Acórdão nº 50037388320208215001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-06-2022

Data de Julgamento15 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50037388320208215001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002240255
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003738-83.2020.8.21.5001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATORA: Desembargadora WALDA MARIA MELO PIERRO

APELANTE: KELLY CRISTINE DE VARGAS GULARTE (AUTOR)

APELADO: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por KELLY CRISTINE DE VARGAS GULARTE contra a sentença que, nos autos da ação revisional de contrato ajuizada em desfavor de BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A, julgou-a improcedente. As custas foram atribuídas à demandante, sendo os honorários fixados em R$ 2.000,00. Suspensa, porém, a exigibilidade em razão da AJG concedida.

Em suas razões, a autora sustenta, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, porquanto não possibilitada a inversão do ônus probatório. No mérito, declara a abusividade dos juros remuneratórios, requerendo a vedação da capitalização mensal, bem como o afastamento da comissão de permanência e tarifas administrativas. Por fim, pugna pela repetição.

Apresentadas contrarrazões, por redistribuição, vieram os autos conclusos.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

De pronto, tenho que não há falar na ocorrência de cerceamento de defesa, porquanto não se evidencia a ausência de manifestação acerca do pleito de inversão do ônus probatório, mas sim de indeferimento, contra o qual não houve irresignação no momento oportuno.

Assim, não há falar em nulidade da decisão.

Quanto ao mais, sobre os juros remuneratórios, a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça é uníssona ao entender que com o advento da Lei 4.595/1964, restou suplantada a incidência do Decreto nº. 22.626/33 (Lei de Usura), ficando o poder normativo delegado para limitar as referidas taxas ao Conselho Monetário Nacional, salvo as exceções legais, entendimento este explicitado pela Súmula 596 do Supremo Tribunal de Federal:

“As disposições do Decreto 22626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional.”

De referir, ainda, que embora as normas inseridas no Código de Defesa do Consumidor sejam aplicáveis aos contratos entabulados com as instituições financeiras, pois que patente a relação de consumo, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 407.097/RS, publicado no DJ 29.09.2003, proclamou que a alteração da taxa de juros pactuada depende da demonstração cabal da sua abusividade, em relação à taxa média do mercado, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou de lucros excessivos, sendo insuficiente o simples fato de a estipulação ultrapassar 12% ao ano ou de haver estabilidade inflacionária no período (REsp's ns. 271.214/RS, 407.097/RS e 420.111/RS).

Dentre os inúmeros precedentes do STJ, destaco:

Bancário. Agravo no agravo de instrumento. Ação de revisão

contratual. Juros remuneratórios. Limitação. Inadmissibilidade. Capitalização mensal de juros. Possibilidade.

- A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade. Súmula 382/STJ.

- Nos contratos bancários celebrados após à vigência da Medida Provisória nº 1.963-17/2000 (reeditada sob o nº 2.170/36), admite-se a capitalização mensal de juros,, desde que pactuada.

Agravo no agravo de instrumento não provido. (AgRg no Ag 1058094 / RS; Ministra NANCY ANDRIGHI; DJe 23/11/2009)

Imprescindível mostra-se a expressa convenção acerca da taxa praticada, visto que a sua ausência enseja o livre arbítrio do credor de exigir cobrança de juros no percentual que bem entender, o que faz com que o consumidor assuma uma obrigação futura e incerta. (AgRg REsp 689.819/RS, AgRg no Ag 585.754/RS e REsp 551.932/RS).

Ademais, a partir do julgamento do REsp nº 1061.530/RS, restou pacificado pela jurisprudência que a limitação da taxa de juros remuneratórios em 12% ao ano, imposta pela Lei de Usura, não é aplicável às instituições financeiras.

A ementa restou assim redigida:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. (...) ORIENTAÇÃO 1 – JUROS REMUNERATÓRIOS.

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...)

(Recurso Especial n. 1.061.530 – RS (2008/0119992-4,) Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008). (grifei)

Esse posicionamento, inclusive, ensejou a formulação da Súmula 382, in verbis:

“A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.”

Por outro lado, eventual abusividade no caso concreto pode determinar a revisão dos juros contratados com base na Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC).

Tem entendido o STJ que, para a aferição da excessiva onerosidade dos juros remuneratórios, é necessário, apenas, o cotejamento da taxa contratada com a taxa média de mercado, sendo possível a revisão da taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato no caso de restar comprovado que o percentual cobrado não se encontra em consonância com a taxa média de mercado - a qual se configura mais condizente com a atual situação econômica do país -, mensalmente disponibilizada pelo BACEN.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO. CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS LIMITADOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. IMPROVIMENTO.

1.- Mantém-se a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado quando comprovada, no caso concreto, a significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa de mercado para operações da espécie.

2.- O agravante não trouxe qualquer argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, o qual se mantém por seus próprios fundamentos.

3.- Agravo Regimental improvido.

(AgRg no AREsp 504021 / RS
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL2014/0089812-6, Rel.
Min. SIDNEI BENETI, Terceira Turma, Julgado em 27.05.2014, DJe em 09.06.2014) grifado

Na espécie, a taxa de juros vem prevista em 1,36% ao mês, consoante se depreende do exame do contrato, não se configurando a alegada abusividade, porquanto essa taxa sequer supera a taxa média do Bacen para o período, que foi de 1,60% ao mês. Por conseguinte, hão de ser mantidos os juros remuneratórios como pactuados.

De outra banda, a capitalização mensal dos juros, na forma de precedentes do Superior Tribunal de Justiça, somente é permitida quando expressamente autorizada por lei específica, como nas cédulas de crédito rural, comercial e industrial, e nos contratos bancários em geral celebrados após 31 de março de 2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17, reeditada sob o nº 2.170-36, desde que previamente pactuada, conforme decidiu a egrégia Segunda Seção da mencionada Corte Superior, sendo ilustrativa a seguinte ementa:

“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO...

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