Acórdão nº 50036079620228210003 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50036079620228210003
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003007965
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003607-96.2022.8.21.0003/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE MARASCHIN DOS SANTOS

APELANTE: ARIELSON FERNANDES MADEIRA (AUTOR)

APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

ARIELSON FERNANDES MADEIRA interpôs apelação cível em face da sentença que julgou improcedente a ação revisional movida em face de BANCO PAN S.A., com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para manter as estipulações pactuadas no contrato ora analisado. Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida. Suspensa a exigibilidade à parte autora, em razão da AJG.

Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Juiz de Direito Dr. Alexandre Passos Vieira, Núcleo PROGRAM Bancário de Justiça 4.0

Em suas razões de apelo, a parte autora sustentou:

a) a impossibilidade de inscrição negativa junto aos órgãos de proteção de crédito;

b) seja deferido o depósito judicial das parcelas incontroversas;

c) suspensão de descontos;

d) a limitação dos juros remuneratórios;

e) o afastamento da capitalização dos juros;

f) ilegalidade da cobrança de comissão de permanência cumulada com outros encargos moratórios;

g) a impossibilidade da cobrança de tarifas bancárias (IOF e TAC);

h) a descaracterização da mora;

i) a repetição de indébito, na forma simples, dos valores pagos de forma abusiva.

Oferecidas contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal, vindo, então, conclusos para julgamento.

Foram cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 935 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo e dispensado de preparo, estando preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade recursal.

RELAÇÃO CONTRATUAL SUB JUDICE

Trata-se de ação revisional que tem por objeto:

  • Cédula de Crédito Bancário nº 344832936, no valor de R$ 1.626,96, celebrado em 12/03/2021, com a incidência de juros remuneratórios de 1,80% ao mês e 25,66% ao ano. Ao período da inadimplência, prevista cobrança de juros remuneratórios, juros moratórios de 1% ao mês e multa moratória de 2%. Juntado o contrato (evento 9 - contrato 2).

AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INVIABILIDADE. CASO CONCRETO.

Postula a parte autora a inversão do ônus da prova, determinando-se que o banco réu proceda a juntada de "contratos ORIGINAIS ou em cópia autenticada entabulados nos últimos 5 anos, os contratos ORIGINÁRIOS da relação entre as partes, comprovantes de depósito/transferência do valor supostamente contrato de empréstimo para a recorrente."

Veja-se que na inicial a parte autora narra genericamente ter firmado com a ré contratos de empréstimos (evento1 - Petição inicial 1), aduzindo que os contratos estão eivados de abusividade, diante da cobrança de encargos ilegais, tornando a dívida demasiadamente excessiva.

In casu, em que pesem as alegações da parte autora, observo que esta sequer informou os dados mínimos da contratação, com exceção do único contrato juntado aos autos pela parte ré (evento 9 - contrato 2), bem como não juntou aos autos qualquer documento (extrato/comprovante ou demonstrativo de contratação) relativo as alegadas contratações que pretende revisar, ou seja, não consta nos autos nenhuma informação acerca das supostas contratações.

Por certo, constitui ônus da parte autora, além da correta delimitação da causa de pedir e do pedido, instruir a pretensão com os documentos indispensáveis para a propositura da ação – art. 320, CPC, qual seja, cópia do contrato, ou, no mínimo elementos indiciários contendo a espécie contratual, valor, juros e encargos.

Não obstante, caso a parte suscite a ocorrência de cobrança excessiva, no mínimo, deve possuir conhecimento e prova documental acerca dos elementos mínimos.

De igual sorte, sequer demonstrada a adoção de qualquer diligência prévia para obtenção do contrato. Logo, não se mostra inverossímil a absoluta indisponibilidade documental, não sendo suprível pela existência de pedido exibitório incidental.

Ademais, ainda que possível a exibição incidental de documentos, assim como aplicável às instituições financeiras às disposições do Código de Defesa do Consumidor, segundo a Súmula nº 297 do STJ, para o autor fazer jus a sua pretensão era necessária uma prova mínima da existência do contrato, ônus do qual não se desincumbiu.

Com efeito, somente o fato de a relação firmada entre as partes ser de consumo não inverte de forma automática o ônus da prova previsto no art. 6º, VIII, CDC, tampouco pode servir de pretexto para que a parte autora deixar de demonstrar, ainda que minimamente, a verossimilhança de suas alegações.

