Acórdão nº 50035018720218210030 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Primeira Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
Classe processualApelação
Número do processo50035018720218210030
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002346331
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

11ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003501-87.2021.8.21.0030/RS

TIPO DE AÇÃO: Transporte de coisas

RELATOR: Desembargador AYMORE ROQUE POTTES DE MELLO

APELANTE: A J Z TRANSPORTES LTDA (AUTOR)

APELADO: PIRAHY ALIMENTOS LTDA. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por A J Z TRANSPORTES LTDA em combate à sentença de improcedência (evento 60, SENT1) proferida nos autos da ação de indenização (processo nº 5003589-28.2021.8.21.0030) que move contra PIRAHY ALIMENTOS LTDA perante a 1ª Vara Cível da Comarca de São Borja.

Adoto o relatório da sentença recorrida, verbis:

"Vistos, etc.
A J Z TRANSPORTES LTDA ajuizou ação indenizatória em face de PIRAHY ALIMENTOS LTDA, partes qualificadas.
Disse que na condição de transportadora de cargas, com inscrição na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) sob nº 045613176 e foi contratado para prestar serviços ao réu, para a realização dos fretes com o veículo de sua propriedade. Discriminou as viagens realizada. Aferiu que durante a realização dos percursos das viagens, passou por trechos de rodovias concedidos à iniciativa privada, sem que a Ré tivesse fornecido a Empresa Autora o vale-pedágio, conforme determina a Resolução nº 2.885, publicada no Diário Oficial da União em 23 de setembro de 2008, e Lei Federal nº 10.209/2001, sendo estes embutidos no valor do frete. Salientou que teve que arcar com o pagamento da integralidade dos custos dos pedágios, nas operações de transportes realizadas à ré, sem o devido ressarcimento. Referiu que a empresa ré não observou a Lei nº 10.209/2001, que instituiu o vale pedágio obrigatório. Enfatizou que o valor total devido chega ao montante de R$ 183.680,12 (cento e oitenta e três mil seiscentos e oitenta reais e doze centavos). Discorreu sobre seu direito. Requereu a procedência da ação e a concessão do benefício da gratuidade da justiça. Juntou documentos (Evento 1).
Deferida a gratuidade da justiça à parte autora (Evento 3).

Citada (Evento 23), a parte ré apresentou contestação (Evento 36), alegando preliminarmente a ilegitimidade ativa da parte autora, uma vez que o transporte teria sido realizado pela empresa Bony Transportes Ltda, sendo motorista Joel Ricardo Andriollo Go.
Alegou a sua ilegitimidade passiva, referindo que a ré beneficia o arroz e coloca à disposição das empresas transportadoras o produto vendido, já saindo com destinatários certos em outras unidades da federação, sendo que a partir do faturamento, com emissão das notas fiscais correspondentes, o arroz beneficiado passa a ser de propriedade do estabelecimento destinatário. Suscitou a prescrição, pois os fretes foram realizados em 2012, aplicando-se ao feito o prazo trienal. No mérito, disse que a empresa Bony Transportes Ltda foi a transportadora que dispunha das cargas para despachar, indicando veículos e motoristas e lançando as parcelas respectivas e que os motoristas, indicados em cada conhecimento, foram quem passaram pelos pedágios, se existiam, e, portanto, quem desembolsaram os respectivos valores, e não a autora. Salientou não estarem comprovados os pedágios com os respectivos recibos. Discorreu sobre a ausência de responsabilidade. Impugnou o benefício da gratuidade da justiça deferido a parte autora. Requereu a improcedência da ação. Juntou documento.
Houve réplica (Evento 39).

Afastadas as preliminares e a prejudicial de mérito alegadas em contestação (Evento 41).

As partes não requereram a produção de outras provas.

Vieram-me os autos conclusos para julgamento.

É o relato. Decido."

O dispositivo da sentença recorrida está redigido nos seguintes termos, verbis:

"Diante do exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por A J Z TRANSPORTES LTDA em desfavor de PIRAHY ALIMENTOS LTDA.
Sucumbente a parte autora, fica condenada ao pagamento dos honorários advocatícios ao procurador da parte ré, verba arbitrada em 10% sobre o valor atualizado da causa, observado o disposto no art. 85, §2º, do Código de Processo Civil.
Todavia, resta suspensa a exigibilidade diante da gratuidade da justiça deferida ao Evento 3.
Publicada e registrada eletronicamente.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquive-se com baixa."

Nas razões (evento 65, APELAÇÃO1), o autor afirma que lhe é devida a indenização prevista no art. 8º da Lei nº 10.209/2001, pois a ré não adiantou o vale-pedágio em modelo próprio, nos termos da legislação de regência. Sustenta que o valor do pedágio não integra o valor do frete, conforme prevê o art. 2º da Lei nº 10.209/2001. Destaca que a ré não impugnou a realização, tampouco a existência de pedágios no trajeto percorrido. Assim, requer o provimento do recurso, para julgar procedente a ação.

Em contrarrazões (evento 70, CONTRAZ1), a ré afirma que a autora não comprovou nos autos o pagamento dos pedágios, tampouco o trajeto percorrido. Sustenta que a pretensão da autora está prescrita, tendo em vista a incidência do prazo prescricional anual, conforme o art. 18 da Lei nº 11.442/2007, ou, sucessivamente, a ocorrência da prescrição trienal. Alega que não restou demonstrado que a ré contratou a empresa BONY TRANSPORTES LTDA, de modo que inexiste prova de que a ré contratou os serviços do autor. Aponta que não estabeleceu qualquer relação obrigacional com a autora. Alega que inexiste prova de dano, tendo em vista a ausência de comprovação do desembolso de valores de pedágio. Defende a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda, pois a subcontratante do frete foi a empresa BONY TRANSPORTES LTDA. Assim, requer o desprovimento do recurso.

