Acórdão nº 50041678820168210022 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 18-05-2023

Data de Julgamento18 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50041678820168210022
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003607497
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004167-88.2016.8.21.0022/RS

TIPO DE AÇÃO: Sucessões

RELATOR: Juiz de Direito MAURO CAUM GONCALVES

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por A. C. A. P. D. A. em face da sentença que, nos autos da ação ordinária com pedido de antecipação de tutela ajuizada em face de A. R. P. D. A., R. M. D. A. R. e G. D. A. R., julgou improcedentes os pedidos, nos seguintes termos do dispositivo:

Em suas razões, defendeu que as aquisições de imóveis realizadas pelos réus foram, na realidade, doações inoficiosas ou doações em antecipação de legítima, ou simulações, ou fraudes praticadas por eles e pelo falecido pai, Adão. Afirmou que a sentença apenas abordou o tema sob a égide dos reflexos sucessórios, nada dizendo sobre a existência de simulação ou fraude nos negócios jurídicos realizados pelos apelados. Insistiu que a análise dos autos torna impositiva a declaração do vício social ou vício de vontade nas transações realizadas, pois o genitor comprou com recursos próprios imóveis em nome de sua filha e netos. Asseverou que, independentemente de ser desnecessária a colação no caso dos imóveis doados aos netos, o Juízo a quo deveria examinar a alegação de simulação da compra e venda, o que não fez. Quanto à filha Rosa, afirmou ter havido doações inoficiosas ou antecipação de legítima, sendo irrelevante analisar o percentual de sua participação no acervo patrimonial deixado pelo de cujus. Advogou que como as doações foram feitas, simulando compra e venda, já se denota a ilicitude do ato, somada ao fato de Rosa ter ocultado a sua filiação na certidão de óbito do genitor. Narrou que os apelados são confessos no que toca o recebimento de doações e vantagens por iniciativa de Adão. Ainda, disse que a morte da viúva meeira no curso da lide não altera seu pedido, afinal contra ela também pendiam imputações de fraudes e, à época dos fatos, o patrimônio era um só. Aduziu que a documentação bancária e as declarações de imposto de renda feitas por Adão comprovam que ele não tinha patrimônio capaz de tornar lícitas as doações realizadas. Destacou que Rosa afirmou sempre trabalhar como cabeleireira ou artesã, mas ela deixou de declarar rendimentos à Receita Federal por vários anos. Pontuou que a irmã chegou a declarar bens adquiridos muitos anos antes de passar a oficializar os seus rendimentos junto à Receita Federal, acrescentando que o pai tinha boa renda anual, desfazendo-se de praticamente todo o numerário que amealhava em prejuízo de seu filho. Discorrendo sobre a movimentação bancária de Rosa, assinalou créditos incompatíveis com a alegada ausência de renda. Com tais aportes, pleiteou o provimento do apelo, reformando-se a sentença para julgar procedente o pedido.

Sem contrarrazões, ascenderam os autos a esta Corte, sendo a mim distribuídos.

O Ministério Público ofertou parecer, opinando pelo desprovimento do apelo.

Declinada da competência por entender tratar-se a matéria de atribuição jurisdicional das Câmaras integrantes dos Colendos 9º e 10º Grupos Cíveis, os autos foram redistribuídos à 17ª Câmara Cível, de rel. da Desª Liege Puricelli Pires.

Suscitado conflito de competência, esta 1ª Vice-Presidência o acolheu, fixando a competência deste Grupo Cível.

Os autos retornaram a mim conclusos.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade (art. 1.009 do Código de Processo Civil), conheço do apelo.

Trata-se de ação que pretende a anulação de supostas doações realizadas ainda em vida por A. P. D. A., as quais teriam superado a legítima e ocasionado prejuízo à herança do autor, apelante. No entanto, o autor não se desincumbiu do ônus de comprovar que o patrimônio existente em nome dos réus é fruto de simulação ou fraude ocorrida entre eles e o de cujus, ônus que lhe incumbia.

Assim, considerando a minúcia com que analisada a questão, rogo vênia para transcrever e integrar ao presente voto as razões expendidas pelo Ministério Público, neste grau recursal, de lavra do douto Procurador Fábio Bidart Piccoli, a fim de evitar desnecessária tautologia, enquanto comungo do desfecho por ele alcançado:

Com efeito, a pretensão do demandante é ambiciosa: por entender violado o seu direito sucessório, ele busca a anulação de todos os negócios jurídicos de compra e venda de imóveis realizados pelos réus, porque eles encobririam verdadeiras doações realizadas em vida pelo de cujus e que, portanto, deveriam ser objeto de colação no seu inventário.

De fato, é sabido que, para efeito de cumprimento do dever de colação, é irrelevante se o herdeiro nasceu antes ou após a doação, não havendo também diferença entre os descendentes, se são eles irmãos germanos ou unilaterais ou se supervenientes à eventual separação ou divórcio do doador. O que deve prevalecer é a ideia de que a doação feita de ascendente a descendente, por si só, não é considerada inválida ou ineficaz pelo ordenamento jurídico, mas impõe ao donatário a obrigação protraída no tempo de, à época do óbito do doador, trazer o patrimônio recebido à colação, a fim de igualar as legítimas, caso não seja ele o único herdeiro necessário, conforme preceituam os artigos 2.002, parágrafo único, e 2.003 do Código Civil.

Da mesma forma, não se ignora que o dever de colacionar os bens recebidos por ato de liberalidade só se dispensa por expressa manifestação do doador, determinando que a doação seja extraída da parte disponível de seus bens.

Ocorre que, antes de se falar do dever de colação, é necessário comprovar que houve um negócio jurídico simulado, cuja consequência não seria a nulidade do ato, mas a subsistência do negócio que se dissimulou – no caso, uma doação de ascendente a descendente ou de um...

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