Contudo, considerando que a parte autora sequer comprovou a relação jurídica existente entre as partes, não há como exigir da parte ré, a juntada de um suposto contrato quando a parte autora não aponta sequer os elementos mínimos indicativos da espécie contratual, valor, juros e encargos, dever legal que a incumbe segundo os arts. 320 e 330 do CPC.

Nesse sentido é o entendimento desta Corte:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS. PRETENSÃO REVISIONAL. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS E INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. COMO A PARTE EMBARGANTE, ORA AGRAVADA, OSTENTA A CONDIÇÃO DE CONSUMIDOR, PRESUME-SE VULNERÁVEL EM RELAÇÃO AO FORNECEDOR DO CRÉDITO, SENDO, PORTANTO, MERECEDORA DA PROTEÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA O CONSUMIDOR, PARA FINS DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, POIS AS RELAÇÕES BANCÁRIAS, FINANCEIRAS E DE CRÉDITO SUBMETEM-SE ÀS NORMAS DO CDC (ART. 3º, § 2º). TODAVIA, INCUMBE À PARTE EMBARGANTE INDICAR OS CONTRATOS QUE PRETENDE REVISAR E IMPUGNÁ-LOS ESPECIFICAMENTE, APONTANDO O VALOR QUE ENTENDE INCONTROVERSO MEDIANTE CÁLCULO, NOS TERMOS DOS ARTS. 330, § 2º E 917, § 3º, AMBOS DO CPC. NA ESPÉCIE, DEPREENDE-SE QUE O PEDIDO DE REVISÃO DE EXIBIÇÃO É GENÉRICO, UMA VEZ QUE A PARTE SEQUER INFORMA QUAIS SÃO OS CONTRATOS QUE PRETENDE DISCUTIR EM JUÍZO, O QUE INCLUSIVE DIFICULTADA A DEFESA DA PARTE ADVERSA. POR TODO O EXPOSTO, TENHO QUE O PEDIDO DE REVISÃO, NO CASO CONCRETO, ESTÁ DELIMITADO AO CDC EMPRÉSTIMO - BB CRÉDITO Nº 916154206 JÁ ACOSTADO AOS AUTOS, MOTIVO PELO QUAL ENTENDO DESNECESSÁRIA A JUNTADA DE DOCUMENTOS ADICIONAIS PARA O JULGAMENTO DO FEITO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO, POR UNANIMIDADE.(Agravo de Instrumento, Nº 50649230820218217000, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Altair de Lemos Junior, Julgado em: 18-08-2021) (grifei)

Por tais razões, é de ser rejeitada a pretensão recursal de inversão do ônus da prova, diante da ausência de comprovação mínima da relação jurídica impugnada, com exceção ao único contrato juntado aos autos (evento 9 - contrato 2), o qual foi analisado na sentença, e é objeto da pretensão recursal em exame.

No ponto, recurso desprovido.

ENCARGOS DA NORMALIDADE

JUROS REMUNERATÓRIOS

No tocante aos juros remuneratórios, as orientações do Superior Tribunal de Justiça, extraídas do julgamento do Recurso Especial n. 1.061.530/RS, datado de 22/10/2008, enfrentado para os efeitos do art. 1.036 do CPC são:

(...)
I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.

ORIENTAÇÃO. 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

(...)

Neste norte, impende referir que este colegiado adotou como um dos parâmetros para apuração da existência de abusividade na contratação, a taxa média de mercado registrada pelo Banco Central do Brasil – BACEN, à época da contratação, e em conformidade com a respectiva operação, somada ao percentual de 30% (trinta por cento), considerada como margem tolerável.

Além disso, também devem ser analisadas as peculiaridades inerentes ao caso concreto, de modo que deve haver criteriosa ponderação em relação ao tipo de operação de crédito contratado, a época em que firmado o contrato, o valor disponibilizado ao consumidor, bem como o prazo de pagamento e/ou financiamento, os custos inerentes à captação de recursos, a capacidade econômica do contratante, as garantias eventualmente exigidas, e ainda, a imprescindível análise do perfil de risco de crédito do contratante.

Portanto, a taxa média de juros divulgada pelo Bacen é apenas um referencial a ser ponderado para fins de constatação da prática abusiva dos juros, contudo, não impõe um limite que deve ser obrigatoriamente observado pelas instituições financeiras, na medida em que esta deve ser aplicada somente na hipótese de comprovação de cobrança exorbitante de juros.

Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVISIONAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. POSSIBILIDADE. COBRANÇA ABUSIVA. REVISÃO. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E REEXAME PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A...

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