no art. 61, incisos I, do Código Penal; e que seja concedido o benefício da gratuitidade judiciária.

Vieram os autos conclusos para sentença.

Sobreveio sentença de improcedência da pretensão acusatória, ao efeito de absolver o réu Rodrigo dos Santos Nunes do crime imputado na denúncia, com base no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

Intimados o Ministério Público e, por edital, o réu.

Interposto recurso de apelação pelo órgão ministerial.

Em razões, pretende a reforma da sentença absolutória. Refere ser a prova suficiente a demonstrar a tipicidade do crime de receptação, pois os denunciados receberam a motocicleta, furtada na data anterior ao fato, sem qualquer documentação, estando cientes portanto da origem espúria. Ratifica os memoriais. Aponta que o apelado possui condenações passadas em julgado, inclusive por furto qualificado, a referendar tivesse conhecimento da origem ilícita da motocicleta que conduzia. Pede, assim, a condenação do réu nos termos da denúncia.

Contrarrazões pela Defesa.

Parecer da douta Procuradoria de Justiça, por meio do qual se manifesta pelo conhecimento da irresignação ministerial e, no mérito, por seu provimento.

VOTO

Eminentes colegas:

Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público em face de sentença absolutória prolatada em favor de Rodrigo dos Santos Nunes, processado pela prática de receptação.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

A fim de introduzir o exame do mérito, transcrevo a análise da prova realizada pelo juízo originário:

Trata-se de ação penal pública que objetiva apurar a responsabilidade criminal do denunciado Rodrigo dos Santos Nunes, pela prática do delito previsto no art. 180, caput, do Código Penal.

No caso, estão presentes as condições da ação e os pressupostos processuais. Não existem nulidades ou irregularidades a serem sanadas, bem como foram observados os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Analisando detidamente a prova carreada aos autos, conclui-se que o conjunto probatório mostrou-se insuficiente para demonstrar a existência do dolo direto exigido pelo tipo penal do art. 180, caput, do Código Penal, qual seja, o prévio conhecimento da origem ilícita dos bens apreendidos em poder do réu.

No mesmo sentido, não houve demonstração...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT