Acórdão nº 50040883120198210014 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Turma Recursal da Fazenda Pública, 30-08-2022

Data de Julgamento30 Agosto 2022
ÓrgãoTerceira Turma Recursal da Fazenda Pública
Classe processualRecurso Inominado
Número do processo50040883120198210014
Tribunal de OrigemTurmas Recursais
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:10022770100
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Turma Recursal da Fazenda Pública

RECURSO INOMINADO CÍVEL Nº 5004088-31.2019.8.21.0014/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Moral

RELATORA: Juiza de Direito LILIAN CRISTIANE SIMAN

RECORRENTE: MUNICÍPIO DE ESTEIO (REQUERIDO)

RECORRIDO: FABIANO PEREIRA DOS SANTOS (REQUERENTE)

RECORRIDO: GISLAINE PEREIRA DOS SANTOS (REQUERENTE)

RELATÓRIO

Trata-se de ação de reparação de danos materiais cumulada com danos morais em que pleiteia a parte autora a condenação do réu no pagamento de indenização por morais em decorrência de alagamento de sua residência por deficiência do sistema de escoamento das águas pluviais no mês de julho do ano de 2015.

Citado, o réu contestou.

Foi prolatada sentença de parcial procedência.

Recorreu o demandado.

VOTO

Eminentes colegas,

Analisados os pressupostos de admissibilidade estipulados pelo art. 42 da Lei nº 9.099/95 passo ao exame do recurso.

Com relação à preliminar de ilegitimidade passiva reafirmada pelo réu em razões de recurso, foi afastada na sentença e não merece acolhida. A causa de pedir trazida a exame pela parte autora na inicial é a que diz com a deficiente manutenção da drenagem de águas pluviais, ato de responsabilidade do ente municipal.

No que se refere à preliminar de ilegitimidade ativa, em face ao fato (alagamento da residência da parte autora) e de residirem os autores no local de alagamentos na época do evento danoso, igulamente não merece acolhida, porquanto o documento acostado no EVENTO 2, FATURA 103 (conta de TV por assinatura), comprova que a autora Gialaine residia no endereço declinado na inicial da ação em 05/07/2015.

No mérito, o juízo de procedência merece ser reformado no tocante ao quantum fixado a título de danos morais, de logo adianto.

A responsabilidade civil do Estado vem prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, in verbis:

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Logo, a regra geral para a imposição de responsabilidade Estatal por atos de seus agentes, é de que se dá ela de forma objetiva, teoria do risco administrativo, não exigindo a comprovação da culpa ou dolo do agente.

Yuseff Said Cahali1 leciona:

“No capítulo anterior, sustentou-se (n. 13, retro) a causalidade como fundamento da responsabilidade objetiva do Estado: a obrigação de indenizar surge, para o ente público, da causação do dano injusto pelos seus agentes; e no parágrafo seguinte (n. 14, retro) examinou-se o reconhecimento da responsabilidade objetiva do Estado em função do princípio da causalidade.

Mas, conforme ali também foi visto, qualquer que seja o entendimento adotado (teoria do risco, teoria do risco integral, teoria do risco administrativo, teoria do risco social), a causa do dano coloca-se como pressuposto necessário da responsabilidade civil do Estado.

Assim, o prejuízo de que se queixa o particular tem que ser conseqüência da atividade ou omissão administrativa: “A responsabilidade da Administração Pública, desvinculada de qualquer fator subjetivo, pode, por isso, ser afirmada independentemente de demonstração de culpa – mas está sempre submetida, como é óbvio, à demonstração de que foi o serviço público que causou o dano sofrido pelo autor.

A causa geradora do dano tanto poderá ser representada por uma atividade lícita, normal, da Administração Pública; como por um ato anormal, ilícito, de seus agentes; para a determinação da responsabilidade civil do Estado, reclama-se porém a existência de um nexo causal entre o dano e a atividade ou omissão da Administração Pública, ou de seu nexo com o ato do funcionário, ainda que lícito, ainda que regular.”

A questão foi pacificada no STF por ocasião do julgamento do RE nº 841.526/RS, no sentido do reconhecimento da responsabilidade objetiva do ente público tanto para atos comissivos como para omissivos:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR MORTE DE DETENTO. ARTIGOS 5º, XLIX, E 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A responsabilidade civil estatal, segundo a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 6º, subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, posto rejeitada a teoria do risco integral. 2. A omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nos casos em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso. 3. É dever do Estado e direito subjetivo do preso que a execução da pena se dê de forma humanizada, garantindo-se os direitos fundamentais do detento, e o de ter preservada a sua incolumidade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal). 4. O dever constitucional de proteção ao detento somente se considera violado quando possível a atuação estatal no sentido de garantir os seus direitos fundamentais, pressuposto inafastável para a configuração da responsabilidade civil objetiva estatal, na forma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. 5. Ad impossibilia nemo tenetur, por isso que nos casos em que não é possível ao Estado agir para evitar a morte do detento (que ocorreria mesmo que o preso estivesse em liberdade), rompe-se o nexo de causalidade, afastando-se a responsabilidade do Poder Público, sob pena de adotar-se contra legem e a opinio doctorum a teoria do risco integral, ao arrepio do texto constitucional. 6. A morte do detento pode ocorrer por várias causas, como, v. g. , homicídio, suicídio, acidente ou morte natural, sendo que nem sempre será possível ao Estado evitá-la, por mais que adote as precauções exigíveis. 7. A responsabilidade civil estatal resta conjurada nas hipóteses em que o Poder Público comprova causa impeditiva da sua atuação protetiva do detento, rompendo o nexo de causalidade da sua omissão com o resultado danoso. 8. Repercussão geral constitucional que assenta a tese de que: em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte do detento. 9. In casu, o tribunal a quo assentou que inocorreu a comprovação do suicídio do detento, nem outra causa capaz de romper o nexo de causalidade da sua omissão com o óbito ocorrido, restando escorreita a decisão impositiva de responsabilidade civil estatal. 10. Recurso extraordinário DESPROVIDO. (RE 841526, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 30/03/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-159 DIVULG 29-07-2016 PUBLIC 01-08-2016)

No mesmo sentido, em sede de uniformização de jurisprudência no âmbito dos JEFAZ, seguiu-se a decisão no IUJ nº 71008591331 assim ementada:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. TURMAS RECURSAIS DA FAZENDA PÚBLICA REUNIDAS. RESPONSABILIDADE CIVIL, EM CASO DE OMISSÃO ESTATAL, POR DANOS DECORRENTES DE ALAGAMENTOS E INUNDAÇÕES. DIVERGÊNCIA ENTRE AS TURMAS FAZENDÁRIAS SOBRE SER OBJETIVA OU SUBJETIVA A RESPONSABILIDADE ESTATAL NA HIPÓTESE. ACOLHIMENTO DO INCIDENTE E UNIFORMIZAÇÃO DO ENTENDIMENTO, COM A EDIÇÃO DE ENUNCIADO NOS SEGUINTES TERMOS: "A RESPONSABILIDADE CIVIL ESTATAL, NOS CASOS DE OMISSÃO, GENÉRICA OU ESPECÍFICA, EM HIPÓTESE DE ALAGAMENTOS E INUNDAÇÕES, É OBJETIVA, RESSALVADA A PROVA, PELO ENTE PÚBLICO, DE ROMPIMENTO DO NEXO CAUSAL ENTRE A OMISSÃO E O DANO EXPERIMENTADO PELO PARTICULAR". INCIDENTE CONHECIDO E UNIFORMIZADO O ENTENDIMENTO, POR MAIORIA, COM EDIÇÃO DE ENUNCIADO.(Incidente de Uniformizacao Jurisprudencia, Nº 71008591331, Turmas Recursais da Fazenda Pública Reunidas, Turmas Recursais, Relator: Laura de Borba Maciel Fleck, Julgado em: 19-12-2019)

Estabelecida a responsabilidade objetiva do ente público, exige-se somente a prova do ato/fato atribuível ao ente, do dano e do nexo...

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