Acórdão nº 50038891220198210013 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 13-12-2022

Data de Julgamento13 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50038891220198210013
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002971347
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5003889-12.2019.8.21.0013/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5003889-12.2019.8.21.0013/RS

TIPO DE AÇÃO: Crime de Descumprimento de Medida Protetiva de Urgência

RELATOR: Desembargador JONI VICTORIA SIMOES

RELATÓRIO

O Ministério Público, na Comarca de Erechim, ofereceu denúncia contra R. L. C., nos autos do processo físico nº 013/2.19.0001186-3, imputando-lhe a prática dos crimes previstos no artigo 24-A da Lei nº 11.340/06 e no artigo 147, do Código Penal, nos seguintes termos:

"1° FATO

Entre os dias 07 de setembro de 2018 e 24 de setembro de 2018, o denunciado R. L. C. descumpriu decisão judicial que deferira medidas protetivas de urgência previstas na Lei n° 11.340/2006 em favor de sua ex-companheira, D. D. C..

2° FATO

Na mesma condição de tempo e lugar, o denunciado R. L. C., ameaçou, por meio de palavras, sua ex-companheira D. D. C., de causar-lhe mal injusto e grave, incutindo-lhe fundado temor.

Na oportunidade, o ora denunciado, mesmo sabedor de que não poderia se aproximar da vítima, deslocou-se até a residência de D., por pelo menos três vezes.

Além disso, realizou ligações e mandou mensagens para a ofendida, ameaçando-a de colocar fogo em sua casa e ameaçou o namorado da vítima, dizendo-lhe que tinha comprado um revólver, dando a entender que os mataria."

A denúncia foi recebida, em 15/04/2019.

Devidamente citado, o acusado apresentou resposta à acusação.

Não sendo caso de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução, na qual foram colhidos os depoimentos da vítima e de uma testemunha, bem como realizado o interrogatório do réu.

Encerrada a instrução, as partes apresentaram memoriais.

Sobreveio sentença que julgou PROCEDENTE a ação penal, a fim de condenar R. L. C. nas sanções dos arts. 147 do Código Penal e 24-A da Lei nº 11.340/2006, na forma do art. 69, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 04 meses e 05 dias de detenção, em regime inicial aberto. Concedido, outrossim, o sursis penal, pelo período de 02 anos, mediante as condições de: (I) no primeiro semestre, comparecimento (12 encontros) a programa de orientação relacionado à violência doméstica e familiar, como forma de modificar o comportamento e coibir a reiteração de condutas como a apurada nos autos; (II) comparecer, mensalmente, perante o juízo da execução para informar seu endereço atualizado e suas atividades; (III) não se ausentar da Comarca, por mais de 30 dias, sem prévia comunicação e autorização do juízo.

O réu foi, ainda, condenado ao pagamento das custas processuais, cuja exigibilidade, contudo, restou suspensa, em razão de sua hipossuficiência econômica. Foi-lhe concedida a possibilidade de apelar em liberdade.

Publicada a sentença, em 09/11/2021.

Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, o qual foi recebido.

O acusado restou intimado da sentença.

O recurso foi recebido.

Em suas razões recursais, sustenta que não houve dolo na conduta do apelante em descumprir as medidas protetivas, uma vez que se deslocou até o local apenas para pedir que lhe devolvessem o telefone celular com o qual teria presenteado a filha. Disse que sequer tinha a intenção de conversar com a ex-companheira. Nesses termos, postula a absolvição do crime de descumprimento de medidas, por aticipidade da conduta. Quanto ao delito de ameaça, afirma que a palavra da vítima não é suficiente para amparar a condenação. Refere que a narrativa da testemunha não corrobora o relato vitimário. Argumenta que a ofendida imputou o fato em questão ao réu por ter ciúmes deste. Afirma, ainda, que não restou demostrado efetivo temor na vítima. Com essas considerações, postula a absolvição do crime de ameaça, por insuficiência probatória. Caso não acolhido o pleito absolutório, requer o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, o afastamento da agravante aplicada, eis que não descrita na denúncia.

O Ministério Público apresentou contrarrazões.

O feito foi digitalizado junto ao Sistema Eproc.

Subiram os autos, operando-se sua distribuição a esta Relatoria.

Em parecer ministerial, o Procurador de Justiça, Dr. Edgar Luiz de Magalhães Tweedie, opinou pelo improvimento do recurso defensivo.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.

Adianto que não merece guarida a pretensão defensiva absolutória.

A materialidade dos delitos de descumprimento de medida protetiva (1º fato) e ameaça (2º fato) restou evidenciada por meio do registro de ocorrência policial, do ofício que concedeu medidas protetivas à vítima, da intimação da aludida medida, bem como da prova oral angariada.

Na mesma linha, a autoria dos crimes é indubitável.

