Acórdão nº 50035497120218215001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50035497120218215001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003130195
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003549-71.2021.8.21.5001/RS

TIPO DE AÇÃO: Práticas Abusivas

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO VESCIA CORSSAC

APELANTE: ORLEI GLEISON LOPES (AUTOR)

APELADO: ITAU UNIBANCO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ORLEI GLEISON LOPES em face da sentença (evento 31, SENT1) que, nos autos da ação revisional ajuizada contra ITAÚ UNIBANCO, assim julgou os pedidos:

"Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para manter as estipulações pactuadas no contrato ora analisado. Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida.

Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se".

O apelante opôs embargos declaratórios (evento 36, EMBDECL1), os quais foram acolhidos, nos seguintes termos (evento 38, DESPADEC1):

"Isso posto, JULGO PROCEDENTES os embargos declaratórios opostos pela parte demandada para o fim de acrescentar ao dispositivo sentencial, o seguinte trecho:

'(...)

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para manter as estipulações pactuadas no contrato ora analisado. Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida. Suspendo a exigibilidade dos ônus da sucumbência, em razão da parte autora litigar sob o pálio da gratuidade judiciária.

(...)'

Intimem-se".

Em suas razões (evento 45, APELAÇÃO1), postula a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN, ante a abusividade da contratação. Defende o afastamento da cobrança da capitalização por ausência de pactuação, e da comissão de permanência, inclusive de forma cumulada com os encargos moratórios. Pleiteia a nulidade da multa moratória, e, alternativamente, que esta seja limitada em 2%. Requer a descaracterização da mora. Pugna, ao final, pelo provimento do recurso, com a majoração dos honorários advocatícios.

Intimado, o apelado apresentou contrarrazões (evento 50, CONTRAZAP1).

Após, subiram os autos a esta Corte.

Por distribuição, vieram-me os autos conclusos para julgamento.

Cumpridas as formalidades legais.

É o relatório.

VOTO

DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL.

O presente recurso norteia-se pelas disposições processuais estabelecidas pelo Código de Processo Civil de 2015.

Com fundamento no art. 1010, §3º, in fine, presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos (cabimento e adequação, tempestividade, regularidade procedimental e formal, isenção do preparo do apelo do autor ante a concessão da gratuidade judiciária, ausência de fato extintivo ou modificativo do direito de recorrer, legitimidade e interesse), recebo o apelo em ambos os efeitos.

DA RELAÇÃO CONTRATUAL.

A presente ação tem por objeto os seguintes contratos:

- Contrato de empréstimo pessoal nº 00000146450688-8, firmado em 03/05/2019, prevendo juros remuneratórios de 2,97% ao mês e de 42,77% ao ano (evento 1, CONTR8);

- Contrato de empréstimo pessoal nº 00000156128475-1, firmado em 19/11/2019, prevendo juros remuneratórios de 2,83% ao mês e de 40,42% ao ano (evento 1, CONTR9).

JUROS REMUNERATÓRIOS.

Com relação à revisão dos juros, embora não divirja propriamente quanto à possibilidade de alteração de dispositivos contratuais que se mostrem abusivos, vinha mantendo entendimento mais restritivo quando da identificação das hipóteses de abusividade, conforme reiteradamente sustentado em decisões anteriores, tanto em primeiro quanto em segundo grau. Não obstante isso, considerando as peculiaridades do trabalho colegiado e também com vistas a preservar a unidade do julgamento, nesse tópico, passo a adotar o posicionamento dominante nesta Câmara conforme desenvolvimento que segue.

Embora a questão da incidência do Código de Defesa do Consumidor se encontre superada pela edição do verbete 297 do STJ, tal não significa que a revisão de cláusulas contratuais seja medida imperativa, senão nos casos de comprovada abusividade.

Nessa linha, persiste o princípio da liberdade na fixação dos juros remuneratórios nos contratos de mútuo e negócios bancários em geral, a exceção daqueles regidos por legislação especial.

Confira-se a Súmula n. 382 do STJ:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.

A orientação emanada pelo Superior Tribunal de Justiça pauta-se no sentido de que, comprovada a abusividade na pactuação dos juros, aplica-se a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN para o mês de celebração do instrumento.

"AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DO STJ QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA DEMANDADA.
1. Os juros remuneratórios devem ser limitados à taxa média de mercado quando comprovada, no caso concreto, a significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa de mercado para operações similares, como foi o caso dos autos, não merecendo reforma o aresto recorrido quanto ao ponto.
1.1. Hipótese em que os juros em debate são superiores ao dobro da média praticada em operações financeiras similares.
2. Para afastar a afirmação contida no acórdão atacado no sentido de que a taxa de juros remuneratórios da avença é abusiva, seria necessário promover o reexame do acervo fático-probatório dos autos e a interpretar as cláusulas contratuais, providências vedadas na via eleita, por força das Súmulas 5 e 7/STJ.
3. Conforme entendimento jurisprudencial consolidado por este Superior Tribunal de Justiça, o reconhecimento da abusividade dos encargos cobrados no período da normalidade contratual traz, como consectário lógico, a descaracterização da mora do devedor. Incidência da Súmula 83/STJ.
4. Agravo interno desprovido". (AgInt no AREsp 1405350 / RS, Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, DATA DO JULGAMENTO 21.06.2021, DJE 01.07.2021) (g.n.)

Nesse contexto, a redução dos juros depende de comprovação da onerosidade excessiva - capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - em cada caso concreto, tendo como parâmetro a taxa média de mercado para as operações equivalentes.

No caso concreto, cuida-se de contrato de empréstimo pessoal não consignado, o que implica análise do alegado excesso em comparação à série temporal divulgada pelo BACEN – 20742 (Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado).

Verifica-se o seguinte:

- No contrato 00000146450688-8, firmado em 03/05/2019, foram pactuados juros mensais de 2,97%, sendo que, à época, a taxa média de mercado para a operação da espécie divulgada pelo BACEN foi de 6,79% ao mês (série 25464), percentual esse que, considerando os parâmetros adotados por esta Câmara, não configura discrepância capaz de justificar a intervenção judicial no pacto e consequente limitação.

- No contrato 00000156128475-1, firmado em 19/11/2019, foram pactuados juros mensais de 2,83%, sendo que, à época, a taxa média de mercado para a operação da espécie divulgada pelo BACEN foi de 6,05% ao mês (série 25464), percentual esse que, considerando os parâmetros adotados por esta Câmara, não configura discrepância capaz de justificar a intervenção judicial no pacto e consequente limitação.

Assim, quanto ao referido contrato, mantenho os juros remuneratórios contratados e, por conseguinte, nego provimento ao apelo.

Desprovido o recurso no ponto.

CAPITALIZAÇÃO.

A jurisprudência do STJ há longa data, sinalizava a possibilidade de cobrança da capitalização dos juros nos contratos bancários, inclusive em periodicidade inferior à anual.

Visando pacificar e uniformizar os julgamentos acerca da matéria, a 2ª Seção do STJ editou a Súmula 539 que assim dispõe:

É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. (Súmula 539, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/06/2015, DJe 15/06/2015)”

Na mesma oportunidade, também editada a Súmula 541, verbis:

A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. (Súmula 541, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/06/2015, DJe 15/06/2015)”

Ou seja, à cobrança da capitalização, necessária a existência de cláusula expressa ou previsão de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal.

Nesse sentido trago à colação julgado do Egrégio STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 182 DO STJ. RECONSIDERAÇÃO. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA LIDE PELO...

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