Acórdão nº 50042822420208210005 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Câmara da Função Delegada dos Tribunais Superiores, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50042822420208210005
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoCâmara da Função Delegada dos Tribunais Superiores

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002297654
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

Departamento de Recursos aos Tribunais Superiores

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

AGRAVO INTERNO EM Apelação Cível Nº 5004282-24.2020.8.21.0005/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATORA: Desembargadora LIZETE ANDREIS SEBBEN

AGRAVANTE: CLAUDIO ANTONIO MANFROI (EMBARGANTE)

AGRAVANTE: MARISTELA SCOTTON MANFROI (EMBARGANTE)

AGRAVADO: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL (EMBARGADO)

RELATÓRIO

Trata-se de agravo interno interposto por CLÁUDIO ANTÔNIO MANFROI e MARISTELA SCOTTON MANFROI, recurso previsto no artigo 1.021 do Código de Processo Civil, apresentado em face de decisão proferida pela 3ª Vice-Presidência que, de acordo com o decidido nos paradigmas Recurso Especial n. 1.061.530/RS – Temas 24 a 27 e Recurso Especial n. 973.827/RS – Temas 246 e 247, analisados sob o rito dos Recursos Repetitivos do Superior Tribunal de Justiça, negou seguimento ao recurso especial, não o admitindo em relação às demais questões.

Os agravantes, reeditando as razões já apresentadas em sede de recurso especial, defenderam a não incidência, ao caso dos autos, das Teses firmadas nos Temas 24 a 27, 246 e 247 do Superior Tribunal de Justiça. Após, em síntese, assim manifestaram:

"O E.STJ, ao julgar o REsp 973.827/RS, de fato firmou entendimento de que “É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.”

Lançando mão deste entendimento, o TJ/RS negou seguimento ao Recurso interposto pelos agravantes. Entretanto, a capitalização mensal dos juros, mesmo quando expressamente pactuada, em contratos como o presente, não é admitida, pois o artigo 591 do atual Código Civil permite, como regra geral, apenas a capitalização anual. Contudo, em se tratando de mera permissão legal, mesmo a incidência anual depende de pactuação nesse sentido.

O simples fato de constar taxa de juros mensal diferente da taxa de juros anual nos extratos bancários não é suficiente para comprovar a sua contratação, posto que a incidência dessa forma de composição das parcelas deveria ser redigida de forma clara e específica.

Portanto, tendo em vista a falta de transparência quanto a contratação da capitalização dos juros, inviável a sua incidência em qualquer periodicidade, devendo ser afastada.

Quanto à edição da Medida Provisória nº. 1.963-17, de 30 de março de 2000, cumpre referir que o STJ firmou entendimento no sentido de que somente é possível a capitalização mensal de juros, nos contratos firmados na vigência da referida MP, desde que expressamente pactuada.

No caso em tela, conforme se observa, não há previsão expressa de incidência de capitalização de juros mensal, contudo, ao analisar o cálculo apresentado pela instituição financeira, verifica-se a aplicação mensal, estando em desacordo com o que prevê a legislação vigente.

A lei permite a cobrança de capitalização anual de juros (art. 591 do Código Civil), caso não haja previsão contratual lícita em período inferior, devendo, portanto, no caso concreto ser declarada sua incidência abusiva (ilícita).

Com efeito, declarada abusiva a incidência de capitalização de juros mensal sem previsão contratual, fica o contrato desprovido e a regra legal de incidência anual é a conclusão que se impõe. Destarte, deve haver recálculo da dívida, para que a capitalização de juros seja anual.

Tendo em vista a orientação instituída pelo CDC de que deve haver interpretação favorável ao consumidor dos dispositivos legais, não há como aplicar artigo de lei que está sendo discutido judicialmente. Portanto, por mais este motivo não é possível a incidência da capitalização mensal. Assim, face todo o exposto, impõe-se o afastamento da capitalização dos juros em qualquer periodicidade.

Deste modo e diante de todo o exposto, deve ser afastada a incidência de qualquer matiz dos Temas Repetitivos 246 e 247 do STJ, porquanto no caso em tela, conforme se observa, não há previsão expressa de incidência de capitalização de juros mensal, contudo, ao analisar o cálculo apresentado pela instituição financeira, verificase a aplicação mensal, estando em desacordo com o que prevê a legislação vigente. Destarte, ao recurso foi negado seguimento também em razão da tese firmada quando do julgamento do Resp 1.061.530/RS, qual seja “as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF.”

Acontece, todavia, com todo respeito, mais uma vez o entendimento exarado na decisão recorrida não está em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, pois o próprio tema 27 dispõe que “é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1 º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto”.

No caso em comento foi reconhecida a relação de consumo, de modo que as cláusulas contratuais podem ser revistas de ofício, bem como os recorrentes discorreram de forma clara e precisa quais seriam as abusividades, conforme se pode perceber no tópico D do recurso especial.

Assim, bem demonstrado estão os motivos pelos quais deve ser reformada a decisão proferida pela Vice-Presidência, de modo que seja conferido juízo positivo de admissibilidade ao Recurso Especial interposto por não incidências dos temas repetitivos 24,25,26,27 e 246 e 247 do STJ."

Por fim, pugnaram seja conhecido e provido o presente agravo interno, para o fim de reformar a decisão agravada, admitindo-se o trânsito do recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça.

Intimada a apresentar suas contrarrazões, a parte agravada ofereceu resposta postulando seja negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se hígida a decisão recorrida. Rogou, ainda, seja fixada multa sobre o valor atualizado da causa, conforme estabelecido no artigo 1.021, §4º, do Código de Processo Civil.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Inicialmente, consigno ser deste Tribunal a competência para a análise do presente agravo, porquanto interposto em face de decisão que negou seguimento a recurso especial com base em entendimento firmado pelo C. STJ, em sede de recursos repetitivos. É o que dispõe o artigo 1.030, §2º, do CPC, in verbis:

Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá:

I – negar seguimento:

a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral;

b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos;

(...)

§ 1º Da decisão de inadmissibilidade proferida com fundamento no inciso V caberá agravo ao tribunal superior, nos termos do art. 1.042.

§ 2º Da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo interno, nos termos do art. 1.021.

Cumpre, também, informar que o presente agravo será analisado tão somente sob o enfoque do decidido nos Recursos Especiais n. 1.061.530/RS – Temas 24 a 27 e n. 973.827/RS - Temas 246 e 247 do STJ, já que a competência delegada pelos Tribunais Superiores a este órgão jurisdicional se restringe a verificação de adequação das decisões proferidas em relação às Teses fixadas pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça sob o rito dos Recursos Repetitivos.

Passo, pois, à análise da insurgência recursal, a qual, adianto, não merece prosperar.

Constou do aresto recorrido:

"Analisando o contrato de confissão de dívida com fiança objeto dos embargos à execução, tenho que a taxa de 1,40% ao mês e 18,16% ao ano (evento 15 - CONTR2) não se mostra abusiva, pois não ultrapassa mais do que o dobro da taxa média mensal de mercado da data da contratação (26-11-2018), a qual era de 13,47% ao ano, isto é, 1,12% ao mês, considerando que a taxa média do BACEN é divulgada para cada modalidade de crédito, com classificação por tipo de encargo e por categoria de tomador...

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