Acórdão nº 50035936220208210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50035936220208210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001548166
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003593-62.2020.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Tratamento médico-hospitalar

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ LOPES DO CANTO

APELANTE: CHRISTIAN NORONHA PICOLI (AUTOR)

ADVOGADO: Robspierre Azzolin Pereira (OAB RS080932B)

APELADO: UNIMED NORDESTE RS SOCIEDADE COOP DE SERV MEDICOS LTDA (RÉU)

ADVOGADO: PAULO ROBERTO DO NASCIMENTO MARTINS (OAB RS028992)

ADVOGADO: CASSIO AUGUSTO VIONE DA ROSA (OAB RS050660)

RELATÓRIO

CHRISTIAN NORONHA PICOLI interpôs recurso de apelação contra a sentença proferida nos autos da ação de ação de obrigação de fazer movida em face de UNIMED NORDESTE RS SOCIEDADE COOP. DE SERV. MÉDICOS LTDA.

Na decisão atacada, os pedidos foram julgados nos seguintes termos:

DIANTE DO EXPOSTO, julgo parcialmente procedente a presente "ação de obrigação de fazer c/c danos morais com pedido liminar de tutela de urgência" ajuizada por CHRISTIAN NORONHA PICOLI contra UNIMED NORDESTE RS SOCIEDADE COOP DE SERV MÉDICOS LTDA., para fins de: a) ordenar que a requerida suporte todas as despesas do tratamento do autor no CENTRO ESPECIALIZADO EM SAÚDE MENTAL, em que foi internado e de todos os medicamentos e terapias necessárias, para o recebimento do tratamento adequado para a sua enfermidade; b) condenar a demandada ao reembolso da quantia de R$ 1.500,00, que deve ser atualizada pelo IGP-M/FGV desde a data do desembolso (14-02-2020 conforme Anexo 14 do Evento 1) e acrescida de juros de mora de 1% ao mês desde a data da citação. Decisão com fundamento nas razões e dispositivos legais citados no corpo da presente sentença.

Havendo sucumbência recíproca, condeno a parte autora ao pagamento de 40% das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios em prol do patrono da parte adversa, ora fixados em R$ 200,00. Outrossim, condeno a ré ao pagamento de 60% das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios em prol do patrono da parte adversa, ora fixados em 14% sobre a condenação. Fica vedada a compensação das verbas de honorários advocatícios. Exegese dos artigos 85 e 86, ambos do CPC.

Suspendo a exigibilidade dos ônus sucumbenciais em relação à parte autora na medida em que goza do benefício da gratuidade de justiça, nos termos do artigo 98, § 3.º, do Código de Processo Civil.

Em suas razões recursais, a parte autora defendeu a ocorrência de danos morais indenizáveis, tendo em vista a negativa injustificada do tratamento postulado, ainda mais considerando que a negativa se deu frente ao quadro de surto psicológico enfrentado pelo autor.

Foi colacionada jurisprudência quanto ao tema, por fim, postulando o apelante o provimento do recurso com a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais em quantia não inferior a R$ 12.000,00.

Contra-arrazoado o recurso, os autos foram remetidos a esta Colenda Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade e objeto do recurso

Eminentes colegas, o recurso intentado objetiva a reforma da decisão de primeiro grau, versando a causa sobre contrato de plano de saúde.

Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizado o recurso cabível, há interesse e legitimidade para recorrer, é tempestivo e está dispensado de preparo, inexistindo fato impeditivo do direito recursal noticiado nos autos.

Assim, verificados os pressupostos legais, conheço do recurso intentado para o exame das questões suscitadas.

Mérito do recurso em exame

Preambularmente, é preciso consignar que os planos ou seguros de saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo atinente ao mercado de prestação de serviços médicos.

Aliás, sobre o tema em discussão o STJ editou a súmula n. 608, dispondo esta que: aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

Ademais, entendo aplicável ao caso em tela o disposto no art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, no que concerne à interpretação de forma mais favorável à parte autora quanto às cláusulas do contrato do plano de saúde avençado, levando-se em conta a relação de consumo entre as partes.

No presente feito, busca a parte autora a cobertura pela demandada de internação psiquiátrica ocorrida em caráter de urgência diante de um surto psicológico sofrido pelo autor, o que já restou reconhecido na decisão singular, postulando a parte recorrente, tão somente, a condenação da ré ao pagamento de indenização pelos danos morais sofridos em razão da negativa de cobertura.

Nesse sentido, cabe colacionar os argumentos do culto Magistrado de primeiro grau, Dr. Silvio Viezzer, os quais serviram de fundamento para a parcial procedência da demanda, cujas razões adoto como de decidir e transcrevo a seguir:

Inicialmente, impende consignar que o contrato de prestação de serviços entabulado entre a demandante e a requerida envolve relação de consumo. É típico contrato de adesão. Assim, entendo aplicáveis ao caso sob exame os preceitos do Código de Proteção e de Defesa do Consumidor, especificamente em seu artigo 47, que prevê que as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor - o hipossuficiente da relação. Ademais, como consequência, surge a possibilidade de haver intervenção do Poder Judiciário para fins de declarar, inclusive de ofício, a nulidade de cláusulas que ferem os direitos
assegurados no aludido diploma legal.

Pois bem! É sabido que a estipulação de cláusula contratual de seguro de saúde com instituição de prazo de carência não é ilegal.

No caso sob exame, no contrato entabulado entre as partes, na sua cláusula XVI, denominada “Períodos de Carência” (fl. 10 do nexo 2 do Evento 16), está previsto que nos casos de procedimento de urgência e emergência, a carência será de 24 horas. E mais, prevê:“As carências explicitadas neste tema serão contadas a partir da data da vigência contratual, ou seja, a partir da assinatura da proposta de adesão, da assinatura do contrato ou do primeiro pagamento, o que ocorrer primeiro.”

Os artigos 12, inciso V, e 35-C, da Lei n.º 9.656/1998 (que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde), com redação dada pela Lei n.º 11.935/2009, determinam que é obrigatória a cobertura do plano de saúde nos casos de urgência e emergência, reduzindo a carência estipulada no contrato ao prazo de 24 horas. Leia-se:

“Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1.º do art. 1.º desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas: (Redação dada pela Medida Provisória n.º 2.177-44, de 2001)

(...)

V - quando fixar períodos de carência:

(...)

c) prazo máximo de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência; (Incluído pela Medida Provisória n.º 2.177-44, de 2001)”

(...)

Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)

I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente; (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)

II - de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional; (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)

III - de planejamento familiar. (Incluído pela Lei n.º 11.935, de 2009).

Parágrafo único. A ANS fará publicar normas regulamentares para o disposto neste artigo, observados os termos de adaptação previstos no art. 35. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001)

(...).”

No presente caso, o objeto de irresignação da parte demandada é sobre a ausência de urgência/emergência no caso dos autos, no que não tem razão.

Lê-se no boletim de internação do autor do Anexo 9 do Evento 1, datado de 14-02-2020 que o tratamento era de URGÊNCIA.

Nesse contexto, o plano de saúde tem a obrigação de arcar com as despesas dos procedimentos relativos à internação psiquiátrica de que necessitou o autor, conforme comprova o contrato de prestação de serviço médico-hospitalar datado de 14-02-2020 firmado entre o autor/paciente e seu responsável Rodrigo Picoli e a clínica de repouso "CSM-CENTRO ESPECIALIZADO EM SAUDE MENTAL E GERIATRIA LTDA."

Saliente-se, neste passo, que no extrato de cartão de crédito do Anexo 14 do Evento 1 restou comprovado que houve pagamento de R$ 1.500,00 em prol da clínica mencionada.

Ainda, consigne-se que não ficou comprovado nenhum outro dispêndio de valores com o tratamento psiquiátrico objeto do processo.

Nesse contexto, vinga o pedido da parte autora no sentido de condenar a ré ao pagamento da quantia de R$ 1.500,00, que deve ser atualizada pelo IGP-M/FGV desde a data do desembolso (14-02-2020 conforme Anexo 14 do Evento 1) e acrescida de juros de mora de 1% ao mês desde a data da citação.

Com relação à indenização pelos danos imateriais, destaca-se que somente os fatos e acontecimentos...

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