Acórdão nº 50039818320218214001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50039818320218214001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001657380
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003981-83.2021.8.21.4001/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: PAULO RICARDO OURIQUES LOPES (AUTOR)

APELADO: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por PAULO RICARDO OURIQUES LOPES em face da sentença prolatada nos autos da ação de revisão de cláusulas contratuais em que contende com BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL. Constou na sentença apelada (Evento 21):

“[...] Ante o exposto, revogo a tutela concedida, JULGO EXTINTO, em parte, o feito, face o reconhecimento da prescrição do contrato de empréstimo nº 20090835301401055000814, nos termos do art. 487, II, do CPC e IMPROCEDENTES os pedidos para manter as estipulações pactuadas nos contratos nº 2014083530140155000461, nº 2015083530140155000114, nº 2016083530140155000686, nº 403961 e nº 2016083530100395000117. Condeno a parte autora, como sucumbente, a arcar com as custas processuais e honorários do advogado da parte adversa. Fixo honorários em R$1000,00 (um mil reais) para o procurador da requerida. Entretanto, suspendo a exigibilidade dos encargos de sucumbência em virtude da concessão da AJG.

Transitada em julgado e nada requerido, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.”

Em suas razões recursais, a parte apelante pede, em preliminar, a desconstituição da sentença, visto que não teve a oportunidade de apresentar réplica à contestação, tampouco de produzir provas, o que configura ofensa ao princípio do contraditório e da ampla defesa e do devido processo legal. Refere que houve cerceamento de defesa quando da prolação de sentença tão logo remetido o feito para o núcleo PROGRAM. No mérito, sustenta que o valor pago referente aos empréstimos pactuados nunca é amortizado, o que torna a dívida impagável. Argumenta não ter ocorrido a prescrição decenal do contrato, em razão das posteriores composições de dívidas. Alega que os juros remuneratórios foram pactuados de forma abusiva, pois superiores a 12% ao ano. Requer o provimento da apelação (Evento 28).

Foram apresentadas contrarrazões no evento 32.

É o relatório.

VOTO

A presente apelação, interposta no Evento 28, é tempestiva, pois o prazo para recorrer da sentença iniciou em 19/10/2021 e findou em 10/11/2021 (Evento 22), sendo que o recurso foi interposto em 10/11/2021 (Evento 28). Além disso, a parte autora é beneficiária da gratuidade judiciária (Evento 3), sendo dispensada do recolhimento do preparo.

Dessa forma, considerando que o recurso é próprio e tempestivo, recebo a apelação e passo ao exame da insurgência recursal.

Inicialmente, saliento que são objeto da revisão de cláusulas contratuais os seguintes contratos:

1) Contrato de Abertura de Crédito Pessoal Banrisul Com Garantia de Fiança nº 20090835301400155000814, firmado em 06/07/2009, no valor de R$ 23.000,00, a ser pago em 83 parcelas, mediante descontos em folha de pagamento, contendo a previsão de juros remuneratórios de 2,50% ao mês e 34,49% ao ano (Evento 1 – OUT6).

2) Cédula de Crédito Bancário nº 2014083530140155000461, firmada em 11/06/2014, no valor de R$ 6.517,87, a ser pago em 58 parcelas, mediante descontos em folha de pagamento, contendo a previsão de juros remuneratórios de 2,15% ao mês e 29,09% ao ano (Evento 1 – OUT7).

3) Cédula de Crédito Bancário nº 2015083530140155000114, firmada em 19/02/2015, no valor de R$ 11.500,00, a ser pago em 96 parcelas, mediante descontos em folha de pagamento, contendo a previsão de juros remuneratórios de 2,30% ao mês e 31,38% ao ano (Evento 1 – OUT8).

4) Cédula de Crédito Bancário nº 2016083530140155000686, firmada em 17/11/2016, no valor de R$ 55.849,67, a ser pago em 96 parcelas, mediante descontos em folha de pagamento, contendo a previsão de juros remuneratórios de 1,85% ao mês e 24,61% ao ano (Evento 1 – OUT9).

5) Cédula de Crédito Bancário nº 2016083530100395000117, firmada em 22/12/2016, no valor de R$ 7.640,99, a ser pago em 48 parcelas, mediante descontos em folha de pagamento, contendo a previsão de juros remuneratórios de 1,75% ao mês e 23,15% ao ano (Evento 1 – OUT10).

6) Cédula de Crédito Bancário nº 403961, firmada em 08/08/2017, no valor de R$ 73.592,72, a ser pago em 180 parcelas, mediante descontos em folha de pagamento, contendo a previsão de juros remuneratórios de 1,65% ao mês e 21,70% ao ano (Evento 1 – OUT11).

1. PRELIMINAR RECURSAL. CERCEAMENTO DE DEFESA.

Alega a parte autora que a sentença deve ser anulada, uma vez que configurado o cerceamento de defesa, porquanto foi tolhida do direito de apresentar réplica, bem como, de produzir provas.

