Acórdão nº 50038131520198210004 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sexta Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoDécima Sexta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50038131520198210004
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002318120
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

16ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003813-15.2019.8.21.0004/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR: Desembargador ÉRGIO ROQUE MENINE

APELANTE: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: PLACIDA WALKIRIA SIMAO FERREIRA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por FACTA FINANCEIRA S.A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO em face da sentença (ev. 42, SENT1), que julgou procedente o pedido veiculado na ação de revisão de contrato ajuizada por PLACIDA WALKIRIA SIMAO FERREIRA, nos seguintes termos:

''(...)

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido por PLÁCIDA WALKIRIA SIMÃO FERREIRA em desfavor de FACTA FINANCEIRA S.A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, extinguindo o feito com resolução de mérito, fulcro no artigo 487, I, do CPC, para:

a) confirmar e tornar definitiva a tutela de urgência concedida no Evento 2, Outros 3, p. 1/5; e

b) condenar a parte demandada a observar o patamar limite de 30% da remuneração bruta mensal da autora para todos os débitos referentes aos contratos existentes entre as partes.

Sucumbente, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e nos honorários do advogado da parte contrária, que, forte no art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC, considerando o labor desempenhado no feito e o tempo de tramitação, vão fixados em R$ 2.000,00, corrigidos monetariamente pelo IGPM, a contar da presente data, e acrescidos de juros moratórios de 12% ao ano, computados do trânsito em julgado.

(...)''

Em suas razões recursais (ev. 47) a parte recorrente afirma, preliminarmente, a carência de litisconsórcio necessário. No mérito, aduz que a relação contratual discutida nos autos foi firmada por meio da autonomia da vontade, e que o pacto não viola a legislação atinente à matéria. Afirma que os descontos não merecem nenhuma limitação. Sustenta a impossibilidade de aplicação analógica da lei federal n.º 10.820/2003. Pugna, subsidiariamente, pela limitação proporcional dos descontos. Nestes termos, requer o provimento do recurso. Tempestivo e devidamente preparado o recurso (ev. 47, docs. 2 e 3).

Em contrarrazões (ev. 52), a parte apelada rebate as alegações da parte apelante e roga pela negativa de provimento do recurso.

Por fim, registro observado o disposto nos artigos 931 e 934 do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

Litisconsórcio passivo

A discussão a respeito do litisconsórcio encontra amparo nos artigos 113, 114 e 115, todos do Código de Processo Civil, nestas palavras:

Art. 113. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:

I - entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;

II - entre as causas houver conexão pelo pedido ou pela causa de pedir;

III - ocorrer afinidade de questões por ponto comum de fato ou de direito.

§ 1º O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes na fase de conhecimento, na liquidação de sentença ou na execução, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa ou o cumprimento da sentença.

§ 2º O requerimento de limitação interrompe o prazo para manifestação ou resposta, que recomeçará da intimação da decisão que o solucionar.

Art. 114. O litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes.

Art. 115. A sentença de mérito, quando proferida sem a integração do contraditório, será:

I - nula, se a decisão deveria ser uniforme em relação a todos que deveriam ter integrado o processo;

II - ineficaz, nos outros casos, apenas para os que não foram citados.

Parágrafo único. Nos casos de litisconsórcio passivo necessário, o juiz determinará ao autor que requeira a citação de todos que devam ser litisconsortes, dentro do prazo que assinar, sob pena de extinção do processo.

No caso dos autos, a parte recorrente pugna pela nulidade do julgamento, ante a ausência de citação do ente pagador e demais instituições que realizam descontos facultativos na folha de pagamento da parte autora.

Em relação ao órgão pagador, este apenas desconta no contracheque da parte autora os valores repassados pela demandada e autorizados pela recorrida, inexistindo obrigatoriedade de figurar no pólo passivo da demanda.

Ademais, compulsando o comprovante de renda da parte autora ao ev. 2, Inicial e Documentos 2, nota-se, além do desconto do empréstimo ora em revisão, há mais dois débitos, discriminados como "EMP. BANRISUL", ''IPERGS'', ''GBOEX'' E ''UNIÃO PREVIDÊNCIA S/A''.

Cabe referir que é a parte autora quem fixa os limites da demanda ao expressar a causa de pedir e pedido, direcionando a ação a quem entender legítimo para figurar no pólo passivo.

Nesse norte, constitui faculdade da parte demandante avaliar a conveniência ou não da formação do litisconsórcio, pois o sistema processual não traz obrigatoriedade à propositura da ação contra todos os credores, tampouco comina penalidade pelo não uso do referido mecanismo, prevalecendo o disposto no art. 5º, XXXV, CF1.

Assim, tem-se que a situação em comento caracteriza litisconsórcio facultativo, nos termos do art. 113 do CPC. Portanto, inexiste óbice à análise somente dos descontos realizados pela FACTA, a qual integra o pólo passivo da ação.

Assim, preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso e o recebo em seus efeitos legais.

Passo ao julgamento.

Limitação de descontos

No tocante à limitação dos descontos efetuados na folha de pagamento da parte, oportuno se faz destacar que a cláusula que autoriza o desconto não é abusiva, seja por não ofender o princípio da autonomia da vontade, seja por não atingir o equilíbrio contratual ou a boa-fé, sendo mero expediente para facilitar a satisfação do crédito, não se revelando ônus para o consumidor, consoante já decidiu o colendo STJ (REsp 728563/RS, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, julgado em 08/06/2005).

Contudo, cabe ressaltar haver legislação específica regulamentando a matéria.

Isso porque, firmou, o Egrégio STJ, no sentido de que os descontos facultativos na folha de pagamento do servidor público ou pensionista devem ser limitados a 30% (trinta por cento) da remuneração, tendo em vista o princípio da razoabilidade e do caráter alimentar dos rendimentos.

Nota-se, que referida limitação, possui como finalidade principal, a de evitar o endividamento desenfreado e garantir o mínimo existencial para a pessoa, assegurando a sua própria subsistência e a da sua família, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana, sem, contudo, menosprezar a autonomia da vontade.

Nesse sentido, é o entendimento do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO AGRAVADA PUBLICADA NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. ASTREINTES. VALOR EXCESSIVO. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA N. 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de considerar que os descontos facultativos na folha de pagamento devem ser limitados a 30% (trinta por cento) da remuneração, tendo em vista o princípio da razoabilidade e do caráter alimentar dos vencimentos. Precedentes. [...] 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 786.641/MG, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 05/05/2016, DJe 12/05/2016).

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTO LIMITADO A 30% DA REMUNERAÇÃO. PRECEDENTES 1. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que os empréstimos consignados na folha de pagamento do servidor...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT