Acórdão nº 50038260320208212001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50038260320208212001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001570291
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003826-03.2020.8.21.2001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR: Desembargador ALTAIR DE LEMOS JÚNIOR

APELANTE: CHRISTIAN VITOR DA SILVA BRUNO (AUTOR)

APELANTE: REALIZE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por REALIZE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. e recurso adesivo interposto por CHRISTIAN VITOR DA SILVA BRUNO em face da sentença proferida em sede de ação anulatória cumulada com indenizatória.

Assim constou no relatório da sentença:

"(...)

Trata-se de AÇÃO ANULATÓRIA, INDENIZATÓRIA c/c PEDIDO LIMINAR ajuizada por CHRISTIAN VÍTOR DA SILVA BRUNO em face de REALIZE CREDITO FINANCIAMENTO, partes devidamente qualificadas nos autos.

Para tanto, relatou, em síntese, que que manteve contrato com as Lojas Renner e nada ficou em aberto, mas não com a ré, a qual faz parte do mesmo grupo econômico. Ocorreu que, a parte ré promoveu restrição indevida no SERASA no valor de R$ 630,60, inscrição esta que tem consequência no SCORE, gerando a diminuição do percentual e afetando a saúde financeira do autor. . Dissertou sobre o direito incidente, apontando os danos vivenciados. Ao final, requereu a procedência, com a declaração de inexistência do débito. Ainda, requereu a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, em valor não inferior a R$ 18.000,00. Postulou a concessão da gratuidade judiciária, e coligiu documentos com o evento 01.

Emenda à inicial no evento 06.

Indeferido o pedido de tutela de urgência, evento 08.

Citada, a parte ré contestou com documentos no evento 28. Preliminarmente, impugnou o pedido de gratuidade judiciária. No mérito, relatou que oferece crédito aos seus clientes, via o uso de seu de cartão de crédito, denominado Cartão de Crédito Renner (“CCR”), cuja contratação é condicionada a verificação das informações prestadas através de apresentação de documento de identificação; e utilização de recurso de biometria facial. Afirmou que, a parte autora contratou o CCR, o qual foi utilizado – mediante a inserção da senha cadastrada pelo cliente - para compras que não foram pagas. Referiu que, a parte autora possui 04 contratos em aberto, onde cumpriu parcialmente com a obrigação contratada. Sinalou que, nos 04 contratos existem parcelas liquidadas e parcelas em atraso, as quais o pagamento não foi comprovado. Quanto ao mais, negou a existência de conduta ilícita ou abusiva que tenha praticado, tampouco nenhuma atitude que possa ter causado dano à honra e à imagem da parte autora. Rejeitou a inexistência de dano moral indenizável. Pugnou pela improcedência.

Réplica no evento 32.

Intimadas para produção de provas, somente a parte ré se manifestou, evento 38.

Invertido o ônus da prova, restou intimada a ré para juntada de documentos, silenciando nos autos, eventos 53 e 59.

O autor requereu a procedência, evento 61.

Vieram os autos conclusos.

(...)"

E o dispositivo:

"(...)

Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação ajuizada por CHRISTIAN VÍTOR DA SILVA BRUNO em face de REALIZE CREDITO FINANCIAMENTO, nos termos do artigo 487, inciso III, “a”, do Novo Código de Processo Civil, tão somente para:

a) DEFERIR parcialmente a liminar requerida, para DETERMINAR que a parte ré efetue o cancelamento do registro de cobrança realizado no nome da parte autora demonstrado pelo anexo 09 do evento 01;

b) DECLARAR a inexistência de débito da parte demandante perante a ré, no valor de R$ 630,60 (seiscentos e trinta reais e sessenta centavos).

Diante do decaimento mínimo da demandante, condeno a parte ré a pagar as custas processuais e honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, que arbitro em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) sobre o valor atribuído à causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do Novo Código de Processo Civil.

(...)"

Em suas razões, a demandada apelou, sustentando, preliminarmente, a falta de interesse de agir do autor, bem como ipugnou a assistência judiciária concedida pelo juízo de origem. No mérito, relatou que oferece crédito aos seus clientes, via o uso de seu de cartão de crédito, denominado Cartão de Crédito Renner (“CCR”), cuja contratação é condicionada a verificação das informações prestadas através de apresentação de documento de identificação; e utilização de recurso de biometria facial. Afirmou que a parte autora contratou o CCR, o qual foi utilizado – mediante a inserção da senha cadastrada pelo cliente - para compras que não foram pagas. Referiu que, a parte autora possui 04 contratos em aberto, onde cumpriu parcialmente com a obrigação contratada. Sinalou que, nos 04 contratos existem parcelas liquidadas e parcelas em atraso, as quais o pagamento não foi comprovado. Defendeu que a inscrição do nome da parte autora nos cadastros de restrição ao crédito é exercício regular de direito, face à existência da dívida. Ainda, postulou pela reforma da decisão, com a consequente condenação da parte autora em multa sobre o valor corrigido da causa, além de indenização pelos prejuízos sofridos e do pagamento de honorários advocatícios e despesas efetuadas pela parte apelante, nos termos do art. 81 do CPC. Requereu a improcedência dos pedidos e prequestionou dispositivos legais. (Evento 75)

O autor, por sua vez, recorreu adesivamente, postulando a condenação do demandado em danos morais, diante da não aplicação da Súmula 385 do STJ ao caso dos autos e majoração dos honorários advocatícios. (Evento 82)

Foram apresentadas contrarrazões pela parte autora (Evento 81).

É o relatório.

VOTO

APELAÇÃO DA PARTE RÉ:

PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR. INOVAÇÃO RECURSAL.

Tendo em vista que, na peça de defesa, nada foi suscitado pela parte apelante acerca da ora alegada ausência de interesse de agir da parte autora, tenho que se trata de inovação recursal, não cabendo, portanto, o seu conhecimento.

Neste sentido:

“É inadmissível inovar o pedido em sede de recurso, visto que não se pode recorrer do que não foi objeto de discussão e decisão em primeira instância (RT 811/282).”1

Destarte, não conheço deste tópico do apelo.

PRELIMINAR. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DE JUSTIÇA.

O beneplácito foi deferido ao autor à vista dos documentos comprobatórios da necessidade alegada como acima referido.

De outro lado, o demandado não trouxe aos autos mínimo elemento para afastar a presunção da necessidade evidenciada pela referida prova documental.

Nesse contexto, não prospera a impugnação.

Preliminar rejeitada.

FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INOCORRÊNCIA. CONTRATAÇÃO E DÍVIDA COMPROVADAS.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 3º, §2º, incluiu expressamente a atividade bancária no conceito de serviço, nos seguintes termos:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. - grifei.

Desta forma, não restam dúvidas de que é aplicável às operações bancárias o Código de Defesa do Consumidor, entendimento, inclusive, sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 297, in verbis:

Súmula 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Portanto, a responsabilidade contratual do banco é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados a seus clientes por defeitos/falhas decorrentes dos serviços que lhes presta, conforme dispõe o art. 14 do CDC:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. – grifei.

Trata-se, assim, de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, fundada na teoria do risco do empreendimento, segundo a qual, consoante doutrina de Sérgio Cavaliere Filho “(...) todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, decorrendo a responsabilidade do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade e executar determinados serviços. Em suma, os riscos do empreendimento correm por conta do fornecedor (de produtos e serviços) e não do consumidor”.

Portanto, os requisitos para a configuração da responsabilidade são: falha na prestação do serviço, dano e nexo causal.

Nesse tipo de responsabilidade, o fornecedor somente afasta o dever de reparar o dano se provar (ônus seu) a ocorrência de uma das causas que excluem o nexo causal, enunciadas no §3º do art. 14 do CDC, quais sejam, a inexistência do defeito (falha na prestação do serviço) e a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

No caso dos autos, ainda que a parte autora negue a existência de relação jurídica com a demandada, resta evidente a relação jurídica entre as partes, uma vez que a demandante afirma ter mantido contrato com as lojas Renner, empresa que faz parte do mesmo grupo da empresa requerida, a qual é a mantenedora dos cartões fornecidos pelas lojas Renner.

A parte demandada, por...

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