A fim de evitar desnecessária tautologia, bem como homenagear o trabalho efetuado pelo magistrado de origem, transcrevo a síntese da prova colhida ao longo do trâmite do feito, realizada na sentença a quo:

"(...)

Interrogado em juízo, o réu disse que estava tendo problemas para visitar e conversar com sua filha, por isso foi até a casa da vítima para entregar um celular que havia comprado para a menina. Negou ter realizado ameaça.

A vítima Divani confirmou os fatos narrados na denúncia. Disse que o réu ficava telefonando para lhe ameaçar. Que ele passou a ligar e mandar mensagens com a desculpa de que precisava falar com a filha. Referiu que a situação começou por ciúmes. Informou que o réu quebrou seu celular na frente da filha. Disse que ele lhe empurrou e lhe ofendeu.

A testemunha Lauri confirmou que o réu ligava para a vítima, ameaçando-a, e em uma das ocasiões ele falou que havia comprado um revólver.

(...)."

Pois bem, do conjunto probatório coligido, conclui-se pela manutenção da condenação do inculpado pela prática dos crimes que lhe foram imputados na denúncia.

Com efeito, no caso em tela, os relatos da vítima se mostraram firmes e lineares, desde a fase policial, no sentido de que, na ocasião do fato, o réu, seu ex-companheiro, descumpriu medidas protetivas que vigiam em seu favor, quando dela se aproximou, invadindo a sua propriedade, bem como para ela telefonou e mandou mensagens. Questionada se o teor da inicial acusatória era verdadeiro, no sentido de que o acusado teria ameaçado incendiar a sua residência, bem como indicado que iria comprar uma arma, assentiu. Salientou ter ficado "apavorada" com as ameaças, razão pela qual acionou a polícia.

Em que pese as alegações defensivas ventiladas nas razões recursais, é consabido que os delitos como o ora em análise, perpetrados mediante violência, no âmbito doméstico, são usualmente cometidos de forma clandestina, raramente deixando testemunhas. Assim, a jurisprudência majoritária vem entendendo que a palavra da ofendida – desde que firme, coerente e livre de indícios de interesse em falsa acusação – merece especial consideração, sendo, inclusive, suficiente para amparar um decreto condenatório.

Nesses termos, é o entendimento deste Colegiado:

APELAÇÃO. DELITO DE AMEAÇA E DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. Conjunto processual que autoriza a manutenção da condenação, porque há provas robustas e seguras de que o réu deliberadamente descumpriu as medidas protetivas de urgência, deferidas em favor de sua ex-mulher, bem como a ameaçou. Condenação mantida. PALAVRA DA VÍTIMA. nos crimes albergados pela Lei Maria da Penha, a palavra da vítima possui valor probante a ensejar decreto condenatório, pois geralmente é a única prova do acontecimento do delito, comumente praticado às escondidas, isto é, sem testemunhas presenciais. DOSIMETRIA DA PENA. Penas-bases mantidas nos mínimos legais - 01 (um) mês de detenção para o delito de ameaça e 03 (três) meses de detenção para o delito de descumprimento de medidas protetivas no âmbito doméstico. Incidente a atenuante da menoridade, todavia inviável a redução da reprimenda em observância à Súmula 231 do STJ. Configurado o concurso material, as penas vão somadas, totalizando 04 (quatro) meses de detenção. REGIME PARA CUMPRIMENTO DA PENA. Mantido o regime aberto, forte o artigo 33, § 2º, alínea c, do Código Penal. SUBSTITUIÇÃO. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos, porquanto se trata de ilícito cometido no âmbito da violência contra a mulher (artigo 17 da Lei nº 11.340/06). Preenchidos os requisitos do artigo 77 do Código Penal, vai mantida a suspensão condicional da pena. Todavia, inviável a aplicação de prestação de serviços à comunidade, pois fixada sanção inferior a 06 meses, substituindo, assim, por limitação de final de semana, pelo período da pena privativa de liberdade imposta. Mantidas as demais condições. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE.(Apelação Criminal, Nº 50033627820208210028, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Julgado em: 08-08-2022)

APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. CONTRAVENÇÃO PENAL. VIAS DE FATO. CONDENAÇÃO MANTIDA. Os elementos de convicção produzidos no curso da instrução demonstram a materialidade e autoria da contravenção penal de vias de fato praticada pelo réu contra a ofendida. Pedido de absolvição por insuficiência probatória desacolhido. PALAVRA DA VÍTIMA. VALOR PROBATÓRIO. Em se tratando de delitos cometidos no âmbito familiar, o depoimento da vítima apresenta especial valor probatório. Isso porque a maioria dos casos de violência doméstica não conta com testemunhas presenciais. Assim, não havendo provas a apontar a eventual existência de motivos para falsa incriminação, as declarações da ofendida devem ser consideradas como elemento para elucidar o fato. AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61, INCISO II, ALÍNEA “F”,...

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