Subiram os autos a esta Corte. Distribuídos, vieram conclusos em 30/03/2022, sendo incluídos na pauta da sessão virtual de julgamentos de 23/06/2022.

Em 14/06/2022, a ré-apelada deduziu pedido de retirada de pauta da sessão virtual de julgamento, para inclusão em sessão telepresencial ou presencial, para realizar sustentação oral de argumentos (evento 6, PET1).

Em 17/06/2022, a autora-apelante A J Z TRANSPORTES LTDA apresentou memoriais (evento 7, MEMORIAIS1).

É o relatório.

VOTO

A. EM PRELIMINAR.

1. O recurso é típico, próprio, tempestivo (eventos 61 e 65 - origem) e está dispensado do preparo recursal, porque a autora-apelante é beneficiária da gratuidade da justiça (evento 3, DESPADEC1).

2. Ainda neste quadrante, não merece acolhimento a preliminar contrarrecursal de ilegitimidade passiva ad causam.

A autora-apelante ingressou em Juízo pleiteando a condenação da ré-apelada ao pagamento de indenização decorrente do não pagamento antecipado do vale-pedágio.

Conforme extraído dos documentos anexados ao acervo probatório (evento 1, NFISCAL8 e evento 1, NFISCAL9 - origem), a autora-apelante A J Z TRANSPORTES LTDA foi subcontratada por BONY TRANSPORTES LTDA, para a realização de fretes entre São Borja (RS) e Curitiba (PR), Guaraparuva (PR), Pinhais (PR), São José dos Pinhais (PR), Guarapuava (PR), Colombo (PR), Ponta Grossa (PR), Reserva (PR), Imbituva (PR), Palmeira (PR) e Douradina (PR), no período de 19/12/2015 a 11/10/2016, tendo como tomadora dos serviços e embarcadora da mercadoria a ré-apelada PIRAHY ALIMENTOS LTDA.

Pois bem. O § 1º do art. 1º da Lei nº 10.209/2001 prevê a responsabilidade do embarcador da carga pelo pagamento do vale-pedágio.

A legislação de regência - Lei nº 10.209/2001 - equipara ao embarcador, para cumprimento da regra do caput do seu art. 1º, o proprietário da carga, o contratante do serviço rodoviário - proprietário ou não da carga - e a empresa transportadora que subcontratar o serviço de transporte de carga prestado por transportador autônomo, verbis:

"Art. 1º Fica instituído o Vale-Pedágio obrigatório, para utilização efetiva em despesas de deslocamento de carga por meio de transporte rodoviário, nas rodovias brasileiras.
§ 1º O pagamento de pedágio, por veículos de carga, passa a ser de responsabilidade do embarcador.

§ 2º Para efeito do disposto no § 1º, considera-se embarcador o proprietário originário da carga, contratante do serviço de transporte rodoviário de carga.

§ 3º Equipara-se, ainda, ao embarcador:
I - o contratante do serviço de transporte rodoviário de carga que não seja o proprietário originário da carga;
II - a empresa transportadora que subcontratar serviço de transporte de carga prestado por transportador autônomo."

Nesta toada, registro que a orientação jurisprudencial firmada nesta Corte é no sentido de reconhecer a legitimidade passiva ad causam da contratante, bem assim da subcontratante, para o adiantamento das quantias referentes ao vale-pedágio previsto pela Lei nº 10.209/2001.

No caso, há responsabilidade solidária da contratante e da subcontratante no pagamento do frete à contratada, conforme dispõe o art. 5º-A, § 2º, da Lei nº 11.442/2007, daí porque não há cogitar que a ré-apelada PIRAHY ALIMENTOS LTDA é ilegítima para figurar no polo passivo da ação.

Neste sentido, colaciono os seguintes precedentes da 11ª Câmara Cível desta Corte de Justiça, verbis:

APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE. AÇÃO DE COBRANÇA. PRESCRIÇÃO. CASO DOS AUTOS EM QUE NÃO OPERADA A PRESCRIÇÃO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO REFORMADA.
LEGITIMIDADE PASSIVA.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ESTABELECIDA ENTRE CONTRATANTE/BENEFICIÁRIA E A SUBCONTRATANTE, NO TOCANTE AO PAGAMENTO DO FRETE À CONTRATADA, IMPOSTA PELO ARTIGO 5º-A, §2º, DA LEI 11.442/2007.
MÉRITO. VALE-PEDÁGIO. A TEOR DO DISPOSTO NO ARTIGO 8º DA LEI 10.209/2001, NOS CASOS EM QUE VERIFICADO O INADIMPLEMENTO DO PEDÁGIO, O EMBARCADOR SERÁ OBRIGADO A INDENIZAR O TRANSPORTADOR EM QUANTIA EQUIVALENTE A DUAS VEZES O VALOR DO FRETE. PROVA DO PAGAMENTO QUE INCUMBIA À DEMANDADA E DA QUAL NÃO LOGOU ÊXITO EM DESINCUMBIR-SE. RESSARCIMENTO DEVIDO. PRECEDENTES...

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