Pois bem.

Com efeito, dispõe o artigo 282 do CPC/2016:

Art. 282. Ao pronunciar a nulidade, o juiz declarará que atos são atingidos e ordenará as providências necessárias a fim de que sejam repetidos ou retificados.

§ 1º O ato não será repetido nem sua falta será suprida quando não prejudicar a parte.

§ 2º Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta.

No caso dos autos, de fato, não houve a intimação da parte autora para apresentar réplica à contestação do evento 14, visto que foi apresentada petição pelo autor no evento 16 e remetidos os autos ao PROGRAM, que julgou antecipadamente o feito (Evento 21).

No entanto, não há de ser declarada a nulidade da sentença, tendo em vista que não houve qualquer prejuízo à parte autora em razão da ausência de intimação para apresentação de réplica, na forma do art. 282, §1º, do CPC.

Ademais, cabe referir que a presente ação de revisão de cláusulas contratuais se trata de matéria eminentemente de direito, não demandando a produção de outras provas.

Isso transcorre da possibilidade de o julgador formar sua convicção a partir dos elementos constantes na prova documental, em especial nos contratos e outros documentos.

Nesse sentido é o entendimento sedimentado por esta Câmara nas ações revisionais, podendo ser perfeitamente adotado para o caso dos autos:

APELAÇÕES CÍVEIS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. Apelo da parte ré. [...] CERCEAMENTO DE DEFESA PROVA PERICIAL. Não configurado, tendo em vista que a realização de perícia contábil, antes da definição dos parâmetros a serem adotados no cálculo do débito, por meio do julgamento da revisão contratual, se apresenta inócua. Preliminar rejeitada. [...] PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÕES CÍVEIS PARCIALMENTE PROVIDAS. (Apelação Cível Nº 70080347990, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Altair de Lemos Junior, Julgado em 27/02/2019) (grifei)

Aliás, a parte apelante sequer especificou nas razões do recurso quais provas pretendia produzir.

Assim, considerando que os documentos necessários ao julgamento do feito, relativos aos contratos em questão, já foram colacionados aos autos, não há falar na necessidade de realização de demais provas.

Desse modo, deve ser rejeitada a preliminar recursal.

2. PRESCRIÇÃO.

O prazo prescricional para revisar cláusulas contratuais com a eventual restituição dos valores pagos a maior é fundada em direito pessoal, aplicando-se, portanto, o prazo decenal preconizado no art. 205 do Código Civil.

O termo inicial do aludido prazo é a data da assinatura do contrato, e para a repetição do indébito é data do pagamento indevido.

A corroborar com o expendido, cito precedentes do STJ:

“AGRAVO INTERNO INTEOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/2015. FUNDAMENTOS DA DECISÃO DE INADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL DEVIDAMENTE REBATIDOS. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL INTEOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. AÇÃO REVISIONAL COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE CONTA-CORRENTE. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 458 DO CPC/1973. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282/STF. PRESCRIÇÃO. AÇÃO REVISIONAL. PRAZO VINTENÁRIO DO CC/1916 E DECENAL DO CC/2002. SÚMULA N. 83/STJ.

1. [...].

3. Nas ações revisionais de contrato bancário, adota-se o prazo prescricional vintenário na vigência do Código Civil de 1916 e o decenal na vigência do Código Civil de 2002.

4. Agravo interno desprovido.”

(AgInt no AREsp 868.658/PR, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/06/2016, DJe 01/07/2016). g.n.

“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRESCRIÇÃO. PRAZO. ARTIGOS 177 DO CC/16 E 205 DO CC/2002.

REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. CONSTATAÇÃO DA MÁ-FÉ. NECESSIDADE.

AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. A prescrição para a restituição/repetição de valores pagos indevidamente em função de contrato bancário segue os prazos previstos nos artigos 177 do Código Civil revogado e 205 do Código Civil vigente, respeitada a norma de transição do artigo 2.028 deste, e tem como termo inicial o efetivo prejuízo (pagamento ou lesão).

2. A Segunda Seção desta Corte firmou o entendimento de que a devolução em dobro dos valores pagos pelo consumidor somente é possível quando demonstrada a má-fé do credor, o que não ocorreu no caso dos autos.

3. Agravo interno a que se nega provimento.”

(AgRg no REsp 1019495/MT, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 19/04/2016, DJe 29/04/2016). g.n.

E desta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. As ações revisionais de contrato bancário e a consequente restituição dos valores pagos a maior são fundadas em direito pessoal, motivo pelo qual o prazo prescricional é de dez anos, na forma do art. 205 do Código Civil de 2.002. No caso, como não transcorreu o prazo decenal entre a celebração do contrato e a propositura da ação, deve ser afastada a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT